"Ponto de vista": "Brexit", ou a reserva mental.
"Brexit", ou a reserva mental.
Não devemos esquecer que o agora famoso art.º 50º do Tratado da União Europeia (o mais relevante dos dois Tratados que são habitualmente designados como "Tratado de Lisboa"), que prevê a possibilidade de um Estado-membro se retirar da União, foi expressamente introduzido na versão final daquele documento - apesar da evidente redundância - por pressão do Reino Unido, como foi público e notório, além de ter sido confirmado pelos principais negociadores do projecto de Tratado Constitucional da União que, apesar de não ter sido aprovado, veria muitas das suas disposições transcritas para os Tratados que ora nos regem.
E tal terá ocorrido porque o Reino Unido argumentava então que não existiam normas claras que estabelecessem a possibilidade de saída (como se tal fosse impeditivo de um Estado soberano assim o decidir).
É certo que houve uma clarificação relativamente ao prazo de dois anos em que se deveria processar a saída, mas por outro lado nada ficou expresso sobre o prazo em que, uma vez manifestada publicamente a intenção de abandono na sequência de decisão legitimamente constitucional, tal seria comunicado formalmente a fim de se iniciar o de dois anos para as negociações relativas à saída da União - situação que poderia levar a que por exemplo entre a citada decisão e a data da retirada pudesse mediar um período total de 3, 4, ou 5 anos, situação que colocaria em desvantagem a "União Europeia Restante" dado que a escolha do momento de início estaria no Estado abandonante...
Por outro lado, como a ou o Primeiro-Ministro do Reino Unido (se continuar a ser "unido") não pode logicamente e de acordo com o Tratado participar nas deliberações e decisões do Conselho Europeu que lhe digam respeito, passaremos a ter reuniões deste Conselho em duas partes: com e sem Reino Unido... Aliás o mesmo ocorrendo analogamente com as reuniões sectoriais a nível ministerial do Conselho da União Europeia.
Ou então podemos imaginar reuniões em que, surgindo situações não previstas, D.Tusk, Presidente do Conselho Europeu, é forçado a dizer "Sorry, Theresa, would you please leave us for 15 minutes - and you can of course order a cup of tea" ...
A "pérfida Albion", assim conhecida há muito e como já o recordei nestas páginas, demonstrou desde logo que aderiu com "reserva mental" a um processo de constituição de uma união europeia, de que prova bastante foi o seu comportamento constante de só procurar usufruir das vantagens, o que as suas recentes atitudes bem o comprovam.
Assim, a "NEU - New European Union" deve ser inflexível nas negociações para o acordo de retirada procurando evitar que o Reino Unido obtenha vantagens de tal processo obtidas à custa de prejuízos para a NEU.
Infelizmente, e como já o referi anteriormente, os dirigentes europeus dos maiores Estados-membros têm um fraco perfil ou estão fragilizados no plano interno - pelo que só uma agregação dos que são capazes de pensar no futuro poderá permitir à União evitar uma decomposição cujos sinais se começam a sentir.
16.Outubro.2016