UE: O sexo dos anjos e o "spitzenkandidat".
Quem conhece a linguagem informal existente nos círculos da "alta política europeia" sabe que a palavra "spitzenkandidat" é a designação dada ao candidato indigitado informalmente para presidir à Comissão Europeia na sequência de acordos prévios entre os principais partidos políticos representados no Parlamento Europeu - ao descarado arrepio do que está formalmente previsto nos Tratados da União Europeia, em que é o Conselho Europeu quem propõe ao Parlamento a eleição de um deputado tendo em consideração os resultados das eleições respectivas.
Aproximando-se tais eleições, previstas para a última semana do mês de Maio, constata-se já ter começado informalmente a campanha eleitoral pelo que importa reflectir uma vez mais sobre a importância do Parlamento Europeu e obviamente sobre os mecanismos eleitorais que incluem a existência se bem que informal do conceito de "spitzenkandidat", num ambiente em que parece haver cada vez mais um afastamento dos cidadãos face ao Parlamento e à própria ideia de União Europeia.
Tal sentimento não acontece por acaso e a razão é relativamente simples: os cidadãos não se sentem suficientemente próximos dos representantes que elegem, tanto a nível nacional como a nível europeu, numa era em que as televisões e a comunicação electrónica a nível horizontal diminuíram substancialmente o contacto pessoal directo, e em que os desempenhos televisivos quer pela televisão clássica quer por transmissões através da Internet permitem aos candidatos com mais capacidade de comunicação e de representação uma maior eficácia na transmissão de conceitos, muitas vezes demagógicos e não suficientemente sustentados em argumentos baseados numa credibilidade decorrente de provas dadas no exercício de funções anteriores.
E não é a panaceia dos "círculos uninominais" que irá concretizar a aproximação entre eleitores e eleitos; por exemplo, no caso de Portugal, é difícil imaginar que um deputado possa escutar individualmente as algumas dezenas de milhar de eleitores que lhe caberiam.
A saúde das democracias está na sua base, que é o poder local, que permite escolhas mais sustentadas, baseadas na observação e no diálogo, permitindo aos eleitos a este nível que escolham os que devem pertencer a um patamar superior - este já pop com poderes de intervenção no plano das altas funções do Estado.
Tal como na Constantinopla bizantina sob cerco turco se discutia qual o sexo dos anjos, assim os altos responsáveis da União Europeia se entretêm com bizarrias artificiais de supra-arquitectura institucional enquanto deixam desagregar a "União" Europeia, quer pela Brexit, quer pelas "salvínicas" diatribes, quer por "orbânicas" atitudes ou até por incendiárias declarações de governos como o polaco.
Depois, surpreendem-se com a desagregação política, e enviam os Comissários Europeus, quais comissários políticos, a sonolentas sessões quase sempre denominadas por "O futuro da Europa", onde alguns estudantes colocam entediantes questões.
Acresce a falta de visão em não se terem promovido muitíssimo mais intercâmbios tipo Erasmus (estudantes) e Leonardo (jovens trabalhadores), que teriam ajudado a criar uma outra união na Europa.
Assim, tanto a nível local, como no plano superestrutural, e numa visão "horizontal", vamos assistindo ao definhar de um projecto que tanto entusiasmou a minha geração.
Até que ocorra um acontecimento ou uma ameaça que actue como um catalisador de uma reacção que provoque um efeito de coesão.
Ocorrerá ?
10.Fevereiro.2019
Ocorrerá ?
10.Fevereiro.2019