"Ponto de vista": Francisco - o primeiro sucessor de Pedro ?

Francisco - o primeiro sucessor de Pedro ?

A notável Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium” é um documento que sai dos parâmetros habituais relativamente aos de natureza doutrinal produzidos pela Igreja Católica, e constitui um desafio a mudanças de atitudes e comportamentos de crentes e não-crentes, desafio que é de saudar vivamente, pois não se apoia sobre qualquer perspectiva de superioridade moral.

Privilegia a atenção aos desprotegidos, nomeadamente os pobres, as mulheres, e as crianças, apelando também a que os jovens possam ter um maior protagonismo e que sejam chamados a participar mais activamente na construção da sociedade.

Considera assim que até que não se melhorem radicalmente os problemas dos pobres não se resolverão os problemas do mundo, e recorda serem duplamente pobres as mulheres que sofrem situações de exclusão, maus tratos e violência, apelando a que haja mais políticos que tomem verdadeiramente a peito tais questões.

Recorda os mais fracos: “os sem-tecto, os dependentes de drogas, os refugiados, os povos indígenas, os idosos cada vez mais sós e abandonados” e os migrantes, relativamente aos quais se exortam os Países “a uma abertura generosa”.

Critica fortemente o sistema económico adoptado na maioria das sociedades políticas actuais, que considera ser injusto logo de raiz, fazendo prevalecer a lei do mais forte, de uma "nova tirania invisível, por vezes virtual” de um “mercado divinizado”, onde reinam a “especulação financeira”, a “corrupção ramificada”, e a “evasão fiscal egoísta”.

No plano das relações com outras comunidades religiosas, lembra que nesta época adquire especial importância a relação com os crentes do Islão, pois "diante de episódios de fundamentalismo violento” há que “evitar odiosas generalizações, porque o verdadeiro Islão e uma adequada interpretação do Alcorão se opõem a toda a violência”, e que “o diálogo inter-religioso” é ” uma condição necessária para a paz no mundo” - sem esquecer igualmente a importância da troca de pontos de vista entre crentes e não-crentes (como é o meu caso) .

No plano interno da Igreja Católica, e coerentemente com o que é anteriormente referido, aponta-se como desejável uma comunidade “ferida e suja por ter saído pelas estradas" em vez de uma Igreja preocupada com o "pragmatismo incolor" da sua vida quotidiana e o cuidado ostensivo da liturgia, lembrando que  o cristianismo "não dispõe de um único modelo cultural” e que o rosto da Igreja é “multiforme”, afirmando que não "podemos esperar que todos os povos, para expressar a fé cristã, tenham de imitar as modalidades adoptadas pelos povos europeus num determinado momento da história".

Não deixa de criticar o "individualismo pós-moderno e globalizado", que "promove um estilo de vida que perverte os vínculos familiares”, concluindo que se alguém "conseguir ajudar pelo menos uma única pessoa a viver melhor, isto já é suficiente para justificar o dom" da sua vida.

Documento abrangente, não esquece o mundo global, a política, a economia, a justiça, e os não católicos, apelando a que a Igreja Católica mude grande parte das suas atitudes para poder assim aumentar a sua autoridade moral para lutar pelos nobres princípios que acabo de salientar.

A concluir, sentir-me-ia-me tentado a opinar que - embora não tenha o conhecimento suficiente da História da Igreja Católica para poder fundamentar tal afirmação - Francisco será o sucessor de Pedro que melhor terá interpretado a doutrina atribuída a Jesus de Nazaré.

1. Dezembro.2013.