Dilemas muçulmanos.
Quantos dos que participaram, tanto em França como noutros países, nas manifestações de repúdio pelo bárbaro assassinato de caricaturistas do Charlie Hebdo, foram motivados não só pela expressão da defesa da liberdade de expressão mas também por um sentimento crítico relativamente aos extremismos de minorias muçulmanas que impulsionaram os perpretadores daqueles crimes, é uma dúvida que não poderá deixar de ser colocada.
De tal sentimento à consideração de que o islamismo é estruturalmente uma religião de ódio vai um pequeno passo, mesmo que tal ilação não seja claramente afirmada, e para essa perspectiva contribuem as notícias sobre as atrocidades cometidas pelo Boko Haram na Nigéria, bem como os sucessivos atentados que dizimam muçulmanos ora chiitas ora sunitas, acções sanguinolentas e sectárias dos Taliban afegãos e paquistaneses, e os conflitos no médio-oriente nestes avultando os massacres do "exército islâmico", e os atentados nos EUA e em Espanha - sem se esquecer a Chechénia e tantos outros episódios.
Não muitos, mas talvez bastantes daqueles manifestantes constatarão que nos países de maior implantação muçulmana não houve manifestações contra o atentado à liberdade de imprensa, e que apenas nalguns deles houve tímidas expressões governamentais de pesar (embora não tenham saído à rua as mesmas massas populares que há três ou quatro anos se insurgiram contra a publicação de caricaturas do profeta Maomé e que agora logicamente se deveriam ter igualmente regozijado com a "execução" de uma possível "fatwa" lançada contra os caricaturistas do profeta em causa).
No fundo, a par da proclamação do direito à liberdade de expressão não terá - lá no fundo dos seus pensamentos - aumentado o fosso que separa os muçulmanos dos que não seguem tais princípios religiosos, apesar das proclamações dos dirigentes de associações islâmicas que asseveram que a sua religião é baseada na paz e no respeito por outras crenças ?
Fosso que só pode ser reduzido pelas comunidades muçulmanas, o que dificilmente ocorrerá a curto prazo sem haver hierarquias com autoridade interpretativa, como sucede no islamismo , e em que continua a haver dissidências sangrentas entre os seus ramos.
Restará à União Europeia o "caminho aéreo" seguido pelos EUA contra os dirigentes promotores de ataques destinados a criar o medo permanente?
E quando tais dirigentes residirem no seu seio ?
11.Janeiro.2015.