"Ponto de vista": A revisão constitucional.


A revisão constitucional.

Tendo já passado 5 anos sobre a última revisão constitucional, a Assembleia da República tem novamente poderes para proceder a uma revisão ordinária do seu texto (independentemente da possibilidade de em qualquer momento o fazer desde que decidido por maioria de quatro quintos dos Deputados em efectividade de funções).

A Constituição impõe "limites materiais" para a sua revisão, sendo a grande maioria consensual, havendo contudo alguns que poderão suscitar reservas a uma minoria de cidadãos, como será o caso dos que advogam o estabelecimento de um regime monárquico hereditário.

Porém, no que respeita à designação dos titulares electivos dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local é estabelecido que deverá ser observado o sufrágio universal e directo, excluindo-se assim a possibilidade de haver eleições indirectas, como passou a ocorrer após o "susto" provocado pelas eleições presidenciais de 1958, em que se admitiu a hipótese de que caso o recenseamento e as eleições tivessem sido verdadeiramente livres Humberto Delgado as teria vencido.

Ora a possibilidade de haver eleições indirectas no quadro de um regime democrático caracterizado pela existência da liberdade política não deveria assustar ninguém, e a meu ver é das poucas perspectivas existentes para se obter a tão desejada aproximação entre eleitores e eleitos, bem como para melhorar o funcionamento do sistema partidário.

Se, como já tenho vindo a afirmar por diversas vezes nestas páginas, o colégio das Assembleias de Freguesia pudesse eleger por exemplo um Senado com poderes importantes no processo legislativo, ou uma parte dos Deputados do Parlamento, haveria por certo efeitos positivos destas eleições indirectas no desejado processo de aproximação entre os cidadãos e os seus representantes electivos, bem como uma melhoria do diálogo com as estruturas partidárias a nível local.

As outras hipóteses que têm vindo a ser propostas visando o reforço da citada aproximação e de que há conhecimento público mais alargado, desde os círculos uninominais à ordenação preferencial dos candidatos nas listas apresentada, estão em meu entender longe de poderem provocar os efeitos pretendidos.

Dir-se-á: mas que fazer, dada a impossibilidade constitucional de haver limites materiais para a revisão constitucional, entre os quais figura o do sufrágio universal ?

Há dias, em debate na SEDES sobre a desejabilidade de uma reforma do sistema político, o ex-Deputado Joaquim Ventura Leite focou o impasse político que se vive na presente crise financira e económica, referindo a propósito - tanto quanto julgo ter compreendido - que uma via para o resolver seria uma candidatura independente às próximas eleições para o cargo de Presidente da República, baseada num projecto de referendo assente numa proposta de novo texto constitucional.

Porém, o texto constitucional apresenta aqui uma nova blindagem, pois a proposta de referendo, mesmo que provenha de grupos de cidadãos, tem que ser aprovada pela Assembleia da República; e, mesmo que fosse de iniciativa governamental, não poderia incluir alterações à Constituição...

Em conclusão: não há via legal para uma melhoria do regime democrático, condicionado que está pela notória incapacidade de os partidos políticos se aproximarem dos cidadãos e de encontrarem soluções de transformação do seu funcionamento.

A única possibilidade de fomento da aproximação entre eleitores e eleitos é assim a de um "enorme aumento" das atribuições, competências e recursos do poder local, esperando-se que de tal modo se acabe por conseguir a desejável "osmose" entre partidos e cidadãos que a tal nível permitirá a modificação e aperfeiçoamento do funcionamento partidário.

Seria lenta. Chegaria a tempo ?

27.Outubro.2013.