Os Comandantes Militares dos EUA, a Constituição, e D.Trump.
O General Milley, Comandante das Forças Armadas dos Estados Unidos da América, e o General Hyten, Vice-Comandante, já deram sinais suficientes do que é a sua interpretação do papel das Forças Armadas numa Democracia.
O General Milley, porque se apressou a pedir desculpa de ter estado ao lado de D.Trump quando este se deslocou a um local onde decorria uma manifestação pacífica que momentos antes tinha sido dispersada através de recurso abusivo a forças de segurança.
E não se deve esquecer que, interrogado há algum tempo sobre eventuais intenções de D.Trump de lançar ataques sobre 52 locais culturais do Irão, respondeu secamente que "seguiremos as leis do conflito armado", em sinal evidente de que havia limites para as ordens presidenciais.
Por outro lado, recorde-se que o General Hyten, nas suas anteriores funções de Comandante do Sistema Estratégico de Defesa Nuclear dos EUA, tinha afirmado que antes de obedecer a uma ordem presidencial de uso de armas nucleares verificaria primeiro a sua legalidade.
Acentue-se igualmente (ou principalmente) que o General Milley
referiu na passada semana que as Forças Armadas não intervirão de modo nenhum em processos de apuramento de resultados eleitorais que são de exclusiva competência do Supremo Tribunal e do Congresso.
Isto num momento em que se admitem hipóteses de se chegar ao dia 20 de Janeiro (em que constitucionalmente deve tomar posse o Presidente eleito) com D.Trump a declarar que não entrega provisoriamente as suas funções a Nancy Pelosi - Presidente da Câmara dos Representantes (parlamento) - por entender que a contagem dos votos por correspondência ainda não está terminada (ou que não é fiável).
Trata-se de situações inconcebíveis mas que já passaram a ser objeto de ponderação por parte de muitos analistas naturalmente impressionados com o apego à Casa Branca que D.Trump tem demonstrado, como por exemplo através do seu uso para anúncio da decisão do seu partido de o apresentar como candidato - algo que até agora ninguém tinha ousado fazer.
Os Generais Milley e Hyten provavelmente estarão neste momento a pensar no que deverão e poderão fazer caso a Presidente provisória Nancy Pelosi, apoiada em deliberação do Supremo Tribunal, ordene que seja cumprida a Constituição.
E se o Supremo Tribunal - em que os juízes nomeados mais recentemente foram propostos por D.Trump - entender que o voto por correspondência não é fiável dado o seu anormal volume ? Pode dar ordens às Forças Armadas e à Guarda Nacional ? E qual a posição do Congresso ?
As Forças Armadas num Estado de direito democrático não deixam de ter uma responsabilidade constitucional
que evidentemente tem que estar apoiada numa sólida interpretação dos desígnios de um país.
E se lhes é lícito intervir quando os seus próprios chefes não sabem interpretar o pensamento profundo quer do pessoal que comanda, quer do seu país, e extrair a confluência possível e desejável, como ocorreu no Portugal de 1974, já a decisão se torna mais fácil para os comandantes - e, entre eles, para o que tem as maiores responsabilidades - quando é clara a correcta interpretação constitucional, e quando é franco e aberto o exercício do seu Comando, com o consequentemente conseguido espírito de corpo.
Que deve ter sempre presente, no mundo aberto em que vivemos, nomeadamente desde o princípio deste século em que se confrontam pulsões totalitárias bem como informações distorcidas, os interesses conjuntos do Estado em que se inserem e os dos restantes - aferidos por perspectivas que tenham presentes um futuro equilibrado para a Humanidade.
General Milley, desejo-lhe que - com os seus pares - tenha boas reflexões, pensadas intenções, e correctas decisões.
31.Agosto.2020.