"Ponto de vista": EUA: perigos na democracia.


   EUA: perigos na democracia.

A candidatura de D.Trump tem permitido constatar que há provavelmente 40% do eleitorado dos EUA que aprova muitas das ideias que aquele cidadão defende, fundadas em conceitos de isolacionismo e de opressão de minorias que já não deveriam ocorrer em países que como os EUA têm evoluído para a adopção de amplos conceitos de democracia.

A expressão "têm evoluído" é justificada pela constatação de apenas há cerca de 50 ou 60 anos continuar a existir segregação racial (recorde-se o episódio Rosa Parks), havendo ainda notórios episódios em que a cor da pele tem sido determinante em acções de natureza policial, facto que porém não deve fazer esquecer o caminho positivo que pelo menos sob o ponto de vista formal tem vindo a ser constatado naquele país.

Contudo outros factores têm contribuído para o adensar de outras formas de divisão social, destacando-se a reordenação do modelo económico que tem vindo a provocar o aumento da pobreza e do sub-emprego e a crescente diferença de rendimentos entre as faixas de maior e de menor riqueza, que aliadas a um modelo de solidariedade social muito afastado do prosseguido noutros países desenvolvidos tem tido como consequência uma redução na riqueza das famílias.

Daí o êxito de discursos que apontam para que os estrangeiros sejam apontados por D.Trump como a fonte de todos os males, englobando e destacando os que professam a religião muçulmana - estejam ou não radicados nos EUA.

Deste modo, sendo pouco provável que D.Trump seja o próximo Presidente dos EUA, o que porém se afigura preocupante para a política mundial - dada a relevância dos EUA - é o facto de a possibilidade de o sistema económico e social daquele país continuar a evoluir num sentido de aumento da pauperização de numerosas camadas populacionais, bem como da constatação por estas que importantes sectores da sociedade recolhem crescentes rendimentos.

Daí à recusa do apoio a políticos "tradicionais" vai um curto passo; e deste à do favorecimento de movimentos radicais vai outro - tal como tem vindo a ocorrer em diversos países europeus, sendo o caso da Islândia o mais recente.

No caso dos EUA o problema é mais candente e paradoxal pois os fenómenos que possibilitaram o aumento do populismo aconteceram precisamente nos mandatos de um Presidente cujas ideias estão em plena oposição a tais perspectivas, e que se é certo que para tal contribuiu em muito a crise financeira que se declarou no início do seu primeiro mandato, não o é menos que lhe terão faltado a imaginação e os meios para ir mais além na procura de melhores soluções estruturais para a debelar.

Os EUA estão a atravessar uma enorme crise. E não parece que alguém oriunda de um "aparelho" clássico de exercício do Poder tenha a capacidade de encontrar os caminhos para fazer diminuir a profunda clivagem que transparece agora naquele tão relevante país.

30.Outubro.2016