Uma opinião do Almirante Nobre de Carvalho: "Os construtores do Império e os iconoclastas".



       OS CONSTRUTORES DO IMPÉRIO E OS ICONOCLASTAS


    Ultimamente alguns utópicos esquerdistas citadinos e pseudo
progressistas, intitulando-se professores e historiadores,
portugueses e também burocratas iluminados catapultados para
cargos de nível elevado na União Europeia, têm dado à estampa e
no ciberespaço, argumentação advogando a necessidade de os
Estados europeus com um passado colonial, nomeadamente
Portugal, alterarem o ensino da História, em que se enaltece o
espírito de aventura dos navegadores e a sua acção civilizadora,
para um enfoque redutor na escravatura a que sujeitaram, durante
um certo período, os povos africanos, omitindo despudoradamente
que estes já praticavam o esclavagismo entre eles, antes da
chegada dos europeus.
    Senti agora uma pulsão para aprofundar um pouco mais este
momentoso assunto, devido ao bom conhecimento que tenho do
antigo Ultramar português , por ter nascido em Gôa nos idos dos
anos quarenta do século passado, onde vivi dez anos, seguidos de
dois em Cabo Verde, cerca de três em Angola e três na Guiné,
estes últimos em zona de campanha e, mais tarde, quatro anos em
Macau, China.
    Segundo aqueles destruidores de imagem e cingindo-me agora ao
nosso País, os portugueses precisam de aprender a exprimir a sua
contricção pelas nefanda acção dos seus antepassados
colonizadores, reduzindo-os à categoria de execráveis
esclavagistas, incentivando inclusivamente os responsáveis
políticos lusos actuais a apresentaram pedidos de desculpas aos
Estados africanos lusófonos, pela sua cruel acção colonizadora.
    Alguns daqueles iluminados advogam mesmo a retirada das placas
onomásticas de ruas e avenidas que justamente eternizam heróis
como Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, Mouzinho de
Albuquerque, Hermenegildo Capelo, Roberto Ivens, e muitos outros
Construtores do Império militares e civis.
    Ora, em meu entender, salvo melhor opinião, o ensino da História
de Portugal às novas gerações, não deve escamotear as vertentes
negativas da colonização, como a época do trabalho escravo, mas
precisa de sublinhar, numa perspectiva planetária, os importantes
aspectos positivos de que nos devemos orgulhar, ao fazer evoluir
os povos do tribalismo, uma galáxia de mundos humanos isolados,
eivado de ódios étnicos, algum canibalismo e esclavagismo, onde a
comunicação é feita com um número reduzido de vocábulos, para
uma cultura hegemónica utilizando o português, idioma avançado,
com milhares de palavras, capaz de alargar o pensamento para
além do horizonte e de exprimir muito mais ideias, catalizando o
acesso do ser humano à evolução e à cidadania plena em direcção
a um mundo unitário, global.
    A História deve ser apresentada aos jovens à luz de um quadro da
evolução da Humanidade, explicando os aspectos positivos e
também, evidentemente, os negativos, criando a emulação que os
motive a serem cidadãos ainda melhores do que os seus avoengos.
    Os portugueses querem-se descomplexados e motivados para
continuar a cooperar com os povos dos actuais Estados
independentes lusófonos que ajudaram a criar em laboriosas
fadigas e com enormes sacrifícios.
    Como disse o cientista israelita Yuval Noah Harari no seu livro
“Sapiens, História Breve da Humanidade”, é preciso olhar a História
alcandorando-nos ao ponto de vista de um satélite espião cósmico,
analisando milénios em vez de séculos, percebendo como se
desenvolveram as culturas que há cerca de 70.000 anos os
organismos pertencentes à espécie “Homo Sapiens” começaram a
formar. Veríamos então como os impérios colonizadores
conseguiram unir diversos grupos étinicos sob uma só alçada
política, fundindo assim segmentos cada vez maiores da espécie
humana e do planeta, na senda de uma evolução unificadora. Nos
últimos 2.500 anos a maior parte dos seres humanos viveu sob
égides imperiais. Os nossos antepassados, habitantes da península
ibérica, por exemplo, foram colonizados pelo Império romano,
adquirindo uma língua mais abrangente, o latim e o direito romano,
sendo o primeiro a raíz da língua portuguesa e o segundo a base do
conceito de cidadania, onde se fundam as leis actuais.
    A presença colonizadora lusitana, com relevo para o papel
missionário da Igreja Católica, fez evoluir os povos na Índia, em
África, na América do Sul, na China e na Oceania, incentivando o
casamento com nativas, proibindo o canibalismo e as guerras
tribais, bem como, em Gôa, o “Sati”, isto é, a queima das viúvas na
pira dos maridos. Foram desbravados grandes espaços, erigiram-
se cidades modernas, demarcando, cartografando e defendendo à
custa de esforços inauditos de portugueses e africanos, as
fronteiras dos vastos territórios, assegurando o seu reconhecimento
internacional mediante a celebração de Tratados. Repare-se na
vastidão de Angola, Moçambique e Brasil. Na colonização
espanhola, por exemplo, apenas se lhes comparam em dimensão,
o México e a Argentina.
    Quando o Estado português resolveu, após 25 de Abril de 1974,
conceder a independência às colónias, particularmente a Angola e
Moçambique, é importante salientar que o grau de desenvolvimento
alcançado nos campos da educação multicultural, da saúde, da
economia, dos transportes rodo e ferroviários, quando comparado
com o dos países africanos limítrofes, é francamente favorável à
colonização portuguesa, como pude observar “in loco” há cerca de
dez anos, quando visitei a República Democrática do Congo, Os
Camarões, o Kénia e o Zimbabwe. Enquanto a colonização inglesa
e a holandesa, elitista, gerou o odioso sistema do “Apartheid” na
África do Sul, pactuando também na Índia com o sistema de castas,
a colonização lusa apostou na miscegenação e criou sociedades
multiraciais. Em 1990, no “Royal College of Defense Studies” em
Londres, tive o prazer de ouvir um distinto conferencista, professor
universitário nigeriano, cujo nome não consigo recordar, analisando
a colonização da África, afirmar que a colonização portuguesa havia
sido a mais humana de todas.
    A concessão apressada da Independência aos territórios
ultramarinos pelo Estado português num quadro internacional de
“Guerra Fria”, entregando-os aos depauperados “Movimentos de
Libertação” sem realizar previamente eleições, provocou como
todos sabem o êxodo para Portugal de várias gerações de
portugueses, abandonou à sua sorte os milhares de soldados
africanos que lutaram ao nosso lado e lançou os africanos numa
longa guerra fratricida que provocou milhões de mortos. A História
se encarregará de julgar os responsáveis directos e remotos que
conduziram a essa difícil decisão. Agora, é imperioso estreitar os
laços culturais e económicos no âmbito dos Estados de língua
oficial portuguesa.

    Concluindo e contrariando os iconoclastas, penso que os
portugueses se devem orgulhar do seu passado, dos seus
Construtores do Império, do enorme contributo, de saldo largamente
positivo que deram à humanidade e que continuam a dar,
contribuindo para o avanço do Homem na senda do progresso.
E, nesta perspectiva e a propósito do que foi referido no início desta
intervenção, sustento que as placas toponímicas e os monumentos
aos heróis de antanho devem ser evidentemente mantidos e
preservados, para emulação das gerações futuras.

21 de Outubro de 2018

João Manuel Nobre de Carvalho