1975 a 1977 : Organização das primeiras 5 Eleições Constitucionais.

 

1975 a 1977 : Organização das primeiras 5 Eleições Constitucionais.
     (Com um abraço a Jorge Miguéis)

No 40º aniversário das eleições para as Autarquias Locais a Junta de Freguesia da União das Freguesias de Algés, Linda-a-Velha, Cruz Quebrada, e Dafundo organizou em 14 de Dezembro de 2016 uma Tertúlia comemorativa no Palácio Anjos, para a qual fui convidado a intervir na respectiva abertura, perante razoável assistência e bastante participação das pessoas presentes.

Eis então um resumo da parte da intervenção que incidiu mais nos aspectos de natureza histórica, ficando para o próximo texto a que versou sobre questões de organização do poder político local, suas relações com a evolução sociológica que se verifica, e questões versando atribuições, competências, e recursos respectivos.

" Senhores Presidente Carlos de Sales Moreira, ilustres membros deste painel - Deputados Dr.Sérgio de Azevedo, Dr.José Santinho Pacheco, Vice-Presidente da Associação Nacional de Freguesias Dr.Francisco de Jesus- - e ilustre Moderador Cte. Carlos Coutinho;

Caras concidadãs e caros concidadãos:

Apresento ao Sr Presidente da Junta Carlos de Sales Moreira e a todos os membros do executivo, conjunto que me habituei a apreciar pela sua competência e dedicação, bem como às vossas colaboradoras e aos vossos colaboradores, as minhas felicitações pela concretização de um acto comemorativo com tão profundo significado, porque demonstrativo da autonomia do poder local e exemplo talvez raro no momento em que se comemoram 40 anos decorridos sobre as marcantes eleições para as autarquias locais. Felicitações que aliás são extensivas a todos quantos indirectamente intervieram para  este acto, nomeadamente no âmbito da Assembleia de Freguesia, e dos Colaboradores da Junta.

Foi-me sugerido que recordasse episódios relacionados com a elaboração das primeiras leis sobre o poder local.
Perguntarão assim e talvez alguns de vós qual a razão que levou a que fosse convidado a iniciar esta tertúlia. É simples:

Em 1974 estive presente no golpe militar de 25 de Abril, coordenando as Forças de Fuzileiros que participaram na ocupação da sede da Dgs/Pide;  e, talvez porque nos meses seguintes tivesse continuado a advogar a plena subordinação do poder militar às instituições decorrentes de eleições livres, viria a ser convidado, em meados de Setembro de 1975, a dirigir o então "STAPE" (Secretariado Técnico para os Assuntos dos Processos Eleitorais) e assim colaborar na organização dos 5 actos eleitorais que viriam a ocorrer em 1976.
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Cinco ?

Sim.: Assembleia da República, Presidente da República, Assembleia Regional dos Açores, Assembleia Regional da Madeira, e Autarquias Locais - já em 12 de Dezembro.

Eleições que,  convém não esquecer, foram tal como as de 1975 as primeiras verdadeiramente democráticas que houve em Portugal.

Porquê as primeiras ?

É que antes de 1974 havia múltiplas restrições ao voto das mulheres, quer durante a monarquia, quer nas formas de república existentes antes de 1974.

E assim me vi eu, sem qualquer formação jurídica, apenas autor de um trabalho de investigação sobre o foro militar, a presidir a grupos de trabalho com insignes juristas como José Magalhães Godinho, Barbosa de Melo, Amândio de Azevedo, e Lino Lima, visando a elaboração de projectos legislativos que depois submetia à apreciação de António Almeida Santos, ou em casos interpretativos à do Conselheiro Almeida Borges - presidente do Supremo Tribunal de Justiça (o que nos valeu aos dois, no caso de símbolos em boletins de voto reclamados simultaneamente por dois partidos, sermos apelidados de "social-fascistas"...).

Projectos que, além dos de natureza eleitoral, versavam também questões relacionadas com os poderes de natureza regional e local, em particular em matéria de atribuições e competências, tendo muitas das versões promulgadas durado mais de 25 anos - assunto a que me referirei oportunamente.

Tudo isto, sem esquecer obviamente os trabalhos de aperfeiçoamento da que ficou então conhecida como a "máquina eleitoral" que tinha sido organizada, sob a direcção política do então Ministro Costa Brás, para as eleições constituintes de 1975 por um grupo de distintos militares e jovens colaboradores civis, tendo estes transitado para a organização dos actos de 1976 e vindo a desempenhar assim o principal papel na respectiva preparação, para cujo sucesso contribuíram decisivamente - aliás como milhares de funcionários, militares, e outros cidadãos.

Deles constava já Jorge Miguéis, que se manteve em funções de âmbito eleitoral mais de 40 anos, grande parte dos quais em funções de alta direcção, e a quem o nosso país deveria estar profundamente grato, elemento fundamental que foi daquela área.   Foi, e é, pois nela continua, agora na Comissão Nacional de Eleições.

E está aqui presente, pois amavelmente acedeu à minha sugestão para comparecer nesta tertúlia de modo a corrigir os naturais lapsos de alguém que, afastado daquelas lides desde 1977, não deixará de cometer.

Seja-me agora permitido um parêntesis: o Coronel Costa Brás também reside neste concelho, mais precisamente a 900 metros daqui; talvez a Assembleia Municipal queira em acto apropriado oportunamente recordar que, novamente como Ministro da Administração Interna, supervisionou a realização das eleições autárquicas de 1976. Os Presidentes da Assembleia de Freguesia e da Junta, aqui presentes, por certo não deixarão de o sugerir.

E, voltando às memórias de então, recordaria com uma ponta de humor que talvez a minha grande realização e vitória na preparação das eleições para as autarquias locais, em 1976, foi o esboço dos símbolos que viriam a ser impressos nos boletins de voto, diferenciando assembleias de juntas ...

Grande, porque perduraram dezenas de anos - aliás como no essencial diversos documentos legislativos ...

Tive uma derrota, porém.

E mencioná-la integra-se no tema que foi sugerido que abordasse nesta intervenção.

Defendia, e ainda defendo, mais poderes para os órgãos executivos em matéria de atribuições, competências e recursos, adequadamente ajustados no que respeita às Juntas, e que estivessem "plasmados" (para não deixar de usar hoje uma palavra de moda, para deixar os ilustres assistentes "pasmados" com a minha sabedoria...) na respectiva Lei.

Tal não foi aceite, porém.

E antecipei assim em 3 meses o prazo que me tinha imposto de regressar à Marinha logo que estivesse completada a arquitectura política de transmissão do poder político-militar para os eleitos pelo povo - mesmo que de modo algo mitigado que como se recorda só viria a plenamente se concretizar em 1982.

Apresentei-me, pois, na Marinha em Março de 1977 (onde me colocaram a "estagiar" em Educação Física da Armada, durante 10 saudáveis anos). ".

(...)

" A terminar:

 Com alguma ingenuidade pensei no início do corrente ano que tanto a Assembleia da República como o Governo poderiam recordar às portuguesas e aos portugueses o quadragésimo aniversário das inesquecíveis datas de 1976 em que o quadro de funcionamento democrático foi erguido, sem que tais iniciativas significassem ingerências em possíveis iniciativas de outros órgãos institucionais, uma vez que sabia que o Presidente da República não deixaria de fazer lembrar adequadamente - como fez - a eleição de António Ramalho Eanes, bem como de se associar - como fez - às comemorações das Associações Nacionais dos Municípios e das Freguesias.

Não tendo o Presidente da Assembleia acolhido tal ideia, apesar de adequadamente exposta, preferindo focar os aspectos comemorativos da aprovação da Constituição, sugeri, assim, a pessoa exercendo importantes funções governativas que fosse proposta ao Presidente da República a data de 12 de Dezembro, comemorativa das primeiras eleições para as Autarquias Locais, para, recordando a realização das Eleições de 1976 se proceder a um acto simbólico de reconhecimento nacional à Função Pública central, regional, e local, condecorando quem, ao longo de mais de 40 anos, foi um esteio sólido da que, sucedendo ao STAPE, é agora designada por "Administração Eleitoral".

Mais uma vez não tive sucesso.

Porém, tê-lo-ei de outra forma, pelo que convido o Dr.Jorge Miguéis a subir a este palco.

Onde eu o condecorarei publicamente.

             Com um abraço.  Um longo abraço ".

18.Dezembro.2016

( Semimórias)