"Ponto de vista": Ocupação da sede da DGS/PIDE - memória e História.

    Ocupação da sede da DGS/PIDE - memória e História.

    A publicação pela "Visão-História", nº 23 (de Março de 2014), de um artigo de Paulo Chitas sobre a ocupação da sede da DGS/PIDE suscitou alguns comentários sobre as duas versões diferentes nele apresentadas relativas ao modo como tal se processou, o que levou a que pela primeira vez se encontrassem alguns dos principais responsáveis por aquela operação, a fim de recordarem em conjunto alguns dos episódios ocorridos naquele dia.

    Assim, o Alm.Vargas de Matos, então Comandante do Destacamento de Fuzileiros que participou no cerco e ocupação da sede daquela polícia política, trocou algumas impressões com o Coronel Alberto Ferreira, que comandava a Secção do Regimento de Cavalaria 3 (Estremoz) participante na mesma operação, e comigo, confirmando que quando os responsáveis pelas forças de Fuzileiros entraram no edifício já as armas dos agentes estavam arrecadadas no gabinete perto do da Direcção (algo de que não me recordava), o que corrobora o que o Coronel de Cavalaria Alberto Ferreira já tinha relatado no livro ""Memórias da Revolução; Portugal 1974-1975" (2004), de autoria do Coronel Manuel Bernardo, ou seja, que a primeira força a entrar na sede da então DGS foi a que ele comandava, sendo acompanhado pelo então Major Campos de Andrada, que o informara ter sido nomeado pelo General Spínola para comandar as forças que tinham a missão de ocupação da sede da então DGS.

    O Coronel Alberto Ferreira  recordava-se também de talvez cerca das 21.30 já ter constatado a presença de pessoal da Marinha junto à entrada da rua António Maria Cardoso, confirmando assim o que realmente aconteceu, ao contrário de diversas alusões que tinham sido publicadas referindo que as forças de Marinha teriam chegado ao local apenas às 02.00 de 26 de Abril.

    Entretanto ainda não é bem perceptível para mim o modo como o então Major Campos de Andrada veio ao encontro do então 1.º Tenente Vargas de Matos e de mim, quando entrámos na sede sem nos termos apercebido que Cavalaria 3 já o tinha feito, e dirigido depois ao gabinete do Major Silva Pais (onde ocorreu então por iniciativa minha o episódio da retirada dos quadros dos altos dignitários do regime político de então), admitindo o Coronel Alberto Ferreira que o então Major Campos de Andrada tenha saído do edifício quando terminou a inspecção documental a que procedeu, tendo então encontrado o então 1.º Tenente Vargas de Matos e eu próprio quando já nos deslocávamos para a entrada do edifício.

    Há, é certo, prestigiados Jornalistas e Historiadores que têm dado a conhecer algumas dúvidas sobre as horas a que as forças participantes no cerco entraram na sede da DGS/PIDE, bem como muitas discrepâncias nos relatos constantes nos jornais da época sobre os acontecimentos ocorridos naqueles dias.

     O mesmo sucede na identificação horária de muitos registos fotográficos, radiofónicos e televisivos, e nas memórias entretanto publicadas por muitos participantes e testemunhas, o que só vem demonstrar quão difícil é o trabalho de reconstituição histórica, bem como a interpretação das razões que levaram os diversos participantes a proceder desta ou daquela maneira.

    Como já escrevi nestas net-páginas, tenho tido o cuidado, quando me interrogam sobre pormenores daqueles tempos, de acentuar que a minha memória se tem concentrado  mais sobre as questões mais importantes, tendo esquecido muitos factos que até poderiam ajudar a esclarecer melhor o passado.

    No caso vertente, tal como já referi, o importante é que a polícia política tenha sido neutralizada e impedida de renascer disfarçada.

    23.Novembro.2014.