_________________________________________________________________
Um
Pacto. E o espírito
europeu ?
Desde
Março do corrente ano que um grupo de europeus e de Fundações com sede na União
Europeia tem vindo a reflectir sobre a necessidade de se formular um "Novo
Pacto para a Europa", na sequência de múltiplos debates e encontros que se
desenrolariam de acordo com um programa que será apresentado publicamente muito
em breve (entre outros meios de difusão, em www.newpactforeurope.eu ).
Já foram
identificadas por aquele grupo de entidades 5 opções possíveis para debate
(admitindo-se evidentemente que possam surgir outras), e que vão desde a
retracção para uma "União mínima" até às perspectivas ambiciosas de
um plena União consolidada.
Parece-me,
porém, que algo falta de essencial na discussão do que somos e do que podemos
vir a querer ser, e a que já me tenho referido em "pontos de vista"
publicados nestas net-páginas: trata-se de chegarmos a um consenso sobre o que
se poderá definir como o "espírito europeu", sem o que qualquer debate
enfermará do elemento agregador que caracteriza a Europa.
É que,
tal como mencionei anteriormente, não foi por acaso que os primeiros Encontros
Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as
cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era mundial, foram
precisamente dedicados ao tema do "Espírito Europeu", vindo a
influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de
instituições europeias que - na minha interpretação - procuravam assumir um
papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até
então a intervenção de diversas nações europeias no mundo procurasse ao mesmo
tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da
democracia e da igualdade.
Porém as diversas formas de que se
foi revestindo a cooperação comunitária que viria a dar origem ao que agora se
designa por União Europeia terão perdido grande parte do fio condutor do
pensamento algo idealista que caracterizou a tentativa de definição de tal
espírito, o que por certo contribuiu para uma formatação em que os aspectos de
mercado passaram a ser determinantes para a construção de uma unidade europeia,
a que se agregaram as naturais dificuldades decorrentes das imigrações de culturas
mediterrânicas e da falta de debate aprofundado sobre tal situação.
Acresce uma ausência de reflexão
sobre o funcionamento dos sistemas políticos, dado o crescente distanciamento
em diversos Estados-membros entre eleitores e eleitos que levam a que a delegação
política seja sentida como insuficiente face à necessidade de participação
local, em sociedades que cada vez recebem mais e melhor informação.
Sem uma reflexão séria sobre o que
pode ser considerado como um "novo espírito europeu" as opções
possíveis para o novo pacto na União arriscam-se a cair por falta de adequado
sentimento agregador.
Tal reflexão deve constituir
elemento prévio de ponderação em todos os debates, pois sem ela a União
Europeia poderá ser uma jangada, mas nunca será um navio.
29.12.2013.
______________________________________________________
O Governo dos Juízes...
... E as Presidências dos Reformados.
Eis o Estado de Portugal, pois por um
lado as Presidências da República, e da Assembleia da República, são exercidas
por personalidades que optaram por auferir pensões de reforma em vez dos
salários de função, e por outro lado os Juízes do Tribunal Constitucional
apontam ao Governo e ao Parlamento caminhos de governação.
Caminhos que na passada semana vieram
à superfície quando aquele Tribunal considerou inconstitucionais as normas que
previam uma redução significativa das pensões atribuídas pela Caixa Geral de
Aposentações dos funcionários do Estado, tendo em vista uma aproximação entre
os critérios seguidos na respectiva determinação e os observados no regime
geral de Segurança Social, sendo tais inconstitucionalidades verificadas por se
tratar de um medida avulsa e não inserida numa perspectiva integrada dentro de
um conceito global e unificado de um sistema de protecção público de pensões.
Tal sistema, segundo o Tribunal,
deveria compreender uma solução estrutural, destinada a atingir uma
sustentabilidade abrangendo igualdade proporcional e solidariedade entre
gerações, pelo que poderiam até justificar a revisão de pensões já atribuídas,
dadas diversas alterações de circunstâncias - demográficas, económicas e
financeiras.
Provavelmente maravilhado com o facto
de um Tribunal ter sugerido a adopção de disposições governativas de carácter
estrutural, o Primeiro-Ministro apressou-se a referir que iria seguir tal
caminho, esquecendo-se porém de mencionar que já por diversas vezes se tinha
pronunciado pela necessidade de "reformas estruturais", tendo
inclusivamente solicitado a um seu Ministro de Estado, há quase um ano, que
procedesse a estudos em tal área.
Tal Ministro - entretanto
"promovido" a Vice-Primeiro-Ministro - acaba de produzir então um
"Guião" que por certo contem as orientações e metodologias
necessárias e suficientes para se resolver em curto prazo o problema financeiro
causado pela decisão do Tribunal.
Metodologias de carácter estrutural,
como é evidente.
22.Dezembro.2013.
____________________________________________________
Uma gaiola dourada.
Conforme noticia a Imprensa, por
despacho conjunto dos Ministérios da Administração Interna (MAI) e da Defesa
Nacional foi nomeado o ex-director nacional da PSP Paulo Gomes para oficial de
ligação do MAI na embaixada de Portugal em Paris. Tal posto terá sido criado
especialmente para Paulo Gomes, que apresentou recentemente a demissão do seu
cargo na PSP, na sequência dos incidentes ocorridos na manifestação das forças
de segurança junto ao Parlamento.
Seja qual for a explicação que o
Ministro da Administração Interna dê no Parlamento - onde aliás também deveria
ser solicitado apropriado esclarecimento ao Ministro dos Negócios Estrangeiros
- anota-se desde já a inconsistência aparente do procedimento desde que se
deram os incidentes na escadaria de acesso ao Parlamento, começando por uma
demissão não explicada, para depois se dar uma substituição igualmente
surpreendente e, para finalizar, uma nomeação para uma "gaiola
dourada", pois se tratou da criação de um lugar aparentemente destinado a
uma pessoa definida, sem concurso público ou sequer existência de um comunicado
explicativo - este, o mínimo que se poderia esperar de um governo que quisesse
ter uma aceitável política de informação.
Tudo poderá levar a crer que Paulo
Gomes tenha solicitado directivas precisas para fazer face a uma situação que
poderia degenerar em violência, dada até a existência de antecedentes de tal
ordem em manifestação anterior há alguns anos, e que tais directivas não lhe
tenham sido dadas com clareza, pelo que terá assim apresentado a sua demissão.
Ficaria assim bem visível o possível
sentimento de culpa do Ministro M.Macedo que o terá levado a conseguir a
criação de um cargo em tão anómalas circunstâncias, prosseguindo assim uma
política de emigração dos nossos melhores quadros...
Esperemos entretanto que nas
escadarias de acesso ao edifício da Assembleia da República não surjam
tabuletas indicando "Paris - 1750 km".
15.Dezembro.2013.
_____________________________________________________
Fredrik de Klerk.
O falecimento de Nelson Mandela
suscitou um enorme pesar à escala mundial, que não podia deixar de ser
subscrito por quem advogasse e advoga os princípios de igualdade entre os seres
humanos, e que se recordasse do modo como conduziu uma sociedade dividida em
termos rácicos até um patamar democrático perdoando anos e anos de opressão a
uma parte do povo sul-africano subjugada por uma minoria.
No entanto muitos tendem a esquecer o
papel que em tal transição foi desempenhado por Fredrik de Klerk, e o facto de
o prémio Nobel da Paz lhe ter sido atribuído em conjunto com Nelson Mandela em
reconhecimento pela sua acção em prol do termo do "apartheid".
É justo, assim, recordar também
Fredrik de Klerk, que conseguiu conquistar a minoria "branca" para o
processo de transição, e aceitando com a maior dignidade passar a ser o
Vice-Presidente de Nelson Mandela após o período de transição para um regime
plenamente democrático.
É igualmente imperioso lembrarmos, a
propósito da acção visionária de F.De Klerk, a irredutibilidade de António
O.Salazar no que respeitaria a um processo de transição no império colonial,
cuja inevitabilidade se desenhava com a independência da União Indiana e
posteriormente das possessões francesas na Ásia e África.
Irredutibilidade que viria a
caracterizar do mesmo modo a governação de Marcelo A.Caetano, que ainda recebeu
o poder político a tempo de tentar uma solução democrática que, aplicada em
Portugal e nas regiões ultramarinas, pudesse assegurar um futuro sem a eclosão
de guerras civis naqueles territórios e a instabilidade que ainda se vive em
alguns deles.
E, diga-se, sem as dificuldades que
caracterizaram a vida da jovem democracia portuguesa, e cujo processo de
maturação política está longe de ser concluído, como o demonstram as graves
dificuldades em que nos encontramos, e o crescente desânimo e emigração
existentes.
8.Dezembro.2013.
____________________________________________________
Francisco - o primeiro sucessor de
Pedro ?
A notável Exortação Apostólica
“Evangelii Gaudium” é um documento que sai dos parâmetros habituais
relativamente aos de natureza doutrinal produzidos pela Igreja Católica, e
constitui um desafio a mudanças de atitudes e comportamentos de crentes e
não-crentes, desafio que é de saudar vivamente, pois não se apoia sobre
qualquer perspectiva de superioridade moral.
Privilegia a atenção aos desprotegidos,
nomeadamente os pobres, as mulheres, e as crianças, apelando também a que os
jovens possam ter um maior protagonismo e que sejam chamados a participar mais
activamente na construção da sociedade.
Considera assim que até que não se
melhorem radicalmente os problemas dos pobres não se resolverão os problemas do
mundo, e recorda serem duplamente pobres as mulheres que sofrem situações de
exclusão, maus tratos e violência, apelando a que haja mais políticos que tomem
verdadeiramente a peito tais questões.
Recorda os mais fracos: “os sem-tecto,
os dependentes de drogas, os refugiados, os povos indígenas, os idosos cada vez
mais sós e abandonados” e os migrantes, relativamente aos quais se exortam os
Países “a uma abertura generosa”.
Critica fortemente o sistema económico
adoptado na maioria das sociedades políticas actuais, que considera ser injusto
logo de raiz, fazendo prevalecer a lei do mais forte, de uma "nova tirania
invisível, por vezes virtual” de um “mercado divinizado”, onde reinam a “especulação
financeira”, a “corrupção ramificada”, e a “evasão fiscal egoísta”.
No plano das relações com outras
comunidades religiosas, lembra que nesta época adquire especial importância a
relação com os crentes do Islão, pois "diante de episódios de fundamentalismo
violento” há que “evitar odiosas generalizações, porque o verdadeiro Islão e
uma adequada interpretação do Alcorão se opõem a toda a violência”, e que “o
diálogo inter-religioso” é ” uma condição necessária para a paz no mundo” - sem
esquecer igualmente a importância da troca de pontos de vista entre crentes e
não-crentes (como é o meu caso) .
No plano interno da Igreja Católica, e
coerentemente com o que é anteriormente referido, aponta-se como desejável uma
comunidade “ferida e suja por ter saído pelas estradas" em vez de uma
Igreja preocupada com o "pragmatismo incolor" da sua vida quotidiana
e o cuidado ostensivo da liturgia, lembrando que o cristianismo "não dispõe de um único
modelo cultural” e que o rosto da Igreja é “multiforme”, afirmando que não
"podemos esperar que todos os povos, para expressar a fé cristã, tenham de
imitar as modalidades adoptadas pelos povos europeus num determinado momento da
história".
Não deixa de criticar o
"individualismo pós-moderno e globalizado", que "promove um
estilo de vida que perverte os vínculos familiares”, concluindo que se alguém
"conseguir ajudar pelo menos uma única pessoa a viver melhor, isto já é
suficiente para justificar o dom" da sua vida.
Documento abrangente, não esquece o
mundo global, a política, a economia, a justiça, e os não católicos, apelando a
que a Igreja Católica mude grande parte das suas atitudes para poder assim
aumentar a sua autoridade moral para lutar pelos nobres princípios que acabo de
salientar.
A concluir, sentir-me-ia-me tentado a
opinar que - embora não tenha o conhecimento suficiente da História da Igreja
Católica para poder fundamentar tal afirmação - Francisco será o sucessor de
Pedro que melhor terá interpretado a doutrina atribuída a Jesus de Nazaré.
1. Dezembro.2013.
________________________________________________
Quem guarda os guardas ?
(Quis custodiet ipsos custodes?)
Esta preocupação, que remonta a
Juvenal e à República socrático-platónica, veio à superfície da política
portuguesa quando no final da manifestação de descontentamento de diversas
forças policiais ocorreram incidentes que por ultrapassarem os limites legais
deveriam ter sido reprimidos por ... forças policiais, o que não sucedeu.
O Ministro da Administração Interna,
na sequência do ocorrido, aceitou o pedido de demissão do Director Nacional da
PSP, ao que consta devido ao facto de este Oficial não ter cedido a pressões do
Ministro para demitir dos seus cargos os responsáveis pelas forças policiais
que teriam a obrigação de reprimir os infractores e que não o fizeram.
Foi então designado um novo Director
Nacional, que exercia as funções de comandante da Unidade Especial de Polícia -
curiosamente a Unidade a que pertenciam as forças que não exerceram as funções
citadas, e cujos comandantes seriam obviamente os alvos das pressões
ministeriais.
Recordemos que há alguns anos ocorreu
uma situação algo semelhante na Praça do Comércio, em que manifestantes de
forças de segurança foram objecto de vigorosa intervenção repressiva por parte
de unidades especiais da Polícia, o que causou algum traumatismo psicológico
nesta força de segurança pública.
Estes acontecimentos fazem-nos
reflectir sobre aquela velha preocupação de Sócrates, e pensar seriamente como
tentar evitar que tais situações se repitam - evidentemente num quadro de
diálogo entre o "patronato governamental" e os sindicatos policiais
que tenha em consideração as dificuldades e escolhos que se deparam aos agentes
de segurança pública, e sem que lhes sejam conferidos privilégios sentidos como
excessivos pela opinião pública.
Atrevo-me pois a sugerir que a postura
das autoridades políticas, no caso de manifestações públicas das forças de
segurança, seja a de responsabilizar previamente os organizadores respectivos
pela manutenção da ordem e pelo respeito da propriedade pública e privada, tal
como o têm vindo a fazer diversas organizações sindicais, em colaboração com os
responsáveis policiais, e evitando situações de potencial confronto como as que
ocorreram frente ao Parlamento.
Como é evidente, deveriam estar sempre
disponíveis forças policiais que rapidamente pudessem acorrer em casos em que
os elementos de segurança e enquadramento dos manifestantes não conseguissem
evitar incidentes.
Estas questões tornam-se mais
candentes num momento em que personalidades conhecidas da vida política apelam
à demissão do Governo e à renúncia do Presidente da República, ouvindo-se
igualmente alusões a "pauladas" no caso de não tomarem tal
iniciativa.
E são questões sensíveis que não se
resolvem com as tradicionais demissões de responsáveis.
24.Novembro.2013.
_______________________________________________________
Junta de Freguesia: a primeira
reunião.
Distrito de Lisboa, Novembro de 2013.
No final do dia realiza-se a primeira
reunião pública da nova Junta de Freguesia de uma "União de
Freguesias" resultante da agregação de três autarquias, na sequência de
uma reorganização administrativa resultante do Memorando de Entendimento entre
a República Portuguesa e três entidades internacionais, assinado em 2011.
Duas das três Freguesias agregadas
tinham cerca de 20 mil eleitores cada, o que levou a que a União respectiva
ficasse a abranger aproximadamente 45 mil eleitores.
Dir-se-ia assim que o público presente
naquela primeira reunião seria numeroso, até pela natural curiosidade
decorrente de se tratar de um acto diferente dos precedentes, e de ter sido
anunciada com antecedência nos lugares habituais e nas net-páginas das Juntas
anteriores.
Porém, à presença de toda a Junta,
composta agora por 7 pessoas, correspondeu a população com a assistência e
participação de - imagine-se - 2 cidadãs e 1 cidadão (nenhum deles sendo
jovem...).
Parece evidente que o cenário descrito
seria outro se as recentes leis relativas às finanças locais, atribuições,
competências e recursos das Freguesias contemplassem uma forte descentralização
que trouxesse para os órgãos de poderes Local responsabilidades acrescidas.
Mas as modificações nas leis
anteriores foram tímidas, o que levou a que a participação potencial dos eleitores
na vida política local tenha sofrido mais um rude golpe, que aliado à
monstruosidade da criação de freguesias com população superior à de diversas
cidades faz temer que um dos sustentáculos da democracia - o Poder Local -
venha a sucumbir penosa e tristemente, apesar dos esforços e evidente
empenhamento dos novos eleitos.
Os responsáveis por este golpe na
Democracia foram também os que permitiram a extinção de pequenas Freguesias no
interior do nosso país, e que eram - com custos reduzidíssimos - um dos poucos
meios de contacto entre uma população desprotegida e a Administração Central.
Resta saber quais as poupanças de
gastos públicos nesta reorganização (talvez não superiores a 5 ou 10 milhões de
Euros), para nos interrogarmos sobre a respectiva eficácia, tanto
administrativa como política.
17.Novembro.2013.
______________________________________________________
União Europeia: os fracassos de
Lisboa.
Em Março de 2000 foi aprovada pelo
Conselho Europeu, em Lisboa, uma estratégia com o objectivo de transformar a
Europa na economia do conhecimento mais competitiva e mais dinâmica do mundo.
Ficou a ser conhecida por
"Estratégia de Lisboa".
Em Dezembro de 2007 foi assinado,
também em Lisboa, um complexo acordo que alterou os dois principais Tratados da
UE: o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia,
tendo este passado a chamar-se Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
Tratados que entraram em vigor em Dezembro de 2009 (já em plena crise
financeira internacional...).
Este conjunto de Tratados passou a ser
designado por Tratado de Lisboa.
Anote-se que o Tratado contem um
conjunto de disposições específicas para os Estados-Membros cuja moeda seja o
euro, tendo entretanto sido aprovado (tendo para tal bastado 12 Estados...)
mais um Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica
e Monetária (vulgo "pacto orçamental"), que entrou em vigor em 1 de
Janeiro de 2013.
Lisboa está assim infelizmente
associada a um processo de ambição excessiva por parte dos dirigentes europeus,
que não cuidam de saber se o que laboriosamente aprovam tem consistência, ou de
acompanhar e melhorar a execução do que foi acordado.
Ambição excessiva que tem sido
permitida pelo afastamento dos cidadãos relativamente a uma maior participação
na vida política.
E se no que respeita à
"Estratégia de Lisboa" se teria podido esperar que a nossa capital
pudesse ter um papel incentivador de tais acções, dada a associação do nome a
tais responsabilidades, papel que necessariamente se teria de revestir de
alguma informalidade, já no que se refere ao Tratado de Lisboa tal posição
deveria caber nomeadamente à Comissão Europeia, pois compete-lhe velar pela
aplicação dos Tratados, e principalmente porque a crise financeira afectou e
muito a capacidade da União, em especial quanto à zona Euro.
Curiosamente, Comissão Europeia
presidida por alguém que transitou do Governo de ... Lisboa.
Porém o Tratado da União Europeia
contém uma disposição que permite a revisão dos Tratados: o artigo 48.º prevê
que qualquer Estado-Membro, o Parlamento Europeu ou a Comissão podem submeter
ao Conselho projectos de revisão dos Tratados.
Eis o que um corajoso Presidente da
República, um Primeiro-Ministro decidido, uma Assembleia da República vertical,
poderiam fazer neste momento difícil para a União e para Portugal.
A partir de - Lisboa.
10.Novembro.2013.
____________________________________________
A Constituição dos EUA e as
comunicações electrónicas.
O Ministério da Justiça dos EUA acaba
de notificar um acusado de que as provas contra ele obtidas tiveram origem em
escutas e intercepções de correio electrónico que não tinham sido objecto de
prévia autorização judicial.
A defesa provavelmente recorrerá para
o Supremo Tribunal pondo em causa a constitucionalidade de tal procedimento,
permitindo que aquela instância máxima de Justiça se pronuncie sobre uma
matéria fundamental em termos de direitos dos cidadãos.
Parece assim oportuno recordar que a
Constituição dos EUA, já nas suas primeiras versões, outorgava ao Congresso os
poderes para criar postos de correio e vias para distribuição postal - algo que
não figura na grande maioria dos textos constitucionais de outros Estados.
O facto de a própria Constituição se
referir expressamente ao correio acentua a importância que este teve na
consolidação federal de um tão extenso território, o que obviamente incluiria a
existência de punições severas para quem usasse o correio para fins ilegais,
proibindo-se igualmente as autoridades postais de violar a correspondência.
O mundo evoluiu entretanto em largos
passos, mas os princípios constitucionais mantêm-se, e a interpretação que o
Supremo Tribunal dos EUA não poderá deixar de fazer assentará por certo na
avaliação do conceito de correspondência como meio de transmissão de
informação, seja por meios telefónicos, audio-visuais, e outros sistemas
electrónicos, designadamente o correio por esta via.
Os princípios por que se regem os
Estados democráticos incluem igualmente o de as polícias deverem requerer
prévia autorização judicial para, com base em indícios apropriados, poderem
proceder a vigilância de actividades suspeitas de poderem perturbar as leis em
vigor, pelo que se aguardará com interesse a evolução deste assunto num país
que ultimamente tem apresentado sinais preocupantes de comportamentos
paranoicos e contraditórios - seja na liberdade de posse de armas, seja na
longa manutenção de detidos sem julgamento imparcial, ou em desaparecimentos -
discretos ou não - de opositores.
03.Novembro.2013.
_________________________________________
A revisão constitucional.
Tendo já passado 5 anos sobre a última
revisão constitucional, a Assembleia da República tem novamente poderes para
proceder a uma revisão ordinária do seu texto (independentemente da
possibilidade de em qualquer momento o fazer desde que decidido por maioria de
quatro quintos dos Deputados em efectividade de funções).
A Constituição impõe "limites
materiais" para a sua revisão, sendo a grande maioria consensual, havendo
contudo alguns que poderão suscitar reservas a uma minoria de cidadãos, como
será o caso dos que advogam o estabelecimento de um regime monárquico
hereditário.
Porém, no que respeita à designação
dos titulares electivos dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do
poder local é estabelecido que deverá ser observado o sufrágio universal e
directo, excluindo-se assim a possibilidade de haver eleições indirectas, como
passou a ocorrer após o "susto" provocado pelas eleições
presidenciais de 1958, em que se admitiu a hipótese de que caso o recenseamento
e as eleições tivessem sido verdadeiramente livres Humberto Delgado as teria
vencido.
Ora a possibilidade de haver eleições
indirectas no quadro de um regime democrático caracterizado pela existência da
liberdade política não deveria assustar ninguém, e a meu ver é das poucas
perspectivas existentes para se obter a tão desejada aproximação entre
eleitores e eleitos, bem como para melhorar o funcionamento do sistema
partidário.
Se, como já tenho vindo a afirmar por
diversas vezes nestas páginas, o colégio das Assembleias de Freguesia pudesse
eleger por exemplo um Senado com poderes importantes no processo legislativo,
ou uma parte dos Deputados do Parlamento, haveria por certo efeitos positivos
destas eleições indirectas no desejado processo de aproximação entre os
cidadãos e os seus representantes electivos, bem como uma melhoria do diálogo
com as estruturas partidárias a nível local.
As outras hipóteses que têm vindo a
ser propostas visando o reforço da citada aproximação e de que há conhecimento
público mais alargado, desde os círculos uninominais à ordenação preferencial
dos candidatos nas listas apresentada, estão em meu entender longe de poderem
provocar os efeitos pretendidos.
Dir-se-á: mas que fazer, dada a
impossibilidade constitucional de haver limites materiais para a revisão
constitucional, entre os quais figura o do sufrágio universal ?
Há dias, em debate na SEDES sobre a
desejabilidade de uma reforma do sistema político, o ex-Deputado Joaquim
Ventura Leite focou o impasse político que se vive na presente crise financira
e económica, referindo a propósito - tanto quanto julgo ter compreendido - que
uma via para o resolver seria uma candidatura independente às próximas eleições
para o cargo de Presidente da República, baseada num projecto de referendo
assente numa proposta de novo texto constitucional.
Porém, o texto constitucional
apresenta aqui uma nova blindagem, pois a proposta de referendo, mesmo que
provenha de grupos de cidadãos, tem que ser aprovada pela Assembleia da
República; e, mesmo que fosse de iniciativa governamental, não poderia incluir
alterações à Constituição...
Em conclusão: não há via legal para uma
melhoria do regime democrático, condicionado que está pela notória incapacidade
de os partidos políticos se aproximarem dos cidadãos e de encontrarem soluções
de transformação do seu funcionamento.
A única possibilidade de fomento da
aproximação entre eleitores e eleitos é assim a de um "enorme
aumento" das atribuições, competências e recursos do poder local,
esperando-se que de tal modo se acabe por conseguir a desejável
"osmose" entre partidos e cidadãos que a tal nível permitirá a
modificação e aperfeiçoamento do funcionamento partidário.
Seria lenta. Chegaria a tempo ?
27.Outubro.2013.
___________________________________________________
A forma do Estado, e os
"kids".
Já decorreu um ano desde que o
Primeiro-Ministro anunciou solenemente que o Governo iria proceder a uma
profunda "refundação" do Estado, a concluir até 2014, e que ao
Orçamento do Estado para 2013 seria acrescentado "um corte permanente de
cerca de quatro mil milhões na despesa pública".
No início do corrente ano declarou o
Primeiro-Ministro que o então Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
Paulo Portas, fora encarregado de apresentar o que classificou como
"guião" para a reforma do Estado, o que até ao momento não ocorreu,
tendo ciclicamente vindo o Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho, a afirmar
que o citado "guião" seria apresentado muito em breve - isto, já
mesmo depois de Paulo Portas ter passado a exercer o novo cargo de
Vice-Primeiro-Ministro.
Tal circunstância repetiu-se há poucos
dias, tendo os portugueses tido que assistir ao triste espectáculo de o
responsável pelo Governo referir publicamente que o Senhor
Vice-Primeiro-Ministro iria apresentar muito em breve o famoso
"guião", como que atirando culpas para o "outro menino",
tal jogo de "kids"...
Se para a elaboração de um documento
onde se anunciarão grandes princípios e métodos para uma reorganização que dê
outra forma ao Estado é necessário esperarem-se longos meses bem podermos
imaginar quantos mais serão necessários para a sua discussão pública e apreciação
parlamentar, para além das que competem ao Conselho de Estado e Conselho
Superior de Defesa Nacional, para não se mencionarem os outros múltiplos órgãos
que não podem deixar de ser chamados a opinar, pelo que se afigura impossível o
respeito dos prazos enunciados há um ano (tendo um deles sofrido já um retardo
de um ano...).
A não ser que o Governo, e a maioria
parlamentar, queiram impor tal reorganização sem qualquer análise pública do
seu teor...
Penoso desempenho este, o de dois
"kids" que não se entendem - perante um país que atónito observa um
modo de governação que muitos classificariam como displicente e irresponsável -
mas não irrevogável.
20.Outubro.2013.
__________________________________________________
Abstenção: apenas um aviso ?
Os resultados até agora conhecidos relativamente ao escrutínio
provisório dos resultados das recentes eleições para as autarquias locais
suscitaram um quase unânime coro de preocupações sobre a abstenção, que teria
sido enorme, e a maior até agora nesse tipo de actos eleitorais.
Se bem que ainda faltem os resultados de diversas eleições locais
que, principalmente devido a empates técnicos, tenham que ser repetidas até ao
próximo dia 20 de Outubro, podem extrair-se desde já algumas conclusões, e
recordar-se alguns factos essenciais para a comparação de resultados com
eleições análogas anteriores.
O primeiro facto a salientar é que o universo eleitoral mudou
substancialmente em 2008, devido a uma Lei que determinou que o recenseamento
seria automaticamente feito a partir da base de dados dos bilhetes de
identidade e cartões de cidadão, o que fez aumentar os recenseados nalgumas
centenas de milhar, muito provavelmente emigrantes que continuaram a manter
tais documentos - se bem que na esmagadora maioria não se desloquem ao
território nacional para exercer o direito de voto (o que aliás seria algo
incongruente, em particular no caso de autarquias).
Desde modo, o que terá algum sentido será a comparação entre o
número real de votantes ao longo dos últimos anos, em que terá havido alguma
estabilização no funcionamento do sistema democrático, infelizmente bem longe
do entusiasmo com que se viveram as primeiras eleições baseadas num universo
verdadeiramente abrangente e longe das restrições que vigoraram até 1974.
Constata-se assim que desde 1999 o número de votantes no
território nacional em eleições legislativas e autárquicas oscilou entre 5,2 e
5,7 milhões de eleitores, sendo precisamente nas autárquicas de 2001 que
ocorreu a participação menos elevada, apenas superior em 200 mil à constatada
há 2 semanas.
Embora nas eleições autárquicas de 2009 tenham votado cerca de 5,5
milhões de eleitores, não se deve porém esquecer que desde então se terá
acentuado um elevado movimento emigratório, que segundo declarações do Secretário
de Estado das Comunidades em 25 de Janeiro passado terá sido nos últimos anos
da ordem dos 100 a 120 mil por ano.
Se admitirmos assim que nos primeiros 9 meses do ano em curso (e
tendo presente que segundo o Governo a situação económica portuguesa
melhorou...) terão emigrado apenas 50 mil portugueses chegaremos à conclusão de
que desde 2009 - data das anteriores eleições autárquicas - se pode estimar que
cerca de 350 mil cidadãos não puderam exercer agora o seu direito de voto no
território nacional, dos quais provavelmente metade (correspondente à média
habitual de abstenções) não o faria deliberadamente.
A conclusão global que se pode retirar é a de que ainda há
mais de 5 milhões de portugueses que acreditam na democracia representativa,
número que se tem até agora revestido de alguma estabilidade.
Porém, é crescente o desencanto que é sentido com o desempenho dos
responsáveis políticos em geral, bem como dos partidos em que se apoiam - e
estes não parecem compreender que são necessárias melhorias profundas na
ligação entre eleitores e eleitos, que não podem deixar de passar por um outro
exercício das atribuições do poder local, a base essencial da democracia.
13.Outubro.2013
__________________________________________________________________________
Uma República envergonhada.
A um cancelamento de um
Feriado nacional de importante significado em
termos de soberania do
povo, e praticamente imposto pelo Poder
suserano estrangeiro,
sucederam-se umas envergonhadas comemorações
oficiais despidas de
participação popular, bem como do simbolismo que
continua a faltar nas
sedes dos principais orgãos de representação do
Estado.
A noção de República
está indelevelmente associada à que decorre da
Democracia, pois o
governo da "coisa pública" não deve deixar de ser
exercido pelos
representantes livremente eleitos pelo povo, pelo que
as eleições que acabam
de ocorrer se revestem de um acrescido
significado, na medida
em que as escolhas eleitorais ocorrem num
ambiente de uma relativa
maior proximidade entre votantes e
candidatos.
Porém a taxa de
participação continua a estar muito longe da
constatada em 1976,
salientando-se que nas eleições autárquicas de há
4 anos houve cerca de 5,5
milhões de
votantes, enquanto nas
de há
uma semana votaram 5
milhões, ou seja menos 500 mil, situação para a qual terá
contribuído o elevado
número de emigrantes (talvez mais de 200 mil) que
desde as últimas
eleições saíram do país.
A abstenção real não
terá assim aumentado tão significativamente como
tem sido aventado, pelo
que
se poderá supor que os
portugueses ainda acreditam nas virtualidades do
sistema democrático,
apesar de ser voz comum o desencanto com o desempenho
dos partidos políticos.
Isto, apesar de a
recente "reorganização" administrativa das
freguesias ter
contribuído para um maior afastamento entre eleitores e
eleitos, como se
constata por
exemplo na de Algés, que
tinha cerca de
20 mil eleitores, tendo
passado a integrar uma União que no seu total
abarca mais de 40 mil, o
que mostra bem o quanto de negativo há na lei que
forçou tal
reorganização, pois a desgnação "freguesia" tem a sua origem em
"frequência",
associada a uma sociabilidade dificilmente atingivel com tais
números e com a extensão
territorial respectiva.
Assim é difícil melhorar
a qualidade dos representantes eleitos, pois
a participação na vida
política é obviamente limitada, não sendo
possível conseguir-se
aquela desejável "osmose" entre partidos e
cidadãos que permitiria um
melhor funcionamento da Democracia.
Só com uma profunda
revisão constitucional se poderá melhorar um
sistema político
classificado de doente por muitos, e tal só é
susceptível de ocorrer
na sequência de graves crises, como o comprovam
as que ocorreram após
1822, e mais recentemente em 1910, 1933, e 1974.
Ocorrerá alguma nos
próximos anos ?
5 de Outubro. 2013.
______________________________________________________________________
Conselho de Coordenação da Coligação.
Decorreu um um ano após a criação de
um "Conselho de Coordenação da Coligação", em acordo firmado entre o
Partido Social-Democrata e o Centro Democrático Social, através do qual os dois
partidos reafirmavam "o seu empenhamento na responsabilidade orçamental,
nas reformas estruturais e na equidade da repartição dos esforços, princípios
que permitem a Portugal vencer a crise e impulsionar uma trajectória de
crescimento sustentável".
Um mês depois o Ministro de Estado e
das Finanças, Vítor Gaspar, pedia a demissão do seu cargo, episódio de que apenas houve conhecimento público em
meados do corrente ano, aquando da sua saída do Governo, a qual esteve na
origem de uma forte crise política.
Certamente que o Presidente da
República estaria informado de tal pedido de demissão, na medida em que o facto
de afirmar não ter sido informado pelo anterior Primeiro-Ministro de situações
importantes terá contribuído para uma maior deterioração das relações
institucionais respectivas e para a aceitação do respectivo pedido de demissão,
facto que aparentemente não terá ocorrido com o conhecimento da situação
demissionária de Vítor Gaspar.
Deduz-se também que o Conselho
Coordenador da Coligação (CCC), nomeadamente ao nível dos seus mais altos
responsáveis, saberia do facto insólito de se manter em funções um Ministro que
pedira a demissão de funções de elevadíssima responsabilidade nas áreas
orçamental, das reformas estruturais e na equidade da repartição dos esforços,
sem se notarem inflexões políticas que lhe permitissem continuar no cargo com
pleno empenhamento.
Deduz-se igualmente que o CCC não terá
ficado surpreendido com a aceitação do pedido de demissão do Ministro Vítor
Gaspar, e que estaria preparado para uma rápida resolução da crise política que
lhe sucedeu.
Tais deduções parecem afinal
incorrectas, pois parece ao fim e ao cabo que o Conselho Coordenador da
Coligação nada coordenou nem aconselhou - quiçá nunca terá tido nenhuma reunião
para além da primeira...
Igualmente parece que o
Primeiro-Ministro, enquanto também primeiro parceiro do CCC, nada coordenou com
o seu par, nem com ele se aconselhou, nem este terá tomado qualquer iniciativa
relevante no mesmo sentido, preferindo de surpresa (ou talvez não, se
recordarmos a posição pública tomada em Abril passado quanto ao que ficou
conhecido como a TSU dos pensionistas) detonar uma crise política cujos
resultados orçamentais - e não apenas estes - poderão vir a ser mais gravosos
para os portugueses.
Resta saber se o Presidente da
República esteve a par do que ia ocorrendo, ou se também apenas sabia pelos
meios de informação pública.
Em conclusão: há coordenação na
coligação ? Seja qual for a resposta, o que parece haver é falta de sentido de
Estado num triângulo institucional que deveria corresponder de outro modo às
suas responsabilidades.
29.Setembro.2013.
____________________________________________
Portugal
Europeu - e agora ?
Decorreu
há uma semana o Encontro em epígrafe, em que perante mais de mil participantes
foram debatidos diversos aspectos decorrentes da participação de Portugal na União
Europeia, em sessões animadas por pessoas de reconhecido mérito, conforme se
pode constatar na respectiva agenda.
Porém
terá faltado na agenda, segundo penso, uma relevante questão: existe um
"espírito europeu" susceptível de ser a base de uma União de Estados
da Europa ?
É
certo que houve uma sessão sectorial, em que se discutiu se haveria uma cultura
europeia, porém numa óptica diferente da que deveria decorrer da análise da
existência de uma identidade transnacional, pelo que salvo intervenções
pontuais de uma assistência que curiosamente era muito maioritariamente
composta por pessoas de idade aparentemente inferior a 50 anos se falou de uma
União à luz dos parâmetros que a têm vindo a sustentar, e não se abordou
adequadamente o que pode caracterizar a existência de um pensamento comum sobre
uma união europeia.
Pensada
tal união na perspectiva de se obterem condições que evitassem conflitos sangrentos
como os que abalaram a Europa nos últimos séculos, terá faltado a procura de
pontos comuns que permitissem a evolução de afirmações de exclusão do que não
seria desejado - o conflito militar - para o que poderiam ser pontos comuns de
acordo sobre o que deveria ser procurado - a identidade cultural possível, e o
decorrente projecto comum.
Esta
procura, necessariamente ajustada à constatação das mutações induzidas pelas
fortes migrações de raiz islâmica, bem como às que ocorreram e ocorrem a partir
de Estados situados nas periferias leste e sul, deveria levar à redefinição dos
actuais Tratados, assentes então em princípios que não deixarão de reconhecer
que uma união europeia só muito lentamente poderá evoluir de uma concertação de
Estados em que é relevante o primado da economia para se transformar, através
da livre circulação de pessoas e da troca de ideias que só os sistemas
democráticos são capazes de proporcionar, numa união política de povos e
nações.
União
política que nas condições actuais não pode deixar de ter apenas a ambição de
evoluir gradualmente e de evitar fracturas que ponham em causa o sentimento de
uma identidade europeia entretanto reencontrada e aperfeiçoada.
22.Setembro.2013.
___________________________________________
Candidaturas saltitantes.
Foi conhecida há poucos dias a decisão
do Tribunal Constitucional que permite que um ex-Presidente de Câmara Municipal
se candidate, após três mandatos consecutivos numa autarquia, a idênticas
funções numa outra análoga.
Creio que terá sido esquecida não só
pelo Tribunal como também pela grande maioria dos cidadãos que o espírito da
Constituição aponta para que os candidatos aos órgãos de uma autarquia tenham
residido e continuem a residir na respectiva área, se bem que a lei eleitoral
não o indique expressamente por, ao que julgo saber, se recear que em muitos
casos de pequenas freguesias não existissem candidatos em número suficiente.
Porém, o espírito da lei e do senso
comum aponta precisamente no sentido da vinculação de candidaturas à residência
no território eleitoral respectivo, pois doutro modo e por exemplo um cidadão
romeno poderia apresentar-se à eleição em Portugal mesmo que a sua residência
habitual fosse no seu país de naturalidade, apenas sendo necessário que estivesse
inscrito no recenseamento eleitoral, tal como os mandatários, e não
necessariamente na área de candidatura, onde apenas estes ultimos teriam que
residir...
Por outro lado, e como é expresso na
mesma lei eleitoral, acresce que os proponentes da candidatura devem fazer
prova de estarem recenseados na área eleitoral em causa - como é lógico
Poderia dizer-se que em muitos casos
não haveria candidatos residentes, mas com a recente redução do número de
pequenas freguesias tal possibilidade terá ficado mais limitada, acrescendo que
a lei prevê que na inexistência de candidaturas seja o órgão executivo
assegurado por uma comissão administrativa provisória nomeada pelo Governo,
sendo por outro lado muito pouco provável que tais inexistências ocorressem ao
nível dos municípios.
Tribunal Constitucional e opinião
pública terão, creio, caído na armadilha de se concentrarem apenas numa
perspectiva da Constituição, esquecendo o fundo do problema: a essência do
Poder local.
E assim temos agora que lidar com a
existência de uma nova classe nas classificações de emprego: presidente de
Câmara Municipal e presidente de Junta de Freguesia, que percorrerão o país
oferecendo os seus préstimos.
Talvez um dia o Parlamento acorde e
pense nestas questões...
15.Setembro.2013.
___________________________________________________________________________
PIDE, jornalismo, e História.
Segundo veio a público na imprensa, o jornalista José Milhazes irá
apresentar em breve um livro em que se refere aos arquivos da
"PIDE-DGS" no qual entre outras afirmações "conta ainda o
episódio vivido por um agente soviético, Guenrikh Borovik, que, passando por
jornalista, em Maio de 1974, entra com "facilidade" na sede da PIDE
em Lisboa, na companhia de um português, tendo "roubado" o próprio
cartão de identidade de Silva Pais, o director da então polícia política,
apesar de ter sido revistado pelos militares do Movimento das Forças Armadas
que guardavam o edifício.".
É assim oportuno mencionar que nos
arquivos do Centro de Documentação 25 de Abril (Universidade de Coimbra) consta
no "Espólio 111" a existência do "Bilhete de Identidade de Silva
Pais, director da PIDE/DGS", conforme se pode verificar a partir daqui.
Não se pode exigir a um jornalista que
seja um historiador, porém os textos que publica são objecto de análise por
historiadores credenciados, que por certo não deixam de os comparar com outras
fontes.
Porém, uma vez publicados em livro,
entram no circuito de referências bibliográficas, pelo que acontece com
frequência que o contraditório só surja noutro livro muito tempo depois,
situação que leva a que se forme no imaginário colectivo uma ideia que não
corresponde plenamente à verdade, a qual, quando se torna pública, já ocorre em
momento tardio demais para se corrigirem totalmente erros de natureza
histórica.
A Internet permite que se faça uma
correcção mais imediata e susceptível de aferição por entidades apropriadas,
que no caso presente não deixariam por certo de verificar se o alegado cartão
de identidade de Silva Pais não seria por exemplo o de associado de uma
eventual associação desportiva dos funcionários da polícia política...
Fica assim registada, por este meio, a
dissonância entre dois testemunhos que mostram a diferença entre o imaginário e
a realidade.
A palavra aos historiadores.
8.Setembro.2013
___________________________________________________________________
Eleições, e Poder
Local
É inconcebível que
a menos de um mês das eleições para os órgãos das autarquias ainda não tenham
sido publicadas as novas leis reguladoras das atribuições e competências
respectivas, bem como dos respectivos regimes financeiros.
Não é possível que os
candidatos possam preparar seriamente as suas campanhas e apresentar-se às eleições tomando apenas como base os
textos dos documentos aprovados na Assembleia da República há apenas um mês.
Tais textos
demonstram aliás que pouco se avançou na transferência de poderes a partir das
Assembleias e Câmaras Municipais numa perspectiva de reforço das atribuições e
competências das Assembleias e Juntas de Freguesia, não tendo sido certamente
por acaso que uma das Propostas de Lei iniciais mencionava no seu título a
expressão "regime jurídico" para depois na versão final vir a ser
substituída por "regime financeiro".
Parente pobre do
sistema democrático, as Freguesias continuam longe de ser a essência do Poder
Local, que mais do que nunca em momentos de crise como os que se vivem deveria
ser a base de um democracia que está longe de se realizar plenamente na mera
representação eleitoral, relegando para plano secundário a participação de base
- a que é essencial na construção democrática.
A poucos meses do
quadragésimo aniversário da queda do "Estado Novo", sombrios
presságios decorrem de eleições que serão por certo pouco concorridas, e de uma
complexa situação financeira envolvendo a elaboração de um Orçamento sem se
terem dados fundamentados que permitam saber como se obterão adequados
financiamentos de Estado para o segundo semestre de 2014.
01.Setembro.2013.
______________________________________________________________
Razões para
uma abstenção.
Faltam cinco
semanas para a realização das eleições para as autarquias locais, e poucos dias
para que seja conhecida a decisão do Tribunal Constitucional sobre a
admissibilidade de apresentação de candidaturas de cidadãos que exerceram
funções de presidência de Câmaras Municipais ou de Juntas de Freguesia durante
os três últimos exercícios numa mesma autarquia.
A grande
maioria dos Deputados deixou que se arrastasse o problema da citada
admissibilidade, decorrente de uma lei obviamente mal redigida pois deu origem
a diversas interpretações judiciais, não só ao nível de primeira instância com
também ao de Relação, tendo que se aguardar até agora por uma decisão que
respeita não apenas a alguns mas sim a muitos casos, com todo o desprestígio
para o processo eleitoral decorrente deste arrastamento.
Por outro
lado, e como já o referi nestas páginas, o "Memorando de
entendimento" sobre o programa de assistência financeira à República
Portuguesa deu origem a um processo de agregação de freguesias que, aprovado
por maioria parlamentar, levou a que por exemplo algumas que abarcavam 20
mil eleitores fossem forçadas a uniões da ordem dos 50 mil - mais do que os
existentes em muitos municípios.
Foi assim
consumada mais uma agressão ao Poder Local, base sem a qual a Democracia deixa
de ser um processo de verdadeira participação política privilegiando o mero
sistema representativo, tão criticado - até pela generalidade dos cidadãos com
responsabilidades políticas - por manter os eleitos afastados dos eleitores.
Não tenho
assim alternativa para um escolha consciente de quem me pudesse representar ao
nível de Assembleia de Freguesia, pois não me é possível em poucos dias
conhecer candidatos oriundos de zonas mais afastadas, bem como os programas com
que se apresentem.
O voto em
branco seria uma possibilidade, mas corresponderia, no meu entender, à
aceitação de um modelo que pelas razões que aduzi considero ser uma violentação
da essência da democracia, e por outro lado corresponderia a avalizar
indirectamente o triste espectáculo que o Parlamento nos ofereceu (sob o olhar
complacente do Presidente da República) não só no caso das citadas agregações
de freguesias mas também quanto ao processo que aguarda decisão no Tribunal
Constitucional.
É assim que
com pena alguém que colaborou na organização das eleições de 1976 não encontra
- pela primeira vez - alternativa eleitoral que não seja a da abstenção.
25.Agosto.2013.
___________________________________________________
Sobre o Washington Post .
A compra do lendário Washington Post
pelo criador e principal accionista da Amazon (J.Bezos) vem criar largas
expectativas sobre o futuro dos jornais em suporte papel, pois parece ser o
primeiro caso de aquisições deste tipo, dado que até agora se assistia quer à
duplicação dos jornais clássicos passando a existir também em formato digital,
quer ao seu simples desaparecimento.
A sobrevivência da Amazon enquanto
fornecedora de livros "clássicos", se bem que ajudada pela sua
expansão ao sistema de vendas de outros produtos com entregas por vias
tradicionais, e a sua entrada no mercado das aquisições de livros e outros
documentos em formato digital, sobrevivendo bem à concorrência da Google e de
outras companhias, faz antever que J.Bezos pense numa nova fórmula que
possibilite uma união "papel-digital" susceptível de permitir a
sobrevivência dos clássicos jornais num mundo em que a informação corre cada
vez mais célere e diversificada.
Parece assim provável que o Washington
Post evolua para um modelo dual, em que a informação muito recente apareça na
versão digital acompanhada de ligações para documentos e comentários que
permitam uma melhor compreensão dos acontecimentos, sempre privilegiando
contribuições audio-visuais de alta credibilidade obtidas aquando do respectivo
evento; e em que na versão em papel, distribuída de modo que por certo
surpreenderá pela imaginação e versatilidade, surgirão análises e debates de
maior profundidade.
Em qualquer dos casos, o valor das
iniciativas de J.Bezos estará dependente do modo como conseguirá manter o
jornalismo tradicional enquanto mediador credível da informação, tanto na
versão em suporte papel como na digital.
Num mundo em que se assiste à
atomização da informação circulante, que nos avassala em termos quase
demolidores, importa cada vez mais dispormos de recursos para nos ajudar a
ponderar sobre a credibilidade do que chega ao nosso alcance, bem como a
comparar pontos de vista.
Oxalá J.Bezos consiga contribuir para
se encontrarem soluções para este tipo de problemas, mantendo a possibilidade
de folhearmos um jornal como ocorre com os livros, em que tal perspectiva está
por natureza aliada à capacidade de calmamente reflectirmos sobre o que lemos.
18.08.2013.
______________________________________________________________________________
Decepções prè-eleitorais.
A "minha Freguesia" aumentou
a sua população para mais do dobro, devido à "reorganização
administrativa" ocorrida na sequência da aplicação de parte do
"Memorando de entendimento" celebrado há cerca de dois anos, visando
a obtenção de economias e a racionalização dos gastos públicos (mas deixando
intocados os Municípios...).
Passou de um população da ordem das 20
mil pessoas para algo que ronda as 50 mil, conjunto aglomerado sob a designação
de "União das Freguesias de (..)", num quantitativo que muitas
cidades portuguesas estão bem longe de alcançar.
As candidaturas apresentadas não são
do conhecimento da esmagadora maioria dos eleitores, factor agravado pela
circunstância de aparecerem agora nas listas respectivas cidadãos obviamente
desconhecidos e distantes dos problemas locais.
Acresce a possibilidade de diversos
cidadãos verem as suas candidaturas rejeitadas judicialmente a 4 ou 5 semanas
do acto eleitoral por força de uma lei obviamente mal elaborada pois permite
interpretações sobre a capacidade eleitoral passiva que têm que passar pelo
crivo da apreciação da sua constitucionalidade.
Não será assim de admirar que a taxa
de abstenção aumente muito, contribuindo deste modo para mais um golpe na
confiança que os cidadãos deviam depositar no sistema democrático.
Perfila-se também no horizonte uma
reduzida participação nas eleições para o Parlamento Europeu, pois se nas
anteriores já tal sucedera, nas que irão ocorrer em Maio do próximo ano não é
difícil antever que os eleitores não acreditem que os futuros deputados venham
a demonstrar capacidade para atenuarem as dificuldades com que a União Europeia
se tem deparado, dado o apagado papel que desempenharam durante a crise que se
instalou em força desde o momento em que tomaram posse.
Parece que tanto no caso das eleições
locais como no das europeias não há capacidade para que as Instituições
políticas promovam a sua auto-reforma, restando aos cidadãos esperar que
ocorram acontecimentos que exerçam um papel catalisador susceptível de - com a
subsequente e inevitável agitação social - induzirem transformações que
introduzam apropriadas modificações no funcionamento das instituições
políticas.
11.Agosto.2013.
Offener Brief an das deutsche Volk.
Caras Alemãs, caros Alemães:
Envio-vos esta carta aberta enquanto
europeu e cidadão participante de um projecto comum que visou e visa a
construção de uma União política que permita que a nossa Europa assuma um novo
papel no mundo, no qual contribua para corrigir os abusos cometidos na expansão
imperial que caracterizou grande parte das nações que a compõem.
E, ao mesmo tempo, que aperfeiçoe
bases de relacionamento interno que evitem a eclosão de mais conflitos
fratricidas como os que permitiram tantas páginas negras na sua História,
algumas das quais muito recentemente.
Esta nova Europa não poderá também
esquecer que foi graças à criatividade dos seus cidadãos que conseguiu um
invejável nível médio de vida, mas que só poderá subsistir se forem assegurados
um apropriado crescimento económico, aliado a um necessário equilíbrio
demográfico.
Povo Alemão: tendes tido dificuldades
em encontrar o vosso lugar na Europa, tendo o recurso à força deixado terríveis
recordações que todos temos procurado ultrapassar, inclusivamente ajudando à
reconstrução do vosso país quer na ajuda financeira e económica prestada a
partir dos anos 50, quer aquando da reunificação dos dois Estados alemães.
O papel da vossa Nação dentro da União
Europeia assume agora uma importância histórica, pois deverá procurar um
difícil equilíbrio entre o vosso peso na economia, obtido através não só das
ajudas prestadas mas também graças às vossas qualidades de criatividade e de
trabalho, e a vossa participação numa união política entre Estados com tão
grandes diferenças culturais e de desenvolvimento.
Tal importância é acrescida pelo facto
de as diferenças relativas ao crescimento terem sido em grande parte devidas a
uma crise financeira à qual a União não soube reagir de forma concertada, e
para a qual importa encontrar modelos apropriados de resposta que recuperem a
confiança dos europeus na união política - sem a qual a maioria dos Estados
entrará num caminho de penoso empobrecimento.
Povo Alemão: tendes uma oportunidade
única para encontrar o vosso papel na União Europeia, em que o diálogo
prevaleça, e em que a cooperação se instale.
As cidadãs e os cidadãos da União
Europeia, e da Europa, assim o esperam.
4.Agosto.2013.
____________________________________________________________________
Anos perdidos.
A recente crise política - decretada
"resolvida" quiçá para reaparecer aquando da preparação do orçamento
para 2014 - veio confirmar alguma falta de qualidade dos actores que nela
desempenharam os principais papeis: A.Silva, P.Coelho, V.Gaspar, P.Portas, e
A.Seguro, e demonstrar que A.Silva teve responsabilidades determinantes na
inacção que permitiu o paradoxo de a formação política que esteve na base da
elaboração do "Memorando de entendimento" para a concessão de
"assistência financeira" à República viesse a estar ausente do
processo de execução respectivo.
Tal demonstração é confirmada pela
atitude tomada no início do corrente mês, em que procurou envolver aquela
formação num acordo que afinal já deveria ter ocorrido após as eleições de
2011, afastado que tinha sido o principal adversário político de A.Silva:
J.Sousa.
Há dois anos A.Silva ainda teria
alguma capacidade política para promover um entendimento inter-partidário que
se consubstanciaria num programa de governo em que para além do
"Memorando" figurasse um pilar notoriamente ausente, que só foi
"descoberto" muito recentemente e que consta da carta de demissão de
V.Gaspar como "a fase do investimento ! " visando o desenvolvimento e
a redução do desemprego, em particular do "desemprego jovem".
Certamente A.Silva, que frequentemente
invoca a sua qualidade de economista, estaria já consciente das enormes
dificuldades de que se revestiria a preparação do orçamento para 2014, pois na
primeira parte do ano ainda a República estaria apoiada pelo Programa de
Assistência Financeira, com parâmetros conhecidos, não se dispondo talvez e
porém de elementos que permitam perceber se na quase inevitável situação de
impossibilidade de "regresso aos
mercados" em condições aceitáveis se poderá recorrer a um sucedâneo que -
de modo cautelar ou afoito ... - assegure a probabilidade de sustentação do
Estado e a permanência na zona Euro.
Sabe-se lá se desconhecedor do facto
de o seu Governo estar a funcionar há vários meses com um Ministro das Finanças
demissionário (e continuando o seu papel de missionário), "agarra" a
crise política para tentar tardiamente uma solução que lhe escapou, e que já
deveria ter tentado - dentro do quadro de referência mental e política em que
se tem movido - há dois anos.
Por outro lado, os actores P.Coelho,
P.Portas e A.Seguro têm vindo a demonstrar o quão doente está o modelo político
português, aparentemente tão constitucionalmente inexpugnável, pois a maioria
dos partidos políticos continua anquilosada e distante do povo, prevalecendo a
ausência de debate interno e o papel dominante dos seus principais dirigentes.
O dia em que o sistema democrático se
aperfeiçoará a partir de uma maior participação de base está aparentemente
longínquo. Até lá, será que resistiremos ?
28.Julho.2013.
____________________________________________
Investimento nas PME.
A recente decisão do Banco Central Europeu no sentido de proporcionar condições para mais apoios às Pequenas e Médias Empresas (PME) indicia uma mudança na política relativa ao investimento na União Europeia que embora tardia e tímida não deve deixar de ser saudada.
No que respeita a Portugal esta perspectiva vem na senda de uma nova linha de financiamento a PME atribuida pelo Banco Europeu de Investimento, embora
paradoxalmente tenha sido concedida mediante a garantia do Estado
português.
O paradoxo provem da constatação de ser Portugal o garante de tal
investimento, em vez de caber tal responsabilidade a apropriado mecanismo
comunitário, como deveria ocorrer numa união em que a solidariedade deveria ser demonstrada de um modo em que os mais fortes proporcionassem ajuda aos que passassem por dificuldades - evidentemente mediante compromissos que demonstrassem o desejo de correcção de problemas de natureza estrutural, e sem que tal implicasse a imposição de sacrifícios excessivos.
Foi aliás a falta desta perspectiva que terá caracterizado negativamente a
inacção da Comissão Europeia ao longo destes últimos anos, em que aquela
Instituição perdeu a sua tradicional missão aglutinadora e de correcção de
desequilíbrios entre os Estados-Membros.
inacção da Comissão Europeia ao longo destes últimos anos, em que aquela
Instituição perdeu a sua tradicional missão aglutinadora e de correcção de
desequilíbrios entre os Estados-Membros.
O papel destes dois Bancos - o BCE e o BEI - na retoma do investimento,
enquanto o sistema bancário tradicional não recuperar o seu equilíbrio (se e
quando o conseguir...) poderá ser essencial para a retoma da confiança
financeira, e do investimento subsequente – com os respectivos efeitos no
emprego, em que as PME têm um papel dominante e fundamentall.
enquanto o sistema bancário tradicional não recuperar o seu equilíbrio (se e
quando o conseguir...) poderá ser essencial para a retoma da confiança
financeira, e do investimento subsequente – com os respectivos efeitos no
emprego, em que as PME têm um papel dominante e fundamentall.
Esperemos que
sejam corrigidos os defeitos conceptuais apontados, e que tal ocorra a tempo de
produzirem efeitos sensíveis na competividade da União, bem como no emprego,
sem o que o projecto europeu pode fenecer,
21,Julho.2013.
_________________________________________________
O “constitucionalista”.
Conforme o disposto na Constituição (art.º 195º, n.º2), o Presidente da
República só pode demitir o Governo quando tal se torne necessário para
assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas, ouvido o
Conselho de Estado.
Porém, na sua recente comunicação ao País (que não à Assembleia da
República...) o Presidente anunciou que irá dissolver a Assembleia – obviamente
na sequência de demissão do Governo - em meados do próximo ano, antevendo assim
que as instituições democráticas não estarão em tal momento a funcionar
regularmente, e que “ouvirá” previamente o Conselho de Estado.
Não irei usar epítetos para
classificar tal intenção que me valham a instauração de eventual processo pelo
Ministério Público, mas não deixarei de me surpreender pelo exercício de
adivinhação pressuposto por tal anunciada “irrevogabilidade”, conceito tão na moda
desde há dias (e aliás confundido com a noção de irreversibilidade”).
Curiosamente não parece muito claro que numa Constituição tão
minuciosa esteja expresso qualquer sistema inequívoco de validação pelo
Tribunal Constitucional de um acto decisório tão relevante para o sistema
democrático, assim deixado ao arbítrio de uma única pessoa .
Parece porém evidente que tal intenção vai ao atropelo do espírito da
Constituição, acrescendo que é formulada por alguém que a tem invocado
constantemente, e que talvez tenha como objectivo ressarcir-se de procedimentos
ou de inacções que desde 2010 contribuiram para que Portugal se encontrasse na
situação politicamente pantanosa em que está, procurando (em fundo
inconfessado) levar o Primeiro-Ministro a demitir-se para então promover um
“governo presidencial”.
Independentemente
dos eventuais méritos e falhas do Governo actual, não deixa de ser surpreendente o recurso a um “artifício
para-constitucional” para forçar a demissão do Primeiro-Ministro, artifício
corroborado por outro atropelo à Constituição, pois sendo público que foi
apresentada ao Presidente da República uma “solução” governativa que continha
diversas propostas de nomeações para o Governo, e estatuindo a Constituição que
(art.º 133º) compete ao Presidente nomear e exonerar os membros
do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro, o respectivo silêncio
corresponde a uma desautorização deste último.
O
objectivo presidencial parece ser assim a formação de um novo governo com apoio
expresso da actual maioria e o “apoio implícito” do terceiro maior grupo
parlamentar, aliviado por não haver eleições a breve prazo mas satisfeito pela
perspectiva de poder vir a dirigir o governo em meados de 2014 (aliás dois
meses depois das eleições para o Parlamento Europeu...).
Contornando
o estabelecido na Constituição, quer quanto ao momento actual, quer em
intenções para o próximo ano, eis um Presidente que deixou de ser
“constitucionalista” e que passou das manobras de bastidores à inacção, e desta
à hiper-actividade.
Resta
saber se em caso de falha destas intenções virá a renunciar ao seu cargo.
14.Julho.2013.
_______________________________________________
Personalidade
e política.
Decorridos
já alguns anos sobre acontecimentos quie moldaram as relações entre os
principais responsáveis pela vida política portuguesa é possível tirarem-se
algumas ilações sobre o respectivo comportamento e conclusões sobre as
respectivas consequências na governação.
O
Presidente da República tem vindo a demonstrar traços de uma personalidade
desconfiada e insegura, refugiando-se em formalismos e evitando a verdadeira
comunicação, como o comprovaram as atitudes tomadas aquando dos aspectos
relacionados com a questão do Estatuto da Região Autónoma dos Açores e a
inconsistência revelada pelo caso das "escutas", culminando nos
episódios que estiveram na origem da queda do Governo.
Nestes,
é difícil acreditar que o Presidente desconhecesse que estava a ser preparado
um programa de recuperação do equilíbrio financeiro e orçamental (o famoso PEC
IV), pois os contactos que a sua Casa Civil certamente manteriam quer com
estruturas governamentais quer com a Comissão Europeia teriam sido suficientes
para que numa das reuniões semanais com o Primeiro-Ministro lhe suscitar
frontal e lealmente a abordagem de tal assunto, evitando assim que corressem
informações segundo as quais desconheceria totalmente as diligências do
Governo, inclusivamente junto da Chanceler alemã.
Por
seu turno, o Primeiro-Ministro demonstrou arrogância em quase todos estes
casos, pois o das "escutas" - que marcou o fim da cooperação
institucional por parte do Presidente - teria sido resolvido com uma conversa
franca em que se demonstraria, e desmontaria, a existência de pequenas intrigas
entre gabinetes, e o assunto de Estado que o PEC IV constituia deveria ter sido
objecto de trocas de impressões com o Presidente.
A
teimosia revelada pelo Primeiro-Ministro em não ter procurado uma fórmula
governativa que lhe permitisse a execução do programa financeiro sem recurso ao
FMI e apenas com o apoio das Instituições da União deu por seu turno origem a
um processo que acelerou de forma quase irreversível o problema das dívidas
soberanas, com consequências sobre a credibilidade do Euro, e que teria
possibilitado uma resolução circunscrita ao assunto das finanças gregas.
Por
outro lado, a ambição desmedida revelada pelo Presidente do Partido
Social-Democrata em querer o poder a todo o custo sem curar de saber se
dispunha de estruturas políticas sólidas e consolidadas que pudessem
ultrapassar as dissensões evidentes no processo que o tinha levado à conquista
do poder partidário, ambição essa aliada a um calculismo que o levou a negar a
existência de contactos ao mais alto nível sobre a existência do PEC IV, acabou
por contribuir para o paradoxo de ter que vir a executar um programa de governo
baseado num Memorando que em muito colhia do programa que tinha rejeitado no
Parlamento e que levara à queda do Governo.
Finalmente,
autismo e vaidade. De quem ? Não é difícil deduzir que se trata das
características do Presidente do Centro Democrático e Social, que não hesita em
tomar decisões sem consultar os orgãos partidários, e sempre revelando um
desejo de sobressair custe o que custar - mesmo que tal tenha o ónus de muitos
milhares de milhões de Euros que recairão sobre os bolsos dos portugueses.
Não
é assim difícil deduzir o modo como evoluirá a presente crise política...
Calculismo
e ambição em doses excessivas, eis o que infelizmente nos esperará até que uma
profunda modificação (não disse "revisão"...) constitucional venha a
permitir escolhas mais sãs por parte dos portugueses.
7.Julho.2013
________________________________________________
Candidaturas
autárquicas: o desprestígio das Instituições.
Como
já referi nestas net-páginas, de acordo com a lei eleitoral quaisquer
impugnações de candidaturas só poderão ocorrer quando forem apresentadas ao
Tribunal da Comarca respectiva , ou seja cerca de 50 dias antes das eleições
(em princípios de Agosto), seguindo-se um processo que poderá chegar à
interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e cuja decisão final
poderá ser proferida apenas a cerca de um mês da data das eleições, com todas
as consequências imagináveis nomeadamente no caso de as impugnações abrangerem
algumas dezenas de municípios e centenas de freguesias ...
Devido
à falta de clareza da mais recente lei em vigor, cedo começou a discussão
pública sobre a sua interpretação, não tendo sido surpresa o facto de começarem
a ser interpostas em diversos tribunais providências cautelares visando impedir
a apresentação de candidaturas de cidadãos mais conhecidos publicamente e que
tinham manifestado a intenção de se candidatarem ao cargo de Presidente numa
autarquia diferente daquela onde se candidataram (e exerceram as mesmas
funções) em três mandatos sucessivos terminado no corrente ano.
Aparentemente
a única sentença curial seria a de os Tribunais em causa não apreciarem as
providências cautelares, pois os cidadãos em causa só se tornariam candidatos
em princípios de Agosto, pois até lá não passariam de
"prè-candidatos", situação que poderia ser comum a milhares de
pessoas provocando assim milhares de iniciativas análogas junto dos Tribunais...
Porém
assistiu-se a tudo, desde algumas decisões naquele sentido, bem como a outras
aceitando as providências em causa, e muitas recusando-as - o que só mostra que
a lei em questão não era nem é clara - havendo ainda tempo para o Parlamento
legislar apropriadamente.
Tal
não ocorreu, pelo menos até agora, assistindo-se a um mútuo assacar de culpas
por tal inépcia entre os principais grupos parlamentares, não tendo havido
qualquer mensagem do Presidente da República dirigida sobre este assunto ao
Parlamento nem aparentemente resultados de algum dos famosos actos de
magistratura de influência realizados em termos discretos.
E
o Governo, consciente por certo das consequências nefastas que estas questões
têm para o um ambiente político que por certo gostaria que fosse calmo na
situação difícil que atravessamos, não apresentou nenhuma Proposta de Lei nem
terá sensibilizado adequadamente os grupos parlamentares em que se apoia,
visando uma clarificação do assunto.
Para
agudizar a situação, assistimos a recursos para Tribunais da Relação - a quem a
lei eleitoral não confere poderes nestas áreas - com decisões díspares, e para
o Tribunal Constitucional, sem que os advogados e gabinetes jurídicos dos
"candidatos" tenham compreendido que até meados ou fins de Agosto
certamente o Tribunal não poderá conhecer da matéria de fundo.
Depois
para "coroar" todo este processo, assistimos a tonitruantes
declarações de vitória pelo facto de um qualquer destes Tribunais ter
pronunciado uma mera decisão processual sem abordar porém as questões de facto
- e uma delas de um cidadão reiteradamente referindo que acontecesse o que
acontecesse seria candidato (o que poderá evidentemente ser, pois não pode ou
não deve haver acórdãos finais antes de meados de Agosto), e que ganharia as eleições
- desrespeitando deste modo a competência do Tribunal Constitucional.
Após
a desastrada lei de agregações de freguesias (não se notando publicamente
qualquer trabalho das comissões instaladoras das uniões de freguesias, que
deveria ter começado já em fins de Maio), só faltava mais este conjunto de
episódios para dar uma machadada violenta no Poder Local de base - ao fim e ao
cabo o cerne da democracia.
Teremos
que aguardar por uma nova modificação constitucional para que estas e outras
questões relevantes possam ser corrigidas e que o nosso país volte a respirar a
esperança de uma democracia com que tantos sonharam desde 1974 - quase há 40
anos.
30.Junho.2013.
_______________________________________________________________________________
Brasil
- informação, participação e democracia.
As manifestações que têm ocorrido no Brasil constituem também
mais um reflexo das consequências do enorme aumento da capacidade de
transmissão electrónica de informação por parte de um igualmente crescente do
número de cidadãos que a ela passaram a ter acesso.
Tais consequências têm obviamente um efeito mais visível dentro
dos países em que existe uma capacidade de comunicação sem barreiras
linguísticas, tendo sido notório o seu aproveitamento em campanhas eleitorais
como as relativas à Presidência dos EUA e, sob outras perspectivas, no
desencadear de movimentos políticos como os que aconteceram em diversos países
do Mediterrâneo e do Médio Oriente, em que bastou um incidente para este se
transformar num catalisador de múltiplas acções colectivas.
Gerando
ou alimentando reacções dos poderes políticos, que vão até à tentativa de
identificação de dissidentes (como tem vindo a ser conhecido quanto aos
Estados-Unidos, e se sabe que existe em muitos outros, nomeadamente na China,
Irão e Coreia do Norte), as chamadas "redes sociais" - com a sua
capacidade de recurso à retransmissão de videos e de outras formas de difusão
de ideias - constituem um fenómeno que marca a evolução da "aldeia
global" de comunicações a que se referia McLuhan, em que predominava uma
informação a partir de poucos emissores, para um aumento exponencial destes
últimos.
Estes
milhões de emissores, por ora ainda muito circunscritos às baias da respectiva
língua e país, tendem porém a fazer circular mais a informação que lhes chega,
bem como a que se bem que em menor grau produzem, do que propriamente em
participar verdadeira e directamente na vida social e política - limitando-se
aos contactos no trabalho (quando o têm) e num cada vez mais reduzido grupos de
amigos e conhecidos, refugiando-se nas mensagens trocadas nos seus computadores
fixos ou móveis, ou absorvendo o que unidireccionalmente lhes é dado a conhecer
através da televisão, quer clássica, quer dos videos pela Internet.
E
como a participação social verdadeira é cada vez mais reduzida, assim também o
é a política, limitada a escolhas eleitorais em que o poder transferido não é
depois suficientemente controlado, na medida em que os instrumentos legais para
tal existentes são igualmente pressentidos como distantes e associados a
conceitos de uma democracia formal cada vez menos participativa - a qual só o
poderá verdadeiramente ser se tiver a sua base no poder local.
Daí
o êxito de manifestações convocadas a partir da ocorrência de um por vezes pouco
provável catalisador, e cujo êxito corresponde à transferência para a rua dos
sentimentos de incapacidade de participação para corrigir injustiças que os
poderes eleitos rapidamente esquecem uma vez instalados.
Daí
o "efeito Brasil".
23.Junho.2031.
_______________________________________________________________________________
À
descoberta das "Descobertas".
Deixo
por agora de lado as reflexões que tenho vindo a fazer nomeadamente sobre
sistemas eleitorais, questões europeias, assuntos de natureza económica e
alguma política nacional, para breves incursões sobre outras perspectivas de
natureza mais prática.
À generalidade dos visitantes de Lisboa é habitualmente sugerida
uma deslocação à zona de Belém, abarcando o Padrão dos Descobrimentos, a Torre
de Belém, o Museu de Marinha e o Mosteiro dos Jerónimos, sendo habitual
constatarmos o grande número de viajantes que percorrem a pé tal circuito.
O
citado percurso poderia ser enriquecido se estivesse atracada na Doca do Bom
Sucesso uma das réplicas das Naus existentes em Portugal, assim demonstrando a
epopeia dos nossos antepassados e complementando de tal modo a lição de
História implícita no conjunto monumental daquela área.
Do
mesmo modo, e sem retirar ao Museu de Marinha e às suas colecções a sua importância
no contexto das expedições portuguesas, poderia o conteúdo do actual Museu de
Arte Popular ser transferido para outro edifício apropriado, e nele instalado
um Museu dos Descobrimentos, dada a sua localização à beira-rio entre o Padrão
e a Doca do Bom Sucesso.
Nesse
novo Museu caberia por certo um modelo dos continentes por onde os portugueses
deixaram marcas da sua presença, com miniaturas nomeadamente das fortalezas,
igrejas e outras construções arquitectónicas de maior importância, bem como as
respectivas fotografias, em ligação com pequenas salas onde se poderiam
apreciar visitas virtuais que em casos mais relevantes como os de Malaca, Goa e
Macau permitissem apreciar através de meios audio-visuais a herança cultural
deixada.
E,
obviamente, com especial relevo para os Estados pertencentes à Comunidade dos
Povos de Língua Portuguesa.
A
presença na Internet estaria disponível nas línguas de maior difusão, sendo
dado especial relevo a um sítio que como o do European University Institute
permitisse explorações mais aprofundadas, e também uma pequena Biblioteca com
as principais obras de referência - naturalmente existentes também na Loja do
Museu.
Quando
recordamos o enorme investimento feito no novo Museu dos Coches, em fase de
conclusão, e observamos o ar algo perdido dos viajantes que se deslocam do
Padrão dos Descobrimentos para a Torre de Belém (frequentemente
"enganados" pelo molhe leste da Doca do Bom-Sucesso), não podemos
deixar de pensar que até nestas áreas parece que nos esquecemos que Portugal
assumiu um papel proeminente no mundo, ao contrário de outras nações que
cultivam o apreço pela sua História.
16.Junho.2013.
_______________________________________________________________________________
Bacalhau
à Brás.
Dois
discursos: um provável, outro real.
O
primeiro, provável, proferido na presença do Príncipe-Regente D.João aquando da
inauguração do Hospital Real da Marinha, em Novembro de 1806, em edifício sito
no Campo de Santa Clara, em Lisboa, teria sido em termos de que se aventa o
seguinte extracto:
"Na
minha qualidade de Ministro da Marinha e do Ultramar não quero deixar de
manifestar a Vossa Alteza o meu profundo reconhecimento pelo inequívoco apoio
prestado para a concretização do Hospital Real da Marinha, aspiração do meu antecessor
nesta pasta, D.Rodrigo de Sousa Coutinho, a quem presto desde já a minha
homenagem pela visão que caracterizou e caracteriza esta iniciativa da
construção do primeiro edifício que no nosso Reino foi destinado a
hospital."
O
segundo, real (mas não sob o conceito de "realeza", antes sob o da
"realidade") foi há três dias proferido pelo Almirante Chefe do
Estado-Maior da Armada aquando da cerimónia correspondente ao fecho das
instalações do Hospital da Marinha, no Campo de Santa Clara, em Lisboa, e em
termos que por certo não deixarão de ser considerados como reacção ao inopinado
cancelamento da prevista presença do Ministro da Defesa Nacional, J.Aguiar
Branco.
Eis
os termos aproximados do final da curta declaração:
"Como
as cozinhas do Hospital já não estarão a funcionar na próxima semana, aproveito
a presente quinta-feira para degustar o bom Bacalhau à Brás que a seguir será
servido, honrando a cultura naval e o bom gosto dos marinheiros que no
mar ou em terra lutaram para que esta casa fosse sempre o seu porto seguro e
fazendo votos para que o seu próximo abrigo assegure apoio a todos, em especial
os que mais dificuldades sentem."
9.Junho.2013
_______________________________________________________________________________
Um
espírito europeu.
Regresso ao tema que abordei há algumas semanas, mencionando então que não foi por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era no Mundo, foram precisamente dedicados ao tema "Espírito Europeu", vindo a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de instituições europeias que procuravam assumir um papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção de diversas nações europeias no mundo procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade.
Talvez não tenha sido também por acaso que os passos que se deram cerca de dez anos depois visando a construção de uma união europeia acabaram por reflectir as naturais dificuldades que resultavam de não ser fácil identificar a existência de um "espírito europeu" comum a tantas nacionalidades, culturas e estados, pelo que se optou pela perspectiva de se dar prioridade à construção de um mercado comum visando em primeiro lugar reduzir as possibilidades de confrontos militares, em vez de se iniciar desde logo um caminho de uma Europa sem fronteiras que fomentasse o intercâmbio do pensamento e permitisse então uma melhor percepção de um espírito europeu - este então capaz de abrir caminho para uma União Europeia mais sólida, e de se apresentar ao resto do mundo como um farol no caminho para a democracia e liberdade política.
É certo que grande parte do resto do mundo, não o esqueçamos, não deixa de recordar o papel que diversos estados europeus tiveram nos últimos cinco séculos, impondo a sua presença militar à grande maioria das nações, em que genocídios e escravatura não deixaram de marcar presença, e digladiando-se ao mesmo tempo na Europa em ferozes confrontos que de modo nenhum poderão ter constituído exemplo, conflitos esses em que foi relevante o papel de ditaduras e de posições de natureza étnica e confessional que ainda há poucos anos observámos nos Balcãs e em outras áreas da Europa.
E, contudo, sentimos que há um "espírito europeu" latente na grande maioria dos nossos cidadãos, assente em valores de tolerância, de fraternidade, e de liberdade política, sem cujo aprofundamento será difícil solidificar a actual União Europeia.
Não poderemos porém deixar de dizer ao mundo que lamentamos os aspectos negativos dos contactos que com outras nações e povos mantivemos, e que estamos empenhados em contribuir para que num globo cada vez mais interdependente se imponham os valores que defendemos.
Sem que tal "espírito europeu" esteja mais presente nos nossos pensamentos, os dirigentes da União Europeia - nomeadamente os futuros - dificilmente poderão tirá-la da situação pantanosa em que se encontra.
Cabe aos pensadores, e aos cidadãos em geral, reflectirem publicamente sobre estas questões, pois sem a consciência desse espírito não haverá uma Europa, mas apenas um continente europeu.
Portugal, donde partiram as primeiras caravelas, e que foi o último império a terminar a colonização política, poderá iniciar um encontro europeu para debater estas matérias. Onde ?
No simbolismo de Sagres.
2.Junho.2013.
Regresso ao tema que abordei há algumas semanas, mencionando então que não foi por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era no Mundo, foram precisamente dedicados ao tema "Espírito Europeu", vindo a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de instituições europeias que procuravam assumir um papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção de diversas nações europeias no mundo procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade.
Talvez não tenha sido também por acaso que os passos que se deram cerca de dez anos depois visando a construção de uma união europeia acabaram por reflectir as naturais dificuldades que resultavam de não ser fácil identificar a existência de um "espírito europeu" comum a tantas nacionalidades, culturas e estados, pelo que se optou pela perspectiva de se dar prioridade à construção de um mercado comum visando em primeiro lugar reduzir as possibilidades de confrontos militares, em vez de se iniciar desde logo um caminho de uma Europa sem fronteiras que fomentasse o intercâmbio do pensamento e permitisse então uma melhor percepção de um espírito europeu - este então capaz de abrir caminho para uma União Europeia mais sólida, e de se apresentar ao resto do mundo como um farol no caminho para a democracia e liberdade política.
É certo que grande parte do resto do mundo, não o esqueçamos, não deixa de recordar o papel que diversos estados europeus tiveram nos últimos cinco séculos, impondo a sua presença militar à grande maioria das nações, em que genocídios e escravatura não deixaram de marcar presença, e digladiando-se ao mesmo tempo na Europa em ferozes confrontos que de modo nenhum poderão ter constituído exemplo, conflitos esses em que foi relevante o papel de ditaduras e de posições de natureza étnica e confessional que ainda há poucos anos observámos nos Balcãs e em outras áreas da Europa.
E, contudo, sentimos que há um "espírito europeu" latente na grande maioria dos nossos cidadãos, assente em valores de tolerância, de fraternidade, e de liberdade política, sem cujo aprofundamento será difícil solidificar a actual União Europeia.
Não poderemos porém deixar de dizer ao mundo que lamentamos os aspectos negativos dos contactos que com outras nações e povos mantivemos, e que estamos empenhados em contribuir para que num globo cada vez mais interdependente se imponham os valores que defendemos.
Sem que tal "espírito europeu" esteja mais presente nos nossos pensamentos, os dirigentes da União Europeia - nomeadamente os futuros - dificilmente poderão tirá-la da situação pantanosa em que se encontra.
Cabe aos pensadores, e aos cidadãos em geral, reflectirem publicamente sobre estas questões, pois sem a consciência desse espírito não haverá uma Europa, mas apenas um continente europeu.
Portugal, donde partiram as primeiras caravelas, e que foi o último império a terminar a colonização política, poderá iniciar um encontro europeu para debater estas matérias. Onde ?
No simbolismo de Sagres.
2.Junho.2013.
_____________________________________________________________________________
Confiança
e investimento.
Moeda, confiança, crédito, bancos, investimento, crescimento, sustentabilidade: este conjunto de palavras está associado ao sentimento de crise financeira e económica que perpassa por muitos países, e aos quais diversos Estados-Membros da União Europeia não estão incólumes, em particular e de forma mais acentuada alguns da Zona Euro.
Nota que enquanto as atenções a nível mundial estão mais centradas sobre as questões de natureza financeira, em particular sobre os aumentos de dívida, poucas iniciativas se notam no que respeita não só à análise das modificações climáticas e suas correlações nomeadamente a partir de 1960 mas também à ausência de acções que possam evitar que daqui a algumas dezenas de anos se torne muito difícil viver no nosso planeta.
Como já tenho vindo a referir nestas páginas, as sociedades humanas tendem a pautar a sua acção mais pela pela correcção dos erros cometidos do que pela tomada de medidas preventivas que possam minorar as eventuais consequências de tais erros.
Tal atitude acontece devido não só a uma perspectiva de pensamento no futuro limitada à vida provável da geração seguinte, eventualmente também na dos netos, como também pela falta de informação e de educação nestas matérias.
Acresce que os sistemas políticos estão baseados quer em modelos de alternância potencial centrada em prazos da ordem dos quatro ou cinco anos, quer em sistemas autoritários cuja maior preocupação é a sustentação no poder, o que tanto num como noutro caso faz relegar para segundo plano o problema de fundo: estamos num navio, a Terra, que pode não vir a ter perspectivas de navegar calmamente caso não se adoptem acções que reduzam tal possibilidade.
Não parecendo provável que as consequências nefastas do aumento do efeito de estufa tenham o mesmo impacto simultaneamente em toda a Terra, assistir-se-à a tentativas locais de correcção que apenas adiarão por pouco tempo os desastres de natureza global, em que mesmo uma acção de emergência concertada a nível dos dirigentes e dos povos a nível mundial terá poucas probabilidades de resultar trazendo como consequência uma deterioração das condições de vida difícil de imaginar, e de que a vida na Beijing agora superpoluída é uma pálida amostra.
As soluções para este problema são de lenta aplicação, e passam - curiosamente - por acções que são de duas ordens:
- o aumento da educação e da informação;
- e o aumento da participação política de base, que ajudará à disseminação da informação.
Umas e outras permitirão aos dirigentes propor acções que gradualmente corrijam os motivos que estão na base da deterioração da vida na Terra, e que serão deste modo melhor aceites pelos povos.
19.Maio.2013.
Moeda, confiança, crédito, bancos, investimento, crescimento, sustentabilidade: este conjunto de palavras está associado ao sentimento de crise financeira e económica que perpassa por muitos países, e aos quais diversos Estados-Membros da União Europeia não estão incólumes, em particular e de forma mais acentuada alguns da Zona Euro.
Nota que enquanto as atenções a nível mundial estão mais centradas sobre as questões de natureza financeira, em particular sobre os aumentos de dívida, poucas iniciativas se notam no que respeita não só à análise das modificações climáticas e suas correlações nomeadamente a partir de 1960 mas também à ausência de acções que possam evitar que daqui a algumas dezenas de anos se torne muito difícil viver no nosso planeta.
Como já tenho vindo a referir nestas páginas, as sociedades humanas tendem a pautar a sua acção mais pela pela correcção dos erros cometidos do que pela tomada de medidas preventivas que possam minorar as eventuais consequências de tais erros.
Tal atitude acontece devido não só a uma perspectiva de pensamento no futuro limitada à vida provável da geração seguinte, eventualmente também na dos netos, como também pela falta de informação e de educação nestas matérias.
Acresce que os sistemas políticos estão baseados quer em modelos de alternância potencial centrada em prazos da ordem dos quatro ou cinco anos, quer em sistemas autoritários cuja maior preocupação é a sustentação no poder, o que tanto num como noutro caso faz relegar para segundo plano o problema de fundo: estamos num navio, a Terra, que pode não vir a ter perspectivas de navegar calmamente caso não se adoptem acções que reduzam tal possibilidade.
Não parecendo provável que as consequências nefastas do aumento do efeito de estufa tenham o mesmo impacto simultaneamente em toda a Terra, assistir-se-à a tentativas locais de correcção que apenas adiarão por pouco tempo os desastres de natureza global, em que mesmo uma acção de emergência concertada a nível dos dirigentes e dos povos a nível mundial terá poucas probabilidades de resultar trazendo como consequência uma deterioração das condições de vida difícil de imaginar, e de que a vida na Beijing agora superpoluída é uma pálida amostra.
As soluções para este problema são de lenta aplicação, e passam - curiosamente - por acções que são de duas ordens:
- o aumento da educação e da informação;
- e o aumento da participação política de base, que ajudará à disseminação da informação.
Umas e outras permitirão aos dirigentes propor acções que gradualmente corrijam os motivos que estão na base da deterioração da vida na Terra, e que serão deste modo melhor aceites pelos povos.
19.Maio.2013.
_________________________________________________________
Clima: previsões, acções e reparações.
Martin Wolf, respeitado autor de textos e comentários sobre questões relacionadas com os sistemas económicos e financeiros, voltou agora (Financial Times, 15.Maio,2013) a um assunto que já tinha antes abordado: as alterações climáticas resultantes da acção humana, verificáveis pelo aumento da percentagem de dióxido de carbono na atmosfera.
Nota que enquanto as atenções a nível mundial estão mais centradas sobre as questões de natureza financeira, em particular sobre os aumentos de dívida, poucas acções se notam no que respeita não só à análise das modificações climáticas e suas correlações nomeadamente a partir de 1960 mas também à ausência de acções que possam contribuir para que daqui a algumas dezenas de anos se torne muito difícil viver no nosso planeta.
Como já tenho vindo a referir nestas páginas, as sociedades humanas tendem a pautar a sua acção mais pela pela correcção dos erros cometidos do que pela tomada de medidas preventivas que possam minorar as eventuais consequências de tais erros.
Tal atitude acontece devido não só a uma perspectiva de pensamento no futuro limitada à vida provável da geração seguinte, eventualmente também na dos netos, como também pela falta de informação e de educação nestas matérias.
Acresce que os sistemas políticos estão baseados quer em modelos de alternância potencial centrada em prazos da ordem dos quatro ou cinco anos, quer em sistemas autoritários cuja maior preocupação é a sustentação no poder, o que tanto num como noutro caso faz relegar para segundo plano o problema de fundo: estamos num navio, a Terra, que pode não vir a ter perspectivas de navegar calmamente caso não se adoptem acções que reduzam tal possibilidade.
Não parecendo provável que as consequências nefastas do aumento do efeito de estufa tenham o mesmo impacto simultaneamente em toda a Terra, assistir-se-à a tentativas locais de correcção que apenas adiarão por pouco tempo os desastres de natureza global, em que mesmo uma acção de emergência concertada a nível dos dirigentes e dos povos a nível mundial terá poucas probabilidades de resultar trazendo como consequência uma deterioração das condições de vida difícil de imaginar, e de que a vida na Beijing agora superpoluída é uma pálida amostra.
As soluções para este problema são de lenta aplicação, e passam - curiosamente - por acções que são de duas ordens:
- o aumento da educação e da informação;
- e o aumento da participação política de base, que ajudará à disseminação da informação.
Umas e outras permitirão aos dirigentes propor acções que gradualmente corrijam os motivos que estão na base da deterioração da vida na Terra, e que serão deste modo melhor aceites pelos povos.
19.Maio.2013.
_____________________________________________________
Conselho Europeu: sem ambições.
Prevista
para o corrente mês, a habitual reunião periódica do Conselho Europeu
apresenta-se com uma agenda cujo conteúdo indiciaria um estado da União sem
problemas estruturais, na medida em que é dedicada à política energética e à
luta contra a evasão fiscal, assuntos que embora relevantes estão longe do que
os cidadãos esperariam que fossem debatidos.
A
questão da energia tem sido periodicamente suscitada por D.Barroso,
aparentemente quando não dispõe de outra que lhe seja agora possível
apresentar, e que constituiu aliás uma das suas preocupações quando iniciou, há
quase 10 anos, o seu consulado presidencial após e segundo Miguel Frasquilho
ter "desiludido os portugueses" ("Jornal de Negócios",
3.5.2013).
A
luta contra a evasão fiscal é também e aparentemente proposta por V.Rompuy, que
acaba de afirmar que "após três anos de emergência, de combate ao incêndio
e de sacrifícios, a paciência começa a faltar e a fadiga instala-se"
(ibidem), compreendendo-se assim com mais clareza a razão de uma agenda
exangue.
Não
admira assim que uma grande parte dos britânicos sinta que só têm a perder com
a manutenção da sua presença na União Europeia, e que se continue a assistir ,
segundo as sondagens do Eurobarómetro, ao avolumar do desânimo dos cidadãos da
União no que respeita ao seu projecto político - e mesmo quanto aos benefícios
obtidos em consequência da adesão, que tendem a ser facilmente esquecidos por
comparação com diversos insucessos entre os quais ressalta a crise financeira
que provocou a quase estagnação económica (e em vários Estados-Membros a
depressão).
A
próxima reunião do Conselho poderá deste modo imitar as longas discussões sobre
o sexo dos anjos que se mantinham enquanto se combatia às portas de
Constantinopla, e esquecendo agora uma simples recomendação de P.Drucker :
"First things first".
12.Maio.2013
______________________________________________________
Lei
e Justiça - os gravadores furtados por Ricardo Rodrigues.
Completam-se
no presente mês 3 anos sobre o dia em que Ricardo Rodrigues, Deputado, (ou
"coisíssima nenhuma", para neste caso usar a original designação
de Vítor Gaspar relativa a eleitos) furtou dois gravadores de jornalistas
da revista "Sábado".
Como
referi há algum tempo nestas páginas, o furto tinha como objecto, conforme
reconhecido pelo próprio, impedir por meios legais a publicação de uma
entrevista que tinha acabado de conceder e que estava registada naqueles
gravadores, e que assim constituiriam meio de prova para tal procedimento, a
ser requerido em tribunal (como se tal furto pudesse ter impedido os
jornalistas de registarem a entrevista por meios tradicionais...).
O
país assistiu entretanto ao facto de Ricardo Rodrigues ter sido depois de tal
furto designado para diversos e importantes cargos oficiais no âmbito das suas
responsabilidades parlamentares, sem que a Assembleia da República
tivesse criticado formalmente o seu comportamento..
Foi
assim julgado, se bem que só ao fim de 2 anos e não pelo acto de furto em si
(passível de pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa) mas apenas no
âmbito de atentado à liberdade de imprensa, pois a apreensão de quaisquer
materiais necessários ao exercício da actividade jornalística é punível com
pena de prisão de 3 meses a 2 anos ou multa de 25 a 100 dias, se pena mais
grave lhe não couber nos termos da lei penal, acrescendo que se o infractor for
agente do Estado e agir nessa qualidade a pena sobe para prisão de 3 meses a 3
anos ou multa de 30 a 150 dias.
Tal
condenação limitou-se apenas a uma multa de 110 dias a 45 euros diários, o que
perfaz 4950 euros, indo em meu entender contra o espírito da lei, pois um
Deputado tem especiais responsabilidades no exemplo que deve dar aos
cidadãos, em particular num regime democrático cuja essência está na liberdade
de expressão, pelo que entendo que a punição deveria ter sido de prisão efectiva.
Anunciou
que iria recorrer da sentença, renunciando às funções de representação da
Assembleia da República no Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários (!),
assim como ao lugar de suplente no - imagine-se - Conselho Superior de
Informações, mas mantendo o lugar de deputado, o que o fez entrar num processo
de contradição evidente, acrescendo que mantem os cargos de Vice-Presidente do
Grupo Parlamentar do Partido Socialista, membro da Comissão Permanente da
Assembleia da República, e membro da Comissão Parlamentar de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias...
Já
decorreu quase um ano desde a condenação, e não são conhecidos os resultados do
recurso anunciado (do qual possivelmente decorrerão outros para as instâncias
superiores, quiçá até ao Tribunal Constitucional - podendo eventualmente ser
"isaltinados" mediante o uso a subterfúgios dilatórios diversos...).
A
imagem da Assembleia da República sai ferida deste assunto, quer por permitir
um quadro legislativo em que a lentidão e as manhas processuais proliferam,
quer por não estabelecer a celeridade processual em casos em que os arguidos
sejam detentores de cargos públicos, ou por permitir a manutenção em funções de
um Deputado que em qualquer outro país democrático teria de imediato renunciado
ao mandato em casos análogos a este.
Este
e outros exemplos ferem o regime democrático,.aumentando a crescente desilusão
que sobre ele muitos cidadãos expressam.
5.Maio.2013.
____________________________________________________
A
última reunião de uma Assembleia de Freguesia.
Em
23 de Abril de 2013 teve lugar a última reunião em que a Assembleia de
Freguesia de Algés teve a oportunidade de no período antes da Ordem do dia
evocar a data de 25 de Abril de 1974 como a que permitiu a criação de condições
para a instituição do Poder local democrático, evocação que tradicionalmente
ocorria cerca do aniversário daquela data.
Foi
a última porque a partir das próximas eleições de Outubro do corrente ano
passará a existir uma "super-freguesia" agregando três outras
freguesias (passando assim dos cerca de 20000 eleitores actuais para perto de
50000) na sequência de uma das mais escandalosas disposições do "Memorando
de Entendimento" assinado em 2011 entre três instituições internacionais e
o Governo português.
Escandalosa
porque a coberto de uma pretensa racionalização da estrutura do Estado, que
previa agregações de concelhos e de freguesias, o Governo actual optou por
propor à Assembleia da República disposições visando apenas a agregação de
indefesas Freguesias, e "esquecendo" os concelhos provavelmente para
não ferir interesses das estruturas partidárias neles implantadas e que
constituem o cerne das respectivas organizações políticas.
Acresce
que as economias resultantes de tais agregações são de reduzido valor, não se
antevendo que venha a haver um significativo acréscimo de produtividade com tal
modelo, e que as outras consequências trarão sérias perturbações aos sistemas
burocráticos - caso por exemplo dos registos prediais - dado não terem sido
estudados e programados com a aconselhável antecedência.
No
entanto as piores consequências sob o ponto de vista político advêm da notória
falta de coerência do modelo aplicado para a determinação das agregações de
freguesias, pois se era desejável terminar com o excesso de freguesias em
determinados concelhos como de Barcelos, esqueceu-se que no cada vez mais
desértico interior as autarquias eram por vezes o único lugar de comunicação do
povo com os sistemas administrativos concelhios, distritais, regionais e
centrais - sendo porém óbvio que em diversos casos já não se justificaria a
respectiva existência dada a cada vez maior desertificação provocada pela
emigração.
Por
outro lado, e ao invés de se procurar promover a aproximação entre eleitores e
eleitos em tecidos urbanos optou-se por agregações como as ocorridas nos
concelhos de Oeiras e Cascais, onde é evidente que a passagem de uma freguesia
de 20 mil para 50 mil cidadãos apenas prejudica e fortemente a coesão local.
Pobre
país, que afasta os seus cidadãos da verdadeira participação política,
restando-lhes as manifestações de rua e os desabafos na Internet e em cartas
aos jornais para procurarem nos intervalos entre eleições dar a sua opinião
sobre o modo como os seus representantes conduzem os negócios do Estado.
Abril
de 2013.
____________________________________________________
Detidos
em Guantanamo: uma nódoa na imagem dos EUA.
Foi
há poucos dias publicado um relatório* elaborado nos EUA por
iniciativa de um respeitado grupo independente, o "Constitution
Project", e que solicitou a um conjunto de onze pessoas de reconhecido
valor a incumbência de analisarem a situação dos detidos em Guantanamo, a
maioria desde há mais de dez anos, bem como noutros centros de detenção fora
dos EUA.
Dirigido
por dois ex-Senadores de grande credibilidade, o trabalho desenvolvido chegou à
inequívoca e seguinte conclusão: "the United States engaged in the
practice of torture”.
O
documento critica também o excessivo uso por parte da Administração de Barack
H.Obama de invocação de segredo de Estado para impedir a publicação dos
pormenores relativos aos comprovados actos de tortura, bem como para bloquear
as reclamações legais das vítimas.
Também
muito recentemente foi publicado um impressionante depoimento ** de um detido em Guantanamo, prestado aos advogados da
"Reprieve", em que dá a sua explicação para as razões que entende
serem de uma detenção desde há 11 anos sem fundamento, e se refere ao modo como
está a ser tratado.
Recordemos
que uma das promessas marcantes de Barack H.Obama aquando da sua eleição em
2008 era acabar com a situação em Guantanamo.
Ao
manter diversas dezenas de pessoas sem acesso a direitos legais e processuais,
bem como ao adiar o respectivo julgamento, invocando que não são prisioneiros
de guerra, mas sim "combatentes inimigos", o Presidente dos EUA falta
a mais uma das promessas que enunciou, e contribui para caracterizar
negativamente a imagem de um país tão capaz de actos de grande generosidade e
abnegação como os que tem demonstrado.
21.Abril.2013.
*
http://www.nytimes.com/2013/04/17/opinion/indisputable-torture-of-prisoners.html?nl=opinion&emc=edit_ty_20130417&_r=1&
**
http://www.nytimes.com/2013/04/15/opinion/hunger-striking-at-guantanamo-bay.html?nl=opinion&emc=edit_ty_20130415&_r=0
____________________________________________________
Encontro
Internacional sobre o espírito europeu.
Ao ligar
o televisor, há dois ou três dias, deparou-se-me um jornalista que anunciava
uma importante comunicação de Herman Van Rompuy, Presidente da União Europeia.
Tratava-se
de uma decisão daquele alto Representante informando que decidira colocar na
agenda da próxima reunião, em 22 de Maio, do Conselho Europeu a que
preside, a questão da luta contra os "paraísos fiscais".
Sem tirar
o mérito relativamente à importância e oportunidade de tal assunto, confesso
que esperaria ouvir o anúncio de uma importante comunicação sobre um debate a
propósito do futuro da União Europeia e da Europa na qual se insere, dado o
momento de desorientação global que os europeus sentem quanto ao seu porvir.
Não foi
por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em
1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o
início de uma nova era no Mundo, foi precisamente dedicado ao "Espírito
Europeu", e que tanto viriam a influenciar os passos que pouco depois se
deram e estiveram na origem de instituições europeias que procuravam assumir um
papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até
então a intervenção de diversas nações europeias procurasse ao mesmo tempo
demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia
e da igualdade.
Pessoas
como Aron, Jaspers, Merleau-Ponty, Rougemont, Luckács, Benda e outros
reflectiram então sobre as razões que teriam levado tantos intelectuais e
pensadores a demitirem-se do seu papel de reflexão sobre as atitudes de
políticos que tinham colocado a guerra, as guerras, como solução para os
problemas dos povos.
E os que
de certo modo terão chegado à conclusão de que não se pode afirmar que existe
um "espírito europeu", tantas diferentes culturas o demonstrando, nem
por isso terão deixado de sair daquele Encontro pensando que estavam
paradoxalmente a procurar descobrir a existência de tal espírito.
O momento
por que passa a União Europeia é inegavelmente de profunda desorientação. A
ausência de um pensamento político-ideológico que tem caracterizado as reuniões
do Conselho Europeu, demonstrando que a condução política não tem prevalecido
sobre o pensamento económico-financeiro, em nada contribui para atenuar a
perplexidade dos cidadãos face ao que sentem como um "vazio europeu".
Para tal
tem em muito contribuído a pobreza intelectual de muitos dirigentes europeus,
quer em funções nas instituições da União Europeia, quer a nível nacional
tanto dentro da União como fora dela.
Está assim
na hora de os pensadores e intelectuais europeus voltarem a reflectir sobre o
"espírito europeu", procurando caminhos que sirvam para que os
cidadãos e os representantes que escolhem possam contribuir para que a
extraordinária diversidade e riqueza de ideias que têm caracterizado a formação
da Europa possa constituir um exemplo para o mundo em termos de paz,
tolerância, desenvolvimento, e democracia.
Portugal,
de certo modo o primeiro país a iniciar o período de colonização europeia, e um
dos últimos a cessá-lo, pode lançar a ideia de um Encontro Internacional sobre
"O espírito europeu", privilegiando a participação de pensadores e
intelectuais, e que ajude a Europa e a União Europeia a procurarem os melhores
caminhos a trilhar no seu futuro no Mundo.
Onde, tal
Encontro?
Obviamente,
em Sagres.
14.Abril.2013.
____________________________________________________
Governo "presidencial".
Tudo leva a crer que as reuniões semanais que o actual Presidente
da República tem mantido com os Primeiros-Ministros se terão quase sempre
pautado pelo exercício da falta de confiança mútua, obviamente com escalas
variáveis de desempenho por parte de cada um dos intervenientes.
Por exemplo - e apenas no que se refere à presente legislatura,
pois na anterior abundam episódios duvidosos - será que aquando da preparação
do orçamento do Estado para 2013 não terão sido ventilados os problemas
decorrentes de eventuais faltas de constitucionalidade dados os precedentes da
decisão do respectivo Tribunal conhecida no verão de 2011 ?
Terá o Presidente perguntado se as soluções previstas tinham sido
ou seriam objecto de atenta análise jurídica, e terá o Primeiro-Ministro dado
tais garantias ?
E uma vez conhecida a apresentação do Orçamento à Assembleia da
República não terá o Presidente - após o estudo preliminar pelos seus
Assessores - dado de imediato a conhecer as dúvidas que por certo já o
assolavam quanto à constitucionalidade de disposições que viriam a ser objecto
de apresentação de pedido de fiscalização sucessiva ?
Não terá o Primeiro-Ministro sugerido que tais dúvidas fossem
antes apresentadas num quadro de fiscalização preventiva, para evitar possíveis
adiamentos de importantes decisões políticas ?
Teria sido evitado o espectáculo surrealista de um Governo
criticando acórdãos do Tribunal Constitucional, insinuando perspectivas de
poder vir a apresentar pedido de demissão, para depois ir a correr solicitar
audiência presidencial posteriormente acompanhada de endeusamento do Ministro
das Finanças - e, dado o precedente do acompanhamento parcial por este último,
sem idêntica presença do dirigente do partido da coligação.
Tudo isto, baseado na repetição quase ininterrupta de que o
Governo dispõe de maioria parlamentar, procurando desde modo alhear-se de
responsabilidades que afinal e sem dar por isso aceitou ao emitir o comunicado
em que pelos seus termos passou de facto a dar plena cobertura a um Governo que
assim passou a ser "presidencial"...
Volto assim a reiterar o que escrevi no "Ponto de vista"
precedente sobre a necessidade de uma revisão constitucional que diminua a
possibilidade de conflitos deste tipo, dado terem sido quase sempre uma
característica dos mandatos presidenciais.
07.Abril.2013.
_____________________________________________
"Peixeiradas" semi-constitucionais.
A semana que decorreu proporcionou à generalidade dos portugueses
o insólito espectáculo da possibilidade de assistirem a uma intervenção pública
do Presidente da República ocorrida sob o pano de fundo de diversos cartazes
publicitários de uma empresa de congelação de peixe, acontecimento ainda mais
inusitado face ao conteúdo que caracterizou o discurso então proferido - aliás
diferente do discurso da "moagem" do dia 6 de Março.
As palavras presidenciais, proferidas no estilo algo sibilino empregado
em diversas ocasiões, foram interpretadas pela generalidade dos comentadores
como tendo em mente uma antecipação a eventuais críticas que o
ex-Primeiro-Ministro José Sócrates P.Sousa lhe viesse a fazer poucas horas
depois, em anunciada entrevista televisionada.
Tais críticas forma efectivamente concretizadas, tendo parte
importante delas sido centrada em afirmações escritas há um ano pelo
Presidente, em que acusava o ex-Primeiro-Ministro de deslealdade institucional.
O que acabo de referir a propósito deste tipo de intervenções tem
a finalidade de recordar que estes dois cidadãos foram mandatados - repito,
mandatados - para dentro do quadro que lhes foi designado dirigirem o nosso
País, e não para procurarem alimentar quezílias ao fim e ao cabo apenas
aparentemente provocadas por lutas por maior poder de intervenção na política
nacional.
Porém este tipo de conflitos tem ocorrido, embora de forma mais ou
menos velada, entre os anteriores Presidentes da República que exerceram
mandatos após a entrada em vigor da Constituição de 1976 e os
Primeiros-Ministros de então, com especial incidência nos mandatos de
recondução, tendo contribuído para a falta de clarificação entre os eleitores a
propósito das funções de uns e de outros, e para a consequente degradação da
vida política.
Parece assim útil que numa próxima revisão constitucional seja
modificado o sistema de eleição do Presidente no sentido de passar a ser
escolhido por uma votação mínima de dois terços dos Deputados em efectividade
de funções.
Os fantasmas que estiverem na origem do actual sistema eleitoral e
que caracterizaram o "Estado Novo" só podiam surgir em regimes de
partido único de liberdade política coarctada.
Não é, e espera-se que não será, o caso actual.
31.Março.2013.
_____________________________________________
Crédito bancário e investimento.
Parece haver opiniões discordantes sobre a existência em Portugal
de crédito bancário para empresas não financeiras, pois enquanto do lado da
Banca tem vindo a ser afirmado que não só existe solidez como também
disponibilidades financeiras, mas que faltam projectos empresariais que
justifiquem a concessão de empréstimos que permitam esgotar a capacidade dos
Bancos, já sob o ponto de vista empresarial ouve-se o contrário, nomeadamente
invocando-se que as taxas de juro requeridas são incomportáveis.
Esta última alegação é por seu turno contestada pelo sector
bancário, que refere que as taxas reais praticadas se situam em valores que
embora não sejam baixos não se afastam da média em termos históricos.
Contudo por outro lado é do conhecimento público que o BPN e o BPP
se "afundaram", com elevados custos para os cidadãos, e que houve
Bancos que tiveram que recorrer aos financiamentos disponíveis no quadro do
Programa de Assistência Financeira a Portugal, tendo inclusivamente quanto a um
deles as acções em Bolsa descido para valores irrisórios.
Entretanto parece haver consenso no nosso País em que para se
atingir antes de 2040 um nível de dívida pública da ordem dos 60% do Produto
Interno Bruto (PIB) haverá que renegociar os juros dos empréstimos concedidos à
República, e que obter taxas de crescimento no mínimo da ordem dos 3% anuais,
para o que seria necessário que o sector exportador crescesse acentuadamente e
que ao mesmo tempo o tecido empresarial também se ajustasse à criação de
produtos que no mercado interno contribuíssem para a redução de importações -
todas estas disposições permitindo fazer recuar o desemprego e a emigração que,
conjuntamente com o decréscimo da natalidade e o aumento da longevidade, têm
criado sombras negras sobre o nosso futuro.
É assim oportuno recordar que as MPME (Micro, Pequenas e Médias
Empresas) são mais de 330 mil (99,5% do conjunto de sociedades do sector não
financeiro) e que o emprego nas MPME se situou em cerca de 75% do total,
relembrando-se também que as Médias Empresas têm vindo a demonstrar um
relevante e crescente desempenho nas nossas exportações.
Assim, uma vez que há opiniões contraditórias sobre a
disponibilidade de crédito bancário para empresas, dos valores das taxas de
juro, e da existência de projectos empresariais credíveis, seria desejável a
concretização de um congresso em que em prazo curto as principais Associações
empresariais (nomeadamente as representantes das MPME) e a Banca esclarecessem
as dúvidas existentes, pois o desânimo que se sente, em particular nos
desempregados, nos trabalhadores precários, e nos que pensam recorrer à
emigração, requer acções urgentes para que se possam abrir horizontes a um país
que acreditou que a democracia e a vivência europeia corresponderiam aos
propósitos de esperança que se desenharam nas últimas décadas.
24.Março.2013.
Encontro Internacional
sobre o espírito europeu.
Ao ligar o televisor, há
dois ou três dias, deparou-se-me um jornalista que anunciava uma importante
comunicação de Herman Van Rompuy, Presidente da União Europeia.
Tratava-se de uma
decisão daquele alto Representante informando que decidira colocar na
agenda da próxima reunião, em 22 de Maio, do Conselho Europeu a que
preside, a questão da luta contra os "paraísos fiscais".
Sem tirar o mérito
relativamente à importância e oportunidade de tal assunto, confesso que
esperaria ouvir o anúncio de uma importante comunicação sobre um debate a
propósito do futuro da União Europeia e da Europa na qual se insere, dado o
momento de desorientação global que os europeus sentem quanto ao seu porvir.
Não foi por acaso que os
primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda
estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova
era no Mundo, foi precisamente dedicado ao "Espírito Europeu", e que
tanto viriam a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na
origem de instituições europeias que procuravam assumir um papel que corrigindo
as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção
de diversas nações europeias procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de
um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade.
Pessoas como Aron,
Jaspers, Merleau-Ponty, Rougemont, Luckács, Benda e outros reflectiram então
sobre as razões que teriam levado tantos intelectuais e pensadores a
demitirem-se do seu papel de reflexão sobre as atitudes de políticos que tinham
colocado a guerra, as guerras, como solução para os problemas dos povos.
E os que de certo modo
terão chegado à conclusão de que não se pode afirmar que existe um
"espírito europeu", tantas diferentes culturas o demonstrando, nem
por isso terão deixado de sair daquele Encontro pensando que estavam
paradoxalmente a procurar descobrir a existência de tal espírito.
O momento por que passa
a União Europeia é inegavelmente de profunda desorientação. A ausência de um
pensamento político-ideológico que tem caracterizado as reuniões do Conselho
Europeu, demonstrando que a condução política não tem prevalecido sobre o
pensamento económico-financeiro, em nada contribui para atenuar a perplexidade
dos cidadãos face ao que sentem como um "vazio europeu".
Para tal tem em muito
contribuído a pobreza intelectual de muitos dirigentes europeus, quer em
funções nas instituições da União Europeia, quer a nível nacional tanto
dentro da União como fora dela.
Está assim na hora de os
pensadores e intelectuais europeus voltarem a reflectir sobre o "espírito
europeu", procurando caminhos que sirvam para que os cidadãos e os
representantes que escolhem possam contribuir para que a extraordinária
diversidade e riqueza de ideias que têm caracterizado a formação da Europa
possa constituir um exemplo para o mundo em termos de paz, tolerância,
desenvolvimento, e democracia.
Portugal, de certo modo
o primeiro país a iniciar o período de colonização europeia, e um dos últimos a
cessá-lo, pode lançar a ideia de um Encontro Internacional sobre "O
espírito europeu", privilegiando a participação de pensadores e
intelectuais, e que ajude a Europa e a União Europeia a procurarem os melhores
caminhos a trilhar no seu futuro no Mundo.
Onde, tal Encontro?
Obviamente, em Sagres.
14.Abril.2013.
____________________________________________________
Governo
"presidencial".
Tudo leva a crer que as
reuniões semanais que o actual Presidente da República tem mantido com os
Primeiros-Ministros se terão quase sempre pautado pelo exercício da falta de confiança
mútua, obviamente com escalas variáveis de desempenho por parte de cada um dos
intervenientes.
Por exemplo - e apenas
no que se refere à presente legislatura, pois na anterior abundam episódios
duvidosos - será que aquando da preparação do orçamento do Estado para 2013 não
terão sido ventilados os problemas decorrentes de eventuais faltas de
constitucionalidade dados os precedentes da decisão do respectivo Tribunal
conhecida no verão de 2011 ?
Terá o Presidente
perguntado se as soluções previstas tinham sido ou seriam objecto de atenta
análise jurídica, e terá o Primeiro-Ministro dado tais garantias ?
E uma vez conhecida a
apresentação do Orçamento à Assembleia da República não terá o Presidente -
após o estudo preliminar pelos seus Assessores - dado de imediato a conhecer as
dúvidas que por certo já o assolavam quanto à constitucionalidade de
disposições que viriam a ser objecto de apresentação de pedido de fiscalização
sucessiva ?
Não terá o
Primeiro-Ministro sugerido que tais dúvidas fossem antes apresentadas num
quadro de fiscalização preventiva, para evitar possíveis adiamentos de
importantes decisões políticas ?
Teria sido evitado o
espectáculo surrealista de um Governo criticando acórdãos do Tribunal
Constitucional, insinuando perspectivas de poder vir a apresentar pedido de
demissão, para depois ir a correr solicitar audiência presidencial
posteriormente acompanhada de endeusamento do Ministro das Finanças - e, dado o
precedente do acompanhamento parcial por este último, sem idêntica presença do
dirigente do partido da coligação.
Tudo isto, baseado na
repetição quase ininterrupta de que o Governo dispõe de maioria parlamentar,
procurando desde modo alhear-se de responsabilidades que afinal e sem dar por
isso aceitou ao emitir o comunicado em que pelos seus termos passou de facto a
dar plena cobertura a um Governo que assim passou a ser
"presidencial"...
Volto assim a reiterar o
que escrevi no "Ponto de vista" precedente sobre a necessidade de uma
revisão constitucional que diminua a possibilidade de conflitos deste tipo,
dado terem sido quase sempre uma característica dos mandatos presidenciais.
07.Abril.2013.
_____________________________________________
"Peixeiradas" semi-constitucionais.
A semana que decorreu proporcionou à generalidade dos portugueses
o insólito espectáculo da possibilidade de assistirem a uma intervenção pública
do Presidente da República ocorrida sob o pano de fundo de diversos cartazes
publicitários de uma empresa de congelação de peixe, acontecimento ainda mais
inusitado face ao conteúdo que caracterizou o discurso então proferido - aliás
diferente do discurso da "moagem" do dia 6 de Março.
As palavras presidenciais, proferidas no estilo algo sibilino
empregado em diversas ocasiões, foram interpretadas pela generalidade dos
comentadores como tendo em mente uma antecipação a eventuais críticas que o
ex-Primeiro-Ministro José Sócrates P.Sousa lhe viesse a fazer poucas horas
depois, em anunciada entrevista televisionada.
Tais críticas forma efectivamente concretizadas, tendo parte
importante delas sido centrada em afirmações escritas há um ano pelo
Presidente, em que acusava o ex-Primeiro-Ministro de deslealdade institucional.
O que acabo de referir a propósito deste tipo de intervenções tem
a finalidade de recordar que estes dois cidadãos foram mandatados - repito,
mandatados - para dentro do quadro que lhes foi designado dirigirem o nosso
País, e não para procurarem alimentar quezílias ao fim e ao cabo apenas
aparentemente provocadas por lutas por maior poder de intervenção na política
nacional.
Porém este tipo de conflitos tem ocorrido, embora de forma mais ou
menos velada, entre os anteriores Presidentes da República que exerceram
mandatos após a entrada em vigor da Constituição de 1976 e os Primeiros-Ministros
de então, com especial incidência nos mandatos de recondução, tendo contribuído
para a falta de clarificação entre os eleitores a propósito das funções de uns
e de outros, e para a consequente degradação da vida política.
Parece assim útil que numa próxima revisão constitucional seja
modificado o sistema de eleição do Presidente no sentido de passar a ser
escolhido por uma votação mínima de dois terços dos Deputados em efectividade
de funções.
Os fantasmas que estiverem na origem do actual sistema eleitoral e
que caracterizaram o "Estado Novo" só podiam surgir em regimes de
partido único de liberdade política coarctada.
Não é, e espera-se que não será, o caso actual.
31.Março.2013.
Crédito bancário e investimento.
Parece haver opiniões discordantes
sobre a existência em Portugal de crédito bancário para empresas não
financeiras, pois enquanto do lado da Banca tem vindo a ser afirmado que não só
existe solidez como também disponibilidades financeiras, mas que faltam
projectos empresariais que justifiquem a concessão de empréstimos que permitam
esgotar a capacidade dos Bancos, já sob o ponto de vista empresarial ouve-se o
contrário, nomeadamente invocando-se que as taxas de juro requeridas são
incomportáveis.
Esta última alegação é por seu turno
contestada pelo sector bancário, que refere que as taxas reais praticadas se
situam em valores que embora não sejam baixos não se afastam da média em termos
históricos.
Contudo por outro lado é do
conhecimento público que o BPN e o BPP se "afundaram", com elevados
custos para os cidadãos, e que houve Bancos que tiveram que recorrer aos
financiamentos disponíveis no quadro do Programa de Assistência Financeira a
Portugal, tendo inclusivamente quanto a um deles as acções em Bolsa descido
para valores irrisórios.
Entretanto parece haver consenso no
nosso País em que para se atingir antes de 2040 um nível de dívida pública da
ordem dos 60% do Produto Interno Bruto (PIB) haverá que renegociar os juros dos
empréstimos concedidos à República, e que obter taxas de crescimento no mínimo
da ordem dos 3% anuais, para o que seria necessário que o sector exportador
crescesse acentuadamente e que ao mesmo tempo o tecido empresarial também se
ajustasse à criação de produtos que no mercado interno contribuíssem para a
redução de importações - todas estas disposições permitindo fazer recuar o
desemprego e a emigração que, conjuntamente com o decréscimo da natalidade e o
aumento da longevidade, têm criado sombras negras sobre o nosso futuro.
É assim oportuno recordar que as MPME (Micro,
Pequenas e Médias Empresas) são mais de 330 mil (99,5% do conjunto de
sociedades do sector não financeiro) e que o emprego nas MPME se situou em
cerca de 75% do total, relembrando-se também que as Médias Empresas têm vindo a
demonstrar um relevante e crescente desempenho nas nossas exportações.
Assim, uma vez que há opiniões
contraditórias sobre a disponibilidade de crédito bancário para empresas, dos
valores das taxas de juro, e da existência de projectos empresariais credíveis,
seria desejável a concretização de um congresso em que em prazo curto as
principais Associações empresariais (nomeadamente as representantes das MPME) e
a Banca esclarecessem as dúvidas existentes, pois o desânimo que se sente, em
particular nos desempregados, nos trabalhadores precários, e nos que pensam
recorrer à emigração, requer acções urgentes para que se possam abrir
horizontes a um país que acreditou que a democracia e a vivência europeia
corresponderiam aos propósitos de esperança que se desenharam nas últimas décadas.
24.Março.2013.
__________________________________________
Amargura
e esperança no sistema político.
(Reflexões sobre o sistema político português, na sequência de uma intervenção na SEDES, em 14.03.2013.).
A SEDES acaba de concretizar em sessão pública a apresentação da "Reflexão nacional sobre o sistema político português", iniciativa a que se associaram múltiplas entidades altamente relevantes no nosso País.
Nessa sessão pedi a palavra para referir os sentimentos contraditórios que tal importante iniciativa me suscitavam:
- a amargura de quem, tendo participado no movimento militar de 25 de Abril de 1974, e depois na organização dos actos eleitorais que consolidaram em 1976 a implantação da democracia, constatava haver um sentimento de profundo desânimo entre muitos portugueses por sentirem que o sistema político português não tem correspondido a grande parte dos seus anseios;
- a esperança de que a presente iniciativa venha a contribuir para uma profunda melhoria do sistema político, motivando os cidadãos para uma participação activa cujos resultados possam fazer acreditar em melhores expectativas na vida de todos nós, e levar a uma maior aproximação entre representados e representantes.
Assim, e no espírito de esperança que esta iniciativa me provocou, não quero deixar de voltar a mencionar algumas ideias que tenho publicado a propósito deste assunto.
Entre as diversas hipóteses conhecidas visando a melhoria do sistema político e a desejável aproximação entre eleitores e eleitos, a que terá muitos defensores em Portugal aponta para a criação de círculos uninominais coexistindo com um círculo nacional na eleição de deputados para o parlamento.
Porém, embora tal sistema prove relativamente bem em países de economias mais desenvolvidas e em que existe um elevado grau de confiança nos representantes eleitos em círculos uninominais bem como no funcionamento do sistema político, o facto é que no nosso país se por exemplo fossem 150 os deputados eleitos através de tal sistema caberia a cada um a representação de cerca de 60000 eleitores, pelo que é lícito perguntarmos se tal proporção possibilita diálogos consistentes e aprofundados com os seus eleitores, e que se tornam muito mais necessários em países onde a democracia não está ainda arreigadamente implantada ou onde o grau de desenvolvimento cultural e económico está longe do desejável.
Acrescentarei, para demonstrar o distanciamento entre eleitores e representados dentro do actual sistema político, nomeadamente quando os primeiros sentem que aos segundos não lhes são outorgados poderes adequados, um exemplo significativo: a freguesia onde resido tem cerca de 20000 eleitores, dos quais a assistência média às reuniões trimestrais da Assembleia de Freguesia tem sido da ordem das 8 pessoas, e de 5 no que respeita às reuniões públicas mensais da Junta.
O que se acaba de referir leva a mais uma reflexão sobre a dicotomia existente entre representação e participação na vida política, pois o aumento dos poderes de representação tem estado mais ligado às sociedades cujo grau de desenvolvimento é maior, na medida em que as pressões provocadas por uma arquitectura social cada vez mais competitiva foram reduzindo o tempo disponível para um envolvimento mais intenso na vida política, contribuindo-se assim para a manutenção de um modelo herdado de tempos em que a distância entre eleitores e centros de poder não deixava outras alternativas que não fossem a delegação de poder nos eleitos.
Estes passaram assim a constituir o que habitualmente se tem designado por “classe política”, que apoiada por uma parte dos cidadãos agregados em partidos políticos assumiu como que um estatuto de natureza profissional dentro de um processo de divisão do trabalho em que a sociedade lhes confere o exercício da direcção política do país.
Contudo este processo tem muitas limitações, na medida em que a intervenção política dos restantes eleitores apenas se consubstancia com maior incidência nos processos de natureza eleitoral, se bem que tenha aumentado uma forma de participação traduzida na troca de informações e opiniões por via electrónica – embora habitualmente com reduzidos efeitos nos períodos post-eleitorais.
De tudo isto resulta um afastamento notório entre "classe política" e partidos políticos, por um lado, e eleitores por outro, o qual se traduz nas expressões coloquiais que ouvimos e lemos todos os dias e em que o termo “eles” e as ilações a ele associadas denotam claramente a existência de um significativo fosso consequência de tal afastamento e ao mesmo tempo símbolo da falta de participação na vida pública.
Assim, uma solução para se procurar melhorar a qualidade da democracia poderia ser a de se fomentar uma maior participação dos cidadãos ao nível local, nomeadamente na vida das freguesias, através da outorga aos seus representantes de competências na eleição de outros órgãos do poder político.
Poderia deste modo competir ao colégio de Assembleias de Freguesia a eleição de um Senado com poderes significativos no processo legislativo, ou em alternativa a eleição de uma parte do Parlamento em que os restantes deputados seriam eleitos por um círculo nacional, e sempre através do sistema proporcional.
Ao reforço do poder político dos eleitos nas freguesias deveria logicamente corresponder um aumento das respectivas atribuições e competências na esfera do poder local, incluindo a redistribuição de recursos das câmaras municipais, contribuindo-se deste modo para a descentralização de que tanto se fala, a qual não pode ser só política mas também administrativa e financeira, pois aquela sem o concurso das outras ficaria bastante limitada.
Tal reformulação implicaria obviamente a reorganização do mapa das autarquias, pois uma participação política aprofundada não é compatível com a existência de freguesias com muitos eleitores.
Se os cidadãos sentirem que os representantes que elegeram directamente têm mais capacidade para melhorarem as condições de vida do local onde estão radicados, e que têm poderes de intervenção importantes na escolha de parte dos órgãos legislativos nacionais e das assembleias municipais, o seu grau de participação na vida política seguramente aumentará, e os partidos deixarão de aparecer como feudos inexpugnáveis, pois aumentará o grau de permeabilidade entre eles e os cidadãos.
Trata-se de propostas algo arrojadas, mas que paradoxalmente serão tanto mais necessárias quanto aumente a falta de contacto directo entre as pessoas que a vida moderna tem vindo a impulsionar, e que não é totalmente substituído pelas restantes formas de intervenção possibilitadas pela melhoria do sistema de comunicações, designadamente as de natureza electrónica.
Aos partidos políticos nada é retirado com a aplicação destes princípios, antes pelo contrário, pois o aumento da participação política a nível local teria decisivo papel na melhoria do respectivo funcionamento e na sua ligação aos eleitores, atenuando-se a o existente fosso entre uns e outros.
Tais propostas têm porém um obstáculo no que respeita aos limites materiais da Constituição: a obrigatoriedade do sufrágio directo para a designação dos órgãos de soberania.
Algo que a presente reflexão promovida pela SEDES poderá ajudar a equacionar.
15.Março.2013.
(Reflexões sobre o sistema político português, na sequência de uma intervenção na SEDES, em 14.03.2013.).
A SEDES acaba de concretizar em sessão pública a apresentação da "Reflexão nacional sobre o sistema político português", iniciativa a que se associaram múltiplas entidades altamente relevantes no nosso País.
Nessa sessão pedi a palavra para referir os sentimentos contraditórios que tal importante iniciativa me suscitavam:
- a amargura de quem, tendo participado no movimento militar de 25 de Abril de 1974, e depois na organização dos actos eleitorais que consolidaram em 1976 a implantação da democracia, constatava haver um sentimento de profundo desânimo entre muitos portugueses por sentirem que o sistema político português não tem correspondido a grande parte dos seus anseios;
- a esperança de que a presente iniciativa venha a contribuir para uma profunda melhoria do sistema político, motivando os cidadãos para uma participação activa cujos resultados possam fazer acreditar em melhores expectativas na vida de todos nós, e levar a uma maior aproximação entre representados e representantes.
Assim, e no espírito de esperança que esta iniciativa me provocou, não quero deixar de voltar a mencionar algumas ideias que tenho publicado a propósito deste assunto.
Entre as diversas hipóteses conhecidas visando a melhoria do sistema político e a desejável aproximação entre eleitores e eleitos, a que terá muitos defensores em Portugal aponta para a criação de círculos uninominais coexistindo com um círculo nacional na eleição de deputados para o parlamento.
Porém, embora tal sistema prove relativamente bem em países de economias mais desenvolvidas e em que existe um elevado grau de confiança nos representantes eleitos em círculos uninominais bem como no funcionamento do sistema político, o facto é que no nosso país se por exemplo fossem 150 os deputados eleitos através de tal sistema caberia a cada um a representação de cerca de 60000 eleitores, pelo que é lícito perguntarmos se tal proporção possibilita diálogos consistentes e aprofundados com os seus eleitores, e que se tornam muito mais necessários em países onde a democracia não está ainda arreigadamente implantada ou onde o grau de desenvolvimento cultural e económico está longe do desejável.
Acrescentarei, para demonstrar o distanciamento entre eleitores e representados dentro do actual sistema político, nomeadamente quando os primeiros sentem que aos segundos não lhes são outorgados poderes adequados, um exemplo significativo: a freguesia onde resido tem cerca de 20000 eleitores, dos quais a assistência média às reuniões trimestrais da Assembleia de Freguesia tem sido da ordem das 8 pessoas, e de 5 no que respeita às reuniões públicas mensais da Junta.
O que se acaba de referir leva a mais uma reflexão sobre a dicotomia existente entre representação e participação na vida política, pois o aumento dos poderes de representação tem estado mais ligado às sociedades cujo grau de desenvolvimento é maior, na medida em que as pressões provocadas por uma arquitectura social cada vez mais competitiva foram reduzindo o tempo disponível para um envolvimento mais intenso na vida política, contribuindo-se assim para a manutenção de um modelo herdado de tempos em que a distância entre eleitores e centros de poder não deixava outras alternativas que não fossem a delegação de poder nos eleitos.
Estes passaram assim a constituir o que habitualmente se tem designado por “classe política”, que apoiada por uma parte dos cidadãos agregados em partidos políticos assumiu como que um estatuto de natureza profissional dentro de um processo de divisão do trabalho em que a sociedade lhes confere o exercício da direcção política do país.
Contudo este processo tem muitas limitações, na medida em que a intervenção política dos restantes eleitores apenas se consubstancia com maior incidência nos processos de natureza eleitoral, se bem que tenha aumentado uma forma de participação traduzida na troca de informações e opiniões por via electrónica – embora habitualmente com reduzidos efeitos nos períodos post-eleitorais.
De tudo isto resulta um afastamento notório entre "classe política" e partidos políticos, por um lado, e eleitores por outro, o qual se traduz nas expressões coloquiais que ouvimos e lemos todos os dias e em que o termo “eles” e as ilações a ele associadas denotam claramente a existência de um significativo fosso consequência de tal afastamento e ao mesmo tempo símbolo da falta de participação na vida pública.
Assim, uma solução para se procurar melhorar a qualidade da democracia poderia ser a de se fomentar uma maior participação dos cidadãos ao nível local, nomeadamente na vida das freguesias, através da outorga aos seus representantes de competências na eleição de outros órgãos do poder político.
Poderia deste modo competir ao colégio de Assembleias de Freguesia a eleição de um Senado com poderes significativos no processo legislativo, ou em alternativa a eleição de uma parte do Parlamento em que os restantes deputados seriam eleitos por um círculo nacional, e sempre através do sistema proporcional.
Ao reforço do poder político dos eleitos nas freguesias deveria logicamente corresponder um aumento das respectivas atribuições e competências na esfera do poder local, incluindo a redistribuição de recursos das câmaras municipais, contribuindo-se deste modo para a descentralização de que tanto se fala, a qual não pode ser só política mas também administrativa e financeira, pois aquela sem o concurso das outras ficaria bastante limitada.
Tal reformulação implicaria obviamente a reorganização do mapa das autarquias, pois uma participação política aprofundada não é compatível com a existência de freguesias com muitos eleitores.
Se os cidadãos sentirem que os representantes que elegeram directamente têm mais capacidade para melhorarem as condições de vida do local onde estão radicados, e que têm poderes de intervenção importantes na escolha de parte dos órgãos legislativos nacionais e das assembleias municipais, o seu grau de participação na vida política seguramente aumentará, e os partidos deixarão de aparecer como feudos inexpugnáveis, pois aumentará o grau de permeabilidade entre eles e os cidadãos.
Trata-se de propostas algo arrojadas, mas que paradoxalmente serão tanto mais necessárias quanto aumente a falta de contacto directo entre as pessoas que a vida moderna tem vindo a impulsionar, e que não é totalmente substituído pelas restantes formas de intervenção possibilitadas pela melhoria do sistema de comunicações, designadamente as de natureza electrónica.
Aos partidos políticos nada é retirado com a aplicação destes princípios, antes pelo contrário, pois o aumento da participação política a nível local teria decisivo papel na melhoria do respectivo funcionamento e na sua ligação aos eleitores, atenuando-se a o existente fosso entre uns e outros.
Tais propostas têm porém um obstáculo no que respeita aos limites materiais da Constituição: a obrigatoriedade do sufrágio directo para a designação dos órgãos de soberania.
Algo que a presente reflexão promovida pela SEDES poderá ajudar a equacionar.
15.Março.2013.
_______________________________________________________________
Reflexões sobre o sistema político português.
A SEDES vai concretizar no próximo dia 14 de Março a
apresentação pública da "reflexão nacional sobre o sistema político
português", iniciativa a que se associaram múltiplas entidades do nosso
País.
Creio assim oportuno recordar algumas intervenções
públicas em que me tenho referido a este assunto, inclusivamente no
"blog" da própria SEDES.
Poderá dizer-se que existe consenso na sociedade
portuguesa sobre a necessidade de se aperfeiçoar profundamente o sistema
político visando o aumento da participação na vida pública e o da tão falada
aproximação entre representados e representantes.
Algumas hipóteses têm sido apresentadas para se
melhorar tal aproximação, das quais as mais conhecidas apontam para a criação
de círculos uninominais coexistindo com um círculo nacional na eleição de
deputados para o parlamento.
Porém, embora tais sistemas provem relativamente bem
em países de economias mais desenvolvidas e em que existe um elevado grau de
confiança nos representantes eleitos em círculos uninominais bem como no
funcionamento do sistema político, o facto é que a relação proporcional em
Portugal entre eleitores e eleitos conferiria a estes a responsabilidade de
representar algumas dezenas de milhar de cidadãos, o que está manifestamente
longe de poder permitir os diálogos consistentes e aprofundados com os seus
eleitores e que se tornam mais necessários em países onde a democracia não está
ainda arreigadamente implantada ou onde o grau de desenvolvimento cultural e
económico está longe do desejável.
Em Portugal, se por exemplo fossem 150 os deputados
eleitos pelo sistema de círculos uninominais, caberia a cada um a representação
de cerca de 60000 eleitores, pelo que é lícito perguntarmos se tal proporção
possibilita a existência de contactos frutíferos.
Acrescentarei, para demonstrar o
distanciamento entre eleitores e representados, nomeadamente quando os
primeiros sentem que aos segundos não lhes são outorgados poderes adequados, um
exemplo significativo: a freguesia onde resido tem cerca de 20000 eleitores,
dos quais a assistência média às reuniões trimestrais da Assembleia de
Freguesia tem sido da ordem das 8 pessoas, e às reuniões públicas mensais da
Junta situando-se em 5.
O que se acaba de referir constitui mais um
contributo para uma reflexão sobre a dicotomia existente entre representação e
participação na vida política, pois o aumento dos poderes de representação tem
estado mais ligado às sociedades cujo grau de desenvolvimento é maior, na
medida em que as pressões provocadas por uma arquitectura social cada vez mais
competitiva foram reduzindo o tempo disponível para uma participação mais
intensa na vida política, contribuindo-se assim para a manutenção de um modelo
herdado de tempos em que a distância entre eleitores e centros de poder não
deixava outras alternativas que não fossem a delegação de poder nos eleitos.
Estes passaram assim a constituir o que
habitualmente se tem designado por “classe política”, que apoiada por uma parte
dos cidadãos agregados em partidos políticos assumiu como que um estatuto de
natureza profissional dentro de um processo de divisão do trabalho em que a
sociedade lhes confere o exercício da direcção política do país.
Contudo este processo tem muitas limitações, na
medida em que a intervenção política dos restantes eleitores apenas se
consubstancia com maior incidência nos processos de natureza eleitoral, se bem
que tenha aumentado uma forma de participação consubstanciada na troca de
informações e opiniões por via electrónica – embora habitualmente com reduzidos
efeitos nos períodos post-eleitorais.
De tudo isto resulta um afastamento notório entre
classe política e partidos políticos, por um lado, e eleitores por outro, o
qual se traduz nas expressões coloquiais que ouvimos e lemos todos os dias e em
que o termo “eles” e as ilações a ele associadas denotam claramente a
existência de um significativo fosso consequência de tal afastamento e ao mesmo
tempo símbolo da falta de participação na vida pública.
A solução então aventada para se procurar melhorar a
qualidade da democracia seria a de se fomentar uma maior participação dos
cidadãos ao nível local, nomeadamente na vida das freguesias, através da
outorga aos seus representantes de competências na eleição de outros órgãos do
poder político.
A tal reforço do poder político dos eleitos nas
freguesias deveria logicamente corresponder um aumento das respectivas
atribuições e competências na esfera do poder local, mediante a redistribuição
dos recursos das cãmaras municipais, contribuindo-se assim para a
descentralização de que tanto se fala, a qual não pode ser só política mas
também administrativa e financeira, pois aquela sem o concurso das outras de
pouco serve.
Poderia assim competir ao colégio de representantes
das freguesias a eleição de uma parte do Parlamento (ou em alternativa a de um
Senado com poderes significativos no processo legislativo), sendo os restantes
deputados eleitos por um círculo nacional, ambas segundo o sistema
proporcional.
Os representantes directos do cidadão eleitor
assumiriam assim um papel extremamente relevante, mas que não deve ser
exclusivo, pois a eleição directa do Presidente da Republica é já um elemento
fundamental na nossa tradição política, e assim deve continuar, pois permite o
exercício de um poder moderador capaz de compensar eventuais desequilíbrios de
natureza política.
Princípios análogos podem e devem ser aplicados nas
eleições para as autarquias municipais, a fim de se minorarem eventuais
conflitos de legitimidade, permitindo-se deste modo que os cidadãos eleitos
directamente, e que constituirão as assembleias de freguesia, desempenhem assim
o papel de “procuradores” privilegiados dos cidadãos que os elegem, sem
prejuízo do diálogo que estes podem ter com o “seu” presidente da câmara,
vereador, ou presidente de junta de freguesia.
Tal reformulação implicaria obviamente a
reorganização do mapa das autarquias, pois uma participação política
aprofundada não é compatível com a existência de freguesias com mais de cinco
mil eleitores.
Se os cidadãos sentirem que os representantes que
elegeram directamente têm mais capacidade para melhorarem as condições de vida
do local onde estão radicados, e que têm poderes de intervenção importantes na
escolha de parte do dos órgãos legislativos nacionais e das assembleias
municipais, o seu grau de participação na vida política seguramente aumentará,
e os partidos deixarão de aparecer como feudos inexpugnáveis.
Trata-se de propostas algo arrojadas, mas que
paradoxalmente serão tanto mais necessárias quanto aumente a falta de contacto
directo entre as pessoas que a vida moderna tem vindo a impulsionar, e que não
é totalmente substituído pelas restantes formas de intervenção possibilitadas
pela melhoria do sistema de comunicações, designadamente as de natureza
electrónica.
Aos partidos políticos nada é retirado com a
aplicação destes princípios, pois a sua intervenção continuaria a processar-se
em todos os momentos deste novo sistema eleitoral, e igualmente aquando da
eleição dos parlamentos pelos representantes directos do povo, na medida em que
aqui os partidos políticos não podem deixar de serem essenciais para o que
todos ambicionamos: a melhoria da qualidade da democracia.
E, por outro lado, o aumento da participação
política a nível local teria decisivo papel na melhoria do funcionamento dos
partidos políticos e da sua ligação aos eleitores, atenuando-se a separação
entre uns e outros.
Têm - tais propostas - um obstáculo residente nos
limites materiais da Constituição quanto à obrigatoriedade do sistema de
eleição directa. Algo que o povo poderá resolver.
10.Março.2013.
______________________________________________
Itália,
Portugal: insatisfação política.
Os resultados das eleições em Itália demonstraram, através do elevado número de aderentes ao movimento de protesto encabeçado pelo comediante B.Grillo (25 % dos votantes), um profundo descontentamento com os partidos tradicionais e com o próprio sistema político, que permitiu que cerca de 50 conjuntos políticos se apresentassem a uma votação que mesmo assim concitou uma participação da ordem dos 75% dos eleitores.
A arquitectura concebida para as eleições que se realizaram a partir de 1993, com um complexo sistema que visava a obtenção de maiorias de governabilidade, ruiu fragorosamente pois contribuiu para o aumento do fosso que se criou entre eleitores e eleitos, voltando a colocar-se com agudeza o sempre presente dilema entre representação e participação políticas.
Em Portugal, embora não haja ainda dados objectivos que com a possível independência refiram o número total de manifestantes em todo o país, as manifestações públicas que ontem ocorreram em diversas cidades foram novamente uma demonstração evidente de descontentamento de grande parte dos cidadãos com a falta de equidade - quer aparente, quer real - na imposta redução dos seus rendimentos e no veloz aumento do desemprego, a que se tem juntado a falta de esclarecimento objectivo e convincente das razões que levaram a tais políticas, bem como das expectativas temporais e quantificadas relativamente à desejável melhoria das condições de vida.
Cabe também referir que o crescente peso que a comunicação directa entre as pessoas permite graças à disseminação dos sistemas informáticos, quer por SMS e correio electrónico nomeadamente em rede, introduzindo factores de velocidade de transmissão da informação que potenciam a formação de novos movimentos políticos como o de B.Grillo em Itália e o que em Portugal organizou as manifestações de ontem.
Estas formas de protesto tendem a ocorrer em especial nos países em que o descontentamento político e social cresce e as formações tradicionais se mantêm afastadas dos cidadãos, levando a que o nível de participação directa dos cidadãos na vida política tenha pouca expressão.
Só quando os responsáveis políticos sentirem que a expressão popular do descontentamento pode evoluir para formas violentas é que talvez tentem instituir novas arquitecturas políticas que obviem a tais possibilidades.
Porém, poderá ser tarde, e por outro lado não terão sucesso caso não promovam a participação política a nível local, com tradução em sistemas representativos a nível nacional como os que tenho vindo a referir nestas páginas.
3.Março.2013.
Os resultados das eleições em Itália demonstraram, através do elevado número de aderentes ao movimento de protesto encabeçado pelo comediante B.Grillo (25 % dos votantes), um profundo descontentamento com os partidos tradicionais e com o próprio sistema político, que permitiu que cerca de 50 conjuntos políticos se apresentassem a uma votação que mesmo assim concitou uma participação da ordem dos 75% dos eleitores.
A arquitectura concebida para as eleições que se realizaram a partir de 1993, com um complexo sistema que visava a obtenção de maiorias de governabilidade, ruiu fragorosamente pois contribuiu para o aumento do fosso que se criou entre eleitores e eleitos, voltando a colocar-se com agudeza o sempre presente dilema entre representação e participação políticas.
Em Portugal, embora não haja ainda dados objectivos que com a possível independência refiram o número total de manifestantes em todo o país, as manifestações públicas que ontem ocorreram em diversas cidades foram novamente uma demonstração evidente de descontentamento de grande parte dos cidadãos com a falta de equidade - quer aparente, quer real - na imposta redução dos seus rendimentos e no veloz aumento do desemprego, a que se tem juntado a falta de esclarecimento objectivo e convincente das razões que levaram a tais políticas, bem como das expectativas temporais e quantificadas relativamente à desejável melhoria das condições de vida.
Cabe também referir que o crescente peso que a comunicação directa entre as pessoas permite graças à disseminação dos sistemas informáticos, quer por SMS e correio electrónico nomeadamente em rede, introduzindo factores de velocidade de transmissão da informação que potenciam a formação de novos movimentos políticos como o de B.Grillo em Itália e o que em Portugal organizou as manifestações de ontem.
Estas formas de protesto tendem a ocorrer em especial nos países em que o descontentamento político e social cresce e as formações tradicionais se mantêm afastadas dos cidadãos, levando a que o nível de participação directa dos cidadãos na vida política tenha pouca expressão.
Só quando os responsáveis políticos sentirem que a expressão popular do descontentamento pode evoluir para formas violentas é que talvez tentem instituir novas arquitecturas políticas que obviem a tais possibilidades.
Porém, poderá ser tarde, e por outro lado não terão sucesso caso não promovam a participação política a nível local, com tradução em sistemas representativos a nível nacional como os que tenho vindo a referir nestas páginas.
3.Março.2013.
__________________________________________________________________
Símbolos
da democracia: em risco.
A
queda do "Estado Novo" foi inegavelmente caracterizada por dois
símbolos que significaram essencialmente o profundo desejo de liberdade
política sentido pela generalidade dos portugueses: o cravo e a canção
"Grândola, vila morena".
Durante
bastante tempo assim permaneceram, mas nas sessões solenes em que na Assembleia
da República se comemorava a data de 25 de Abril de 1974 o cravo passou a ser
ostentado ao fim de alguns anos quase apenas pelos participantes cujo
posicionamento político se situava mais à esquerda, bem como pelos promotores
dos desfiles públicos celebrativos da mesma data.
Lenta
e gradualmente a grande maioria dos responsáveis políticos pouco fez para
procurar manter o cravo como um símbolo da liberdade, e os desfiles
comemorativos como uma verdadeira festa popular partilhada por todos os que
desejavam um regime democrático, independentemente das suas opções partidárias.
No
entanto a inolvidável canção permaneceu até agora como um símbolo da liberdade,
e que se bem que mais cantada em manifestações públicas de predomínio político
mais à esquerda mantinha-se respeitada mesmo pelos que a não entoavam, pois
assentava nos inatacáveis conceitos de liberdade, igualdade política e
fraternidade que caracterizam as modernas democracias.
Porém,
o seu recente uso como arma política por discordantes da acção governativa
mostra a falta de horizontes que estes têm quando banalizam o uso de uma canção
nobre e simbólica, levando a que muitos dos que por certo a cantariam em
situações que inequivocamente fossem de comemoração de actos de liberdade
política talvez hesitem e pensarão duas vezes antes de o fazer.
Riscos
para o papel da canção, maus sinais para a democracia, num país que cava
progressivamente a divisão entre os seus cidadãos.
24.Fev.2013.
____________________________________________________
Forças Armadas e condição militar.
Está prevista a realização, no próximo dia 22 de Fevereiro, de um jantar de Oficiais, que terá como tema de debate “Forças Armadas e Condição Militar”, o qual foi inicialmente previsto para que nele participassem apenas Almirantes e outros Oficiais-Generais, na situação de reserva e reforma, mas que foi por estes aberto aos outros oficiais em idêntica situação, e estando já assegurada a participação de um número significativo de ex–Chefes de Estado-Maior (CEM), tendo também a Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) informado que iria prestar apoio à concretização do repasto e difundir a respectiva realização através dos seus próprios meios.
Há portanto diversos níveis de participação previstos: ex-CEM, Almirantes e outros Oficiais-Generais, Oficiais associados na AOFA, e outros Oficiais, tendo sido escolhido um tema de debate que parece estar situado bem dentro das competências de preocupação no âmbito socio-profissional da AOFA, sem que tal possa porém ser considerado como exclusivo desta Associação.
Dado o facto de se tratar de uma iniciativa autónoma de altos Quadros militares coincidente com diversas notícias sobre projectos de reestruturações das Forças Armadas, bem como de novas reduções salariais e de outras compensações ou direitos, nomeadamente na área da assistência em termos de saúde, pode-se admitir que o objectivo inicial de tal jantar se prende com a oposição a tais projectos e reduções, porém numa perspectiva que englobando interesses sócio-profissionais, deontológicos e assistenciais nem por isso deixa de aparentemente os transcender, uma vez que os citados projectos implicam fortes reajustamentos nos efectivos e recursos das Forças Armadas - acrescendo que ocorrem antes da aprovação formal da revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Seria pois mais lógico e transparente que o tema a debater por iniciativa dos promotores - dadas as suas qualificações e o facto de ter sido desencadeada sem a participação da AOFA - fosse a reestruturação das Forças Armadas (em que os parâmetros da "Condição Militar" e os seus reflexos de natureza socio-profissional e assistencial não deixariam por certo de ser abordados, uma vez que são elementos essenciais em qualquer modelo de reorganização).
Assim, podem aqueles Oficiais-Generais defrontar-se com o facto de os propósitos e tema da sua iniciativa (certamente tomada com o fim de colaborarem de modo critico mas também construtivo na desejável reorganização das Forças Armadas) serem eventualmente interpretados pelo País - e pelos militares no serviço activo, nomeadamente os Oficiais e Cadetes - como um pronunciamento com origem principalmente em reacção a disposições governamentais redutoras dos seus salários e outros atributos de natureza assistencial, atitude que poderia detonar outros tipos de procedimentos fora de um quadro democrático num Portugal que passou a viver num regime sem opressão, com liberdade de expressão, e representantes políticos escolhidos em eleições livres - embora com muitas carências sociais, económicas e em matéria de Justiça.
Teria sido preferível que aqueles Almirantes e outros Oficiais-Generais se tivessem reunido sem participação de outros Oficiais, que o tema não fizesse referência à "Condição Militar", mas apenas à reestruturação das Forças Armadas - e que dessem a conhecer as suas preocupações e sugestões às entidades apropriadas.
Teria sido preferível que a AOFA tivesse promovido os necessários debates sobre a "Condição Militar", além dos que já concretizou, e que desse a conhecer as suas conclusões e propostas às entidades responsáveis.
Mas, mais importante, teria sido preferível que a Assembleia da República e o Governo tivessem tomado as iniciativas apropriadas para que em clima de diálogo participativo fossem tomadas decisões que não criassem nos militares - conscientes dos sacrifícios que são necessários para que Portugal retome a sua soberania - a sensação de que são objecto de injustiças e discriminações.
21.Fev.2013.
Está prevista a realização, no próximo dia 22 de Fevereiro, de um jantar de Oficiais, que terá como tema de debate “Forças Armadas e Condição Militar”, o qual foi inicialmente previsto para que nele participassem apenas Almirantes e outros Oficiais-Generais, na situação de reserva e reforma, mas que foi por estes aberto aos outros oficiais em idêntica situação, e estando já assegurada a participação de um número significativo de ex–Chefes de Estado-Maior (CEM), tendo também a Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) informado que iria prestar apoio à concretização do repasto e difundir a respectiva realização através dos seus próprios meios.
Há portanto diversos níveis de participação previstos: ex-CEM, Almirantes e outros Oficiais-Generais, Oficiais associados na AOFA, e outros Oficiais, tendo sido escolhido um tema de debate que parece estar situado bem dentro das competências de preocupação no âmbito socio-profissional da AOFA, sem que tal possa porém ser considerado como exclusivo desta Associação.
Dado o facto de se tratar de uma iniciativa autónoma de altos Quadros militares coincidente com diversas notícias sobre projectos de reestruturações das Forças Armadas, bem como de novas reduções salariais e de outras compensações ou direitos, nomeadamente na área da assistência em termos de saúde, pode-se admitir que o objectivo inicial de tal jantar se prende com a oposição a tais projectos e reduções, porém numa perspectiva que englobando interesses sócio-profissionais, deontológicos e assistenciais nem por isso deixa de aparentemente os transcender, uma vez que os citados projectos implicam fortes reajustamentos nos efectivos e recursos das Forças Armadas - acrescendo que ocorrem antes da aprovação formal da revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Seria pois mais lógico e transparente que o tema a debater por iniciativa dos promotores - dadas as suas qualificações e o facto de ter sido desencadeada sem a participação da AOFA - fosse a reestruturação das Forças Armadas (em que os parâmetros da "Condição Militar" e os seus reflexos de natureza socio-profissional e assistencial não deixariam por certo de ser abordados, uma vez que são elementos essenciais em qualquer modelo de reorganização).
Assim, podem aqueles Oficiais-Generais defrontar-se com o facto de os propósitos e tema da sua iniciativa (certamente tomada com o fim de colaborarem de modo critico mas também construtivo na desejável reorganização das Forças Armadas) serem eventualmente interpretados pelo País - e pelos militares no serviço activo, nomeadamente os Oficiais e Cadetes - como um pronunciamento com origem principalmente em reacção a disposições governamentais redutoras dos seus salários e outros atributos de natureza assistencial, atitude que poderia detonar outros tipos de procedimentos fora de um quadro democrático num Portugal que passou a viver num regime sem opressão, com liberdade de expressão, e representantes políticos escolhidos em eleições livres - embora com muitas carências sociais, económicas e em matéria de Justiça.
Teria sido preferível que aqueles Almirantes e outros Oficiais-Generais se tivessem reunido sem participação de outros Oficiais, que o tema não fizesse referência à "Condição Militar", mas apenas à reestruturação das Forças Armadas - e que dessem a conhecer as suas preocupações e sugestões às entidades apropriadas.
Teria sido preferível que a AOFA tivesse promovido os necessários debates sobre a "Condição Militar", além dos que já concretizou, e que desse a conhecer as suas conclusões e propostas às entidades responsáveis.
Mas, mais importante, teria sido preferível que a Assembleia da República e o Governo tivessem tomado as iniciativas apropriadas para que em clima de diálogo participativo fossem tomadas decisões que não criassem nos militares - conscientes dos sacrifícios que são necessários para que Portugal retome a sua soberania - a sensação de que são objecto de injustiças e discriminações.
21.Fev.2013.
____________________________________________________
Informação, delegação e participação,
em democracia.
Os sistemas de organização política assentes
em conceitos de igualdade dos cidadãos que se têm vindo a constituir nas
últimas centenas de anos são caracterizados essencialmente pela conjugação da
república com a democracia, e obviamente com a adopção dos métodos de sufrágio
universal pelos maiores de idade.
Evoluindo de estádios de
desenvolvimento político a partir de pequenas comunidades em que os
responsáveis pela organização social e económica eram eleitos pelo grupo
(excluindo-se logicamente desta análise os grupos em que a direcção política
decorria da lei do mais forte, ou da adopção de sistemas hereditários), o seu
crescimento populacional e territorial e a consequente organização em Estado
obrigou a que os principais dirigentes passassem a constituir um conjunto de
representantes das comunidades de base, mas que porém tinham que reduzir tanto
mais acentuadamente o contacto com estas últimas quanto maiores a distância ou
as dificuldades de deslocações.
Daí a consequência inevitável de os
poderes de delegação na direcção do Estado passarem a ser aumentados, bem como
o facto de a participação local na vida política diminuir acentuadamente uma
vez que tendia a ser reduzida às escolhas dos representantes em eleições
periódicas, com as óbvias consequências em termos de afastamento entre eleitores
e eleitos.
E à medida que os Estados foram
aumentando de dimensão foi sendo constatada a necessidade de se instituirem
poderes intermédios de nível regional ou local, a que porém e com poucas
excepções não eram atribuídas competências na escolha política dos
representantes a nível nacional, e que assim viam mantidos os poderes de
delegação e representação conferidos por eleições a nível nacional.
A troca de ideias e de experiências
entre os cidadãos foi entretanto evoluindo desde os tempos em que era
essencialmente oral, passando por longas e lentas fases em que a escrita e a
sua transmissão foi progredindo em função dos métodos de cópia e reprodução,
bem como do aumento da literacia e das capacidades económicas para não só ler
textos escritos, mas também para difundir o pensamento.
Com o telefone assistimos à expansão
da comunicação oral, e com a radio ao crescimento exponencial da informação que
tal como já ocorria com a imprensa era quase exclusivamente direccionada a
partir de poucos, perspectivas que foram muito aumentadas com a televisão -
pese embora o facto de terem crescido as possibilidades de haver muito mais
"emissores" tanto na imprensa como na radio e na televisão. Mas esta,
cuja unidireccionalidade de informação tanto influenciou o mundo nos últimos 50
anos, não terá sido suficientemente compensada pela oferta de diversas
alternativas.
A todos estes factores, que
progressivamente foram potenciados a partir do início do séc.XX, veio juntar-se
um cuja crescente dimensão já está a modificar o modo como a informação é
gerada e circula: a informática e a sua versão em rede mundial: a Internet -
esta cada vez mais circulando entre telecomputadores e telefones móveis, em
crescente utilização por cada vez mais cidadãos contribuindo assim para a melhoria
do conhecimento e do leque de opções neste contida.
É inegável que desde o advento da
televisão passou a haver muito menor comunicação das pessoas face a face
(preferindo-se ficar em casa a ver a TV em vez de visitar amigos). Acresce que
o cada vez maior recurso à Internet e às comunicações móveis potencia tal
afastamento - ou seja, aumenta o que se poderia apelidar de "comunicação
fria" em detrimento da "quente", em que as emoções são
transmitidas pelo contacto de proximidade física.
E se na comunicação "fria"
pode circular mais informação (nem sempre a "melhor") com vantagens
inegáveis quanto à tomada de opções racionais, nada substitui - pelo menos até
agora - o contacto pessoal e directo, que permite avaliar com mais consistência
e menor margem de erro se o nosso interlocutor nos oferece uma adequada
capacidade para nos representar. Avaliação cuja fiabilidade é por certo maior
do que aquela que nos é facultada por um qualquer candidato cujas faculdades de
representação teatral nos sejam apresentadas em campanha televisiva.
E assim voltamos ao tema com que
iniciámos o presente texto, e que assenta na procura do equilíbrio entre
representação e participação, e que cada vez mais deve assentar no princípio de
esta última dever ser a base de uma saudável vida política e principalmente num
tempo em que progressivamente aumenta a informação que nos chega, bem como a
sua qualidade, e em que temos possibilidades acrescidas de comunicar a outros
as nossas opiniões e outras informações, em vez de passivamente esperarmos por
uma próxima campanha eleitoral precedendo a escolha de um "longínquo"
representante a nível nacional.
Ou seja: o cidadão deve poder eleger
alguém a quem confere o direito de administrar, com os recursos conferidos por
lei, o local em que vive, e deve poder eleger alguém que em representação do
mesmo local faça parte de um colégio eleitoral que escolha cidadãos com
atribuições políticas ao mais alto nível da representação do Estado, bem como
ao da representação no nível imediato do poder local
Tal princípio deve ser aplicado em
paralelo com os da eleição directa e tradicional dos representantes políticos a
nível dos órgãos centrais, regionais, e locais do Estado, permitindo-se assim
um melhor equilíbrio entre os princípios da representação e da participação.
E - não menos importante - permitiria
a cada vez mais necessária abertura dos partidos políticos ao contacto com os
eleitores de base, diminuindo o crescente afastamento que em muitos Estados
ocorre.
17.Fev.2013
______________________________________________________________________
Candidaturas e ética.
Retomando um tema sobre o qual escrevi
nestas páginas há cerca de três meses, a ele volto, pois como era de prever
aumentou de tom a discussão pública sobre a interpretação a dar à lei de 2005
que determinou a limitação de mandatos dos presidentes dos órgãos executivos
das autarquias locais, suscitando tantas clivagens de opinião que de imediato
fazem deduzir que a lei poderá estar mal elaborada.
A lei determina que o presidente da
câmara municipal e o presidente de junta de freguesia, depois de concluídos
três mandatos consecutivos, não podem assumir aquelas funções durante o
quadriénio
imediatamente subsequente ao último
mandato consecutivo permitido, sendo porém omissa quanto ao local do exercício
do mandato - o que tem provocado entendimentos (nomeadamente da Comissão
Nacional de Eleições, no âmbito das suas atribuições de promoção do
esclarecimento dos cidadãos, e de assegurar a igualdade de tratamento em actos
eleitorais) de que seria possível voltar a ser eleito numa autarquia diferente.
As questões à volta deste assunto -
até porque envolvem anunciadas intenções de candidatura às Câmaras Municipais
de Lisboa e do Porto - já levaram a que políticos e deputados influentes tenham
referido que o Parlamento deveria legislar de novo, o que porém não recolhe
opiniões consensuais quanto a tal atitude, bem como relativamente ao sentido de
nova eventual lei.
É certo que sob o ponto de vista
processual haveria vantagem em que ocorresse uma clarificação, pois em termos
formais quaisquer impugnações de candidaturas só poderão ocorrer quando forem
apresentadas as candidaturas, cerca de 50 dias antes das eleições, seguindo-se
um processo que poderá chegar à interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional e cuja decisão final poderá ser proferida apenas a cerca de um
mês da data das eleições, com todas as consequências imagináveis nomeadamente
no caso de as impugnações abrangerem algumas dezenas de municípios e centenas
de freguesias ...
Acresce que no presente caso das
eleições para as Câmaras Municipais e Assembleias de Freguesia há situações
curiosas que aparentemente não estão claramente definidas, pois a citada lei de
2005 não impede que alguém que tenha exercido um cargo de Presidente de Câmara
ou de Freguesia se candidate a mandato na mesma autarquia desde que não se
apresente em primeiro lugar na lista de candidatos, pois poderá exercer um
mandato como vereador, ou que no caso das novas "Uniões de Freguesias"
se aproveite para aparecer de novo num território autárquico onde já terá
exercido funções em parte dele - caso que mostra uma vez mais o desastre
político provocado pela infeliz Reorganização Administrativa do Território das
Autarquias (RATA), em lei de título aliás apressadamente corrigido para se ler
"Freguesias" em vez de "Autarquias"...
Por outro lado, e no caso de se
candidatar a Presidente noutra autarquia, pareceu-me numa primeira leitura da
legislação que não estaria obrigado (ou obrigada) a residir no respectivo
território, embora os seus proponentes devam fazer prova de recenseamento na
área respectiva - o que demonstra o espírito da lei uma vez que as autarquias
locais devem ser presididas por quem nelas reside (e eu acrescentaria um prazo
mínimo de residência que por certo contribuiria para um melhor conhecimento das
questões relativas à autarquia em causa).
Penso pois que há que evitar, por
aperfeiçoamentos legislativos claros e que respeitem o esírito do sistema
democrático, que apareça a figura do "candidato-estrela" que seria
recrutado, um pouco à semelhança dos jogadores de futebol profissional ou dos
administradores de delegações regionais de empresas multinacionais, para
"gerir" uma outra autarquia, em situações que poderiam chegar ao limite
de alguém que após três mandatos muda de "equipa" e vai para
"seara" alheia onde poderá permanecer mais doze anos, rendendo depois
alguém que saíu de bom "porto" para outros doze anos e assim
sucessivamente durante mais algumas dúzias de anos - quiçá acabando a sua
vetustez, qual jogador em fins de carreira, em "barrancos"...
Um princípio aceitável poderia ser o
de serem permitidas recandidaturas, desde que não consecutivas, para os cargos
de Presidente da República e de Presidentes de Autarquias, possibilitando-se
deste modo que o exercício do mandato não fosse em grande parte condicionado
pelo desejo de uma reeleição para um segundo mandato consecutivo, permitindo-se
assim ao eleitorado comparar desempenhos.
No que respeita aos Deputados, a
situação tem contornos algo diferentes, pois representam todo o país e não os
círculos por onde foram eleitos; mas tal não deve impedir a necessária e
apropriada reflexão dos cidadãos e dos seus representantes sobre tal matéria.
Tudo isto deveria levar à meditação
sobre o que poderiam numa democracia ser os limites aceitáveis para
recandidaturas em eleições para cargos políticos, bem como quais os limites
temporais de cada exercício de mandato, processo cujos resultados teriam
tradução em adequada revisão constitucional que se debruçasse sobre a
organização do poder político - sem esquecer a necessidade do fomento da
respectiva participação local.
10.Fev.2013.
___________________________________________________________________________
As gerações (jerações...) que nos têm
dirigido.
Não foi por acaso que no título deste
texto escrevi "jerações"...
Com isto quis significar que as
gerações que têm dirigido a governação do nosso país desde há cerca de 30 anos
têm vindo essencialmente das "Juventudes" das habitualmente
designadas "máquinas partidárias", com as consequentes deficiências,
na grande maioria dos casos, decorrentes da falta de qualidade na respectiva
cultura - tanto global, como política - e na expressão de projectos para o
futuro sustentados e coerentes.
A respectiva ascenção dentro das
hierarquias dos militantes em partidos políticos mostra bem o fosso que se
constituiu entre este e os eleitores, e que no meu entender provem da falta de
incentivo à participação política ao nível do poder local, em especial nas
circunscrições que estão ou deviam estar mais próximas do diálogo com os
cidadãos.
Tendo-se perdido em 1976, com a
aprovação da Constituição, a hipótese de organizar o poder local em moldes que
permitissem uma maior osmose entre o eleitorado e os seus representantes a
nível das freguesias, e com a impossibilidade constitucional de se permitir a
existência de eleições indirectas susceptíveis de constituirem por exemplo uma
segunda Câmara parlamentar, o nível de participação política ficou fortemente
reduzido, levando ao predomínio dos "aparelhos" partidários na
escolha dos dirigentes a propor aos eleitores, levando assim a que Portugal
pautasse a sua vida política com predomínio excessivo da representação
periódica traduzida nos processos previstos nos calendários eleitorais - o que
se é suficiente e consensual em países com longas tradições nesta área e com
economias sustentadas já deixa a desejar noutros países em que tal não ocorre e
deveria ser suprido por sistemas fomentadores da participação política.
Outra consequência do afastamento de
muitos cidadãos relativamente à participação na vida política nos moldes
actuais tem sido o alheamento de pessoas que pelo seu valor poderiam dar um
contributo útil para o futuro de Portugal, notando-se que a qualidade do
pensamento político da generalidade dos dirigentes partidários mais jovens
deixa muito a desejar se comparada por exemplo com a de Miguel Pinheiro, Sérgio
Figueiredo, Martim Avilez ou Pedro Santos Guerreiro - para só citar algumas
pessoas que têm tido papel de relevo nos meios de informação pública.
Muitas outras personalidades poderiam
ser igualmente citadas, mesmo entre as que se situam em grupos etários mais
elevados, bem como outras mais jovens que começam a despontar e que ainda não
ponderaram a hipótese de emigrar.
Porém parece que estamos num beco sem
saída no que respeita ao aumento do grau de participação política, pois a
solução que evoquei relativamente aos processos eleitorais a nível local quanto
a eleições indirectas está barrada por um limite no que respeita a revisões
constitucionais, uma vez que têm que respeitar o sufrágio directo na designação
dos titulares electivos dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do
poder local.
Um ciclo sem fim á vista, em que as
novas "jerações" se perpetuam sem melhoria da respectiva qualidade ?
4.Fev.2013
________________________________________________________________
Eleições, recenseamento, votações.
Caso
o Tribunal Constitucional não dê provimento a diversas alegações de
inconstitucionalidade que eventual e provavelmente lhe sejam presentes a
propósito da inconstitucionalidade da "troikada" lei de reorganização
territorial das Freguesias haverá que tomar providências no sentido de o
recenseamento eleitoral ser reajustado de acordo com o novo mapa de Freguesias
e de "Uniões de Freguesias" - ("troikada" porque decorreu
de iniciativa estrangeira, com cumplicidades nacionais, visando reduzir a
"enorme" quantia dos cerca de 200 milhões de Euros de encargos com as
Freguesias, sem curar de saber se os custos sociais e políticos justificariam
tão apressada e mal baseada reforma, que vai aumentar ainda mais o
distanciamento entre cidadãos e eleitos).
O
reajustamento que será necessário é devido ao facto de muitos eleitores mudarem
de "freguesia" e de as novas circunscrições passarem a ter eleitos
que representam os cidadãos correspondentes a um território maior, sendo assim
obrigatória a determinação de novos mapas de representantes locais.
Por
outro lado, o facto de a estrutura do recenseamento eleitoral assentar desde
2008 (por lei aprovada por unanimidade na Assembleia da República) na
transposição automática dos dados de identificação civil (Cartão de cidadão ou
Bilhete de identidade) dos cidadãos maiores de 18 anos de idade obrigará a que
os Números de Eleitor sejam modificados também nas
freguesias que se mantenham mas sejam agregadas, de
modo a que os cadernos eleitorais possam reflectir os novos conjuntos de
cidadãos eleitores mesmo que não venha a haver grandes modificações nos locais
habituais de voto.
Acresce
que para efeitos de notificações pelo correio relativamente a novas
"freguesias" e a Números de Eleitor irão verificar-se dificuldades caso
os Códigos Postais não sejam ajustados adequadamente pelos CTT, pois poderá
ocorrer que a metodologia seguida por esta empresa no desenho do mapa nacional
daqueles códigos não se coadune com a nova reorganização territorial.
Todas
estas questões deveriam estar estudadas pelo Governo e pelo Parlamento logo a
partir do momento em que foi decidido propor-se um novo mapa territorial, bem
como muitas outras com elas relacionadas, como por exemplo com o facto de as
freguesias constituirem a base de inúmeras operações de natureza estatística,
esperando-se que a recente criação de uma estrutura temporária composta por 5
Secretários de Estado (dos quais um acaba de se demitir) e 7 Directores-Gerais
consiga realizar o trabalho que devia estar a ser prosseguido há mais tempo -
conforme a quantidade e qualidade das entidades que a compõem fale por si
quanto ao nível das dificuldades suscitadas pelas questões referidas - e que
não deixarão de ter alguma tradução nos meses que precederão as eleições
previstas para o corrente ano quando "freguesias" em
"desaparecimento" serão solicitadas a colaborar em diversas das
necessárias operações preparatórias.
Entretanto
a opinião pública continua a ser agitada por questões que recorrentemente são
levantadas em anos com eleições previstas, incidindo sobre a provável
existência de muitos emigrantes no recenseamento eleitoral, mas esquecendo que
foi o Parlamento que unanimemente estabeleceu o princípio anteriormente
referido quanto ao uso dos dados de identificação civil, o que terá continuado
a permitir que portugueses habitualmente
radicados no estrangeiro declarem ter a sua residência no território nacional.
Este
problema ´poderia ser colmatado em sede de revisão constitucional, com o sugeri
nestas net-páginas e na imprensa já em 2011, através da aplicação do princípio
de não serem contabilizadas as abstenções, o que não prejudicaria as eleições
em círculo nacional (único) como o são as do Presidente da República e dos
Deputados ao Parlamento Europeu, e introduziria maior justiça nas eleições de
Deputados à Assembleia da República, na medida em que a distritos com maior
emigração - onde há muitos eleitores não residentes habitualmente - não seriam
atribuídos mais Deputados do que os que correspondessem ao verdadeiro
"peso" eleitoral dos respectivos círculos, argumento que seria
igualmente válido para as eleições locais (nestas, contribuindo-se para um
correcto ajustamento do número de eleitos).
(Por
feliz coincidência de opiniões o anterior Presidente do CDS/PP, Dr.Manuel
Monteiro, apresentou em 2012 na sua tese de Doutoramento propostas análogas,
que aliás tem vindo a defender em diversas intervenções públicas).
Haveria
entretanto que manter uma excepção quanto ao número de Deputados pelos círculos
da emigração, para os quais se manteria o actual sistema, bem como nos
referendos, para cuja validade a Constituição impõe que a participação seja
superior a 50 por cento dos inscritos, e obviamente instituir limites mínimos
de eleitos em cada circunscrição.
Assim,
os mapas de eleitos seriam elaborados a seguir à publicação dos resultados
oficiais de cada círculo - e não antes, como sucede actualmente.
Aguardemos
que o Parlamento se pronuncie sobre todas estas questões ...
27.Jan.2013.
___________________________________________________
O "Tratado
orçamental" e os 4 mil milhões.
Muito discretamente
entrou em vigor no passado dia 1 de Janeiro o "Tratado orçamental"
que institui regras ainda mais apertadas no que respeita ao equilíbrio
orçamental e ao "peso" da dívida pública nos Estados-membros que o
ratificaram, entre os quais Portugal (aliás o primeiro a fazê-lo), regras essas
que produzem efeitos no direito nacional o mais tardar em 1 de Janeiro do
próximo ano.
É estabelecido um
limite estrutural para o desequilíbrio das contas públicas que não deverá
exceder 0,5 % do produto interno bruto (PIB) a preços de mercado, em prazo que
será proposto pela Comissão Europeia tendo em conta os riscos para a
sustentabilidade específicos do Estado-membro, e deve ser reduzida
progressivamente a dívida pública para o limite de 60% do PIB - acções que
segundo a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) ao Parlamento implicarão
uma consolidação orçamental adicional que deverá obrigar a excedentes primários
mais elevados, superiores a 4% do PIB até 2020.
.
Por outro lado seria
essencial assegurar uma taxa de crescimento do PIB que permitisse assegurar uma
diminuição acentuada da dívida pública - e a título de exemplo o retorno aos
níveis de 60% que se constatavam antes de 2007 só seria possível em 2035 se tal
taxa fosse de 5% ao ano !
Estes dados ajudam a
compreender a razão do atabalhoamento governamental ao encomendar um estudo ao
FMI (esquecendo que seria mais lógico solicitá-lo a alguém da "casa
europeia", ou seja à Comissão dado que a esta entidade competirá analisar
os riscos de sustentabilidade tal como expresso no Tratado em causa), e ao
divulgá-lo de modo tosco, acompanhado da convocação de cerca de 30 pessoas para
de modo igualmente artesanal discorrerem sobre a reforma do Estado - que não passariam
de reduções drásticas de despesas no valor dos muito anunciados 4 mil milhões
de Euros..
É que se constatou
que o desequilíbrio do orçamento de natureza estrutural é de tal modo elevado
que só pode ser diminuído através de mais impostos - que causam ainda maior
arrefecimento na economia, que em vez de crescer se retrai - ou de redução da
despesa pública.
Daí a necessidade de
à pressa se obterem diminuições substanciais nas despesas do Estado. Daí o tal
valor dos 4 mil milhões de Euros, que permitiriam (por certo ainda acompanhados
por alguma e ainda significativa carga fiscal) uma apresentação de contas já
dentro dos primeiros passos (de Coelho...) no sentido da consecução dos
objectivos fixados no Tratado.
E tudo isto apoiado
naqueles que acreditam que a redução do desequilíbrio orçamental permitirá o
propalado "regresso aos mercados" dentro de poucos meses
transformando a Banca portuguesa num enorme motor de crescimento, apoiada por
fluxos de investimento estrangeiro que verão em Portugal um "El
dorado" para os seus lucros...
Mas - e os
portugueses ? Os que emigram, os que estão desempregados sem perspectivas, os
pequenos empresários falidos, os que não conseguem crédito para o
desenvolvimento, os mais idosos sem apoios, os doentes?
Serão "pequenos
pormenores" de um "ajustamento" feito à pressa? Esquecendo a
necessidade de uma verdadeira participação das pessoas na definição de
alternativas e de modos para serem obtidas por forma mais gradual e justa ?
Esquecendo que há
instrumentos na União Europeia que permitiriam a concessão de investimentos às
pequenas e médias empresas susceptíveis de reanimarem a economia e o
crescimento, sem prejuízo dos esforços de ajustamentos nos desequilíbrios
orçamentais dos Estados-membros. E, no caso português, só agora
"descobrindo" a necessidade de um Banco de Investimento - mas apenas
para administração de reduzidos fundos europeus de apoio estrutural.
Tudo isto é mais uma
demonstração de um exercício de poder governamental que apesar de tentar
demonstrar boa vontade tem sido caracterizado por navegar à vista e com a
simplória ilusão de que os "mercados" vêm aí e rapidamente para nos
ajudar.
19.Janeiro.2013.
___________________________________________________
Jardim condecorado com uma medalha
militar...
Segundo o Decreto -Lei n.º 316/2002,
de 27 de dezembro, as medalhas privativas do Ministério da Defesa Nacional, do
Estado-Maior-General e dos ramos das Forças Armadas destinam-se a galardoar os
militares
e civis, nacionais ou estrangeiros,
que, no âmbito técnico-profissional, revelem elevada competência,
extraordinário desempenho e relevantes qualidades pessoais, contribuindo
significativamente para a eficiência, prestígio e cumprimento da missão do
Ministério da Defesa Nacional, do Estado-Maior-General das Forças Armadas ou do
respectivo ramo.
É de realçar, desde já, que o
respectivo âmbito se circunscreve à área técnico-profissional...
Segundo a imprensa, de que li
atentamente diversas versões credíveis para ter a certeza de que não estava a
ser alvo de uma burla - tão comum nos tempos que correm - o Presidente do
Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, foi agraciado recentemente
com a medalha militar da Cruz de S. Jorge, de primeira classe, imposta pelo
Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, em "reconhecimento pelos
serviços prestados que em muito contribuíram para a eficiência e cumprimento
das Forças Armadas Portuguesas na Madeira", e que foi entregue em
cerimónia pública onde estiveram presentes o Representante da República, o
Presidente da Assembleia Legislativa, e o Bispo do Funchal, além de outras
individualidades.
O Chefe de Estado-Maior General das
Forças Armadas, terá dito durante a cerimónia respectiva nutrir pelo governante
madeirense "respeito e admiração", reconhecendo-lhe
"carisma", "patriotismo", "prestígio",
"pragmatismo", acrescentando tratar-se de um "verdadeiro líder,
homem de honra e de uma só palavra", realçando também a
"postura" do Presidente do executivo madeirense em matéria de
cooperação institucional com os três ramos das Forças Armadas.
Cabe assim recordar, dado que a
memória colectiva por vezes é curta, os múltiplos comportamentos pautados por
profundas grosserias relativamente a diversos dos mais altos responsáveis do
Estado demonstrados por aquele agente público, bem como os reiterados
despautérios em matéria de gestão dos réditos públicos, e o inconcebível
comportamento institucional face a um dos anteriores Comandantes da Zona
Marítima da Madeira que apenas procurava cumprir várias disposições legais.
Para além do espírito da lei apontar
para ser necessário o exercício de qualidades pessoais no âmbito técnico-profissional
- não constando que o Presidente do Governo Regional em causa tenha
desempenhado funções de tal tipo - os encómios proferidos na cerimónia pelo
Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas parecem ser notoriamente
desajustados face ao perfil da personalidade agraciada.
O tempora ...
13.Janeiro.13
___________________________________________________
Recapitalizações bancárias.
Parece que o Governo não tirou as
ilações necessárias da desastrosa nacionalização do BPN, cujos resultados
negativos continuam a estar presentes e pelos vistos sem muitas hipóteses de
solução para os "enormes "buracos" financeiros que contribuem
para o agravamento das contas públicas.
Isto, a propósito da utilização na
recapitalização do Banco Internacional do Funchal (BANIF) de 1100 milhões de
Euros ainda disponíveis para tais efeitos no quadro do "Memorando de
entendimento" firmado em Maio de 2011.
Aparentemente o motivo que terá levado
o Governo a tal decisão terá sido o receio de falência do BANIF, e o eventual
efeito de uma "corrida aos depósitos" no sistema bancário, motivo
aliás semelhante ao invocado pelo Governo de então quanto ao BPN, rejeitando as
propostas apresentadas por Miguel Cadilhe para evitar a nacionalização -
estando ainda por conhecer outras razões porventura ligadas à influência de
muitas personalidades relevantes nos meios políticos e empresariais com
notórios interesses na SLN, cuja osmose com o BPN era bem conhecida.
Diversos analistas nestas áreas
consideram que o BANIF não tinha hipóteses de sobrevivência, e que a presente
operação não as irá aumentar, pelo que o capital de 1100 milhões de Euros,
acrescido dos juros de cerca de 400 milhões que lhe serão devidos pelo facto de
se tratar de um empréstimo internacional, acabará por ser um´- mais um - ónus
para os contribuintes, que assistirão impotentes à sua provável venda a troco
de algumas toneladas de bananas madeirenses ou dos seus equivalentes
monetários...
Não esqueçamos entretanto que um dos
conceitos de base que terá presidido à elaboração do já famoso "Memorando
de entendimento" assenta na pressuposição de que com o "regresso aos
mercados" na sequência dos equilíbrios do orçamento e da balança de
pagamentos será possível à Banca financiar-se no exterior do país e fora do
quadro transitório dos empréstimos do BCE, sendo-lhe então possível conceder
mais créditos financeiros, nomeadamente ao tecido empresarial.
Esta perspectiva contribui talvez para
explicar as razões que têm levado o Governo a adiar a constituição de um Banco
de investimento, pois este acabaria por retirar aos bancos tradicionais parte
importante da respectiva capacidade creditícia. E também ajuda a compreender os
motivos que estarão na base do aparente desinteresse por um aumento do recurso
ao BEI - Banco Europeu de Investimento, quer directamente, quer através da
pressão sobre o Conselho Europeu e sobre a Comissão Europeia (aliás parece que
está lá em funções uma conhecida personalidade portuguesa...) no sentido de ser
demonstrada a vantagem de um papel mais preponderante no financiamento da
economia numa Europa em notória recessão.
E tal, sem prejuízo das disposições
que visem atingir os necessários e imprescindíveis equilíbrios tanto de
natureza orçamental como de proporção de despesa pública face ao PIB.
Será que estas observações querem
dizer que o sistema económico e financeiro da União Europeia (e a nível
mundial) está excessivamente dependente da Banca privada, pois quando treme
acaba por ter que recorrer a formas de recapitalização que não passam de nacionalizações
parciais - directas ou indirectas ?
6.Janeiro.2013
010108
010108