"Ponto de vista"- Uma nova "troika" na Europa?

    Uma nova "troika" na Europa?

Agosto é um mês em que as instituições da União Europeia observam um consensual lazer, apenas interrompido em casos de extrema urgência, pelo que há que observar cuidadosamente se tal repouso não é porventura aproveitado pelos dirigentes mais zelosos (sim, ainda há alguns...) para tomar iniciativas que poderão eventualmente passar um pouco mais despercebidas, dada a menor atenção pública prestada neste período à política europeia.

Será talvez o caso do encontro que reuniu A.Merkel, F.Hollande e M.Renzi na ilha italiana onde A.Spinelli e A.Rossi escreveram em 1941 um manifesto que - então presos em Ventotene - viria a premonitoriamente a apelar à formação de uma união europeia anti-totalitária.

Tal reunião, "justificada" pelo argumento de juntar os mais altos responsáveis dos 3 Estados-membros mais populosos em termos post-"Brexitianos", seria também destinada a preparar o encontro "informal" do Conselho Europeu que em Setembro analisará em Bratislava precisamente o futuro de uma União sem o Reino Unido.

Porém, e para lá das habituais palavras no final do encontro sobre a necessidade de melhorar a segurança, animar o crescimento económico, e procurar dar aos mais jovens perspectivas animadoras para o futuro, o que não foi muito notado foi o facto de aqueles 3 Estados terem sido os principais fundadores da primeira versão de uma união europeia que incluía também o então Benelux, e que agora com uma Alemanha reunificada e já livres da incómoda presença de um Reino Unido sempre procurando acautelar primeiro os seus interesses tendem a considerar-se os motores de uma nova União de que porventura se considerarão os mais legítimos fundadores.

Aproveitando as tendências exógenas - mas sempre com um pé dentro para o que mais lhes poderá interessar - das periferias nórdicas e da Europa do leste, e a falta de poder político das restantes devido ao estado calamitoso das finanças públicas da maioria dos Estados-membros nelas situados, tenderão provavelmente a constituir-se em núcleo duro, quiçá propondo tal "troika" uma inevitável modificação dos Tratados fundamentais.

Modificação que, reconhecendo que o termo "União" deverá continuar a ser usado dado o seu valor simbólico, e constatando por outro lado que uma Federação não tem condições neste momento para se assumir como tal, irá provavelmente tender para um modelo confederativo, o único que permitirá a convivência das múltiplas "uniões" existentes, das quais as mais relevantes são notoriamente a da zona Euro e a do espaço Schengen.

Os outros Estados-membros de maior população - uma Espanha enfraquecida, e uma Polónia reticente a um fortalecimento da União - acabarão por aceitar os novos termos contratuais, que pelo menos permitirão que continue a existir a agregação mínima que dará tempo aos europeus para reflectirem seriamente sobre o seu futuro, ou para reagirem apropriadamente a circunstâncias inesperadas que possam vir a constituir um novo agregador.

Cabe contudo aos restantes Estados-membros - entre os quais a República Portuguesa - um papel crítico do qual não devem abdicar, pelo que tanto os cidadãos em geral como os seus representantes políticos não podem deixar de intervir.

E de procurar as melhores formas de actuar para que as suas opiniões sejam consideradas.

28.Agosto.2016