18.Fevereiro.2019
O Almirante João Nobre de Carvalho sublinha, em oportuno e desassombrado artigo, que a Defesa da Pátria é direito e dever de todos os portugueses:
A DEFESA DA PÁTRIA É DIREITO E DEVER DE TODOS OS PORTUGUESES
Muitos cidadãos podem pensar, erradamente, que Portugal está imune a ameaças como a guerra e o terrorismo.
Não é verdade.
Aprende-se nas escolas militares que a ameaça é o produto lógico das capacidades pelas intenções. Assim, um país vizinho pode ter meios militares significativos, susceptíveis de serem utilizados contra Portugal, mísseis de alcance adequado, por exemplo, mas esse governo estrangeiro, não manifesta intenções de invadir ou adquirir pela força recursos portugueses. Assim sendo, aquele Estado não constitui uma ameaça. Porém, se tiver os meios ofensivos necessários e tencionar utilizá-los contra nós, constituirá, efectivamente uma ameaça. Os Serviços de Informações são essenciais nesta área.
Sendo a política internacional o que é, regendo-se pelos interesses percebidos por cada Estado, o nosso País deve manter-se atento à evolução das capacidades militares dos vizinhos a Oeste e a Sul, especialmente no tocante à sua evolução política e as possíveis intenções dos respectivos governos, não descurando a preparação das nossas Forças Armadas (FA).
É importante, como disse o Professor Adriano Moreira, olhar para a evolução do mapa da Europa nos últimos duzentos anos, como se espreitássemos por um caleidoscópio, constatando como se alteraram as fronteiras, como desapareceram Estados e se criaram outros, em consequência de guerras, como um Estado pode passar de amigo a inimigo e vice-versa.
O nosso País não está livre, por exemplo, de inopinadamente, serem descobertos recursos minerais raros, em terra ou no subsolo marinho sob a sua jurisdição, que suscitem a cobiça de outros Estados. O nosso grande vizinho ibérico, sujeito a importantes forças centrífugas internas, através da história sempre sonhou em dominar a península, nomeadamente os portos da vertente atlântica. As potências atlânticas, em especial o Reino Unido e os Estados Unidos da América têm sido os nossos aliados tradicionais na preservação da independência Nacional. Por isso o País é membro, fundador, da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
Perante a eclosão de uma guerra mundial, Portugal pode ser cobiçado por uma grande potência beligerante que pretenda conquistar a Europa, como aliás já aconteceu durante a II Grande Guerra.
Os Estados que compõem a União Europeia divergem significativamente na política externa, o Reino Unido, uma das duas potências nucleares europeias, poderá desligar-se em breve e vislumbram-se outras fissuras. A Rússia é percebida de modo diferente pela Alemanha e pela França e outros países europeus. Por isso uma Defesa comum europeia credível sem o apoio dos EUA, é problemática.
Portugal também não está imune ao terrorismo islâmico, dada a liberdade de circulação de que podem usufruir os inúmeros muçulmanos que vivem na União Europeia, e nomeadamente os que mais recentemente para ela se deslocaram.
Acresce ainda a possibilidade de o País ser colocado subitamente perante uma ameaça inteiramente nova e imprevisível neste momento.
Perante este quadro, Portugal, à semelhança de outros Estados, não pode deixar de possuir Forças Armadas (FA) com competências suficientes para constituírem um dissuasor, interoperarem com as FA dos Estados aliados, mostrando que os portugueses querem continuar como Nação independente. É indispensável que as FA preservem as infra-estruturas e a organização que lhe permitam, em caso de necessidade, aumentar os efectivos, por forma a assegurar o recrutamento e a mobilização geral dos cidadãos. Segundo o Artigo 276º nº 1 da Constituição da Republica, a Defesa da Pátria é direito e dever fundamental de todos os portugueses.
As nossas FA têm como missão principal a defesa militar da República e a participação nas Alianças de que Portugal faz parte. Na sua capacidade sobrante podem desempenhar missões de serviço público, como o salvamento marítimo, a patrulha do espaço jurisdicional aéreo e marítimo, a fiscalização da pesca, a colaboração com o Serviço Nacional de Protecção Civil, nomeadamente em catástrofes e no combate aos incêndios florestais. Para além das suas obrigações constitucionais quando é decretado o Estado de Sítio ou de Emergência, as FA devem poder colaborar com as Forças de Segurança no território Nacional, especialmente no combate ao terrorismo, ao tráfico de seres humanos e estupefacientes e outra ameaças.
Acontece que os nossos políticos e governantes, de um modo geral, no seu discurso ao País, provavelmente para não alarmar a população, têm procurado justificar a necessidade da existência das Forças Armadas com as missões de serviço público que executam, escamoteando o verdadeiro e primordial objectivo da sua existência, a Defesa da Pátria. Por isso a Nação exige dos militares total dedicação, inclusivamente o sacrifício da própria vida no cumprimento da missão, se necessário. No entanto, parece-me oportuno lembrar que a preparação do militar deve ser no sentido de fazer o inimigo morrer pela pátria deles, como disse às suas tropas o General Patton, o lendário herói do Exercito dos EUA, em vésperas do desembarque nas costas da Normandia, no inesquecível Dia “D”.
Assim, em tempo de paz, a principal preocupação dos militares é manter um elevado nível de exigência no plano ético, moral e de treino incessante, procurando nos exercícios simular o mais possível o ambiente de guerra, assegurando um elevado grau de prontidão e de interoperabilidade com os seus congéneres aliados, para que não constitua o elo mais fraco.
João Nobre de Carvalho
Contra-Almirante, na situação de reforma.
18.Fevereiro.2019