António Piteira, Patrono de um dos futuros Cursos da Escola Naval


...... 22.Agosto.2024

António Piteira, Patrono do próximo Curso da Escola Naval.

O Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada e Autoridade Marítima Nacional decidiu, na sequência de apropriada proposta da AORN - Associação dos Oficiais da Reserva Naval - designar o nome do então Sub-Tenente Fuzileiro António Piteira, tombado em combate em Angola, como Patrono do próximo Curso da Escola Naval, juntando-o assim aos de Carvalho Araújo e de Oliveira e  Carmo, que igualmente sacrificaram as suas vidas pela Pátria.

Apensa-se o notável texto da citada Proposta, em que são recordadas  valorosas acções daqueles três brilhantes Oficiais da nossa Marinha, que as colocaram na Galeria dos Heróis Nacionais.

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A MARINHA DE GUERRA E A EVOCAÇÃO DOS SEUS HERÓIS

No século XX, dois oficiais, pelos feitos em combate e pelo sacrifício das suas vidas daí resultante, tiveram a sua memória perpetuada, sendo-lhes atribuídos os nomes a dois navios e um como patrono de um curso de cadetes da Escola Naval. 

No dia 8 de Outubro de 1918 o Caça Minas Augusto de Castilho, antigo arrastão da pesca do bacalhau e um dos doze navios requisitados pela Marinha durante a I guerra mundial, sob o comando do 1.º tenente José Botelho de Carvalho Araújo enfrentou um submarino alemão - U139 num encontro desigual. 

Augusto de Castilho recebeu a missão de escoltar o paquete S. Miguel em viagem da Madeira para os Açores e nessa viagem foi detectado o submarino alemão. O comandante não hesitou em dar-lhe combate, interpondo-se entre os dois navios, protegendo deste modo o paquete. Foi um confronto bem desigual. Por um lado, um submarino fortemente armado, com duas peças de artilharia de 150mm. Por outro lado o pequeno navio português com uma peça de 65 mm avante e uma de 47 mm a ré. Apesar do desequilíbrio, o combate durou mais de duas horas e quando se esgotaram as munições já o comandante Carvalho Araújo e outros membros da guarnição tinham morrido, mas a sua acção possibilitou a fuga do paquete. 

O nome de Carvalho Araújo, promovido a título póstumo a capitão-tenente, foi dado ao navio que durante vários anos actuou em Angola como navio base da missão hidrográfica sediada naquela província. 

No dia 18 de Dezembro de 1961 no comando da Lancha de Fiscalização Vega, em missão nas águas do Estado da Índia, o 2.º tenente Jorge Manuel Catalão de Oliveira e Carmo entrou em combate com forças indianas, vários navios e aviões, num combate desigual, apenas opondo-se-lhes com uma peça antiaérea de 20mm. Atingido e com ele mais dois membros da guarnição que também não sobreviveram, o comandante entrou na História como um herói a quem o feito foi reconhecido, e o seu nome perpetuado na Corveta Oliveira e Carmo e o curso incorporado na Escola Naval no ano de 1962 tendo-o como seu patrono. 

Oliveira e Carmo foi promovido a título póstumo a Capitão-tenente. 

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Sub-Tenente Fz António Bernardino Apolónio Piteira  (1947-1973)

 Corria o ano de 1971 e no dia 18 de Fevereiro, 57 cadetes davam entrada na Escola Naval para a frequência do 18.º Curso de Formação de Oficiais da Reserva Naval. 

António Bernardino Apolónio Piteira foi um dos 25 elementos integrado na classe de Fuzileiros, enquanto 23 o foram na classe de Marinha e 9 na classe de Técnicos Especialistas. 

Único oficial da Reserva Naval morto em combate no período da guerra no Ultramar, recordado por quantos com ele iniciaram a caminhada na Armada, António Piteira é lembrança permanente de um acontecimento único da nossa História, mas não só. 

O simples mencionar do seu nome traz à memória dos camaradas que mais de perto o conheceram, a personalidade de um jovem que profundamente a todos marcou. E curiosamente, não pela sua acção de forte liderança ou de imposição de vontade superior aos demais, mas apenas pela sua simplicidade e simpatia. 

Normalmente as recordações pessoais perduram quando assentam em acontecimentos relevantes que transformam a rotina de cada um, pela positiva, e muitas vezes até pela negativa. Raramente tendo a sua origem em actos de simplicidade, em manifestações de camaradagem, em amizade desinteressada, ou na simples e contagiante alegria de viver. 

Muito forte foi António Piteira em vida, para manter entre os seus amigos o sentimento de tristeza e o carinho comovido que todos manifestam decorrido longo período de várias décadas passadas. 

Quantos o conheceram de perto traçam o retrato fiel da sua personalidade, mais do que usando adjectivos “difíceis”, apenas com o sentimento da saudade.

Natural da freguesia da Quinta do Jogo, do concelho de Arraiolos, onde nasceu a 11 de Outubro de 1947, era seu Pai o senhor Augusto da Silva Piteira e sua Mãe a senhora D. Balbina Rita Apolónio. 

Deu os primeiros passos no ensino, nas Escolas da região e por aí se manteve até ingressar na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. 

A incorporação militar na Escola Naval interrompeu-lhe o contacto académico, iniciando-o numa nova fase, a que se entregou com contagiante entusiasmo. Marcou camaradas, e por estes foi promovido a figura de proa na nobre qualidade da vida que é a Amizade.

Promovido a ASP FZ RN em 13 de Outubro de 1971, frequentou o curso de fuzileiro e foi destacado para Angola onde chegou em 18 de Setembro do ano seguinte com o posto de STEN, assumindo o comando do 3.º Pelotão da Companhia N.º 1 de Fuzileiros. 

No dia 2 de Junho de 1973, cerca das 0080 horas, integrado numa coluna de viaturas do Destacamento do Zambeze, numa missão de serviço à Lumbala, foi alvo de uma emboscada inimiga.

 Dessa emboscada, ocorrida na picada entre Lumbala e o Chilombo, a cerca de 10 Km desta última localidade, resultou a morte de António Piteira.

O relato da tragédia dessa manhã, descrito no auto oficial então levantado, é suficientemente esclarecedor do heroísmo demonstrado por António Piteira. 

Quiseram os seus amigos recordá-lo, trazendo à memória o legado de uma convivência diária com um Homem Bom, que a todos entristece por ter sido o escolhido para tão dramático fim. 

A SALA RESERVA NAVAL no edifício central da Escola Naval no Alfeite, assinala com a máxima dignidade a memória de António Piteira, sendo anualmente atribuído um prémio com o seu nome ao cadete que de entre os seus pares e por votação secreta e universal de todos os alunos daquela Escola, revelar ao longo de todos os anos do curso, as virtudes que se reconheciam no homenageado - Camaradagem, Solidariedade, Generosidade e Altruísmo.

Na terra da sua naturalidade a evocação da sua memória ficou assinalada de forma digna e sentida, realçando o quanto a sua personalidade ali se lhe reconhecia.

 Também a Escola de Fuzileiros onde alcançou a especialidade, o seu nome ficou gravado com especial relevo no Museu ali erigido. 

Recordando dois oficiais de Marinha, os comandantes Carvalho Araújo e Oliveira e Carmo, que no século passado sacrificaram a própria vida em defesa dos mais altos princípios que juraram, a Marinha soube realçar os feitos heróicos dos seus maiores, ao primeiro atribuindo o seu nome a um navio e ao segundo, para além da atribuição do seu nome a um navio, prolongando a sua memória como patrono de um curso de alunos da Escola Naval. 

Este documento mais não pretende do que trazer para o presente a figura do nosso camarada António Piteira, o único oficial da Armada e da Reserva Naval morto em combate durante o período da guerra do Ultramar, finda em 1975, e o quanto desejariam, também os oficiais da Reserva Naval, que a sua memória pudesse ser mais longamente prolongada, ao ser atribuído o seu nome como patrono de um curso de cadetes da Escola Naval, se assim for considerado justo e de acordo com os superiores critérios do Estado-Maior da Armada.

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