"Ponto de vista" : As hipocrisias do "poder local" das Freguesias.


        As hipocrisias do "poder local" das Freguesias.


Participei recentemente  numa reunião em que o presidente da Junta da União de Freguesias onde tenho a minha residência tentou explicar a um conjunto de cidadãos nela também moradores quais eram os recursos de que dispunha bem como as competências que lhe estavam atribuídas.

A grande maioria dos presentes ficou espantada com o quadro que lhes foi descrito: aquela União de Freguesias tinha (e tem) cerca de 50000 residentes, havendo cerca de 43000 eleitores (não necessariamente residentes pois uma quantidade apreciável, embora difícil de estimar dado que um significativo número de emigrantes não estará a nela residir neste momento - situação que a lei admite na medida em que todos os cidadãos com bilhete de identidade estão automaticamente recenseados como eleitores).

Ou seja, tem quase a mesma população do concelho de Évora, cuja Câmara Municipal dispõe de mais de 1000 colaboradores, enquanto a Junta de Freguesia da citada União tem ao seu serviço apenas cerca de 50 pessoas.

E, enquanto o orçamento municipal de Évora para 2019 é da ordem dos 55 milhões de Euros, o da União em causa nem chega a meio milhão.

Acresce que poucos cidadãos estarão conscientes de que nos 7 elementos que compõem a referida Junta apenas o Presidente tem uma remuneração significativa (cerca de 2300 Euros mensais), pois o Secretário e o Tesoureiro auferem pouco mais de 200, e os restantes 150 cada, numa soma da ordem dos 3500 Euros para o total do executivo.

Não é assim de admirar que, tal como escrevi recentemente nestas mesmas páginas que, quando instado sobre a resolução de problemas que muitas vezes se apresentam como sendo simples, o presidente da Junta responda argumentando que o assunto é da competência da Câmara Municipal, ou que não tem recursos apropriados.

Cabe referir novamente, como já o fiz nestas páginas, que as maiores preocupações dos cidadãos a nível local incidem sobre a organização da recolha de resíduos, a ordenação do trânsito e do estacionamento automóvel, o ruído nocturno, a poluição por dejectos caninos, a limpeza das vias públicas e a  respectiva iluminação, pequenas reparações nas calçadas, a segurança nas ruas, a proliferação de desenhos nos edifícios, e um melhor conhecimento das actividades dos órgãos de poder local.

Em diversos dos casos indicados, e tal como acentuei recentemente, uma simples delegação de competências (incluindo o aumento do respectivo âmbito) dos órgåos de polícia municipal, reportando em primeira instância ao Presidente da Junta, com conhecimento à autoridade policial (PSP/GNR), e noutros casos algumas transferências de competências e de recursos em pessoal e meios financeiros, bastariam para melhorar sensivelmente o ambiente de vida local, e para assim aumentar significativamente o grau de interesse e participação nas reuniões públicas quer da Junta quer da Assembleia.

Com as saudáveis consequências no processo de escolhas dos nossos representantes, pois os próprios partidos políticos não deixariam de dar muito mais atenção às situações em que os cidadãos se encontram mais perto dos seus representantes.

Porém as disposições legais que têm vindo a ser publicadas sob o diáfano manto de uma "descentralização" que contudo  termina no patamar municipal, sem que tenha havido adequada audição prévia das Assembleias de Freguesia, acentuam as características administrativas das competências transferidas a partir do poder central, em detrimento das que poderiam e deveriam ser fomentadas ao nível do poder político de base.

A hipocrisia que esteve em 2013 na  base da aglutinação de freguesias em mega-"Uniões" (dezenas...) persiste assim na incoerência de lhes não serem atribuídos adequados recursos e correspondentes competências, enquanto não voltar a haver uma desejável reorganização do Poder Local.



E a democracia vai larvarmente definhando, com diversos cidadãos procurando já outras alternativas.

20.Janeiro.2019