"Ponto de vista": A UE, a NATO, e o "califado".


A UE, a NATO, e o "califado".

Não tem sido fácil a relação ao longo dos séculos entre a Europa e os seus vizinhos do Médio-Oriente e da África do Norte, nomeadamente a partir da expansão islâmica, e embora seja impossível num texto curto abordar os complexos problemas que a História e a situação actual abarcam, pode-se tentar uma abordagem a partir do momento em que entraram em vigor os acordos "Sykes-Picot" que na sequência da derrota do Império Otomano estabeleceram o quadro de fronteiras que permaneceu até hoje, com a excepção dos introduzidos pela imposição do Estado de Israel e dos conflitos que de tal surgiram nomeadamente com o Egipto e a Síria.

Assim, e em estilo algo telegráfico, recordemos alguns dos mais marcantes episódios que assinalam períodos de intervenção estrangeira no Médio-Oriente e na África do Norte: a CIA e Mossadegh (1953), as independências no Norte de África (década de 1950), a crise do Suez (1956) e a "expulsão" daquela área pelos EUA do Reino Unido e França, a queda do Xá da Pérsia e o corte de relações do Irão com os EUA (1979), a guerra entre o Iraque e o Irão (1980/8), acompanhada pela intervenção e retirada russa no Afeganistão (1979/89), seguida pela invasão do Kuwait pelo Iraque e intervenção subsequente dos EUA (1991), o ataque da Al-Caeda aos EUA (2001) e as respectivas retaliações: 2001/2015, sobre o Afeganistão, e 2003/2011 sobre o Iraque - esta, terminada com uma derrota "de facto" uma vez que este "país" não se conseguiu afirmar como Estado.

E, assim como nos romances policiais se colocava com frequência a questão "cherchez la femme", é por demais evidente que a "femme" tem sido quase sempre o petróleo, assumindo os EUA desde a crise do Suez o papel preponderante e remetendo as potências da UE para um papel secundário e de fornecimento de "cobertura" para serem apresentadas convenientes "coligações" nas intervenções militares.

A derrota dos EUA no Iraque, bem como a guerra civil que entretanto surgiu na Síria, permitiu que no vazio de poder na zona que se poderia apelidar de "Siriaque" surgisse uma tentativa de formação de um Estado que declarou ser seu objectivo a reconstituição de um "califado" como o que chegou a existir nos primórdios da expansão islâmica, estendendo-se desde o Iraque à Península Ibérica, e declarando guerra a todos quantos não observassem os preceitos do Islão - de acordo com as suas interpretações dos textos corânicos, que assumiam e assumem aspectos horrendamente desumanos e ignominiosos.

Tal atitude, e as ditas interpretações inclassificáveis das doutrinas muçulmanas, aliadas ao desequilíbrio provocado pelas instabilidades na Síria e no Iraque e às preocupações com o controle petrolífero na área, levaram a uma análoga declaração de guerra de diversos países em coligações contra um "Estado", com episódios sangrentos dos quais os mais recentes e visíveis foram os atentados perpretados há dois dias em Paris.

Porém, dada a aparente reduzida eficácia das existentes coligações, limitada à realização de ataques aéreos, muitos europeus - enquanto vizinhos próximos do "Siriaque", bem como dos Estados onde se detectam sinais de expansão da influência das respectivas ideias - interrogam-se sobre os tipos de respostas a dar no quadro da guerra declarada que se constata existir.

Cabe assim recordar a existência no quadro da NATO de uma cláusula segundo a qual um ataque a um dos seus membros obriga a uma resposta solidária conjunta, o que já é configurável dados os actos e declarações de guerra já existentes, sendo obviamente desejável que tal resposta fosse partilhada activamente pelos países de confissão maioritariamente muçulmana que criticaram os atentados recentes.

E se a NATO não reagir em tal sentido, é tempo de a UE criar uma verdadeira política de Defesa, que englobe todos os seus Estados-membros, e que possibilite respostas adequadas a situações como a que se vive no presente momento.

Não pode é limitar-se ao papel ridículo de, como já tem acontecido em unidades militares, pagar a "contratados" para assegurarem a sua tranquilidade e defesa.

15/16.Novembro.2015.

-------------------------------------------------------