O nosso Comandante Naval terá ficado com limitações ao exercício do comando no mar ?
Para se compreender o motivo da pergunta que constitui o título do presente texto é importante recordar que o "termo de identidade e residência" é definido pela Procuradoria-Geral da República como sendo uma das medidas de coacção, podendo ser aplicada pelo juiz, pelo Ministério Público e pelas polícias, devendo ser de aplicação obrigatória sempre que alguém for constituído como arguido, e consiste, para além da identificação do arguido e da indicação da sua residência, em o arguido ficar obrigado a comparecer perante as autoridades sempre que a lei o obrigar ou para tal for notificado; e que o arguido fica igualmente obrigado a não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova residência ou o lugar onde possa ser encontrado.
A presente introdução vem a propósito de uma queixa por crime de difamação apresentada em Janeiro de 2016 pelo Vice-Almirante Cunha Lopes contra o então Chefe do Estado-Maior da Armada, Almirante Macieira Fragoso, e contra o então seu Chefe do Gabinete, Contra-Almirante Gouveia e Melo (agora Vice-Almirante exercendo o cargo de Comandante Naval), a qual suscitou várias tentativas de arquivamento, quer por parte do Ministério Público quer por parte do Juiz de Instrução em 1ª instância, que levaram à apresentação de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Tal recurso teve provimento, num Acórdão produzido e assinado por dois Juízes Desembargadores, que após analisarem os factos formaram a convicção de que existe matéria para pronunciar os arguidos e serem acusados do crime de difamação agravada.
Os autos já regressaram à 1ª instância e os arguidos já foram pronunciados, aguardando julgamento com a medida de coacção "Termo de Identidade e Residência".
Não sendo habitual que um Comandante Naval embarque para dirigir operações navais, tal já tem ocorrido (e é aconselhável que aconteça) para observar e acompanhar exercícios da Esquadra, cujo ânimo normalmente é reforçado com essa perspectiva.
Aliás, e para os leitores menos familiarizados com a organização da Marinha e com a importância do cargo de Comandante Naval, é preciso não esquecer que tem na sua dependência directa mais de 70% dos militares da Marinha, envolvendo todos os meios e forças operacionais.
Aliás, e para os leitores menos familiarizados com a organização da Marinha e com a importância do cargo de Comandante Naval, é preciso não esquecer que tem na sua dependência directa mais de 70% dos militares da Marinha, envolvendo todos os meios e forças operacionais.
Porém, dado que o actual Comandante Naval, Vice-Almirante Gouveia e Melo, ficará obrigado a comparecer perante as autoridades sempre que a lei o exigir ou para tal for notificado, e a não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova residência ou o lugar onde possa ser encontrado, parece difícil que a presente situação seja compatível com o pleno exercício do seu alto cargo.
17.Novembro.2018
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Comentário do Contra-Almirante João Nobre de Carvalho (recebido em 24.Nov.2018):
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Comentário do Contra-Almirante João Nobre de Carvalho (recebido em 24.Nov.2018):
"Independentemente da justeza do Ponto de Vista sobre o “Termo de identidade e residência” aplicado ao Almirante Comandante Naval em funções, deve reflectir-se sobre os acontecimentos que deram azo a esta situação. Na Marinha Portuguesa, uma Instituição militar secular, três Almirantes no activo, um deles o próprio Chefe do Estado-Maior da Armada (CEMA), desentenderam-se, o que exercia o cargo de Director-Geral de Marinha (DGM) foi exonerado pelo CEMA, a imprensa publicou um texto originado pela Marinha que o DGM considerou difamatório e resolveu instaurar um processo em tribunal contra o CEMA e o seu Chefe de Gabinete de então (agora exercendo o cargo de Comandante Naval).
Considero lamentável que a Marinha, um Ramo das Forças Armadas, não consiga sanar internamente as divergências internas existentes entre os Almirantes, sem recurso aos Tribunais. Este novo procedimento poderá ter reflexos negativos desestabilizadores na disciplina da própria Marinha e no respeito dos restantes cidadãos pela instituição, pela falta de confiança que revela entre os que constituem o Comando superior da própria Marinha, os Almirantes no activo. Devendo todos os militares reger-se pelos ditames da ética e da honra consubstanciados no Regulamento de Disciplina Militar, algo deve ter falhado nos comportamentos dos militares em causa, quer na formação militar dos Oficiais, na Escola Naval ou nos Cursos para acesso aos postos do Almirantado, quer no sistema de escolha actualmente instituído para seleccionar os Chefes de Estado-Maior dos Ramos das Forças Armadas. Acredito que o assunto seja analisado por quem de direito por forma a tirar conclusões que permitam soltar o melhor rumo para um futuro harmonioso.
João Nobre de Carvalho
C/Alm Ref ".