Emigração e distorções eleitorais.
Conforme referi em texto anterior, o novo recenseamento eleitoral faz pressupor que continuam a nele estarem inscritos muitos milhares de eleitores que residem habitualmente no estrangeiro, uma vez que o número de recenseados no território nacional com idade igual ou superior a 18 anos é de cerca de 9,3 milhões, o que deveria corresponder a cerca de 83% da população total possuidora de nacionalidade portuguesa - que portanto se situaria perto dos 11 milhões, número bem acima do que é habitualmente referido por diversas fontes.
Assim, se admitirmos a hipótese de não sermos 11 milhões, mas apenas 10,5 (número mesmo assim superior aos que são aventados), pelo que os cerca de 83% deveriam corresponder a 8,7 milhões de recenseados, sendo a diferença para os 9,3 milhões (600 mil), imputável a emigrantes que mantêm no documento de identificação nacional a residência no nosso país.
E se em vez dos citados 10,5 fossem só 10,2 ? "É só fazer as contas" (como alguém dizia...) para se atingir um número da ordem dos 800 mil.
Recordemos entretanto que nas eleições em 2015 para a Assembleia da República os recenseados com morada indicada no território nacional eram em quantidade muito próxima da actual, pelo que se afigura lícito considerar estável o actual modelo de recenseamento, e sólidos os respectivos números, e procedermos a algumas reflexões sobre a influência que tais circunstâncias poderão ter nos resultados eleitorais do próximo Outubro.
Não devemos esquecer que os emigrantes elegem 4 deputados, e que ao manterem a indicação de residência em território nacional não só ficam impedidos de votar nos seus representantes nos círculos Iegais destinados aos cidadãos residentes no estrangeiro como também contribuem para que a distribuição dos emigrantes pelos círculos eleitorais não seja homogénea, levando o número de deputados por círculo a ser diferente do que deveria, com óbvias implicações na distribuição de mandatos - e, em círculos de forte emigracão, podendo suceder que para eleger um determinado número de deputados sejam necessários menos votantes do que noutro de semelhante dimensão em que tenha havido menos emigrantes....
Recorde-se, a propósito, o que ocorreu nas eleições de 2015 em 3 círculos com cerca de 150 mil recenseados (Bragança, Évora, e Guarda), em que os perfis de emigração parecem ser diferentes, tal como o são as percentagens de abstenção, que configuram a probabilidade de em Bragança haver bastante mais emigrantes recenseados, em percentagem, do que em Évora.
E recordemos também, nas eleições de 1999, os resultados que conduziram à solução "limiana" e posteriormente à resolução "pantanosa".
E, nas próximas eleições para a Assembleia da República, quem sabe se estas questões não irão estar na origem de urna mudança de uma "geringonça" para uma "jiga-joga"...
Não é fácil encontrar uma solução para estes dilemas, pois creio que não é muito clara a determinação legal de quem "reside" ou não no território nacional, nomeadamente na União Europeia.
Se aquando das eleições de 2015 estas suposições não tiveram porventura um suporte tão objectivo como o que o recente recenseamento lhes dá, a irrefutabilidade dos documentos de identificação civil, agora aplicada de modo universal, permite repensar melhor o sistema eleitoral.
E, assim, estaremos num momento apropriado para se voltar a propor - como aventei publicamente já há alguns anos (aliás tal como - na mesma época - Manuel Monteiro) que o número de deputados em cada círculo no território nacional passe a ser determinado em função da aplicação do método de Hondt ao número de votantes, considerando porém a eventual atribuição mínima, compensatória, e prévia de 2 deputados por círculo.
Método que recompensa a participação política, numa perspectiva totalmente diferente da proposta de lugares vazios num parlamento, correspondentes às abstenções ou a votos em branco, e que de vez em quando é sugerida por distintas personalidades de tão diversos quadrantes.
Evirando quase totalmente, numa mais que provável previsão, a possibilidade de haver uma significativa distorção dos resultados eleitorais provocada pelos emigrantes recenseados no território nacional
4.Agosto.2019