"Ponto de vista": A UE no ano das decisões.


 A UE no ano das decisões. 

Os atentados suicidas ocorridos há poucos dias em Bruxelas voltaram a agitar profundamente os europeus, não só dada a proximidade temporal aos de Paris mas também porque incidiram sobre vias de transporte internacional, pondo em causa igualmente o espaço de livre circulação dentro da União Europeia.

Revelaram igualmente como a mobilidade interna prevista nos acordos de Schengen terá contribuído para a facilidade com que cidadãos residentes na Bélgica pudessem sem grandes dificuldades organizar e executar operações como as que ocorreram em Paris, apesar de algum amadorismo dos seus executantes - bem demonstrada pela confissão de não ter concretizado a prevista detonação suicida num estádio por não ter podido entrar por falta de bilhete de acesso ao espectáculo...

E sem se esquecer a falta de coordenação entre autoridades policiais de diversos Estados-membros em áreas relacionadas com a troca de informações sobre indivíduos suspeitos, bem como as carências informativas a propósito de possíveis redes associadas à potencial prática de acções terroristas. 

Estes acontecimentos, aliados à inevitável associação que alguns sectores da opinião publica fazem relativamente ao grande fluxo de refugiados para a União Europeia, têm contribuído para um aumento da influência do extremismo e da xenofobia com as consequências visíveis nas recentes eleições regionais na Alemanha, que poderão igualmente indiciar sinais de progressão do chamado euro-cepticismo.

Como já escrevi recentemente nestas páginas, as acelerações ou retardamentos significativos no quadro evolutivo das auto-organizações (como é o caso da UE) têm normalmente a sua origem em fenómenos catalisadores, quase sempre inesperados. 

A migração em larga escala de refugiados já constituiu um primeiro efeito catalítico que porém não apontou no sentido de passar a haver uma maior consistência da União Europeia, levando assim ao proliferar de decisões autónomas dos Estados-membros, com pouca ou nenhuma coordenação geral e originando assim a perda de grande parte da sua eficácia decisória numa questão tão importante como o é a da sua coesão interna, assim ferida por tal fenómeno de perfil centrífugo.

No entanto, os atentados de Paris e de Bruxelas - nomeadamente estes últimos - poderão ter exercido um efeito catalisador de sentido contrário, induzindo reacções de natureza centrípeta, centrada contudo e por agora apenas na colaboração entre as forças de segurança e no aumento legal dos seus poderes.

É aqui que reside um dos aspectos essenciais para o futuro da União Europeia: a compatibilização dos acordos de Schengen com o aumento da coordenação entre os sistemas de informação e de natureza policial e judiciária.

Pode acontecer que após a primeira reacção de natureza eurocéptica ao catalisador que foi o grande fluxo de refugiados venha a suceder uma atitude de procura de maior coesão, suscitada pelo catalisador que foram os recentes atentados (e outros que infelizmente poderão vir a ocorrer).

27.Março.2016.