Tancos: O engenho de encobrir, e a arte de descobrir...
E aqueles que por obras valerosas
se vão da lei da Morte libertando,
cantando espalharei por toda parte,
se a tanto me ajudar o engenho e arte.
Porém, Loulé chamusca Tancos - e daí nova versão lusíada:
se vão da lei da censura libertando,
cantando espalharei por toda parte,
se a tanto me ajudar o engenho e arte...
Factos algo esclarecedores (baseados apenas em documentos publicados na imprensa):
Em Fevereiro, o Ministro da Defesa lê, "com agrado", uma proposta de "público reconhecimento" a três militares das forças da GNR em Loulé, por "resultados que contribuíram decisivamente para a realização da Justiça", pois a "acção destes militares foi muito além do usual dever que a função lhes impõe", e remete-a em 28 daquele mês para o Ministro da Administração Interna, que - apenas três dias depois, no próprio sábado, dia 3 de Março - manifesta a sua concordância com o elogioso despacho do seu par e remete o documento ao Comandante-Geral da GNR para que dele fosse dado conhecimento aos militares em causa.
(Coincidência: como já foi referido nestas páginas, os referidos três militares foram indiciados pelo Ministério Público, na sequência das investigações da Polícia Judiciária sobre o furto de material de guerra em Tancos, em meados de 2017, como tendo participado na devolução do citado material em operação que envolvia o encobrimento à Polícia Judiciaria relativamente ao autor do furto.)
Por outro lado, reaparecida a quase totalidade do material furtado - "oficialmente", segundo a Polícia Judiciária Militar (PJM), na sequência de um telefonema "anónimo" que afinal teria sido feito por um elemento da própria PJM mas que teria sido interceptado pela Polícia Judiciária - vem a público um Memorando, entregue por um dos responsáveis pela descoberta da "devolução", ao Chefe do Gabinete do Ministro da Defesa Nacional, e que, dando conhecimento dos contornos de que se tinha revestido a devolução, não referia porém que esta tinha sido feita sob condição de não ser transmitida à Polícia Judiciária a identidade do autor do furto - ou seja, que tinha havido encobrimento.
Assim, nas primeiras declarações públicas sobre o já então famoso memorando, o Chefe do Gabinete referiu que não tinha nele "descortinado" qualquer encobrimento.
E há apenas dois ou três dias confirmou que tinha mostrado o memorando ao Ministro.
O que "explica" que o Ministro, interrogado sobre o memorando, tenha por mais que uma vez negado "categoricamente" ter tido conhecimento de qualquer "encobrimento" no caso da recuperação do material militar furtado nos paióis em Tancos.
Ter-lhe-ão contado tudo, excepto o encobrimento - que terá sido substituído pelo recurso ao telefonema "anónimo"?
Assim, ao engenho de encobrir, deverá contrapor-se a arte de descobrir...
28.Outubro.2018