Textos e outros documentos : 2013.

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Um Pacto. E o espírito europeu ?
Desde Março do corrente ano que um grupo de europeus e de Fundações com sede na União Europeia tem vindo a reflectir sobre a necessidade de se formular um "Novo Pacto para a Europa", na sequência de múltiplos debates e encontros que se desenrolariam de acordo com um programa que será apresentado publicamente muito em breve (entre outros meios de difusão, em www.newpactforeurope.eu ).
Já foram identificadas por aquele grupo de entidades 5 opções possíveis para debate (admitindo-se evidentemente que possam surgir outras), e que vão desde a retracção para uma "União mínima" até às perspectivas ambiciosas de um plena União consolidada.
Parece-me, porém, que algo falta de essencial na discussão do que somos e do que podemos vir a querer ser, e a que já me tenho referido em "pontos de vista" publicados nestas net-páginas: trata-se de chegarmos a um consenso sobre o que se poderá definir como o "espírito europeu", sem o que qualquer debate enfermará do elemento agregador que caracteriza a Europa.
É que, tal como mencionei anteriormente, não foi por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era mundial, foram precisamente dedicados ao tema do "Espírito Europeu", vindo a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de instituições europeias que - na minha interpretação - procuravam assumir um papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção de diversas nações europeias no mundo procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade. 
Porém as diversas formas de que se foi revestindo a cooperação comunitária que viria a dar origem ao que agora se designa por União Europeia terão perdido grande parte do fio condutor do pensamento algo idealista que caracterizou a tentativa de definição de tal espírito, o que por certo contribuiu para uma formatação em que os aspectos de mercado passaram a ser determinantes para a construção de uma unidade europeia, a que se agregaram as naturais dificuldades decorrentes das imigrações de culturas mediterrânicas e da falta de debate aprofundado sobre tal situação.
Acresce uma ausência de reflexão sobre o funcionamento dos sistemas políticos, dado o crescente distanciamento em diversos Estados-membros entre eleitores e eleitos que levam a que a delegação política seja sentida como insuficiente face à necessidade de participação local, em sociedades que cada vez recebem mais e melhor informação.
Sem uma reflexão séria sobre o que pode ser considerado como um "novo espírito europeu" as opções possíveis para o novo pacto na União arriscam-se a cair por falta de adequado sentimento agregador.
Tal reflexão deve constituir elemento prévio de ponderação em todos os debates, pois sem ela a União Europeia poderá ser uma jangada, mas nunca será um navio.
29.12.2013.

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O Governo dos Juízes...

... E as Presidências dos Reformados.

Eis o Estado de Portugal, pois por um lado as Presidências da República, e da Assembleia da República, são exercidas por personalidades que optaram por auferir pensões de reforma em vez dos salários de função, e por outro lado os Juízes do Tribunal Constitucional apontam ao Governo e ao Parlamento caminhos de governação.

Caminhos que na passada semana vieram à superfície quando aquele Tribunal considerou inconstitucionais as normas que previam uma redução significativa das pensões atribuídas pela Caixa Geral de Aposentações dos funcionários do Estado, tendo em vista uma aproximação entre os critérios seguidos na respectiva determinação e os observados no regime geral de Segurança Social, sendo tais inconstitucionalidades verificadas por se tratar de um medida avulsa e não inserida numa perspectiva integrada dentro de um conceito global e unificado de um sistema de protecção público de pensões.

Tal sistema, segundo o Tribunal, deveria compreender uma solução estrutural, destinada a atingir uma sustentabilidade abrangendo igualdade proporcional e solidariedade entre gerações, pelo que poderiam até justificar a revisão de pensões já atribuídas, dadas diversas alterações de circunstâncias - demográficas, económicas e financeiras.

Provavelmente maravilhado com o facto de um Tribunal ter sugerido a adopção de disposições governativas de carácter estrutural, o Primeiro-Ministro apressou-se a referir que iria seguir tal caminho, esquecendo-se porém de mencionar que já por diversas vezes se tinha pronunciado pela necessidade de "reformas estruturais", tendo inclusivamente solicitado a um seu Ministro de Estado, há quase um ano, que procedesse a estudos em tal área.

Tal Ministro - entretanto "promovido" a Vice-Primeiro-Ministro - acaba de produzir então um "Guião" que por certo contem as orientações e metodologias necessárias e suficientes para se resolver em curto prazo o problema financeiro causado pela decisão do Tribunal.

Metodologias de carácter estrutural, como é evidente.

22.Dezembro.2013.

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Uma gaiola dourada.

Conforme noticia a Imprensa, por despacho conjunto dos Ministérios da Administração Interna (MAI) e da Defesa Nacional foi nomeado o ex-director nacional da PSP Paulo Gomes para oficial de ligação do MAI na embaixada de Portugal em Paris. Tal posto terá sido criado especialmente para Paulo Gomes, que apresentou recentemente a demissão do seu cargo na PSP, na sequência dos incidentes ocorridos na manifestação das forças de segurança junto ao Parlamento.

Seja qual for a explicação que o Ministro da Administração Interna dê no Parlamento - onde aliás também deveria ser solicitado apropriado esclarecimento ao Ministro dos Negócios Estrangeiros - anota-se desde já a inconsistência aparente do procedimento desde que se deram os incidentes na escadaria de acesso ao Parlamento, começando por uma demissão não explicada, para depois se dar uma substituição igualmente surpreendente e, para finalizar, uma nomeação para uma "gaiola dourada", pois se tratou da criação de um lugar aparentemente destinado a uma pessoa definida, sem concurso público ou sequer existência de um comunicado explicativo - este, o mínimo que se poderia esperar de um governo que quisesse ter uma aceitável política de informação.

Tudo poderá levar a crer que Paulo Gomes tenha solicitado directivas precisas para fazer face a uma situação que poderia degenerar em violência, dada até a existência de antecedentes de tal ordem em manifestação anterior há alguns anos, e que tais directivas não lhe tenham sido dadas com clareza, pelo que terá assim apresentado a sua demissão.

Ficaria assim bem visível o possível sentimento de culpa do Ministro M.Macedo que o terá levado a conseguir a criação de um cargo em tão anómalas circunstâncias, prosseguindo assim uma política de emigração dos nossos melhores quadros...

Esperemos entretanto que nas escadarias de acesso ao edifício da Assembleia da República não surjam tabuletas indicando "Paris - 1750 km".

15.Dezembro.2013.
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Fredrik de Klerk.

O falecimento de Nelson Mandela suscitou um enorme pesar à escala mundial, que não podia deixar de ser subscrito por quem advogasse e advoga os princípios de igualdade entre os seres humanos, e que se recordasse do modo como conduziu uma sociedade dividida em termos rácicos até um patamar democrático perdoando anos e anos de opressão a uma parte do povo sul-africano subjugada por uma minoria.

No entanto muitos tendem a esquecer o papel que em tal transição foi desempenhado por Fredrik de Klerk, e o facto de o prémio Nobel da Paz lhe ter sido atribuído em conjunto com Nelson Mandela em reconhecimento pela sua acção em prol do termo do "apartheid".

É justo, assim, recordar também Fredrik de Klerk, que conseguiu conquistar a minoria "branca" para o processo de transição, e aceitando com a maior dignidade passar a ser o Vice-Presidente de Nelson Mandela após o período de transição para um regime plenamente democrático.

É igualmente imperioso lembrarmos, a propósito da acção visionária de F.De Klerk, a irredutibilidade de António O.Salazar no que respeitaria a um processo de transição no império colonial, cuja inevitabilidade se desenhava com a independência da União Indiana e posteriormente das possessões francesas na Ásia e África.

Irredutibilidade que viria a caracterizar do mesmo modo a governação de Marcelo A.Caetano, que ainda recebeu o poder político a tempo de tentar uma solução democrática que, aplicada em Portugal e nas regiões ultramarinas, pudesse assegurar um futuro sem a eclosão de guerras civis naqueles territórios e a instabilidade que ainda se vive em alguns deles.

E, diga-se, sem as dificuldades que caracterizaram a vida da jovem democracia portuguesa, e cujo processo de maturação política está longe de ser concluído, como o demonstram as graves dificuldades em que nos encontramos, e o crescente desânimo e emigração existentes.

8.Dezembro.2013.

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Francisco - o primeiro sucessor de Pedro ?

A notável Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium” é um documento que sai dos parâmetros habituais relativamente aos de natureza doutrinal produzidos pela Igreja Católica, e constitui um desafio a mudanças de atitudes e comportamentos de crentes e não-crentes, desafio que é de saudar vivamente, pois não se apoia sobre qualquer perspectiva de superioridade moral.

Privilegia a atenção aos desprotegidos, nomeadamente os pobres, as mulheres, e as crianças, apelando também a que os jovens possam ter um maior protagonismo e que sejam chamados a participar mais activamente na construção da sociedade.

Considera assim que até que não se melhorem radicalmente os problemas dos pobres não se resolverão os problemas do mundo, e recorda serem duplamente pobres as mulheres que sofrem situações de exclusão, maus tratos e violência, apelando a que haja mais políticos que tomem verdadeiramente a peito tais questões.

Recorda os mais fracos: “os sem-tecto, os dependentes de drogas, os refugiados, os povos indígenas, os idosos cada vez mais sós e abandonados” e os migrantes, relativamente aos quais se exortam os Países “a uma abertura generosa”.

Critica fortemente o sistema económico adoptado na maioria das sociedades políticas actuais, que considera ser injusto logo de raiz, fazendo prevalecer a lei do mais forte, de uma "nova tirania invisível, por vezes virtual” de um “mercado divinizado”, onde reinam a “especulação financeira”, a “corrupção ramificada”, e a “evasão fiscal egoísta”.

No plano das relações com outras comunidades religiosas, lembra que nesta época adquire especial importância a relação com os crentes do Islão, pois "diante de episódios de fundamentalismo violento” há que “evitar odiosas generalizações, porque o verdadeiro Islão e uma adequada interpretação do Alcorão se opõem a toda a violência”, e que “o diálogo inter-religioso” é ” uma condição necessária para a paz no mundo” - sem esquecer igualmente a importância da troca de pontos de vista entre crentes e não-crentes (como é o meu caso) .

No plano interno da Igreja Católica, e coerentemente com o que é anteriormente referido, aponta-se como desejável uma comunidade “ferida e suja por ter saído pelas estradas" em vez de uma Igreja preocupada com o "pragmatismo incolor" da sua vida quotidiana e o cuidado ostensivo da liturgia, lembrando que  o cristianismo "não dispõe de um único modelo cultural” e que o rosto da Igreja é “multiforme”, afirmando que não "podemos esperar que todos os povos, para expressar a fé cristã, tenham de imitar as modalidades adoptadas pelos povos europeus num determinado momento da história".

Não deixa de criticar o "individualismo pós-moderno e globalizado", que "promove um estilo de vida que perverte os vínculos familiares”, concluindo que se alguém "conseguir ajudar pelo menos uma única pessoa a viver melhor, isto já é suficiente para justificar o dom" da sua vida.

Documento abrangente, não esquece o mundo global, a política, a economia, a justiça, e os não católicos, apelando a que a Igreja Católica mude grande parte das suas atitudes para poder assim aumentar a sua autoridade moral para lutar pelos nobres princípios que acabo de salientar.

A concluir, sentir-me-ia-me tentado a opinar que - embora não tenha o conhecimento suficiente da História da Igreja Católica para poder fundamentar tal afirmação - Francisco será o sucessor de Pedro que melhor terá interpretado a doutrina atribuída a Jesus de Nazaré.

1. Dezembro.2013.

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Quem guarda os guardas ?

(Quis custodiet ipsos custodes?)

Esta preocupação, que remonta a Juvenal e à República socrático-platónica, veio à superfície da política portuguesa quando no final da manifestação de descontentamento de diversas forças policiais ocorreram incidentes que por ultrapassarem os limites legais deveriam ter sido reprimidos por ... forças policiais, o que não sucedeu.

O Ministro da Administração Interna, na sequência do ocorrido, aceitou o pedido de demissão do Director Nacional da PSP, ao que consta devido ao facto de este Oficial não ter cedido a pressões do Ministro para demitir dos seus cargos os responsáveis pelas forças policiais que teriam a obrigação de reprimir os infractores e que não o fizeram.

Foi então designado um novo Director Nacional, que exercia as funções de comandante da Unidade Especial de Polícia - curiosamente a Unidade a que pertenciam as forças que não exerceram as funções citadas, e cujos comandantes seriam obviamente os alvos das pressões ministeriais.

Recordemos que há alguns anos ocorreu uma situação algo semelhante na Praça do Comércio, em que manifestantes de forças de segurança foram objecto de vigorosa intervenção repressiva por parte de unidades especiais da Polícia, o que causou algum traumatismo psicológico nesta força de segurança pública.

Estes acontecimentos fazem-nos reflectir sobre aquela velha preocupação de Sócrates, e pensar seriamente como tentar evitar que tais situações se repitam - evidentemente num quadro de diálogo entre o "patronato governamental" e os sindicatos policiais que tenha em consideração as dificuldades e escolhos que se deparam aos agentes de segurança pública, e sem que lhes sejam conferidos privilégios sentidos como excessivos pela opinião pública.

Atrevo-me pois a sugerir que a postura das autoridades políticas, no caso de manifestações públicas das forças de segurança, seja a de responsabilizar previamente os organizadores respectivos pela manutenção da ordem e pelo respeito da propriedade pública e privada, tal como o têm vindo a fazer diversas organizações sindicais, em colaboração com os responsáveis policiais, e evitando situações de potencial confronto como as que ocorreram frente ao Parlamento.

Como é evidente, deveriam estar sempre disponíveis forças policiais que rapidamente pudessem acorrer em casos em que os elementos de segurança e enquadramento dos manifestantes não conseguissem evitar incidentes.

Estas questões tornam-se mais candentes num momento em que personalidades conhecidas da vida política apelam à demissão do Governo e à renúncia do Presidente da República, ouvindo-se igualmente alusões a "pauladas" no caso de não tomarem tal iniciativa.

E são questões sensíveis que não se resolvem com as tradicionais demissões de responsáveis.

24.Novembro.2013.
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Junta de Freguesia: a primeira reunião.

Distrito de Lisboa, Novembro de 2013.

No final do dia realiza-se a primeira reunião pública da nova Junta de Freguesia de uma "União de Freguesias" resultante da agregação de três autarquias, na sequência de uma reorganização administrativa resultante do Memorando de Entendimento entre a República Portuguesa e três entidades internacionais, assinado em 2011.

Duas das três Freguesias agregadas tinham cerca de 20 mil eleitores cada, o que levou a que a União respectiva ficasse a abranger aproximadamente 45 mil eleitores.

Dir-se-ia assim que o público presente naquela primeira reunião seria numeroso, até pela natural curiosidade decorrente de se tratar de um acto diferente dos precedentes, e de ter sido anunciada com antecedência nos lugares habituais e nas net-páginas das Juntas anteriores.

Porém, à presença de toda a Junta, composta agora por 7 pessoas, correspondeu a população com a assistência e participação de - imagine-se - 2 cidadãs e 1 cidadão (nenhum deles sendo jovem...).

Parece evidente que o cenário descrito seria outro se as recentes leis relativas às finanças locais, atribuições, competências e recursos das Freguesias contemplassem uma forte descentralização que trouxesse para os órgãos de poderes Local responsabilidades acrescidas.

Mas as modificações nas leis anteriores foram tímidas, o que levou a que a participação potencial dos eleitores na vida política local tenha sofrido mais um rude golpe, que aliado à monstruosidade da criação de freguesias com população superior à de diversas cidades faz temer que um dos sustentáculos da democracia - o Poder Local - venha a sucumbir penosa e tristemente, apesar dos esforços e evidente empenhamento dos novos eleitos.

Os responsáveis por este golpe na Democracia foram também os que permitiram a extinção de pequenas Freguesias no interior do nosso país, e que eram - com custos reduzidíssimos - um dos poucos meios de contacto entre uma população desprotegida e a Administração Central.

Resta saber quais as poupanças de gastos públicos nesta reorganização (talvez não superiores a 5 ou 10 milhões de Euros), para nos interrogarmos sobre a respectiva eficácia, tanto administrativa como política.

17.Novembro.2013.

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União Europeia: os fracassos de Lisboa.

Em Março de 2000 foi aprovada pelo Conselho Europeu, em Lisboa, uma estratégia com o objectivo de transformar a Europa na economia do conhecimento mais competitiva e mais dinâmica do mundo.

Ficou a ser conhecida por "Estratégia de Lisboa".

Em Dezembro de 2007 foi assinado, também em Lisboa, um complexo acordo que alterou os dois principais Tratados da UE: o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia, tendo este passado a chamar-se Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, Tratados que entraram em vigor em Dezembro de 2009 (já em plena crise financeira internacional...).

Este conjunto de Tratados passou a ser designado por Tratado de Lisboa.

Anote-se que o Tratado contem um conjunto de disposições específicas para os Estados-Membros cuja moeda seja o euro, tendo entretanto sido aprovado (tendo para tal bastado 12 Estados...) mais um Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (vulgo "pacto orçamental"), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2013.

Lisboa está assim infelizmente associada a um processo de ambição excessiva por parte dos dirigentes europeus, que não cuidam de saber se o que laboriosamente aprovam tem consistência, ou de acompanhar e melhorar a execução do que foi acordado.

Ambição excessiva que tem sido permitida pelo afastamento dos cidadãos relativamente a uma maior participação na vida política.

E se no que respeita à "Estratégia de Lisboa" se teria podido esperar que a nossa capital pudesse ter um papel incentivador de tais acções, dada a associação do nome a tais responsabilidades, papel que necessariamente se teria de revestir de alguma informalidade, já no que se refere ao Tratado de Lisboa tal posição deveria caber nomeadamente à Comissão Europeia, pois compete-lhe velar pela aplicação dos Tratados, e principalmente porque a crise financeira afectou e muito a capacidade da União, em especial quanto à zona Euro.

Curiosamente, Comissão Europeia presidida por alguém que transitou do Governo de ... Lisboa.

Porém o Tratado da União Europeia contém uma disposição que permite a revisão dos Tratados: o artigo 48.º prevê que qualquer Estado-Membro, o Parlamento Europeu ou a Comissão podem submeter ao Conselho projectos de revisão dos Tratados.

Eis o que um corajoso Presidente da República, um Primeiro-Ministro decidido, uma Assembleia da República vertical, poderiam fazer neste momento difícil para a União e para Portugal.

A partir de - Lisboa.

10.Novembro.2013.
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A Constituição dos EUA e as comunicações electrónicas.

O Ministério da Justiça dos EUA acaba de notificar um acusado de que as provas contra ele obtidas tiveram origem em escutas e intercepções de correio electrónico que não tinham sido objecto de prévia autorização judicial.

A defesa provavelmente recorrerá para o Supremo Tribunal pondo em causa a constitucionalidade de tal procedimento, permitindo que aquela instância máxima de Justiça se pronuncie sobre uma matéria fundamental em termos de direitos dos cidadãos.

Parece assim oportuno recordar que a Constituição dos EUA, já nas suas primeiras versões, outorgava ao Congresso os poderes para criar postos de correio e vias para distribuição postal - algo que não figura na grande maioria dos textos constitucionais de outros Estados.

O facto de a própria Constituição se referir expressamente ao correio acentua a importância que este teve na consolidação federal de um tão extenso território, o que obviamente incluiria a existência de punições severas para quem usasse o correio para fins ilegais, proibindo-se igualmente as autoridades postais de violar a correspondência.

O mundo evoluiu entretanto em largos passos, mas os princípios constitucionais mantêm-se, e a interpretação que o Supremo Tribunal dos EUA não poderá deixar de fazer assentará por certo na avaliação do conceito de correspondência como meio de transmissão de informação, seja por meios telefónicos, audio-visuais, e outros sistemas electrónicos, designadamente o correio por esta via.

Os princípios por que se regem os Estados democráticos incluem igualmente o de as polícias deverem requerer prévia autorização judicial para, com base em indícios apropriados, poderem proceder a vigilância de actividades suspeitas de poderem perturbar as leis em vigor, pelo que se aguardará com interesse a evolução deste assunto num país que ultimamente tem apresentado sinais preocupantes de comportamentos paranoicos e contraditórios - seja na liberdade de posse de armas, seja na longa manutenção de detidos sem julgamento imparcial, ou em desaparecimentos - discretos ou não - de opositores.

03.Novembro.2013.

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A revisão constitucional.

Tendo já passado 5 anos sobre a última revisão constitucional, a Assembleia da República tem novamente poderes para proceder a uma revisão ordinária do seu texto (independentemente da possibilidade de em qualquer momento o fazer desde que decidido por maioria de quatro quintos dos Deputados em efectividade de funções).

A Constituição impõe "limites materiais" para a sua revisão, sendo a grande maioria consensual, havendo contudo alguns que poderão suscitar reservas a uma minoria de cidadãos, como será o caso dos que advogam o estabelecimento de um regime monárquico hereditário.

Porém, no que respeita à designação dos titulares electivos dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local é estabelecido que deverá ser observado o sufrágio universal e directo, excluindo-se assim a possibilidade de haver eleições indirectas, como passou a ocorrer após o "susto" provocado pelas eleições presidenciais de 1958, em que se admitiu a hipótese de que caso o recenseamento e as eleições tivessem sido verdadeiramente livres Humberto Delgado as teria vencido.

Ora a possibilidade de haver eleições indirectas no quadro de um regime democrático caracterizado pela existência da liberdade política não deveria assustar ninguém, e a meu ver é das poucas perspectivas existentes para se obter a tão desejada aproximação entre eleitores e eleitos, bem como para melhorar o funcionamento do sistema partidário.

Se, como já tenho vindo a afirmar por diversas vezes nestas páginas, o colégio das Assembleias de Freguesia pudesse eleger por exemplo um Senado com poderes importantes no processo legislativo, ou uma parte dos Deputados do Parlamento, haveria por certo efeitos positivos destas eleições indirectas no desejado processo de aproximação entre os cidadãos e os seus representantes electivos, bem como uma melhoria do diálogo com as estruturas partidárias a nível local.

As outras hipóteses que têm vindo a ser propostas visando o reforço da citada aproximação e de que há conhecimento público mais alargado, desde os círculos uninominais à ordenação preferencial dos candidatos nas listas apresentada, estão em meu entender longe de poderem provocar os efeitos pretendidos.

Dir-se-á: mas que fazer, dada a impossibilidade constitucional de haver limites materiais para a revisão constitucional, entre os quais figura o do sufrágio universal ?

Há dias, em debate na SEDES sobre a desejabilidade de uma reforma do sistema político, o ex-Deputado Joaquim Ventura Leite focou o impasse político que se vive na presente crise financira e económica, referindo a propósito - tanto quanto julgo ter compreendido - que uma via para o resolver seria uma candidatura independente às próximas eleições para o cargo de Presidente da República, baseada num projecto de referendo assente numa proposta de novo texto constitucional.

Porém, o texto constitucional apresenta aqui uma nova blindagem, pois a proposta de referendo, mesmo que provenha de grupos de cidadãos, tem que ser aprovada pela Assembleia da República; e, mesmo que fosse de iniciativa governamental, não poderia incluir alterações à Constituição...

Em conclusão: não há via legal para uma melhoria do regime democrático, condicionado que está pela notória incapacidade de os partidos políticos se aproximarem dos cidadãos e de encontrarem soluções de transformação do seu funcionamento.

A única possibilidade de fomento da aproximação entre eleitores e eleitos é assim a de um "enorme aumento" das atribuições, competências e recursos do poder local, esperando-se que de tal modo se acabe por conseguir a desejável "osmose" entre partidos e cidadãos que a tal nível permitirá a modificação e aperfeiçoamento do funcionamento partidário.

Seria lenta. Chegaria a tempo ?

27.Outubro.2013.

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A forma do Estado, e os "kids".

Já decorreu um ano desde que o Primeiro-Ministro anunciou solenemente que o Governo iria proceder a uma profunda "refundação" do Estado, a concluir até 2014, e que ao Orçamento do Estado para 2013 seria acrescentado "um corte permanente de cerca de quatro mil milhões na despesa pública".

No início do corrente ano declarou o Primeiro-Ministro que o então Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas, fora encarregado de apresentar o que classificou como "guião" para a reforma do Estado, o que até ao momento não ocorreu, tendo ciclicamente vindo o Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho, a afirmar que o citado "guião" seria apresentado muito em breve - isto, já mesmo depois de Paulo Portas ter passado a exercer o novo cargo de Vice-Primeiro-Ministro.

Tal circunstância repetiu-se há poucos dias, tendo os portugueses tido que assistir ao triste espectáculo de o responsável pelo Governo referir publicamente que o Senhor Vice-Primeiro-Ministro iria apresentar muito em breve o famoso "guião", como que atirando culpas para o "outro menino", tal jogo de "kids"...

Se para a elaboração de um documento onde se anunciarão grandes princípios e métodos para uma reorganização que dê outra forma ao Estado é necessário esperarem-se longos meses bem podermos imaginar quantos mais serão necessários para a sua discussão pública e apreciação parlamentar, para além das que competem ao Conselho de Estado e Conselho Superior de Defesa Nacional, para não se mencionarem os outros múltiplos órgãos que não podem deixar de ser chamados a opinar, pelo que se afigura impossível o respeito dos prazos enunciados há um ano (tendo um deles sofrido já um retardo de um ano...).

A não ser que o Governo, e a maioria parlamentar, queiram impor tal reorganização sem qualquer análise pública do seu teor...

Penoso desempenho este, o de dois "kids" que não se entendem - perante um país que atónito observa um modo de governação que muitos classificariam como displicente e irresponsável - mas não irrevogável.

20.Outubro.2013.
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Abstenção: apenas um aviso ?

Os resultados até agora conhecidos relativamente ao escrutínio provisório dos resultados das recentes eleições para as autarquias locais suscitaram um quase unânime coro de preocupações sobre a abstenção, que teria sido enorme, e a maior até agora nesse tipo de actos eleitorais. 

Se bem que ainda faltem os resultados de diversas eleições locais que, principalmente devido a empates técnicos, tenham que ser repetidas até ao próximo dia 20 de Outubro, podem extrair-se desde já algumas conclusões, e recordar-se alguns factos essenciais para a comparação de resultados com eleições análogas anteriores.

O primeiro facto a salientar é que o universo eleitoral mudou substancialmente em 2008, devido a uma Lei que determinou que o recenseamento seria automaticamente feito a partir da base de dados dos bilhetes de identidade e cartões de cidadão, o que fez aumentar os recenseados nalgumas centenas de milhar, muito provavelmente emigrantes que continuaram a manter tais documentos - se bem que na esmagadora maioria não se desloquem ao território nacional para exercer o direito de voto (o que aliás seria algo incongruente, em particular no caso de autarquias).

Desde modo, o que terá algum sentido será a comparação entre o número real de votantes ao longo dos últimos anos, em que terá havido alguma estabilização no funcionamento do sistema democrático, infelizmente bem longe do entusiasmo com que se viveram as primeiras eleições baseadas num universo verdadeiramente abrangente e longe das restrições que vigoraram até 1974.

Constata-se assim que desde 1999 o número de votantes no território nacional em eleições legislativas e autárquicas oscilou entre 5,2 e 5,7 milhões de eleitores, sendo precisamente nas autárquicas de 2001 que ocorreu a participação menos elevada, apenas superior em 200 mil à constatada há 2 semanas.

Embora nas eleições autárquicas de 2009 tenham votado cerca de 5,5 milhões de eleitores, não se deve porém esquecer que desde então se terá acentuado um elevado movimento emigratório, que segundo declarações do Secretário de Estado das Comunidades em 25 de Janeiro passado terá sido nos últimos anos da ordem dos 100 a 120 mil por ano.

Se admitirmos assim que nos primeiros 9 meses do ano em curso (e tendo presente que segundo o Governo a situação económica portuguesa melhorou...) terão emigrado apenas 50 mil portugueses chegaremos à conclusão de que desde 2009 - data das anteriores eleições autárquicas - se pode estimar que cerca de 350 mil cidadãos não puderam exercer agora o seu direito de voto no território nacional, dos quais provavelmente metade (correspondente à média habitual de abstenções) não o faria deliberadamente.

 A conclusão global que se pode retirar é a de que ainda há mais de 5 milhões de portugueses que acreditam na democracia representativa, número que se tem até agora revestido de alguma estabilidade.

Porém, é crescente o desencanto que é sentido com o desempenho dos responsáveis políticos em geral, bem como dos partidos em que se apoiam - e estes não parecem compreender que são necessárias melhorias profundas na ligação entre eleitores e eleitos, que não podem deixar de passar por um outro exercício das atribuições do poder local, a base essencial da democracia.

13.Outubro.2013
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Uma República envergonhada.
A um cancelamento de um Feriado nacional de importante significado em
termos de soberania do povo, e praticamente imposto pelo Poder
suserano estrangeiro, sucederam-se umas envergonhadas comemorações
oficiais despidas de participação popular, bem como do simbolismo que
continua a faltar nas sedes dos principais orgãos de representação do
Estado.

A noção de República está indelevelmente associada à que decorre da
Democracia, pois o governo da "coisa pública" não deve deixar de ser
exercido pelos representantes livremente eleitos pelo povo, pelo que
as eleições que acabam de ocorrer se revestem de um acrescido
significado, na medida em que as escolhas eleitorais ocorrem num
ambiente de uma relativa maior proximidade entre votantes e
candidatos.

Porém a taxa de participação continua a estar muito longe da
constatada em 1976, salientando-se que nas eleições autárquicas de há
4 anos houve cerca de 5,5 milhões de
votantes, enquanto nas de há
uma semana votaram 5 milhões, ou seja menos 500 mil, situação para a qual terá
contribuído o elevado número de emigrantes (talvez mais de 200 mil) que
desde as últimas eleições saíram do país.

A abstenção real não terá assim aumentado tão significativamente como
tem sido aventado, pelo que
se poderá supor que os portugueses ainda acreditam nas virtualidades do
sistema democrático, apesar de ser voz comum o desencanto com o desempenho
dos partidos políticos.

Isto, apesar de a recente "reorganização" administrativa das
freguesias ter contribuído para um maior afastamento entre eleitores e
eleitos, como se constata por
exemplo na de Algés, que tinha cerca de
20 mil eleitores, tendo passado a integrar uma União que no seu total
abarca mais de 40 mil, o que mostra bem o quanto de negativo há na lei que
forçou tal reorganização, pois a desgnação "freguesia" tem a sua origem em
"frequência", associada a uma sociabilidade dificilmente atingivel com tais
números e com a extensão territorial respectiva.

Assim é difícil melhorar a qualidade dos representantes eleitos, pois
a participação na vida política é obviamente limitada, não sendo
possível conseguir-se aquela desejável "osmose" entre partidos e
cidadãos que permitiria um melhor funcionamento da Democracia.

Só com uma profunda revisão constitucional se poderá melhorar um
sistema político classificado de doente por muitos, e tal só é
susceptível de ocorrer na sequência de graves crises, como o comprovam
as que ocorreram após 1822, e mais recentemente em 1910, 1933, e 1974.

Ocorrerá alguma nos próximos anos ?

5 de Outubro. 2013.
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Conselho de Coordenação da Coligação.

Decorreu um um ano após a criação de um "Conselho de Coordenação da Coligação", em acordo firmado entre o Partido Social-Democrata e o Centro Democrático Social, através do qual os dois partidos reafirmavam "o seu empenhamento na responsabilidade orçamental, nas reformas estruturais e na equidade da repartição dos esforços, princípios que permitem a Portugal vencer a crise e impulsionar uma trajectória de crescimento sustentável".

Um mês depois o Ministro de Estado e das Finanças, Vítor Gaspar, pedia a demissão do seu cargo, episódio  de que apenas houve conhecimento público em meados do corrente ano, aquando da sua saída do Governo, a qual esteve na origem de uma forte crise política.

Certamente que o Presidente da República estaria informado de tal pedido de demissão, na medida em que o facto de afirmar não ter sido informado pelo anterior Primeiro-Ministro de situações importantes terá contribuído para uma maior deterioração das relações institucionais respectivas e para a aceitação do respectivo pedido de demissão, facto que aparentemente não terá ocorrido com o conhecimento da situação demissionária de Vítor Gaspar.

Deduz-se também que o Conselho Coordenador da Coligação (CCC), nomeadamente ao nível dos seus mais altos responsáveis, saberia do facto insólito de se manter em funções um Ministro que pedira a demissão de funções de elevadíssima responsabilidade nas áreas orçamental, das reformas estruturais e na equidade da repartição dos esforços, sem se notarem inflexões políticas que lhe permitissem continuar no cargo com pleno empenhamento.

Deduz-se igualmente que o CCC não terá ficado surpreendido com a aceitação do pedido de demissão do Ministro Vítor Gaspar, e que estaria preparado para uma rápida resolução da crise política que lhe sucedeu.

Tais deduções parecem afinal incorrectas, pois parece ao fim e ao cabo que o Conselho Coordenador da Coligação nada coordenou nem aconselhou - quiçá nunca terá tido nenhuma reunião para além da primeira...

Igualmente parece que o Primeiro-Ministro, enquanto também primeiro parceiro do CCC, nada coordenou com o seu par, nem com ele se aconselhou, nem este terá tomado qualquer iniciativa relevante no mesmo sentido, preferindo de surpresa (ou talvez não, se recordarmos a posição pública tomada em Abril passado quanto ao que ficou conhecido como a TSU dos pensionistas) detonar uma crise política cujos resultados orçamentais - e não apenas estes - poderão vir a ser mais gravosos para os portugueses.

Resta saber se o Presidente da República esteve a par do que ia ocorrendo, ou se também apenas sabia pelos meios de informação pública.

Em conclusão: há coordenação na coligação ? Seja qual for a resposta, o que parece haver é falta de sentido de Estado num triângulo institucional que deveria corresponder de outro modo às suas responsabilidades.

29.Setembro.2013.

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Portugal Europeu - e agora ?

Decorreu há uma semana o Encontro em epígrafe, em que perante mais de mil participantes foram debatidos diversos aspectos decorrentes da participação de Portugal na União Europeia, em sessões animadas por pessoas de reconhecido mérito, conforme se pode constatar na respectiva agenda.

Porém terá faltado na agenda, segundo penso, uma relevante questão: existe um "espírito europeu" susceptível de ser a base de uma União de Estados da Europa ?

É certo que houve uma sessão sectorial, em que se discutiu se haveria uma cultura europeia, porém numa óptica diferente da que deveria decorrer da análise da existência de uma identidade transnacional, pelo que salvo intervenções pontuais de uma assistência que curiosamente era muito maioritariamente composta por pessoas de idade aparentemente inferior a 50 anos se falou de uma União à luz dos parâmetros que a têm vindo a sustentar, e não se abordou adequadamente o que pode caracterizar a existência de um pensamento comum sobre uma união europeia.

Pensada tal união na perspectiva de se obterem condições que evitassem conflitos sangrentos como os que abalaram a Europa nos últimos séculos, terá faltado a procura de pontos comuns que permitissem a evolução de afirmações de exclusão do que não seria desejado - o conflito militar - para o que poderiam ser pontos comuns de acordo sobre o que deveria ser procurado - a identidade cultural possível, e o decorrente projecto comum.

Esta procura, necessariamente ajustada à constatação das mutações induzidas pelas fortes migrações de raiz islâmica, bem como às que ocorreram e ocorrem a partir de Estados situados nas periferias leste e sul, deveria levar à redefinição dos actuais Tratados, assentes então em princípios que não deixarão de reconhecer que uma união europeia só muito lentamente poderá evoluir de uma concertação de Estados em que é relevante o primado da economia para se transformar, através da livre circulação de pessoas e da troca de ideias que só os sistemas democráticos são capazes de proporcionar, numa união política de povos e nações.

União política que nas condições actuais não pode deixar de ter apenas a ambição de evoluir gradualmente e de evitar fracturas que ponham em causa o sentimento de uma identidade europeia entretanto reencontrada e aperfeiçoada.

22.Setembro.2013.
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Candidaturas saltitantes.

Foi conhecida há poucos dias a decisão do Tribunal Constitucional que permite que um ex-Presidente de Câmara Municipal se candidate, após três mandatos consecutivos numa autarquia, a idênticas funções numa outra análoga.

Creio que terá sido esquecida não só pelo Tribunal como também pela grande maioria dos cidadãos que o espírito da Constituição aponta para que os candidatos aos órgãos de uma autarquia tenham residido e continuem a residir na respectiva área, se bem que a lei eleitoral não o indique expressamente por, ao que julgo saber, se recear que em muitos casos de pequenas freguesias não existissem candidatos em número suficiente.

Porém, o espírito da lei e do senso comum aponta precisamente no sentido da vinculação de candidaturas à residência no território eleitoral respectivo, pois doutro modo e por exemplo um cidadão romeno poderia apresentar-se à eleição em Portugal mesmo que a sua residência habitual fosse no seu país de naturalidade, apenas sendo necessário que estivesse inscrito no recenseamento eleitoral, tal como os mandatários, e não necessariamente na área de candidatura, onde apenas estes ultimos teriam que residir...

Por outro lado, e como é expresso na mesma lei eleitoral, acresce que os proponentes da candidatura devem fazer prova de estarem recenseados na área eleitoral em causa - como é lógico

Poderia dizer-se que em muitos casos não haveria candidatos residentes, mas com a recente redução do número de pequenas freguesias tal possibilidade terá ficado mais limitada, acrescendo que a lei prevê que na inexistência de candidaturas seja o órgão executivo assegurado por uma comissão administrativa provisória nomeada pelo Governo, sendo por outro lado muito pouco provável que tais inexistências ocorressem ao nível dos municípios.

Tribunal Constitucional e opinião pública terão, creio, caído na armadilha de se concentrarem apenas numa perspectiva da Constituição, esquecendo o fundo do problema: a essência do Poder local.

E assim temos agora que lidar com a existência de uma nova classe nas classificações de emprego: presidente de Câmara Municipal e presidente de Junta de Freguesia, que percorrerão o país oferecendo os seus préstimos.

Talvez um dia o Parlamento acorde e pense nestas questões...

15.Setembro.2013.
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PIDE, jornalismo, e História.
Segundo veio a público na imprensa, o jornalista José Milhazes irá apresentar em breve um livro em que se refere aos arquivos da "PIDE-DGS" no qual entre outras afirmações "conta ainda o episódio vivido por um agente soviético, Guenrikh Borovik, que, passando por jornalista, em Maio de 1974, entra com "facilidade" na sede da PIDE em Lisboa, na companhia de um português, tendo "roubado" o próprio cartão de identidade de Silva Pais, o director da então polícia política, apesar de ter sido revistado pelos militares do Movimento das Forças Armadas que guardavam o edifício.".
É assim oportuno mencionar que nos arquivos do Centro de Documentação 25 de Abril (Universidade de Coimbra) consta no "Espólio 111" a existência do "Bilhete de Identidade de Silva Pais, director da PIDE/DGS", conforme se pode verificar a partir daqui.
Não se pode exigir a um jornalista que seja um historiador, porém os textos que publica são objecto de análise por historiadores credenciados, que por certo não deixam de os comparar com outras fontes.
Porém, uma vez publicados em livro, entram no circuito de referências bibliográficas, pelo que acontece com frequência que o contraditório só surja noutro livro muito tempo depois, situação que leva a que se forme no imaginário colectivo uma ideia que não corresponde plenamente à verdade, a qual, quando se torna pública, já ocorre em momento tardio demais para se corrigirem totalmente erros de natureza histórica.
A Internet permite que se faça uma correcção mais imediata e susceptível de aferição por entidades apropriadas, que no caso presente não deixariam por certo de verificar se o alegado cartão de identidade de Silva Pais não seria por exemplo o de associado de uma eventual associação desportiva dos funcionários da polícia política...
Fica assim registada, por este meio, a dissonância entre dois testemunhos que mostram a diferença entre o imaginário e a realidade.
A palavra aos historiadores.
8.Setembro.2013
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Eleições, e Poder Local
É inconcebível que a menos de um mês das eleições para os órgãos das autarquias ainda não tenham sido publicadas as novas leis reguladoras das atribuições e competências respectivas, bem como dos respectivos regimes financeiros.

Não é possível que os candidatos possam preparar seriamente as suas campanhas e apresentar-se  às eleições tomando apenas como base os textos dos documentos aprovados na Assembleia da República há apenas um mês.

Tais textos demonstram aliás que pouco se avançou na transferência de poderes a partir das Assembleias e Câmaras Municipais numa perspectiva de reforço das atribuições e competências das Assembleias e Juntas de Freguesia, não tendo sido certamente por acaso que uma das Propostas de Lei iniciais mencionava no seu título a expressão "regime jurídico" para depois na versão final vir a ser substituída por "regime financeiro".

Parente pobre do sistema democrático, as Freguesias continuam longe de ser a essência do Poder Local, que mais do que nunca em momentos de crise como os que se vivem deveria ser a base de um democracia que está longe de se realizar plenamente na mera representação eleitoral, relegando para plano secundário a participação de base - a que é essencial na construção democrática.

A poucos meses do quadragésimo aniversário da queda do "Estado Novo", sombrios presságios decorrem de eleições que serão por certo pouco concorridas, e de uma complexa situação financeira envolvendo a elaboração de um Orçamento sem se terem dados fundamentados que permitam saber como se obterão adequados financiamentos de Estado para o segundo semestre de 2014.

01.Setembro.2013.
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    Razões para uma abstenção.
    Faltam cinco semanas para a realização das eleições para as autarquias locais, e poucos dias para que seja conhecida a decisão do Tribunal Constitucional sobre a admissibilidade de apresentação de candidaturas de cidadãos que exerceram funções de presidência de Câmaras Municipais ou de Juntas de Freguesia durante os três últimos exercícios numa mesma autarquia.
    A grande maioria dos Deputados deixou que se arrastasse o problema da citada admissibilidade, decorrente de uma lei obviamente mal redigida pois deu origem a diversas interpretações judiciais, não só ao nível de primeira instância com também ao de Relação, tendo que se aguardar até agora por uma decisão que respeita não apenas a alguns mas sim a muitos casos, com todo o desprestígio para o processo eleitoral decorrente deste arrastamento.
    Por outro lado, e como já o referi nestas páginas, o "Memorando de entendimento" sobre o programa de assistência financeira à República Portuguesa deu origem a um processo de agregação de freguesias que, aprovado por maioria parlamentar,  levou a que por exemplo algumas que abarcavam 20 mil eleitores fossem forçadas a uniões da ordem dos 50 mil - mais do que os existentes em muitos municípios.
    Foi assim consumada mais uma agressão ao Poder Local, base sem a qual a Democracia deixa de ser um processo de verdadeira participação política privilegiando o mero sistema representativo, tão criticado - até pela generalidade dos cidadãos com responsabilidades políticas - por manter os eleitos afastados dos eleitores.
    Não tenho assim alternativa para um escolha consciente de quem me pudesse representar ao nível de Assembleia de Freguesia, pois não me é possível em poucos dias conhecer candidatos oriundos de zonas mais afastadas, bem como os programas com que se apresentem.
    O voto em branco seria uma possibilidade, mas corresponderia, no meu entender, à aceitação de um modelo que pelas razões que aduzi considero ser uma violentação da essência da democracia, e por outro lado corresponderia a avalizar indirectamente o triste espectáculo que o Parlamento nos ofereceu (sob o olhar complacente do Presidente da República) não só no caso das citadas agregações de freguesias mas também quanto ao processo que aguarda decisão no Tribunal Constitucional.
    É assim que com pena alguém que colaborou na organização das eleições de 1976 não encontra - pela primeira vez - alternativa eleitoral que não seja a da abstenção.
25.Agosto.2013.
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Sobre o Washington Post .

A compra do lendário Washington Post pelo criador e principal accionista da Amazon (J.Bezos) vem criar largas expectativas sobre o futuro dos jornais em suporte papel, pois parece ser o primeiro caso de aquisições deste tipo, dado que até agora se assistia quer à duplicação dos jornais clássicos passando a existir também em formato digital, quer ao seu simples desaparecimento.

A sobrevivência da Amazon enquanto fornecedora de livros "clássicos", se bem que ajudada pela sua expansão ao sistema de vendas de outros produtos com entregas por vias tradicionais, e a sua entrada no mercado das aquisições de livros e outros documentos em formato digital, sobrevivendo bem à concorrência da Google e de outras companhias, faz antever que J.Bezos pense numa nova fórmula que possibilite uma união "papel-digital" susceptível de permitir a sobrevivência dos clássicos jornais num mundo em que a informação corre cada vez mais célere e diversificada.

Parece assim provável que o Washington Post evolua para um modelo dual, em que a informação muito recente apareça na versão digital acompanhada de ligações para documentos e comentários que permitam uma melhor compreensão dos acontecimentos, sempre privilegiando contribuições audio-visuais de alta credibilidade obtidas aquando do respectivo evento; e em que na versão em papel, distribuída de modo que por certo surpreenderá pela imaginação e versatilidade, surgirão análises e debates de maior profundidade.

Em qualquer dos casos, o valor das iniciativas de J.Bezos estará dependente do modo como conseguirá manter o jornalismo tradicional enquanto mediador credível da informação, tanto na versão em suporte papel como na digital.

Num mundo em que se assiste à atomização da informação circulante, que nos avassala em termos quase demolidores, importa cada vez mais dispormos de recursos para nos ajudar a ponderar sobre a credibilidade do que chega ao nosso alcance, bem como a comparar pontos de vista.

Oxalá J.Bezos consiga contribuir para se encontrarem soluções para este tipo de problemas, mantendo a possibilidade de folhearmos um jornal como ocorre com os livros, em que tal perspectiva está por natureza aliada à capacidade de calmamente reflectirmos sobre o que lemos.

18.08.2013.

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Decepções prè-eleitorais.

A "minha Freguesia" aumentou a sua população para mais do dobro, devido à "reorganização administrativa" ocorrida na sequência da aplicação de parte do "Memorando de entendimento" celebrado há cerca de dois anos, visando a obtenção de economias e a racionalização dos gastos públicos (mas deixando intocados os Municípios...).

Passou de um população da ordem das 20 mil pessoas para algo que ronda as 50 mil, conjunto aglomerado sob a designação de "União das Freguesias de (..)", num quantitativo que muitas cidades portuguesas estão bem longe de alcançar.

As candidaturas apresentadas não são do conhecimento da esmagadora maioria dos eleitores, factor agravado pela circunstância de aparecerem agora nas listas respectivas cidadãos obviamente desconhecidos e distantes dos problemas locais.

Acresce a possibilidade de diversos cidadãos verem as suas candidaturas rejeitadas judicialmente a 4 ou 5 semanas do acto eleitoral por força de uma lei obviamente mal elaborada pois permite interpretações sobre a capacidade eleitoral passiva que têm que passar pelo crivo da apreciação da sua constitucionalidade.

Não será assim de admirar que a taxa de abstenção aumente muito, contribuindo deste modo para mais um golpe na confiança que os cidadãos deviam depositar no sistema democrático.

Perfila-se também no horizonte uma reduzida participação nas eleições para o Parlamento Europeu, pois se nas anteriores já tal sucedera, nas que irão ocorrer em Maio do próximo ano não é difícil antever que os eleitores não acreditem que os futuros deputados venham a demonstrar capacidade para atenuarem as dificuldades com que a União Europeia se tem deparado, dado o apagado papel que desempenharam durante a crise que se instalou em força desde o momento em que tomaram posse.

Parece que tanto no caso das eleições locais como no das europeias não há capacidade para que as Instituições políticas promovam a sua auto-reforma, restando aos cidadãos esperar que ocorram acontecimentos que exerçam um papel catalisador susceptível de - com a subsequente e inevitável agitação social - induzirem transformações que introduzam apropriadas modificações no funcionamento das instituições políticas.

11.Agosto.2013.


Offener Brief an das deutsche Volk.

    Caras Alemãs, caros Alemães:

Envio-vos esta carta aberta enquanto europeu e cidadão participante de um projecto comum que visou e visa a construção de uma União política que permita que a nossa Europa assuma um novo papel no mundo, no qual contribua para corrigir os abusos cometidos na expansão imperial que caracterizou grande parte das nações que a compõem.

E, ao mesmo tempo, que aperfeiçoe bases de relacionamento interno que evitem a eclosão de mais conflitos fratricidas como os que permitiram tantas páginas negras na sua História, algumas das quais muito recentemente.

Esta nova Europa não poderá também esquecer que foi graças à criatividade dos seus cidadãos que conseguiu um invejável nível médio de vida, mas que só poderá subsistir se forem assegurados um apropriado crescimento económico, aliado a um necessário equilíbrio demográfico.

Povo Alemão: tendes tido dificuldades em encontrar o vosso lugar na Europa, tendo o recurso à força deixado terríveis recordações que todos temos procurado ultrapassar, inclusivamente ajudando à reconstrução do vosso país quer na ajuda financeira e económica prestada a partir dos anos 50, quer aquando da reunificação dos dois Estados alemães.

O papel da vossa Nação dentro da União Europeia assume agora uma importância histórica, pois deverá procurar um difícil equilíbrio entre o vosso peso na economia, obtido através não só das ajudas prestadas mas também graças às vossas qualidades de criatividade e de trabalho, e a vossa participação numa união política entre Estados com tão grandes diferenças culturais e de desenvolvimento.

Tal importância é acrescida pelo facto de as diferenças relativas ao crescimento terem sido em grande parte devidas a uma crise financeira à qual a União não soube reagir de forma concertada, e para a qual importa encontrar modelos apropriados de resposta que recuperem a confiança dos europeus na união política - sem a qual a maioria dos Estados entrará num caminho de penoso empobrecimento.

Povo Alemão: tendes uma oportunidade única para encontrar o vosso papel na União Europeia, em que o diálogo prevaleça, e em que a cooperação se instale.

As cidadãs e os cidadãos da União Europeia, e da Europa, assim o esperam.

4.Agosto.2013.

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Anos perdidos.

A recente crise política - decretada "resolvida" quiçá para reaparecer aquando da preparação do orçamento para 2014 - veio confirmar alguma falta de qualidade dos actores que nela desempenharam os principais papeis: A.Silva, P.Coelho, V.Gaspar, P.Portas, e A.Seguro, e demonstrar que A.Silva teve responsabilidades determinantes na inacção que permitiu o paradoxo de a formação política que esteve na base da elaboração do "Memorando de entendimento" para a concessão de "assistência financeira" à República viesse a estar ausente do processo de execução respectivo.

Tal demonstração é confirmada pela atitude tomada no início do corrente mês, em que procurou envolver aquela formação num acordo que afinal já deveria ter ocorrido após as eleições de 2011, afastado que tinha sido o principal adversário político de A.Silva: J.Sousa.

Há dois anos A.Silva ainda teria alguma capacidade política para promover um entendimento inter-partidário que se consubstanciaria num programa de governo em que para além do "Memorando" figurasse um pilar notoriamente ausente, que só foi "descoberto" muito recentemente e que consta da carta de demissão de V.Gaspar como "a fase do investimento ! " visando o desenvolvimento e a redução do desemprego, em particular do "desemprego jovem".

Certamente A.Silva, que frequentemente invoca a sua qualidade de economista, estaria já consciente das enormes dificuldades de que se revestiria a preparação do orçamento para 2014, pois na primeira parte do ano ainda a República estaria apoiada pelo Programa de Assistência Financeira, com parâmetros conhecidos, não se dispondo talvez e porém de elementos que permitam perceber se na quase inevitável situação de impossibilidade de "regresso  aos mercados" em condições aceitáveis se poderá recorrer a um sucedâneo que - de modo cautelar ou afoito ... - assegure a probabilidade de sustentação do Estado e a permanência na zona Euro.

Sabe-se lá se desconhecedor do facto de o seu Governo estar a funcionar há vários meses com um Ministro das Finanças demissionário (e continuando o seu papel de missionário), "agarra" a crise política para tentar tardiamente uma solução que lhe escapou, e que já deveria ter tentado - dentro do quadro de referência mental e política em que se tem movido - há dois anos.

Por outro lado, os actores P.Coelho, P.Portas e A.Seguro têm vindo a demonstrar o quão doente está o modelo político português, aparentemente tão constitucionalmente inexpugnável, pois a maioria dos partidos políticos continua anquilosada e distante do povo, prevalecendo a ausência de debate interno e o papel dominante dos seus principais dirigentes.

O dia em que o sistema democrático se aperfeiçoará a partir de uma maior participação de base está aparentemente longínquo. Até lá, será que resistiremos ?

28.Julho.2013.

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Investimento nas PME.


A recente decisão do Banco Central Europeu no sentido de proporcionar condições para mais apoios às Pequenas e Médias Empresas (PME) indicia uma mudança na política relativa ao investimento na União Europeia que
 embora tardia e tímida não deve deixar de ser saudada.

No que respeita a Portugal esta perspectiva vem na senda de uma nova linha de financiamento a PME atribuida pelo Banco Europeu de Investimento, embora 
paradoxalmente tenha sido concedida mediante a garantia do
 Estado 
português.

O paradoxo provem da constatação de ser Portugal o garante de tal 
investimento, em vez de caber tal responsabilidade a apropriado
 mecanismo 
comunitário, como deveria ocorrer numa união em que a solidariedade deveria ser demonstrada de um modo em que os mais fortes proporcionassem ajuda aos que passassem por dificuldades - evidentemente mediante compromissos que demonstrassem o desejo de correcção de problemas de natureza estrutural, e sem que tal implicasse a imposição de sacrifícios excessivos.
Foi aliás a falta desta perspectiva que terá caracterizado negativamente a 
inacção da Comissão Europeia ao longo destes últimos anos, em que aquela 
Instituição perdeu a sua tradicional missão aglutinadora e de correcção de 
desequilíbrios entre os Estados-Membros.
O papel destes dois Bancos - o BCE e o BEI - na retoma do investimento, 
enquanto o sistema bancário tradicional não recuperar o seu equilíbrio (se e 
quando o conseguir...) poderá ser essencial para a retoma da confiança 
financeira, e do investimento subsequente – com os respectivos efeitos no 
emprego, em que as PME têm um papel dominante e fundamentall.
Esperemos que sejam corrigidos os defeitos conceptuais apontados, e que tal ocorra a tempo de produzirem efeitos sensíveis na competividade da União, bem como no emprego, sem o que o projecto europeu pode fenecer,
21,Julho.2013.
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O “constitucionalista”.
Conforme o disposto na Constituição (art.º  195º, n.º2), o Presidente da República só pode demitir o Governo quando tal se torne necessário para assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas, ouvido o Conselho de Estado.
Porém, na sua recente comunicação ao País (que não à Assembleia da República...) o Presidente anunciou que irá dissolver a Assembleia – obviamente na sequência de demissão do Governo - em meados do próximo ano, antevendo assim que as instituições democráticas não estarão em tal momento a funcionar regularmente, e que “ouvirá” previamente o Conselho de Estado.
Não irei usar epítetos  para classificar tal intenção que me valham a instauração de eventual processo pelo Ministério Público, mas não deixarei de me surpreender pelo exercício de adivinhação pressuposto por tal anunciada “irrevogabilidade”, conceito tão na moda desde há dias (e aliás confundido com a noção de irreversibilidade”).
Curiosamente não parece muito claro que numa Constituição tão minuciosa esteja expresso qualquer sistema inequívoco de validação pelo Tribunal Constitucional de um acto decisório tão relevante para o sistema democrático, assim deixado ao arbítrio de uma única pessoa .
Parece porém evidente que tal intenção vai ao atropelo do espírito da Constituição, acrescendo que é formulada por alguém que a tem invocado constantemente, e que talvez tenha como objectivo ressarcir-se de procedimentos ou de inacções que desde 2010 contribuiram para que Portugal se encontrasse na situação politicamente pantanosa em que está, procurando (em fundo inconfessado) levar o Primeiro-Ministro a demitir-se para então promover um “governo presidencial”.
Independentemente dos eventuais méritos e falhas do Governo actual, não deixa de ser  surpreendente o recurso a um “artifício para-constitucional” para forçar a demissão do Primeiro-Ministro, artifício corroborado por outro atropelo à Constituição, pois sendo público que foi apresentada ao Presidente da República uma “solução” governativa que continha diversas propostas de nomeações para o Governo, e estatuindo a Constituição que (art.º 133º) compete ao Presidente nomear e exonerar os membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro, o respectivo silêncio corresponde a uma desautorização deste último.
O objectivo presidencial parece ser assim a formação de um novo governo com apoio expresso da actual maioria e o “apoio implícito” do terceiro maior grupo parlamentar, aliviado por não haver eleições a breve prazo mas satisfeito pela perspectiva de poder vir a dirigir o governo em meados de 2014 (aliás dois meses depois das eleições para o Parlamento Europeu...).
Contornando o estabelecido na Constituição, quer quanto ao momento actual, quer em intenções para o próximo ano, eis um Presidente que deixou de ser “constitucionalista” e que passou das manobras de bastidores à inacção, e desta à hiper-actividade.
Resta saber se em caso de falha destas intenções virá a renunciar ao seu cargo.
14.Julho.2013.
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Personalidade e política.
Decorridos já alguns anos sobre acontecimentos quie moldaram as relações entre os principais responsáveis pela vida política portuguesa é possível tirarem-se algumas ilações sobre o respectivo comportamento e conclusões sobre as respectivas consequências na governação.
O Presidente da República tem vindo a demonstrar traços de uma personalidade desconfiada e insegura, refugiando-se em formalismos e evitando a verdadeira comunicação, como o comprovaram as atitudes tomadas aquando dos aspectos relacionados com a questão do Estatuto da Região Autónoma dos Açores e a inconsistência revelada pelo caso das "escutas", culminando nos episódios que estiveram na origem da queda do Governo.
Nestes, é difícil acreditar que o Presidente desconhecesse que estava a ser preparado um programa de recuperação do equilíbrio financeiro e orçamental (o famoso PEC IV), pois os contactos que a sua Casa Civil certamente manteriam quer com estruturas governamentais quer com a Comissão Europeia teriam sido suficientes para que numa das reuniões semanais com o Primeiro-Ministro lhe suscitar frontal e lealmente a abordagem de tal assunto, evitando assim que corressem informações segundo as quais desconheceria totalmente as diligências do Governo, inclusivamente junto da Chanceler alemã.
Por seu turno, o Primeiro-Ministro demonstrou arrogância em quase todos estes casos, pois o das "escutas" - que marcou o fim da cooperação institucional por parte do Presidente - teria sido resolvido com uma conversa franca em que se demonstraria, e desmontaria, a existência de pequenas intrigas entre gabinetes, e o assunto de Estado que o PEC IV constituia deveria ter sido objecto de trocas de impressões com o Presidente.
A teimosia revelada pelo Primeiro-Ministro em não ter procurado uma fórmula governativa que lhe permitisse a execução do programa financeiro sem recurso ao FMI e apenas com o apoio das Instituições da União deu por seu turno origem a um processo que acelerou de forma quase irreversível o problema das dívidas soberanas, com consequências sobre a credibilidade do Euro, e que teria possibilitado uma resolução circunscrita ao assunto das finanças gregas.
Por outro lado, a ambição desmedida revelada pelo Presidente do Partido Social-Democrata em querer o poder a todo o custo sem curar de saber se dispunha de estruturas políticas sólidas e consolidadas que pudessem ultrapassar as dissensões evidentes no processo que o tinha levado à conquista do poder partidário, ambição essa aliada a um calculismo que o levou a negar a existência de contactos ao mais alto nível sobre a existência do PEC IV, acabou por contribuir para o paradoxo de ter que vir a executar um programa de governo baseado num Memorando que em muito colhia do programa que tinha rejeitado no Parlamento e que levara à queda do Governo.
Finalmente, autismo e vaidade. De quem ? Não é difícil deduzir que se trata das características do Presidente do Centro Democrático e Social, que não hesita em tomar decisões sem consultar os orgãos partidários, e sempre revelando um desejo de sobressair custe o que custar - mesmo que tal tenha o ónus de muitos milhares de milhões de Euros que recairão sobre os bolsos dos portugueses.
Não é assim difícil deduzir o modo como evoluirá a presente crise política...
Calculismo e ambição em doses excessivas, eis o que infelizmente nos esperará até que uma profunda modificação (não disse "revisão"...) constitucional venha a permitir escolhas mais sãs por parte dos portugueses.
7.Julho.2013
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Candidaturas autárquicas: o desprestígio das Instituições.

Como já referi nestas net-páginas, de acordo com a lei eleitoral quaisquer impugnações de candidaturas só poderão ocorrer quando forem apresentadas ao Tribunal da Comarca respectiva , ou seja cerca de 50 dias antes das eleições (em princípios de Agosto), seguindo-se um processo que poderá chegar à interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e cuja decisão final poderá ser proferida apenas a cerca de um mês da data das eleições, com todas as consequências imagináveis nomeadamente no caso de as impugnações abrangerem algumas dezenas de municípios e centenas de freguesias ...

Devido à falta de clareza da mais recente lei em vigor, cedo começou a discussão pública sobre a sua interpretação, não tendo sido surpresa o facto de começarem a ser interpostas em diversos tribunais providências cautelares visando impedir a apresentação de candidaturas de cidadãos mais conhecidos publicamente e que tinham manifestado a intenção de se candidatarem ao cargo de Presidente numa autarquia diferente daquela onde se candidataram (e exerceram as mesmas funções) em três mandatos sucessivos terminado no corrente ano.

Aparentemente a única sentença curial seria a de os Tribunais em causa não apreciarem as providências cautelares, pois os cidadãos em causa só se tornariam candidatos em princípios de Agosto, pois até lá não passariam de "prè-candidatos", situação que poderia ser comum a milhares de pessoas provocando assim milhares de iniciativas análogas junto dos Tribunais...

Porém assistiu-se a tudo, desde algumas decisões naquele sentido, bem como a outras aceitando as providências em causa, e muitas recusando-as - o que só mostra que a lei em questão não era nem é clara - havendo ainda tempo para o Parlamento legislar apropriadamente. 

Tal não ocorreu, pelo menos até agora, assistindo-se a um mútuo assacar de culpas por tal inépcia entre os principais grupos parlamentares, não tendo havido qualquer mensagem do Presidente da República dirigida sobre este assunto ao Parlamento nem aparentemente resultados de algum dos famosos actos de magistratura de influência realizados em termos discretos.

E o Governo, consciente por certo das consequências nefastas que estas questões têm para o um ambiente político que por certo gostaria que fosse calmo na situação difícil que atravessamos, não apresentou nenhuma Proposta de Lei nem terá sensibilizado adequadamente os grupos parlamentares em que se apoia, visando uma clarificação do assunto.

Para agudizar a situação, assistimos a recursos para Tribunais da Relação - a quem a lei eleitoral não confere poderes nestas áreas - com decisões díspares, e para o Tribunal Constitucional, sem que os advogados e gabinetes jurídicos dos "candidatos" tenham compreendido que até meados ou fins de Agosto certamente o Tribunal não poderá conhecer da matéria de fundo.

Depois para "coroar" todo este processo, assistimos a tonitruantes declarações de vitória pelo facto de um qualquer destes Tribunais ter pronunciado uma mera decisão processual sem abordar porém as questões de facto - e uma delas de um cidadão reiteradamente referindo que acontecesse o que acontecesse seria candidato (o que poderá evidentemente ser, pois não pode ou não deve haver acórdãos finais antes de meados de Agosto), e que ganharia as eleições - desrespeitando deste modo a competência do Tribunal Constitucional.

Após a desastrada lei de agregações de freguesias (não se notando publicamente qualquer trabalho das comissões instaladoras das uniões de freguesias, que deveria ter começado já em fins de Maio), só faltava mais este conjunto de episódios para dar uma machadada violenta no Poder Local de base - ao fim e ao cabo o cerne da democracia.

Teremos que aguardar por uma nova modificação constitucional para que estas e outras questões relevantes possam ser corrigidas e que o nosso país volte a respirar a esperança de uma democracia com que tantos sonharam desde 1974 - quase há 40 anos.

30.Junho.2013.

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Brasil - informação, participação e democracia.
As manifestações que têm ocorrido no Brasil constituem também mais um reflexo das consequências do enorme aumento da capacidade de transmissão electrónica de informação por parte de um igualmente crescente do número de cidadãos que a ela passaram a ter acesso.
Tais consequências têm obviamente um efeito mais visível dentro dos países em que existe uma capacidade de comunicação sem barreiras linguísticas, tendo sido notório o seu aproveitamento em campanhas eleitorais como as relativas à Presidência dos EUA e, sob outras perspectivas, no desencadear de movimentos políticos como os que aconteceram em diversos países do Mediterrâneo e do Médio Oriente, em que bastou um incidente para este se transformar num catalisador de múltiplas acções colectivas.

Gerando ou alimentando reacções dos poderes políticos, que vão até à tentativa de identificação de dissidentes (como tem vindo a ser conhecido quanto aos Estados-Unidos, e se sabe que existe em muitos outros, nomeadamente na China, Irão e Coreia do Norte), as chamadas "redes sociais" - com a sua capacidade de recurso à retransmissão de videos e de outras formas de difusão de ideias - constituem um fenómeno que marca a evolução da "aldeia global" de comunicações a que se referia McLuhan, em que predominava uma informação a partir de poucos emissores, para um aumento exponencial destes últimos.

Estes milhões de emissores, por ora ainda muito circunscritos às baias da respectiva língua e país, tendem porém a fazer circular mais a informação que lhes chega, bem como a que se bem que em menor grau produzem, do que propriamente em participar verdadeira e directamente na vida social e política - limitando-se aos contactos no trabalho (quando o têm) e num cada vez mais reduzido grupos de amigos e conhecidos, refugiando-se nas mensagens trocadas nos seus computadores fixos ou móveis, ou absorvendo o que unidireccionalmente lhes é dado a conhecer através da televisão, quer clássica, quer dos videos pela Internet.

E como a participação social verdadeira é cada vez mais reduzida, assim também o é a política, limitada a escolhas eleitorais em que o poder transferido não é depois suficientemente controlado, na medida em que os instrumentos legais para tal existentes são igualmente pressentidos como distantes e associados a conceitos de uma democracia formal cada vez menos participativa - a qual só o poderá verdadeiramente ser se tiver a sua base no poder local.

Daí o êxito de manifestações convocadas a partir da ocorrência de um por vezes pouco provável catalisador, e cujo êxito corresponde à transferência para a rua dos sentimentos de incapacidade de participação para corrigir injustiças que os poderes eleitos rapidamente esquecem uma vez instalados.

Daí o "efeito Brasil".

23.Junho.2031.
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À descoberta das "Descobertas".
Deixo por agora de lado as reflexões que tenho vindo a fazer nomeadamente sobre sistemas eleitorais, questões europeias, assuntos de natureza económica e alguma política nacional, para breves incursões sobre outras perspectivas de natureza mais prática.
À generalidade dos visitantes de Lisboa é habitualmente sugerida uma deslocação à zona de Belém, abarcando o Padrão dos Descobrimentos, a Torre de Belém, o Museu de Marinha e o Mosteiro dos Jerónimos, sendo habitual constatarmos o grande número de viajantes que percorrem a pé tal circuito.

O citado percurso poderia ser enriquecido se estivesse atracada na Doca do Bom Sucesso uma das réplicas das Naus existentes em Portugal, assim demonstrando a epopeia dos nossos antepassados e complementando de tal modo a lição de História implícita no conjunto monumental daquela área.

Do mesmo modo, e sem retirar ao Museu de Marinha e às suas colecções a sua importância no contexto das expedições portuguesas, poderia o conteúdo do actual Museu de Arte Popular ser transferido para outro edifício apropriado, e nele instalado um Museu dos Descobrimentos, dada a sua localização à beira-rio entre o Padrão e a Doca do Bom Sucesso.

Nesse novo Museu caberia por certo um modelo dos continentes por onde os portugueses deixaram marcas da sua presença, com miniaturas nomeadamente das fortalezas, igrejas e outras construções arquitectónicas de maior importância, bem como as respectivas fotografias, em ligação com pequenas salas onde se poderiam apreciar visitas virtuais que em casos mais relevantes como os de Malaca, Goa e Macau permitissem apreciar através de meios audio-visuais a herança cultural deixada.

E, obviamente, com especial relevo para os Estados pertencentes à Comunidade dos Povos de Língua Portuguesa.

A presença na Internet estaria disponível nas línguas de maior difusão, sendo dado especial relevo a um sítio que como o do European University Institute permitisse explorações mais aprofundadas, e também uma pequena Biblioteca com as principais obras de referência - naturalmente existentes também na Loja do Museu.

Quando recordamos o enorme investimento feito no novo Museu dos Coches, em fase de conclusão, e observamos o ar algo perdido dos viajantes que se deslocam do Padrão dos Descobrimentos para a Torre de Belém (frequentemente "enganados" pelo molhe leste da Doca do Bom-Sucesso), não podemos deixar de pensar que até nestas áreas parece que nos esquecemos que Portugal assumiu um papel proeminente no mundo, ao contrário de outras nações que cultivam o apreço pela sua História.

16.Junho.2013.

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Bacalhau à Brás.

Dois discursos: um provável, outro real.

O primeiro, provável, proferido na presença do Príncipe-Regente D.João aquando da inauguração do Hospital Real da Marinha, em Novembro de 1806, em edifício sito no Campo de Santa Clara, em Lisboa, teria sido em termos de que se aventa o seguinte extracto:

"Na minha qualidade de Ministro da Marinha e do Ultramar não quero deixar de manifestar a Vossa Alteza o meu profundo reconhecimento pelo inequívoco apoio prestado para a concretização do Hospital Real da Marinha, aspiração do meu antecessor nesta pasta, D.Rodrigo de Sousa Coutinho, a quem presto desde já a minha homenagem pela visão que caracterizou e caracteriza esta iniciativa da construção do primeiro edifício que no nosso Reino foi destinado a hospital."

O segundo, real (mas não sob o conceito de "realeza", antes sob o da "realidade") foi há três dias proferido pelo Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada aquando da cerimónia correspondente ao fecho das instalações do Hospital da Marinha, no Campo de Santa Clara, em Lisboa, e em termos que por certo não deixarão de ser considerados como reacção ao inopinado cancelamento da prevista presença do Ministro da Defesa Nacional, J.Aguiar Branco.

Eis os termos aproximados do final da curta declaração:

"Como as cozinhas do Hospital já não estarão a funcionar na próxima semana, aproveito a presente quinta-feira para degustar o bom Bacalhau à Brás que a seguir será servido, honrando a cultura naval e o bom gosto dos marinheiros que no mar ou em terra lutaram para que esta casa fosse sempre o seu porto seguro e fazendo votos para que o seu próximo abrigo assegure apoio a todos, em especial os que mais dificuldades sentem."

9.Junho.2013
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Um espírito europeu.

Regresso ao tema que abordei há algumas semanas, mencionando então que não foi por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era no Mundo, foram precisamente dedicados ao tema "Espírito Europeu", vindo a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de instituições europeias que procuravam assumir um papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção de diversas nações europeias no mundo procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade.

Talvez não tenha sido também por acaso que os passos que se deram cerca de dez anos depois visando a construção de uma união europeia acabaram por reflectir as naturais dificuldades que resultavam de não ser fácil identificar a existência de um "espírito europeu" comum a tantas nacionalidades, culturas e estados, pelo que se optou pela perspectiva de se dar prioridade à construção de um mercado comum visando em primeiro lugar reduzir as possibilidades de confrontos militares, em vez de se iniciar desde logo um caminho de uma Europa sem fronteiras que fomentasse o intercâmbio do pensamento e permitisse então uma melhor percepção de um espírito europeu - este então capaz de abrir caminho para uma União Europeia mais sólida, e de se apresentar ao resto do mundo como um farol no caminho para a democracia e liberdade política.

É certo que grande parte do resto do mundo, não o esqueçamos, não deixa de recordar o papel que diversos estados europeus tiveram nos últimos cinco séculos, impondo a sua presença militar à grande maioria das nações, em que genocídios e escravatura não deixaram de marcar presença, e digladiando-se ao mesmo tempo na Europa em ferozes confrontos que de modo nenhum poderão ter constituído exemplo, conflitos esses em que foi relevante o papel de ditaduras e de posições de natureza étnica e confessional que ainda há poucos anos observámos nos Balcãs e em outras áreas da Europa.

E, contudo, sentimos que há um "espírito europeu" latente na grande maioria dos nossos cidadãos, assente em valores de tolerância, de fraternidade, e de liberdade política, sem cujo aprofundamento será difícil solidificar a actual União Europeia.

Não poderemos porém deixar de dizer ao mundo que lamentamos os aspectos negativos dos contactos que com outras nações e povos mantivemos, e que estamos empenhados em contribuir para que num globo cada vez mais interdependente se imponham os valores que defendemos.

Sem que tal "espírito europeu" esteja mais presente nos nossos pensamentos, os dirigentes da União Europeia - nomeadamente os futuros - dificilmente poderão tirá-la da situação pantanosa em que se encontra.

Cabe aos pensadores, e aos cidadãos em geral, reflectirem publicamente sobre estas questões, pois sem a consciência desse espírito não haverá uma Europa, mas apenas um continente europeu.

Portugal, donde partiram as primeiras caravelas, e que foi o último império a terminar a colonização política, poderá iniciar um encontro europeu para debater estas matérias. Onde ?

No simbolismo de Sagres.

2.Junho.2013.
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Confiança e investimento.

Moeda, confiança, crédito, bancos, investimento, crescimento, sustentabilidade: este conjunto de palavras está associado ao sentimento de crise financeira e económica que perpassa por muitos países, e aos quais diversos Estados-Membros da União Europeia não estão incólumes, em particular e de forma mais acentuada alguns da Zona Euro.

Nota que enquanto as atenções a nível mundial estão mais centradas sobre as questões de natureza financeira, em particular sobre os aumentos de dívida, poucas iniciativas se notam no  que respeita não só à análise das modificações climáticas e suas correlações nomeadamente a partir de 1960 mas também à ausência de acções que possam evitar que daqui a algumas dezenas de anos se torne muito difícil viver no nosso planeta.

Como já tenho vindo a referir nestas páginas, as sociedades humanas tendem a pautar a sua acção mais pela pela correcção dos erros cometidos do que pela tomada de medidas preventivas que possam minorar as eventuais consequências de tais erros.

Tal atitude acontece devido não só a uma perspectiva de pensamento no futuro limitada à vida provável da geração seguinte, eventualmente também na dos netos, como também pela falta de informação e de educação nestas matérias.

Acresce que os sistemas políticos estão baseados quer em modelos de alternância potencial centrada em prazos da ordem dos quatro ou cinco anos, quer em sistemas autoritários cuja maior preocupação é a sustentação no poder, o que tanto num como noutro caso faz relegar para segundo plano o problema de fundo: estamos num navio, a Terra, que pode não vir a ter perspectivas de navegar calmamente caso não se adoptem acções que reduzam tal possibilidade.

Não parecendo provável que as consequências nefastas do aumento do efeito de estufa tenham o mesmo impacto simultaneamente em toda a Terra, assistir-se-à a tentativas locais de correcção que apenas adiarão por pouco tempo os desastres  de natureza global, em que mesmo uma acção de emergência concertada  a nível dos dirigentes e dos povos a nível mundial terá poucas probabilidades de resultar trazendo como consequência uma deterioração das condições de vida difícil de imaginar, e de que a vida na Beijing agora superpoluída é uma pálida amostra.

As soluções para este problema são de lenta aplicação, e passam - curiosamente - por acções que são de duas ordens:
- o aumento da educação e da informação;
- e o aumento da participação política de base, que ajudará à disseminação da informação.

Umas e outras permitirão aos dirigentes propor acções que gradualmente corrijam os motivos que estão na base da deterioração da vida na Terra, e que serão deste modo melhor aceites pelos povos.

19.Maio.2013.
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Clima: previsões, acções e reparações.



Martin Wolf, respeitado autor de textos e comentários sobre questões relacionadas com os sistemas económicos e financeiros, voltou agora (Financial Times, 15.Maio,2013) a um assunto que já tinha antes abordado:  as alterações climáticas resultantes da acção humana, verificáveis pelo aumento da percentagem de dióxido de carbono na atmosfera.

Nota que enquanto as atenções a nível mundial estão mais centradas sobre as questões de natureza financeira, em particular sobre os aumentos de dívida, poucas acções se notam no  que respeita não só à análise das modificações climáticas e suas correlações nomeadamente a partir de 1960 mas também à ausência de acções que possam contribuir para que daqui a algumas dezenas de anos se torne muito difícil viver no nosso planeta.

Como já tenho vindo a referir nestas páginas, as sociedades humanas tendem a pautar a sua acção mais pela pela correcção dos erros cometidos do que pela tomada de medidas preventivas que possam minorar as eventuais consequências de tais erros.

Tal atitude acontece devido não só a uma perspectiva de pensamento no futuro limitada à vida provável da geração seguinte, eventualmente também na dos netos, como também pela falta de informação e de educação nestas matérias.

Acresce que os sistemas políticos estão baseados quer em modelos de alternância potencial centrada em prazos da ordem dos quatro ou cinco anos, quer em sistemas autoritários cuja maior preocupação é a sustentação no poder, o que tanto num como noutro caso faz relegar para segundo plano o problema de fundo: estamos num navio, a Terra, que pode não vir a ter perspectivas de navegar calmamente caso não se adoptem acções que reduzam tal possibilidade.

Não parecendo provável que as consequências nefastas do aumento do efeito de estufa tenham o mesmo impacto simultaneamente em toda a Terra, assistir-se-à a tentativas locais de correcção que apenas adiarão por pouco tempo os desastres  de natureza global, em que mesmo uma acção de emergência concertada  a nível dos dirigentes e dos povos a nível mundial terá poucas probabilidades de resultar trazendo como consequência uma deterioração das condições de vida difícil de imaginar, e de que a vida na Beijing agora superpoluída é uma pálida amostra.

As soluções para este problema são de lenta aplicação, e passam - curiosamente - por acções que são de duas ordens:
- o aumento da educação e da informação;
- e o aumento da participação política de base, que ajudará à disseminação da informação.

Umas e outras permitirão aos dirigentes propor acções que gradualmente corrijam os motivos que estão na base da deterioração da vida na Terra, e que serão deste modo melhor aceites pelos povos.
19.Maio.2013.
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                                Conselho Europeu: sem ambições.

Prevista para o corrente mês, a habitual reunião periódica do Conselho Europeu apresenta-se com uma agenda cujo conteúdo indiciaria um estado da União sem problemas estruturais, na medida em que é dedicada à política energética e à luta contra a evasão fiscal, assuntos que embora relevantes estão longe do que os cidadãos esperariam que fossem debatidos.

A questão da energia tem sido periodicamente suscitada por D.Barroso, aparentemente quando não dispõe de outra que lhe seja agora possível apresentar, e que constituiu aliás uma das suas preocupações quando iniciou, há quase 10 anos, o seu consulado presidencial após e segundo Miguel Frasquilho ter "desiludido os portugueses" ("Jornal de Negócios", 3.5.2013).

A luta contra a evasão fiscal é também e aparentemente proposta por V.Rompuy, que acaba de afirmar que "após três anos de emergência, de combate ao incêndio e de sacrifícios, a paciência começa a faltar e a fadiga instala-se" (ibidem), compreendendo-se assim com mais clareza a razão de uma agenda exangue.

Não admira assim que uma grande parte dos britânicos sinta que só têm a perder com a manutenção da sua presença na União Europeia, e que se continue a assistir , segundo as sondagens do Eurobarómetro, ao avolumar do desânimo dos cidadãos da União no que respeita ao seu projecto político - e mesmo quanto aos benefícios obtidos em consequência da adesão, que tendem a ser facilmente esquecidos por comparação com diversos insucessos entre os quais ressalta a crise financeira que provocou a quase estagnação económica (e em vários Estados-Membros a depressão).

A próxima reunião do Conselho poderá deste modo imitar as longas discussões sobre o sexo dos anjos que se mantinham enquanto se combatia às portas de Constantinopla, e esquecendo agora uma simples recomendação de P.Drucker : "First things first".

12.Maio.2013
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Lei e Justiça - os gravadores furtados por Ricardo Rodrigues.

Completam-se no presente mês 3 anos sobre o dia em que Ricardo Rodrigues, Deputado, (ou "coisíssima nenhuma", para neste caso usar a original designação  de Vítor Gaspar relativa a eleitos) furtou dois gravadores de jornalistas da revista "Sábado".

Como referi há algum tempo nestas páginas, o furto tinha como objecto, conforme reconhecido pelo próprio, impedir por meios legais a publicação de uma entrevista que tinha acabado de conceder e que estava registada naqueles gravadores, e que assim constituiriam meio de prova para tal procedimento, a ser requerido em tribunal (como se tal furto pudesse ter impedido os jornalistas de registarem a entrevista por meios tradicionais...).

O país assistiu entretanto ao facto de Ricardo Rodrigues ter sido depois de tal furto designado para diversos e importantes cargos oficiais no âmbito das suas responsabilidades parlamentares, sem que  a Assembleia da República tivesse criticado formalmente o seu comportamento..
  
Foi assim julgado, se bem que só ao fim de 2 anos e não pelo acto de furto em si (passível de pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa) mas apenas no âmbito de atentado à liberdade de imprensa, pois a apreensão de quaisquer materiais necessários ao exercício da actividade jornalística é punível com pena de prisão de 3 meses a 2 anos ou multa de 25 a 100 dias, se pena mais grave lhe não couber nos termos da lei penal, acrescendo que se o infractor for agente do Estado e agir nessa qualidade a pena sobe para prisão de 3 meses a 3 anos ou multa de 30 a 150 dias.
  
Tal condenação limitou-se apenas a uma multa de 110 dias a 45 euros diários, o que perfaz 4950 euros, indo em meu entender contra o espírito da lei, pois um  Deputado tem especiais responsabilidades no exemplo que deve dar aos cidadãos, em particular num regime democrático cuja essência está na liberdade de expressão, pelo que entendo que a punição deveria ter sido de prisão efectiva.

Anunciou que iria recorrer da sentença, renunciando às funções de representação da Assembleia da República no Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários (!), assim como ao lugar de suplente no - imagine-se - Conselho Superior de Informações, mas mantendo o lugar de deputado, o que o fez entrar num processo de contradição evidente, acrescendo que mantem os cargos de Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, membro da Comissão Permanente da Assembleia da República, e membro da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias...

Já decorreu quase um ano desde a condenação, e não são conhecidos os resultados do recurso anunciado (do qual possivelmente decorrerão outros para as instâncias superiores, quiçá até ao Tribunal Constitucional - podendo eventualmente ser "isaltinados" mediante o uso a subterfúgios dilatórios diversos...).

A imagem da Assembleia da República sai ferida deste assunto, quer por permitir um quadro legislativo em que a lentidão e as manhas processuais proliferam, quer por não estabelecer a celeridade processual em casos em que os arguidos sejam detentores de cargos públicos, ou por permitir a manutenção em funções de um Deputado que em qualquer outro país democrático teria de imediato renunciado ao mandato em casos análogos a este.

Este e outros exemplos ferem o regime democrático,.aumentando a crescente desilusão que sobre ele muitos cidadãos expressam.

5.Maio.2013.
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A última reunião de uma Assembleia de Freguesia.

Em 23 de Abril de 2013 teve lugar a última reunião em que a Assembleia de Freguesia de Algés teve a oportunidade de no período antes da Ordem do dia evocar a data de 25 de Abril de 1974 como a que permitiu a criação de condições para a instituição do Poder local democrático, evocação que tradicionalmente ocorria cerca do aniversário daquela data.

Foi a última porque a partir das próximas eleições de Outubro do corrente ano passará a existir uma "super-freguesia" agregando três outras freguesias (passando assim dos cerca de 20000 eleitores actuais para perto de 50000) na sequência de uma das mais escandalosas disposições do "Memorando de Entendimento" assinado em 2011 entre três instituições internacionais e o Governo português.

Escandalosa porque a coberto de uma pretensa racionalização da estrutura do Estado, que previa agregações de concelhos e de freguesias, o Governo actual optou por propor à Assembleia da República disposições visando apenas a agregação de indefesas Freguesias, e "esquecendo" os concelhos provavelmente para não ferir interesses das estruturas partidárias neles implantadas e que constituem o cerne das respectivas organizações políticas.

Acresce que as economias resultantes de tais agregações são de reduzido valor, não se antevendo que venha a haver um significativo acréscimo de produtividade com tal modelo, e que as outras consequências trarão sérias perturbações aos sistemas burocráticos - caso por exemplo dos registos prediais - dado não terem sido estudados e programados com a aconselhável antecedência.

No entanto as piores consequências sob o ponto de vista político advêm da notória falta de coerência do modelo aplicado para a determinação das agregações de freguesias, pois se era desejável terminar com o excesso de freguesias em determinados concelhos como de Barcelos, esqueceu-se que no cada vez mais desértico interior as autarquias eram por vezes o único lugar de comunicação do povo com os sistemas administrativos concelhios, distritais, regionais e centrais - sendo porém óbvio que em diversos casos já não se justificaria a respectiva existência dada a cada vez maior desertificação provocada pela emigração.

Por outro lado, e ao invés de se procurar promover a aproximação entre eleitores e eleitos em tecidos urbanos optou-se por agregações como as ocorridas nos concelhos de Oeiras e Cascais, onde é evidente que a passagem de uma freguesia de 20 mil para 50 mil cidadãos apenas prejudica e fortemente a coesão local.

Pobre país, que afasta os seus cidadãos da verdadeira participação política, restando-lhes as manifestações de rua e os desabafos na Internet e em cartas aos jornais para procurarem nos intervalos entre eleições dar a sua opinião sobre o modo como os seus representantes conduzem os negócios do Estado.

Abril de 2013.
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Detidos em Guantanamo: uma nódoa na imagem dos EUA.

Foi há poucos dias publicado um relatório* elaborado nos EUA por iniciativa de um respeitado grupo independente, o "Constitution Project", e que solicitou a um conjunto de onze pessoas de reconhecido valor a incumbência de analisarem a situação dos detidos em Guantanamo, a maioria desde há mais de dez anos, bem como noutros centros de detenção fora dos EUA.

Dirigido por dois ex-Senadores de grande credibilidade, o trabalho desenvolvido chegou à inequívoca e seguinte conclusão: "the United States engaged in the practice of torture”.

O documento critica também o excessivo uso por parte da Administração de Barack H.Obama de invocação de segredo de Estado para impedir a publicação dos pormenores relativos aos comprovados actos de tortura, bem como para bloquear as reclamações legais das vítimas.

Também muito recentemente foi publicado um impressionante depoimento ** de um detido em Guantanamo, prestado aos advogados da "Reprieve", em que dá a sua explicação para as razões que entende serem de uma detenção desde há 11 anos sem fundamento, e se refere ao modo como está a ser tratado.

Recordemos que uma das promessas marcantes de Barack H.Obama aquando da sua eleição em 2008 era acabar com a situação em Guantanamo.

Ao manter diversas dezenas de pessoas sem acesso a direitos legais e processuais, bem como ao adiar o respectivo julgamento, invocando que não são prisioneiros de guerra, mas sim "combatentes inimigos", o Presidente dos EUA falta a mais uma das promessas que enunciou, e contribui para caracterizar negativamente a imagem de um país tão capaz de actos de grande generosidade e abnegação como os que tem demonstrado.

21.Abril.2013.

* http://www.nytimes.com/2013/04/17/opinion/indisputable-torture-of-prisoners.html?nl=opinion&emc=edit_ty_20130417&_r=1&
** http://www.nytimes.com/2013/04/15/opinion/hunger-striking-at-guantanamo-bay.html?nl=opinion&emc=edit_ty_20130415&_r=0
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Encontro Internacional sobre o espírito europeu.

Ao ligar o televisor, há dois ou três dias, deparou-se-me um jornalista que anunciava uma importante comunicação de Herman Van Rompuy, Presidente da União Europeia.

Tratava-se de uma decisão daquele alto Representante informando que decidira colocar na  agenda da próxima reunião, em 22 de Maio, do Conselho Europeu a que preside, a questão da luta contra os "paraísos fiscais".

Sem tirar o mérito relativamente à importância e oportunidade de tal assunto, confesso que esperaria ouvir o anúncio de uma importante comunicação sobre um debate a propósito do futuro da União Europeia e da Europa na qual se insere, dado o momento de desorientação global que os europeus sentem quanto ao seu porvir.

Não foi por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era no Mundo, foi precisamente dedicado ao "Espírito Europeu", e que tanto viriam a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de instituições europeias que procuravam assumir um papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção de diversas nações europeias procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade.

Pessoas como Aron, Jaspers, Merleau-Ponty, Rougemont, Luckács, Benda e outros reflectiram então sobre as razões que teriam levado tantos intelectuais e pensadores a demitirem-se do seu papel de reflexão sobre as atitudes de políticos que tinham colocado a guerra, as guerras, como solução para os problemas dos povos.

E os que de certo modo terão chegado à conclusão de que não se pode afirmar que existe um "espírito europeu", tantas diferentes culturas o demonstrando, nem por isso terão deixado de sair daquele Encontro pensando que estavam paradoxalmente a procurar descobrir a existência de tal espírito.

O momento por que passa a União Europeia é inegavelmente de profunda desorientação. A ausência de um pensamento político-ideológico que tem caracterizado as reuniões do Conselho Europeu, demonstrando que a condução política não tem prevalecido sobre o pensamento económico-financeiro, em nada contribui para atenuar a perplexidade dos cidadãos face ao que sentem como um "vazio europeu".

Para tal tem em muito contribuído a pobreza intelectual de muitos dirigentes europeus, quer em funções nas instituições da  União Europeia, quer a nível nacional tanto dentro da União como fora dela.

Está assim na hora de os pensadores e intelectuais europeus voltarem a reflectir sobre o "espírito europeu", procurando caminhos que sirvam para que os cidadãos e os representantes que escolhem possam contribuir para que a extraordinária diversidade e riqueza de ideias que têm caracterizado a formação da Europa possa constituir um exemplo para o mundo em termos de paz, tolerância, desenvolvimento, e democracia.

Portugal, de certo modo o primeiro país a iniciar o período de colonização europeia, e um dos últimos a cessá-lo, pode lançar a ideia de um Encontro Internacional sobre "O espírito europeu", privilegiando a participação de pensadores e intelectuais, e que ajude a Europa e a União Europeia a procurarem os melhores caminhos a trilhar no seu futuro no Mundo.

Onde, tal Encontro?

Obviamente, em Sagres.

14.Abril.2013.

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Governo "presidencial".

Tudo leva a crer que as reuniões semanais que o actual Presidente da República tem mantido com os Primeiros-Ministros se terão quase sempre pautado pelo exercício da falta de confiança mútua, obviamente com escalas variáveis de desempenho por parte de cada um dos intervenientes.

Por exemplo - e apenas no que se refere à presente legislatura, pois na anterior abundam episódios duvidosos - será que aquando da preparação do orçamento do Estado para 2013 não terão sido ventilados os problemas decorrentes de eventuais faltas de constitucionalidade dados os precedentes da decisão do respectivo Tribunal conhecida no verão de 2011 ?

Terá o Presidente perguntado se as soluções previstas tinham sido ou seriam objecto de atenta análise jurídica, e terá o Primeiro-Ministro dado tais garantias ?

E uma vez conhecida a apresentação do Orçamento à Assembleia da República não terá o Presidente - após o estudo preliminar pelos seus Assessores - dado de imediato a conhecer as dúvidas que por certo já o assolavam quanto à constitucionalidade de disposições que viriam a ser objecto de apresentação de pedido de fiscalização sucessiva ?

Não terá o Primeiro-Ministro sugerido que tais dúvidas fossem antes apresentadas num quadro de fiscalização preventiva, para evitar possíveis adiamentos de importantes decisões políticas ?

Teria sido evitado o espectáculo surrealista de um Governo criticando acórdãos do Tribunal Constitucional, insinuando perspectivas de poder vir a apresentar pedido de demissão, para depois ir a correr solicitar audiência presidencial posteriormente acompanhada de endeusamento do Ministro das Finanças - e, dado o precedente do acompanhamento parcial por este último, sem idêntica presença do dirigente do partido da coligação.

Tudo isto, baseado na repetição quase ininterrupta de que o Governo dispõe de maioria parlamentar, procurando desde modo alhear-se de responsabilidades que afinal e sem dar por isso aceitou ao emitir o comunicado em que pelos seus termos passou de facto a dar plena cobertura a um Governo que assim passou a ser "presidencial"...

Volto assim a reiterar o que escrevi no "Ponto de vista" precedente sobre a necessidade de uma revisão constitucional que diminua a possibilidade de conflitos deste tipo, dado terem sido quase sempre uma característica dos mandatos presidenciais.

07.Abril.2013.
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"Peixeiradas" semi-constitucionais.

A semana que decorreu proporcionou à generalidade dos portugueses o insólito espectáculo da possibilidade de assistirem a uma intervenção pública do Presidente da República ocorrida sob o pano de fundo de diversos cartazes publicitários de uma empresa de congelação de peixe, acontecimento ainda mais inusitado face ao conteúdo que caracterizou o discurso então proferido - aliás diferente do discurso da "moagem" do dia 6 de Março.

As palavras presidenciais, proferidas no estilo algo sibilino empregado em diversas ocasiões, foram interpretadas pela generalidade dos comentadores como tendo em mente uma antecipação a eventuais críticas que o ex-Primeiro-Ministro José Sócrates P.Sousa lhe viesse a fazer poucas horas depois, em anunciada entrevista televisionada.

Tais críticas forma efectivamente concretizadas, tendo parte importante delas sido centrada em afirmações escritas há um ano pelo Presidente, em que acusava o ex-Primeiro-Ministro de deslealdade institucional.

O que acabo de referir a propósito deste tipo de intervenções tem a finalidade de recordar que estes dois cidadãos foram mandatados - repito, mandatados - para dentro do quadro que lhes foi designado dirigirem o nosso País, e não para procurarem alimentar quezílias ao fim e ao cabo apenas aparentemente provocadas por lutas por maior poder de intervenção na política nacional.

Porém este tipo de conflitos tem ocorrido, embora de forma mais ou menos velada, entre os anteriores Presidentes da República que exerceram mandatos após a entrada em vigor da Constituição de 1976 e os Primeiros-Ministros de então, com especial incidência nos mandatos de recondução, tendo contribuído para a falta de clarificação entre os eleitores a propósito das funções de uns e de outros, e para a consequente degradação da vida política.

Parece assim útil que numa próxima revisão constitucional seja modificado o sistema de eleição do Presidente no sentido de passar a ser escolhido por uma votação mínima de dois terços dos Deputados em efectividade de funções.

Os fantasmas que estiverem na origem do actual sistema eleitoral e que caracterizaram o "Estado Novo" só podiam surgir em regimes de partido único de liberdade política coarctada.

Não é, e espera-se que não será, o caso actual.

31.Março.2013.

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Crédito bancário e investimento.

Parece haver opiniões discordantes sobre a existência em Portugal de crédito bancário para empresas não financeiras, pois enquanto do lado da Banca tem vindo a ser afirmado que não só existe solidez como também disponibilidades financeiras, mas que faltam projectos empresariais que justifiquem a concessão de empréstimos que permitam esgotar a capacidade dos Bancos, já sob o ponto de vista empresarial ouve-se o contrário, nomeadamente invocando-se que as taxas de juro requeridas são incomportáveis.

Esta última alegação é por seu turno contestada pelo sector bancário, que refere que as taxas reais praticadas se situam em valores que embora não sejam baixos não se afastam da média em termos históricos.

Contudo por outro lado é do conhecimento público que o BPN e o BPP se "afundaram", com elevados custos para os cidadãos, e que houve Bancos que tiveram que recorrer aos financiamentos disponíveis no quadro do Programa de Assistência Financeira a Portugal, tendo inclusivamente quanto a um deles as acções em Bolsa descido para valores irrisórios.

Entretanto parece haver consenso no nosso País em que para se atingir antes de 2040 um nível de dívida pública da ordem dos 60% do Produto Interno Bruto (PIB) haverá que renegociar os juros dos empréstimos concedidos à República, e que obter taxas de crescimento no mínimo da ordem dos 3% anuais, para o que seria necessário que o sector exportador crescesse acentuadamente e que ao mesmo tempo o tecido empresarial também se ajustasse à criação de produtos que no mercado interno contribuíssem para a redução de importações - todas estas disposições permitindo fazer recuar o desemprego e a emigração que, conjuntamente com o decréscimo da natalidade e o aumento da longevidade, têm criado sombras negras sobre o nosso futuro.

É assim oportuno recordar que as MPME (Micro, Pequenas e Médias Empresas) são mais de 330 mil (99,5% do conjunto de sociedades do sector não financeiro) e que o emprego nas MPME se situou em cerca de 75% do total, relembrando-se também que as Médias Empresas têm vindo a demonstrar um relevante e crescente desempenho nas nossas exportações.

Assim, uma vez que há opiniões contraditórias sobre a disponibilidade de crédito bancário para empresas, dos valores das taxas de juro, e da existência de projectos empresariais credíveis, seria desejável a concretização de um congresso em que em prazo curto as principais Associações empresariais (nomeadamente as representantes das MPME) e a Banca esclarecessem as dúvidas existentes, pois o desânimo que se sente, em particular nos desempregados, nos trabalhadores precários, e nos que pensam recorrer à emigração, requer acções urgentes para que se possam abrir horizontes a um país que acreditou que a democracia e a vivência europeia corresponderiam aos propósitos de esperança que se desenharam nas últimas décadas.

24.Março.2013.



Encontro Internacional sobre o espírito europeu.

Ao ligar o televisor, há dois ou três dias, deparou-se-me um jornalista que anunciava uma importante comunicação de Herman Van Rompuy, Presidente da União Europeia.

Tratava-se de uma decisão daquele alto Representante informando que decidira colocar na  agenda da próxima reunião, em 22 de Maio, do Conselho Europeu a que preside, a questão da luta contra os "paraísos fiscais".

Sem tirar o mérito relativamente à importância e oportunidade de tal assunto, confesso que esperaria ouvir o anúncio de uma importante comunicação sobre um debate a propósito do futuro da União Europeia e da Europa na qual se insere, dado o momento de desorientação global que os europeus sentem quanto ao seu porvir.

Não foi por acaso que os primeiros Encontros Internacionais de Genebra, realizados em 1946 quando ainda estavam quentes as cinzas do terrível conflito que marcou o início de uma nova era no Mundo, foi precisamente dedicado ao "Espírito Europeu", e que tanto viriam a influenciar os passos que pouco depois se deram e estiveram na origem de instituições europeias que procuravam assumir um papel que corrigindo as perspectivas colonizadoras que tinham caracterizado até então a intervenção de diversas nações europeias procurasse ao mesmo tempo demonstrar a nobreza de um pensamento que afirmasse os princípios da democracia e da igualdade.

Pessoas como Aron, Jaspers, Merleau-Ponty, Rougemont, Luckács, Benda e outros reflectiram então sobre as razões que teriam levado tantos intelectuais e pensadores a demitirem-se do seu papel de reflexão sobre as atitudes de políticos que tinham colocado a guerra, as guerras, como solução para os problemas dos povos.

E os que de certo modo terão chegado à conclusão de que não se pode afirmar que existe um "espírito europeu", tantas diferentes culturas o demonstrando, nem por isso terão deixado de sair daquele Encontro pensando que estavam paradoxalmente a procurar descobrir a existência de tal espírito.

O momento por que passa a União Europeia é inegavelmente de profunda desorientação. A ausência de um pensamento político-ideológico que tem caracterizado as reuniões do Conselho Europeu, demonstrando que a condução política não tem prevalecido sobre o pensamento económico-financeiro, em nada contribui para atenuar a perplexidade dos cidadãos face ao que sentem como um "vazio europeu".

Para tal tem em muito contribuído a pobreza intelectual de muitos dirigentes europeus, quer em funções nas instituições da  União Europeia, quer a nível nacional tanto dentro da União como fora dela.

Está assim na hora de os pensadores e intelectuais europeus voltarem a reflectir sobre o "espírito europeu", procurando caminhos que sirvam para que os cidadãos e os representantes que escolhem possam contribuir para que a extraordinária diversidade e riqueza de ideias que têm caracterizado a formação da Europa possa constituir um exemplo para o mundo em termos de paz, tolerância, desenvolvimento, e democracia.

Portugal, de certo modo o primeiro país a iniciar o período de colonização europeia, e um dos últimos a cessá-lo, pode lançar a ideia de um Encontro Internacional sobre "O espírito europeu", privilegiando a participação de pensadores e intelectuais, e que ajude a Europa e a União Europeia a procurarem os melhores caminhos a trilhar no seu futuro no Mundo.

Onde, tal Encontro?

Obviamente, em Sagres.

14.Abril.2013.

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Governo "presidencial".

Tudo leva a crer que as reuniões semanais que o actual Presidente da República tem mantido com os Primeiros-Ministros se terão quase sempre pautado pelo exercício da falta de confiança mútua, obviamente com escalas variáveis de desempenho por parte de cada um dos intervenientes.

Por exemplo - e apenas no que se refere à presente legislatura, pois na anterior abundam episódios duvidosos - será que aquando da preparação do orçamento do Estado para 2013 não terão sido ventilados os problemas decorrentes de eventuais faltas de constitucionalidade dados os precedentes da decisão do respectivo Tribunal conhecida no verão de 2011 ?

Terá o Presidente perguntado se as soluções previstas tinham sido ou seriam objecto de atenta análise jurídica, e terá o Primeiro-Ministro dado tais garantias ?

E uma vez conhecida a apresentação do Orçamento à Assembleia da República não terá o Presidente - após o estudo preliminar pelos seus Assessores - dado de imediato a conhecer as dúvidas que por certo já o assolavam quanto à constitucionalidade de disposições que viriam a ser objecto de apresentação de pedido de fiscalização sucessiva ?

Não terá o Primeiro-Ministro sugerido que tais dúvidas fossem antes apresentadas num quadro de fiscalização preventiva, para evitar possíveis adiamentos de importantes decisões políticas ?

Teria sido evitado o espectáculo surrealista de um Governo criticando acórdãos do Tribunal Constitucional, insinuando perspectivas de poder vir a apresentar pedido de demissão, para depois ir a correr solicitar audiência presidencial posteriormente acompanhada de endeusamento do Ministro das Finanças - e, dado o precedente do acompanhamento parcial por este último, sem idêntica presença do dirigente do partido da coligação.

Tudo isto, baseado na repetição quase ininterrupta de que o Governo dispõe de maioria parlamentar, procurando desde modo alhear-se de responsabilidades que afinal e sem dar por isso aceitou ao emitir o comunicado em que pelos seus termos passou de facto a dar plena cobertura a um Governo que assim passou a ser "presidencial"...

Volto assim a reiterar o que escrevi no "Ponto de vista" precedente sobre a necessidade de uma revisão constitucional que diminua a possibilidade de conflitos deste tipo, dado terem sido quase sempre uma característica dos mandatos presidenciais.

07.Abril.2013.
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"Peixeiradas" semi-constitucionais.

A semana que decorreu proporcionou à generalidade dos portugueses o insólito espectáculo da possibilidade de assistirem a uma intervenção pública do Presidente da República ocorrida sob o pano de fundo de diversos cartazes publicitários de uma empresa de congelação de peixe, acontecimento ainda mais inusitado face ao conteúdo que caracterizou o discurso então proferido - aliás diferente do discurso da "moagem" do dia 6 de Março.

As palavras presidenciais, proferidas no estilo algo sibilino empregado em diversas ocasiões, foram interpretadas pela generalidade dos comentadores como tendo em mente uma antecipação a eventuais críticas que o ex-Primeiro-Ministro José Sócrates P.Sousa lhe viesse a fazer poucas horas depois, em anunciada entrevista televisionada.

Tais críticas forma efectivamente concretizadas, tendo parte importante delas sido centrada em afirmações escritas há um ano pelo Presidente, em que acusava o ex-Primeiro-Ministro de deslealdade institucional.

O que acabo de referir a propósito deste tipo de intervenções tem a finalidade de recordar que estes dois cidadãos foram mandatados - repito, mandatados - para dentro do quadro que lhes foi designado dirigirem o nosso País, e não para procurarem alimentar quezílias ao fim e ao cabo apenas aparentemente provocadas por lutas por maior poder de intervenção na política nacional.

Porém este tipo de conflitos tem ocorrido, embora de forma mais ou menos velada, entre os anteriores Presidentes da República que exerceram mandatos após a entrada em vigor da Constituição de 1976 e os Primeiros-Ministros de então, com especial incidência nos mandatos de recondução, tendo contribuído para a falta de clarificação entre os eleitores a propósito das funções de uns e de outros, e para a consequente degradação da vida política.

Parece assim útil que numa próxima revisão constitucional seja modificado o sistema de eleição do Presidente no sentido de passar a ser escolhido por uma votação mínima de dois terços dos Deputados em efectividade de funções.

Os fantasmas que estiverem na origem do actual sistema eleitoral e que caracterizaram o "Estado Novo" só podiam surgir em regimes de partido único de liberdade política coarctada.

Não é, e espera-se que não será, o caso actual.

31.Março.2013.


Crédito bancário e investimento.

Parece haver opiniões discordantes sobre a existência em Portugal de crédito bancário para empresas não financeiras, pois enquanto do lado da Banca tem vindo a ser afirmado que não só existe solidez como também disponibilidades financeiras, mas que faltam projectos empresariais que justifiquem a concessão de empréstimos que permitam esgotar a capacidade dos Bancos, já sob o ponto de vista empresarial ouve-se o contrário, nomeadamente invocando-se que as taxas de juro requeridas são incomportáveis.

Esta última alegação é por seu turno contestada pelo sector bancário, que refere que as taxas reais praticadas se situam em valores que embora não sejam baixos não se afastam da média em termos históricos.

Contudo por outro lado é do conhecimento público que o BPN e o BPP se "afundaram", com elevados custos para os cidadãos, e que houve Bancos que tiveram que recorrer aos financiamentos disponíveis no quadro do Programa de Assistência Financeira a Portugal, tendo inclusivamente quanto a um deles as acções em Bolsa descido para valores irrisórios.

Entretanto parece haver consenso no nosso País em que para se atingir antes de 2040 um nível de dívida pública da ordem dos 60% do Produto Interno Bruto (PIB) haverá que renegociar os juros dos empréstimos concedidos à República, e que obter taxas de crescimento no mínimo da ordem dos 3% anuais, para o que seria necessário que o sector exportador crescesse acentuadamente e que ao mesmo tempo o tecido empresarial também se ajustasse à criação de produtos que no mercado interno contribuíssem para a redução de importações - todas estas disposições permitindo fazer recuar o desemprego e a emigração que, conjuntamente com o decréscimo da natalidade e o aumento da longevidade, têm criado sombras negras sobre o nosso futuro.

É assim oportuno recordar que as MPME (Micro, Pequenas e Médias Empresas) são mais de 330 mil (99,5% do conjunto de sociedades do sector não financeiro) e que o emprego nas MPME se situou em cerca de 75% do total, relembrando-se também que as Médias Empresas têm vindo a demonstrar um relevante e crescente desempenho nas nossas exportações.

Assim, uma vez que há opiniões contraditórias sobre a disponibilidade de crédito bancário para empresas, dos valores das taxas de juro, e da existência de projectos empresariais credíveis, seria desejável a concretização de um congresso em que em prazo curto as principais Associações empresariais (nomeadamente as representantes das MPME) e a Banca esclarecessem as dúvidas existentes, pois o desânimo que se sente, em particular nos desempregados, nos trabalhadores precários, e nos que pensam recorrer à emigração, requer acções urgentes para que se possam abrir horizontes a um país que acreditou que a democracia e a vivência europeia corresponderiam aos propósitos de esperança que se desenharam nas últimas décadas.

24.Março.2013.
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Amargura e esperança no sistema político.

 
(Reflexões sobre o sistema político português, na sequência de uma intervenção na SEDES, em 14.03.2013.).

   A SEDES acaba de concretizar em sessão pública a apresentação da "Reflexão nacional sobre o sistema político português", iniciativa a que se associaram múltiplas entidades altamente relevantes no nosso País.
 
   Nessa sessão pedi a palavra para referir os sentimentos contraditórios que tal importante iniciativa me suscitavam:
- a amargura de quem, tendo participado no movimento militar de 25 de Abril de 1974, e depois na organização dos actos eleitorais que consolidaram em 1976 a implantação da democracia, constatava haver um sentimento de profundo desânimo entre muitos portugueses por sentirem que o sistema político português não tem correspondido a grande parte dos seus anseios;
- a esperança de que a presente iniciativa venha a contribuir para uma profunda melhoria do sistema político, motivando os cidadãos para uma participação activa cujos resultados possam fazer acreditar em melhores expectativas na vida de todos nós, e levar a uma maior aproximação entre representados e representantes.

   Assim, e no espírito de esperança que esta iniciativa me provocou, não quero deixar de voltar a mencionar algumas ideias que tenho publicado a propósito deste assunto.
    Entre as diversas hipóteses conhecidas visando a melhoria do sistema político e a desejável aproximação entre eleitores e eleitos, a que terá muitos defensores em Portugal aponta para a criação de círculos uninominais coexistindo com um círculo nacional na eleição de deputados para o parlamento.
    Porém, embora tal sistema prove relativamente bem em países de economias mais desenvolvidas e em que existe um elevado grau de confiança nos representantes eleitos em círculos uninominais bem como no funcionamento do sistema político, o facto é que no nosso país se por exemplo fossem 150 os deputados eleitos através de tal sistema caberia a cada um a representação de cerca de 60000 eleitores, pelo que é lícito perguntarmos se tal proporção possibilita diálogos consistentes e aprofundados com os seus eleitores, e que se tornam muito mais necessários em países onde a democracia não está ainda arreigadamente implantada ou onde o grau de desenvolvimento cultural e económico está longe do desejável.
    Acrescentarei, para demonstrar o distanciamento entre eleitores e representados dentro do actual sistema político, nomeadamente quando os primeiros sentem que aos segundos não lhes são outorgados poderes adequados, um exemplo significativo: a freguesia onde resido tem cerca de 20000 eleitores, dos quais a assistência média às reuniões trimestrais da Assembleia de Freguesia tem sido da ordem das 8 pessoas, e de 5 no que respeita às reuniões públicas mensais da Junta.

    O que se acaba de referir leva a mais uma reflexão sobre a dicotomia existente entre representação e participação na vida política, pois o aumento dos poderes de representação tem estado mais ligado às sociedades cujo grau de desenvolvimento é maior, na medida em que as pressões provocadas por uma arquitectura social cada vez mais competitiva foram reduzindo o tempo disponível para um envolvimento mais intenso na vida política, contribuindo-se assim para a manutenção de um modelo herdado de tempos em que a distância entre eleitores e centros de poder não deixava outras alternativas que não fossem a delegação de poder nos eleitos.

    Estes passaram assim a constituir o que habitualmente se tem designado por “classe política”, que apoiada por uma parte dos cidadãos agregados em partidos políticos assumiu como que um estatuto de natureza profissional dentro de um processo de divisão do trabalho em que a sociedade lhes confere o exercício da direcção política do país.
    Contudo este processo tem muitas limitações, na medida em que a intervenção política dos restantes eleitores apenas se consubstancia com maior incidência nos processos de natureza eleitoral, se bem que tenha aumentado uma forma de participação traduzida na troca de informações e opiniões por via electrónica – embora habitualmente com reduzidos efeitos nos períodos post-eleitorais.
    De tudo isto resulta um afastamento notório entre "classe política" e partidos políticos, por um lado, e eleitores por outro, o qual se traduz nas expressões coloquiais que ouvimos e lemos todos os dias e em que o termo “eles” e as ilações a ele associadas denotam claramente a existência de um significativo fosso consequência de tal afastamento e ao mesmo tempo símbolo da falta de participação na vida pública.

    Assim, uma solução para se procurar melhorar a qualidade da democracia poderia ser a de se fomentar uma maior participação dos cidadãos ao nível local, nomeadamente na vida das freguesias, através da outorga aos seus representantes de competências na eleição de outros órgãos do poder político.
     Poderia deste modo competir ao colégio de Assembleias de Freguesia a eleição de um Senado com poderes significativos no processo legislativo, ou em alternativa a eleição de uma parte do Parlamento em que os restantes deputados seriam eleitos por um círculo nacional, e sempre através do sistema proporcional.
     Ao reforço do poder político dos eleitos nas freguesias deveria logicamente corresponder um aumento das respectivas atribuições e competências na esfera do poder local, incluindo a redistribuição de recursos das câmaras municipais, contribuindo-se deste modo para a descentralização de que tanto se fala, a qual não pode ser só política mas também administrativa e financeira, pois aquela sem o concurso das outras ficaria bastante limitada.
    Tal reformulação implicaria obviamente a reorganização do mapa das autarquias, pois uma participação política aprofundada não é compatível com a existência de freguesias com muitos eleitores.

    Se os cidadãos sentirem que os representantes que elegeram directamente têm mais capacidade para melhorarem as condições de vida do local onde estão radicados, e que têm poderes de intervenção importantes na escolha de parte dos órgãos legislativos nacionais e das assembleias municipais, o seu grau de participação na vida política seguramente aumentará, e os partidos deixarão de aparecer como feudos inexpugnáveis, pois aumentará o grau de permeabilidade entre eles e os cidadãos.
     Trata-se de propostas algo arrojadas, mas que paradoxalmente serão tanto mais necessárias quanto aumente a falta de contacto directo entre as pessoas que a vida moderna tem vindo a impulsionar, e que não é totalmente substituído pelas restantes formas de intervenção possibilitadas pela melhoria do sistema de comunicações, designadamente as de natureza electrónica.
     Aos partidos políticos nada é retirado com a aplicação destes princípios, antes pelo contrário, pois o aumento da participação política a nível local teria decisivo papel na melhoria do respectivo funcionamento e na sua ligação aos eleitores, atenuando-se a o existente fosso entre uns e outros.

    Tais propostas têm porém um obstáculo no que respeita aos limites materiais da Constituição:  a obrigatoriedade do sufrágio directo para a designação dos órgãos de soberania.
     Algo que a presente reflexão promovida pela SEDES poderá ajudar a equacionar.


15.Março.2013.
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Reflexões sobre o sistema político português.

   A SEDES vai concretizar no próximo dia 14 de Março a apresentação pública da "reflexão nacional sobre o sistema político português", iniciativa a que se associaram múltiplas entidades do nosso País.
   Creio assim oportuno recordar algumas intervenções públicas em que me tenho referido a este assunto, inclusivamente no "blog" da própria SEDES.

    Poderá dizer-se que existe consenso na sociedade portuguesa sobre a necessidade de se aperfeiçoar profundamente o sistema político visando o aumento da participação na vida pública e o da tão falada aproximação entre representados e representantes.
    Algumas hipóteses têm sido apresentadas para se melhorar tal aproximação, das quais as mais conhecidas apontam para a criação de círculos uninominais coexistindo com um círculo nacional na eleição de deputados para o parlamento.
    Porém, embora tais sistemas provem relativamente bem em países de economias mais desenvolvidas e em que existe um elevado grau de confiança nos representantes eleitos em círculos uninominais bem como no funcionamento do sistema político, o facto é que a relação proporcional em Portugal entre eleitores e eleitos conferiria a estes a responsabilidade de representar algumas dezenas de milhar de cidadãos, o que está manifestamente longe de poder permitir os diálogos consistentes e aprofundados com os seus eleitores e que se tornam mais necessários em países onde a democracia não está ainda arreigadamente implantada ou onde o grau de desenvolvimento cultural e económico está longe do desejável.
    Em Portugal, se por exemplo fossem 150 os deputados eleitos pelo sistema de círculos uninominais, caberia a cada um a representação de cerca de 60000 eleitores, pelo que é lícito perguntarmos se tal proporção possibilita a existência de contactos frutíferos.
     Acrescentarei, para demonstrar o distanciamento entre eleitores e representados, nomeadamente quando os primeiros sentem que aos segundos não lhes são outorgados poderes adequados, um exemplo significativo: a freguesia onde resido tem cerca de 20000 eleitores, dos quais a assistência média às reuniões trimestrais da Assembleia de Freguesia tem sido da ordem das 8 pessoas, e às reuniões públicas mensais da Junta situando-se em 5.
    O que se acaba de referir constitui mais um contributo para uma reflexão sobre a dicotomia existente entre representação e participação na vida política, pois o aumento dos poderes de representação tem estado mais ligado às sociedades cujo grau de desenvolvimento é maior, na medida em que as pressões provocadas por uma arquitectura social cada vez mais competitiva foram reduzindo o tempo disponível para uma participação mais intensa na vida política, contribuindo-se assim para a manutenção de um modelo herdado de tempos em que a distância entre eleitores e centros de poder não deixava outras alternativas que não fossem a delegação de poder nos eleitos.
    Estes passaram assim a constituir o que habitualmente se tem designado por “classe política”, que apoiada por uma parte dos cidadãos agregados em partidos políticos assumiu como que um estatuto de natureza profissional dentro de um processo de divisão do trabalho em que a sociedade lhes confere o exercício da direcção política do país.
    Contudo este processo tem muitas limitações, na medida em que a intervenção política dos restantes eleitores apenas se consubstancia com maior incidência nos processos de natureza eleitoral, se bem que tenha aumentado uma forma de participação consubstanciada na troca de informações e opiniões por via electrónica – embora habitualmente com reduzidos efeitos nos períodos post-eleitorais.
    De tudo isto resulta um afastamento notório entre classe política e partidos políticos, por um lado, e eleitores por outro, o qual se traduz nas expressões coloquiais que ouvimos e lemos todos os dias e em que o termo “eles” e as ilações a ele associadas denotam claramente a existência de um significativo fosso consequência de tal afastamento e ao mesmo tempo símbolo da falta de participação na vida pública.

    A solução então aventada para se procurar melhorar a qualidade da democracia seria a de se fomentar uma maior participação dos cidadãos ao nível local, nomeadamente na vida das freguesias, através da outorga aos seus representantes de competências na eleição de outros órgãos do poder político.
    A tal reforço do poder político dos eleitos nas freguesias deveria logicamente corresponder um aumento das respectivas atribuições e competências na esfera do poder local, mediante a redistribuição dos recursos das cãmaras municipais, contribuindo-se assim para a descentralização de que tanto se fala, a qual não pode ser só política mas também administrativa e financeira, pois aquela sem o concurso das outras de pouco serve.
    Poderia assim competir ao colégio de representantes das freguesias a eleição de uma parte do Parlamento (ou em alternativa a de um Senado com poderes significativos no processo legislativo), sendo os restantes deputados eleitos por um círculo nacional, ambas segundo o sistema proporcional.
    Os representantes directos do cidadão eleitor assumiriam assim um papel extremamente relevante, mas que não deve ser exclusivo, pois a eleição directa do Presidente da Republica é já um elemento fundamental na nossa tradição política, e assim deve continuar, pois permite o exercício de um poder moderador capaz de compensar eventuais desequilíbrios de natureza política.
    Princípios análogos podem e devem ser aplicados nas eleições para as autarquias municipais, a fim de se minorarem eventuais conflitos de legitimidade, permitindo-se deste modo que os cidadãos eleitos directamente, e que constituirão as assembleias de freguesia, desempenhem assim o papel de “procuradores” privilegiados dos cidadãos que os elegem, sem prejuízo do diálogo que estes podem ter com o “seu” presidente da câmara, vereador, ou presidente de junta de freguesia.
    Tal reformulação implicaria obviamente a reorganização do mapa das autarquias, pois uma participação política aprofundada não é compatível com a existência de freguesias com mais de cinco mil eleitores.
    Se os cidadãos sentirem que os representantes que elegeram directamente têm mais capacidade para melhorarem as condições de vida do local onde estão radicados, e que têm poderes de intervenção importantes na escolha de parte do dos órgãos legislativos nacionais e das assembleias municipais, o seu grau de participação na vida política seguramente aumentará, e os partidos deixarão de aparecer como feudos inexpugnáveis.

    Trata-se de propostas algo arrojadas, mas que paradoxalmente serão tanto mais necessárias quanto aumente a falta de contacto directo entre as pessoas que a vida moderna tem vindo a impulsionar, e que não é totalmente substituído pelas restantes formas de intervenção possibilitadas pela melhoria do sistema de comunicações, designadamente as de natureza electrónica.
    Aos partidos políticos nada é retirado com a aplicação destes princípios, pois a sua intervenção continuaria a processar-se em todos os momentos deste novo sistema eleitoral, e igualmente aquando da eleição dos parlamentos pelos representantes directos do povo, na medida em que aqui os partidos políticos não podem deixar de serem essenciais para o que todos ambicionamos: a melhoria da qualidade da democracia.
    E, por outro lado, o aumento da participação política a nível local teria decisivo papel na melhoria do funcionamento dos partidos políticos e da sua ligação aos eleitores, atenuando-se a separação entre uns e outros.

    Têm - tais propostas - um obstáculo residente nos limites materiais da Constituição quanto à obrigatoriedade do sistema de eleição directa. Algo que o povo poderá resolver.

10.Março.2013.
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Itália, Portugal: insatisfação política.

Os resultados das eleições em Itália demonstraram, através do elevado número de aderentes ao movimento de protesto encabeçado pelo comediante B.Grillo (25 % dos votantes), um profundo descontentamento com os partidos tradicionais e com o próprio sistema político, que permitiu que cerca de 50 conjuntos políticos se apresentassem a uma votação que mesmo assim concitou uma participação da ordem dos 75% dos eleitores.

A arquitectura concebida para as eleições que se realizaram a partir de 1993, com um
complexo sistema que visava a obtenção de maiorias de governabilidade, ruiu fragorosamente pois contribuiu para o aumento do fosso que se criou entre eleitores e eleitos, voltando a colocar-se com agudeza o sempre presente dilema entre representação e participação políticas.

Em Portugal, embora não haja ainda dados objectivos que com a possível independência refiram o número total de manifestantes em todo o país, as manifestações públicas que ontem ocorreram em diversas cidades foram novamente uma demonstração evidente de descontentamento de grande parte dos cidadãos com a falta de equidade - quer aparente, quer real - na imposta redução dos seus rendimentos e no veloz aumento do desemprego, a que se tem juntado a falta de esclarecimento objectivo e convincente das razões que levaram a tais políticas, bem como das expectativas temporais e quantificadas relativamente à desejável melhoria das condições de vida.

Cabe também referir que o crescente peso que a comunicação directa entre as pessoas permite graças à disseminação dos sistemas informáticos, quer por SMS e correio electrónico nomeadamente em rede, introduzindo factores de velocidade de transmissão da informação que potenciam a formação de novos movimentos políticos como o de B.Grillo em Itália e o que em Portugal organizou as manifestações de ontem.

Estas formas de protesto tendem a ocorrer em especial nos países em que o descontentamento político e social cresce e as formações tradicionais se mantêm afastadas dos cidadãos, levando a que o nível de participação directa dos cidadãos na vida política tenha pouca expressão.

Só quando os responsáveis políticos sentirem que a expressão popular do descontentamento pode evoluir para formas violentas é que talvez tentem instituir novas arquitecturas políticas que obviem a tais possibilidades.

Porém, poderá ser tarde, e por outro lado não terão sucesso caso não promovam a participação política a nível local, com tradução em sistemas representativos a nível nacional como os que tenho vindo a referir nestas páginas.

3.Março.2013.
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Símbolos da democracia: em risco.

A queda do "Estado Novo" foi inegavelmente caracterizada por dois símbolos que significaram essencialmente o profundo desejo de liberdade política sentido pela generalidade dos portugueses: o cravo e a canção "Grândola, vila morena".

Durante bastante tempo assim permaneceram, mas nas sessões solenes em que na Assembleia da República se comemorava a data de 25 de Abril de 1974 o cravo passou a ser ostentado ao fim de alguns anos quase apenas pelos participantes cujo posicionamento político se situava mais à esquerda, bem como pelos promotores dos desfiles públicos celebrativos da mesma data.

Lenta e gradualmente a grande maioria dos responsáveis políticos pouco fez para procurar manter o cravo como um símbolo da liberdade, e os desfiles comemorativos como uma verdadeira festa popular partilhada por todos os que desejavam um regime democrático, independentemente das suas opções partidárias.

No entanto a inolvidável canção permaneceu até agora como um símbolo da liberdade, e que se bem que mais cantada em manifestações públicas de predomínio político mais à esquerda mantinha-se respeitada mesmo pelos que a não entoavam, pois assentava nos inatacáveis conceitos de liberdade, igualdade política e fraternidade que caracterizam as modernas democracias.

Porém, o seu recente uso como arma política por discordantes da acção governativa mostra a falta de horizontes que estes têm quando banalizam o uso de uma canção nobre e simbólica, levando a que muitos dos que por certo a cantariam em situações que inequivocamente fossem de comemoração de actos de liberdade política talvez hesitem e pensarão duas vezes antes de o fazer.

Riscos para o papel da canção, maus sinais para a democracia, num país que cava progressivamente a divisão entre os seus cidadãos.

24.Fev.2013.
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 Forças Armadas e condição militar.

Está prevista a realização, no próximo dia 22 de Fevereiro, de um jantar de Oficiais, que terá como tema de debate “Forças Armadas e Condição Militar”, o qual foi inicialmente previsto para que nele participassem apenas Almirantes e outros Oficiais-Generais, na situação de reserva e reforma, mas que foi por estes aberto aos outros oficiais em idêntica situação, e estando já assegurada a participação de um número significativo de ex–Chefes de Estado-Maior (CEM), tendo também a Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) informado que iria prestar apoio à concretização do repasto e difundir a respectiva realização através dos seus próprios meios.

Há portanto diversos níveis de participação previstos: ex-CEM, Almirantes e outros Oficiais-Generais, Oficiais associados na AOFA, e outros Oficiais, tendo sido escolhido um tema de debate que parece estar situado bem dentro das competências de preocupação no âmbito socio-profissional da AOFA, sem que tal possa porém ser considerado como exclusivo desta Associação.

Dado o facto de se tratar de uma iniciativa autónoma de altos Quadros militares coincidente com diversas notícias sobre projectos de reestruturações das Forças Armadas, bem como de novas reduções salariais e de outras compensações ou direitos, nomeadamente na área da assistência em termos de saúde, pode-se admitir que o objectivo inicial de tal jantar se prende com a oposição a tais projectos e reduções, porém numa perspectiva que englobando interesses sócio-profissionais, deontológicos e assistenciais nem por isso deixa de aparentemente os transcender, uma vez que os citados projectos implicam fortes reajustamentos nos efectivos e recursos das Forças Armadas - acrescendo que ocorrem antes da aprovação formal da revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional.

Seria pois mais lógico e transparente que o tema a debater por iniciativa dos promotores - dadas as suas qualificações e o facto de ter sido desencadeada sem a participação da AOFA - fosse a reestruturação das Forças Armadas (em que os parâmetros da "Condição Militar" e os seus reflexos de natureza socio-profissional e assistencial não deixariam por certo de ser abordados, uma vez que são elementos essenciais em qualquer modelo de reorganização).

Assim, podem aqueles Oficiais-Generais defrontar-se com o facto de os propósitos e tema da sua iniciativa (certamente tomada com o fim de colaborarem de modo critico mas também construtivo na desejável reorganização das Forças Armadas) serem eventualmente interpretados pelo País - e pelos militares no serviço activo, nomeadamente os Oficiais e Cadetes - como um pronunciamento com origem principalmente em reacção a disposições governamentais redutoras dos seus salários e outros atributos de natureza assistencial, atitude que poderia detonar outros tipos de procedimentos fora de um quadro democrático num Portugal que passou a viver num regime sem opressão, com liberdade de expressão, e representantes políticos escolhidos em eleições livres - embora com muitas carências sociais, económicas e em matéria de Justiça.

Teria sido preferível que aqueles Almirantes e outros Oficiais-Generais se tivessem reunido sem participação de outros Oficiais, que o tema não fizesse referência à "Condição Militar", mas apenas à reestruturação das Forças Armadas - e que dessem a conhecer as suas preocupações e sugestões às entidades apropriadas.

Teria sido preferível que a AOFA tivesse promovido os necessários debates sobre a "Condição Militar", além dos que já concretizou, e que desse a conhecer as suas conclusões e propostas às entidades responsáveis.

Mas, mais importante, teria sido preferível que a Assembleia da República e o Governo tivessem tomado as iniciativas apropriadas para que em clima de diálogo participativo fossem tomadas decisões que não criassem nos militares - conscientes dos sacrifícios que são necessários para que Portugal retome a sua soberania - a sensação de que são objecto de injustiças e discriminações.

21.Fev.2013.  
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Informação, delegação e participação, em democracia.

Os sistemas de organização política assentes em conceitos de igualdade dos cidadãos que se têm vindo a constituir nas últimas centenas de anos são caracterizados essencialmente pela conjugação da república com a democracia, e obviamente com a adopção dos métodos de sufrágio universal pelos maiores de idade.

Evoluindo de estádios de desenvolvimento político a partir de pequenas comunidades em que os responsáveis pela organização social e económica eram eleitos pelo grupo (excluindo-se logicamente desta análise os grupos em que a direcção política decorria da lei do mais forte, ou da adopção de sistemas hereditários), o seu crescimento populacional e territorial e a consequente organização em Estado obrigou a que os principais dirigentes passassem a constituir um conjunto de representantes das comunidades de base, mas que porém tinham que reduzir tanto mais acentuadamente o contacto com estas últimas quanto maiores a distância ou as dificuldades de deslocações.

Daí a consequência inevitável de os poderes de delegação na direcção do Estado passarem a ser aumentados, bem como o facto de a participação local na vida política diminuir acentuadamente uma vez que tendia a ser reduzida às escolhas dos representantes em eleições periódicas, com as óbvias consequências em termos de afastamento entre eleitores e eleitos.

E à medida que os Estados foram aumentando de dimensão foi sendo constatada a necessidade de se instituirem poderes intermédios de nível regional ou local, a que porém e com poucas excepções não eram atribuídas competências na escolha política dos representantes a nível nacional, e que assim viam mantidos os poderes de delegação e representação conferidos por eleições a nível nacional.

A troca de ideias e de experiências entre os cidadãos foi entretanto evoluindo desde os tempos em que era essencialmente oral, passando por longas e lentas fases em que a escrita e a sua transmissão foi progredindo em função dos métodos de cópia e reprodução, bem como do aumento da literacia e das capacidades económicas para não só ler textos escritos, mas também para difundir o pensamento.

Com o telefone assistimos à expansão da comunicação oral, e com a radio ao crescimento exponencial da informação que tal como já ocorria com a imprensa era quase exclusivamente direccionada a partir de poucos, perspectivas que foram muito aumentadas com a televisão - pese embora o facto de terem crescido as possibilidades de haver muito mais "emissores" tanto na imprensa como na radio e na televisão. Mas esta, cuja unidireccionalidade de informação tanto influenciou o mundo nos últimos 50 anos, não terá sido suficientemente compensada pela oferta de diversas alternativas.

A todos estes factores, que progressivamente foram potenciados a partir do início do séc.XX, veio juntar-se um cuja crescente dimensão já está a modificar o modo como a informação é gerada e circula: a informática e a sua versão em rede mundial: a Internet - esta cada vez mais circulando entre telecomputadores e telefones móveis, em crescente utilização por cada vez mais cidadãos contribuindo assim para a melhoria do conhecimento e do leque de opções neste contida.

É inegável que desde o advento da televisão passou a haver muito menor comunicação das pessoas face a face (preferindo-se ficar em casa a ver a TV em vez de visitar amigos). Acresce que o cada vez maior recurso à Internet e às comunicações móveis potencia tal afastamento - ou seja, aumenta o que se poderia apelidar de "comunicação fria" em detrimento da "quente", em que as emoções são transmitidas pelo contacto de proximidade física.

E se na comunicação "fria" pode circular mais informação (nem sempre a "melhor") com vantagens inegáveis quanto à tomada de opções racionais, nada substitui - pelo menos até agora - o contacto pessoal e directo, que permite avaliar com mais consistência e menor margem de erro se o nosso interlocutor nos oferece uma adequada capacidade para nos representar. Avaliação cuja fiabilidade é por certo maior do que aquela que nos é facultada por um qualquer candidato cujas faculdades de representação teatral nos sejam apresentadas em campanha televisiva.

E assim voltamos ao tema com que iniciámos o presente texto, e que assenta na procura do equilíbrio entre representação e participação, e que cada vez mais deve assentar no princípio de esta última dever ser a base de uma saudável vida política e principalmente num tempo em que progressivamente aumenta a informação que nos chega, bem como a sua qualidade, e em que temos possibilidades acrescidas de comunicar a outros as nossas opiniões e outras informações, em vez de passivamente esperarmos por uma próxima campanha eleitoral precedendo a escolha de um "longínquo" representante a nível nacional.

Ou seja: o cidadão deve poder eleger alguém a quem confere o direito de administrar, com os recursos conferidos por lei, o local em que vive, e deve poder eleger alguém que em representação do mesmo local faça parte de um colégio eleitoral que escolha cidadãos com atribuições políticas ao mais alto nível da representação do Estado, bem como ao da representação no nível imediato do poder local

Tal princípio deve ser aplicado em paralelo com os da eleição directa e tradicional dos representantes políticos a nível dos órgãos centrais, regionais, e locais do Estado, permitindo-se assim um melhor equilíbrio entre os princípios da representação e da participação.

E - não menos importante - permitiria a cada vez mais necessária abertura dos partidos políticos ao contacto com os eleitores de base, diminuindo o crescente afastamento que em muitos Estados ocorre.

17.Fev.2013
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Candidaturas e ética.

Retomando um tema sobre o qual escrevi nestas páginas há cerca de três meses, a ele volto, pois como era de prever aumentou de tom a discussão pública sobre a interpretação a dar à lei de 2005 que determinou a limitação de mandatos dos presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais, suscitando tantas clivagens de opinião que de imediato fazem deduzir que a lei poderá estar mal elaborada.

A lei determina que o presidente da câmara municipal e o presidente de junta de freguesia, depois de concluídos três mandatos consecutivos, não podem assumir aquelas funções durante o quadriénio
imediatamente subsequente ao último mandato consecutivo permitido, sendo porém omissa quanto ao local do exercício do mandato - o que tem provocado entendimentos (nomeadamente da Comissão Nacional de Eleições, no âmbito das suas atribuições de promoção do esclarecimento dos cidadãos, e de assegurar a igualdade de tratamento em actos eleitorais) de que seria possível voltar a ser eleito numa autarquia diferente.

As questões à volta deste assunto - até porque envolvem anunciadas intenções de candidatura às Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto - já levaram a que políticos e deputados influentes tenham referido que o Parlamento deveria legislar de novo, o que porém não recolhe opiniões consensuais quanto a tal atitude, bem como relativamente ao sentido de nova eventual lei.

É certo que sob o ponto de vista processual haveria vantagem em que ocorresse uma clarificação, pois em termos formais quaisquer impugnações de candidaturas só poderão ocorrer quando forem apresentadas as candidaturas, cerca de 50 dias antes das eleições, seguindo-se um processo que poderá chegar à interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e cuja decisão final poderá ser proferida apenas a cerca de um mês da data das eleições, com todas as consequências imagináveis nomeadamente no caso de as impugnações abrangerem algumas dezenas de municípios e centenas de freguesias ...

Acresce que no presente caso das eleições para as Câmaras Municipais e Assembleias de Freguesia há situações curiosas que aparentemente não estão claramente definidas, pois a citada lei de 2005 não impede que alguém que tenha exercido um cargo de Presidente de Câmara ou de Freguesia se candidate a mandato na mesma autarquia desde que não se apresente em primeiro lugar na lista de candidatos, pois poderá exercer um mandato como vereador, ou que no caso das novas "Uniões de Freguesias" se aproveite para aparecer de novo num território autárquico onde já terá exercido funções em parte dele - caso que mostra uma vez mais o desastre político provocado pela infeliz Reorganização Administrativa do Território das Autarquias (RATA), em lei de título aliás apressadamente corrigido para se ler "Freguesias" em vez de "Autarquias"...

Por outro lado, e no caso de se candidatar a Presidente noutra autarquia, pareceu-me numa primeira leitura da legislação que não estaria obrigado (ou obrigada) a residir no respectivo território, embora os seus proponentes devam fazer prova de recenseamento na área respectiva - o que demonstra o espírito da lei uma vez que as autarquias locais devem ser presididas por quem nelas reside (e eu acrescentaria um prazo mínimo de residência que por certo contribuiria para um melhor conhecimento das questões relativas à autarquia em causa).

Penso pois que há que evitar, por aperfeiçoamentos legislativos claros e que respeitem o esírito do sistema democrático, que apareça a figura do "candidato-estrela" que seria recrutado, um pouco à semelhança dos jogadores de futebol profissional ou dos administradores de delegações regionais de empresas multinacionais, para "gerir" uma outra autarquia, em situações que poderiam chegar ao limite de alguém que após três mandatos muda de "equipa" e vai para "seara" alheia onde poderá permanecer mais doze anos, rendendo depois alguém que saíu de bom "porto" para outros doze anos e assim sucessivamente durante mais algumas dúzias de anos - quiçá acabando a sua vetustez, qual jogador em fins de carreira, em "barrancos"...

Um princípio aceitável poderia ser o de serem permitidas recandidaturas, desde que não consecutivas, para os cargos de Presidente da República e de Presidentes de Autarquias, possibilitando-se deste modo que o exercício do mandato não fosse em grande parte condicionado pelo desejo de uma reeleição para um segundo mandato consecutivo, permitindo-se assim ao eleitorado comparar desempenhos.

No que respeita aos Deputados, a situação tem contornos algo diferentes, pois representam todo o país e não os círculos por onde foram eleitos; mas tal não deve impedir a necessária e apropriada reflexão dos cidadãos e dos seus representantes sobre tal matéria.

Tudo isto deveria levar à meditação sobre o que poderiam numa democracia ser os limites aceitáveis para recandidaturas em eleições para cargos políticos, bem como quais os limites temporais de cada exercício de mandato, processo cujos resultados teriam tradução em adequada revisão constitucional que se debruçasse sobre a organização do poder político - sem esquecer a necessidade do fomento da respectiva participação local.

10.Fev.2013.
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As gerações (jerações...) que nos têm dirigido.

Não foi por acaso que no título deste texto escrevi "jerações"...

Com isto quis significar que as gerações que têm dirigido a governação do nosso país desde há cerca de 30 anos têm vindo essencialmente das "Juventudes" das habitualmente designadas "máquinas partidárias", com as consequentes deficiências, na grande maioria dos casos, decorrentes da falta de qualidade na respectiva cultura - tanto global, como política - e na expressão de projectos para o futuro sustentados e coerentes.

A respectiva ascenção dentro das hierarquias dos militantes em partidos políticos mostra bem o fosso que se constituiu entre este e os eleitores, e que no meu entender provem da falta de incentivo à participação política ao nível do poder local, em especial nas circunscrições que estão ou deviam estar mais próximas do diálogo com os cidadãos.

Tendo-se perdido em 1976, com a aprovação da Constituição, a hipótese de organizar o poder local em moldes que permitissem uma maior osmose entre o eleitorado e os seus representantes a nível das freguesias, e com a impossibilidade constitucional de se permitir a existência de eleições indirectas susceptíveis de constituirem por exemplo uma segunda Câmara parlamentar, o nível de participação política ficou fortemente reduzido, levando ao predomínio dos "aparelhos" partidários na escolha dos dirigentes a propor aos eleitores, levando assim a que Portugal pautasse a sua vida política com predomínio excessivo da representação periódica traduzida nos processos previstos nos calendários eleitorais - o que se é suficiente e consensual em países com longas tradições nesta área e com economias sustentadas já deixa a desejar noutros países em que tal não ocorre e deveria ser suprido por sistemas fomentadores da participação política.

Outra consequência do afastamento de muitos cidadãos relativamente à participação na vida política nos moldes actuais tem sido o alheamento de pessoas que pelo seu valor poderiam dar um contributo útil para o futuro de Portugal, notando-se que a qualidade do pensamento político da generalidade dos dirigentes partidários mais jovens deixa muito a desejar se comparada por exemplo com a de Miguel Pinheiro, Sérgio Figueiredo, Martim Avilez ou Pedro Santos Guerreiro - para só citar algumas pessoas que têm tido papel de relevo nos meios de informação pública.

Muitas outras personalidades poderiam ser igualmente citadas, mesmo entre as que se situam em grupos etários mais elevados, bem como outras mais jovens que começam a despontar e que ainda não ponderaram a hipótese de emigrar. 

Porém parece que estamos num beco sem saída no que respeita ao aumento do grau de participação política, pois a solução que evoquei relativamente aos processos eleitorais a nível local quanto a eleições indirectas está barrada por um limite no que respeita a revisões constitucionais, uma vez que têm que respeitar o sufrágio directo na designação dos titulares electivos dos órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local.

Um ciclo sem fim á vista, em que as novas "jerações" se perpetuam sem melhoria da respectiva qualidade ?

4.Fev.2013
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Eleições, recenseamento, votações.

Caso o Tribunal Constitucional não dê provimento a diversas alegações de inconstitucionalidade que eventual e provavelmente lhe sejam presentes a propósito da inconstitucionalidade da "troikada" lei de reorganização territorial das Freguesias haverá que tomar providências no sentido de o recenseamento eleitoral ser reajustado de acordo com o novo mapa de Freguesias e de "Uniões de Freguesias" - ("troikada" porque decorreu de iniciativa estrangeira, com cumplicidades nacionais, visando reduzir a "enorme" quantia dos cerca de 200 milhões de Euros de encargos com as Freguesias, sem curar de saber se os custos sociais e políticos justificariam tão apressada e mal baseada reforma, que vai aumentar ainda mais o distanciamento entre cidadãos e eleitos). 
O reajustamento que será necessário é devido ao facto de muitos eleitores mudarem de "freguesia" e de as novas circunscrições passarem a ter eleitos que representam os cidadãos correspondentes a um território maior, sendo assim obrigatória a determinação de novos mapas de representantes locais.
Por outro lado, o facto de a estrutura do recenseamento eleitoral assentar desde 2008 (por lei aprovada por unanimidade na Assembleia da República) na transposição automática dos dados de identificação civil (Cartão de cidadão ou Bilhete de identidade) dos cidadãos maiores de 18 anos de idade obrigará a que os Números de Eleitor sejam modificados também nas freguesias que se mantenham mas sejam agregadas, de modo a que os cadernos eleitorais possam reflectir os novos conjuntos de cidadãos eleitores mesmo que não venha a haver grandes modificações nos locais habituais de voto. 
Acresce que para efeitos de notificações pelo correio relativamente a novas "freguesias" e a Números de Eleitor irão verificar-se dificuldades caso os Códigos Postais não sejam ajustados adequadamente pelos CTT, pois poderá ocorrer que a metodologia seguida por esta empresa no desenho do mapa nacional daqueles códigos não se coadune com a nova reorganização territorial.
Todas estas questões deveriam estar estudadas pelo Governo e pelo Parlamento logo a partir do momento em que foi decidido propor-se um novo mapa territorial, bem como muitas outras com elas relacionadas, como por exemplo com o facto de as freguesias constituirem a base de inúmeras operações de natureza estatística, esperando-se que a recente criação de uma estrutura temporária composta por 5 Secretários de Estado (dos quais um acaba de se demitir) e 7 Directores-Gerais consiga realizar o trabalho que devia estar a ser prosseguido há mais tempo - conforme a quantidade e qualidade das entidades que a compõem fale por si quanto ao nível das dificuldades suscitadas pelas questões referidas - e que não deixarão de ter alguma tradução nos meses que precederão as eleições previstas para o corrente ano quando "freguesias" em "desaparecimento" serão solicitadas a colaborar em diversas das necessárias operações preparatórias.
Entretanto a opinião pública continua a ser agitada por questões que recorrentemente são levantadas em anos com eleições previstas, incidindo sobre a provável existência de muitos emigrantes no recenseamento eleitoral, mas esquecendo que foi o Parlamento que unanimemente estabeleceu o princípio anteriormente referido quanto ao uso dos dados de identificação civil, o que terá continuado a permitir que portugueses  habitualmente radicados no estrangeiro declarem ter a sua residência no território nacional.
Este problema ´poderia ser colmatado em sede de revisão constitucional, com o sugeri nestas net-páginas e na imprensa já em 2011, através da aplicação do princípio de não serem contabilizadas as abstenções, o que não prejudicaria as eleições em círculo nacional (único) como o são as do Presidente da República e dos Deputados ao Parlamento Europeu, e introduziria maior justiça nas eleições de Deputados à Assembleia da República, na medida em que a distritos com maior emigração - onde há muitos eleitores não residentes habitualmente - não seriam atribuídos mais Deputados do que os que correspondessem ao verdadeiro "peso" eleitoral dos respectivos círculos, argumento que seria igualmente válido para as eleições locais (nestas, contribuindo-se para um correcto ajustamento do número de eleitos). 
(Por feliz coincidência de opiniões o anterior Presidente do CDS/PP, Dr.Manuel Monteiro, apresentou em 2012 na sua tese de Doutoramento propostas análogas, que aliás tem vindo a defender em diversas intervenções públicas).
Haveria entretanto que manter uma excepção quanto ao número de Deputados pelos círculos da emigração, para os quais se manteria o actual sistema, bem como nos referendos, para cuja validade a Constituição impõe que a participação seja superior a 50 por cento dos inscritos, e obviamente instituir limites mínimos de eleitos em cada circunscrição.
Assim, os mapas de eleitos seriam elaborados a seguir à publicação dos resultados oficiais de cada círculo - e não antes, como sucede actualmente.
Aguardemos que o Parlamento se pronuncie sobre todas estas questões ...
27.Jan.2013.

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O "Tratado orçamental" e os 4 mil milhões.

Muito discretamente entrou em vigor no passado dia 1 de Janeiro o "Tratado orçamental" que institui regras ainda mais apertadas no que respeita ao equilíbrio orçamental e ao "peso" da dívida pública nos Estados-membros que o ratificaram, entre os quais Portugal (aliás o primeiro a fazê-lo), regras essas que produzem efeitos no direito nacional o mais tardar em 1 de Janeiro do próximo ano.

É estabelecido um limite estrutural para o desequilíbrio das contas públicas que não deverá exceder 0,5 % do produto interno bruto (PIB) a preços de mercado, em prazo que será proposto pela Comissão Europeia tendo em conta os riscos para a sustentabilidade específicos do Estado-membro, e deve ser reduzida progressivamente a dívida pública para o limite de 60% do PIB - acções que segundo a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) ao Parlamento implicarão uma consolidação orçamental adicional que deverá obrigar a excedentes primários mais elevados, superiores a 4% do PIB até 2020.
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Por outro lado seria essencial assegurar uma taxa de crescimento do PIB que permitisse assegurar uma diminuição acentuada da dívida pública - e a título de exemplo o retorno aos níveis de 60% que se constatavam antes de 2007 só seria possível em 2035 se tal taxa fosse de 5% ao ano !

Estes dados ajudam a compreender a razão do atabalhoamento governamental ao encomendar um estudo ao FMI (esquecendo que seria mais lógico solicitá-lo a alguém da "casa europeia", ou seja à Comissão dado que a esta entidade competirá analisar os riscos de sustentabilidade tal como expresso no Tratado em causa), e ao divulgá-lo de modo tosco, acompanhado da convocação de cerca de 30 pessoas para de modo igualmente artesanal discorrerem sobre a reforma do Estado - que não passariam de reduções drásticas de despesas no valor dos muito anunciados 4 mil milhões de Euros..

É que se constatou que o desequilíbrio do orçamento de natureza estrutural é de tal modo elevado que só pode ser diminuído através de mais impostos - que causam ainda maior arrefecimento na economia, que em vez de crescer se retrai - ou de redução da despesa pública.

Daí a necessidade de à pressa se obterem diminuições substanciais nas despesas do Estado. Daí o tal valor dos 4 mil milhões de Euros, que permitiriam (por certo ainda acompanhados por alguma e ainda significativa carga fiscal) uma apresentação de contas já dentro dos primeiros passos (de Coelho...) no sentido da consecução dos objectivos fixados no Tratado.

E tudo isto apoiado naqueles que acreditam que a redução do desequilíbrio orçamental permitirá o propalado "regresso aos mercados" dentro de poucos meses transformando a Banca portuguesa num enorme motor de crescimento, apoiada por fluxos de investimento estrangeiro que verão em Portugal um "El dorado" para os seus lucros...

Mas - e os portugueses ? Os que emigram, os que estão desempregados sem perspectivas, os pequenos empresários falidos, os que não conseguem crédito para o desenvolvimento, os mais idosos sem apoios, os doentes?

Serão "pequenos pormenores" de um "ajustamento" feito à pressa? Esquecendo a necessidade de uma verdadeira participação das pessoas na definição de alternativas e de modos para serem obtidas por forma mais gradual e justa ?

Esquecendo que há instrumentos na União Europeia que permitiriam a concessão de investimentos às pequenas e médias empresas susceptíveis de reanimarem a economia e o crescimento, sem prejuízo dos esforços de ajustamentos nos desequilíbrios orçamentais dos Estados-membros. E, no caso português, só agora "descobrindo" a necessidade de um Banco de Investimento - mas apenas para administração de reduzidos fundos europeus de apoio estrutural.

Tudo isto é mais uma demonstração de um exercício de poder governamental que apesar de tentar demonstrar boa vontade tem sido caracterizado por navegar à vista e com a simplória ilusão de que os "mercados" vêm aí e rapidamente para nos ajudar.

19.Janeiro.2013.

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Jardim condecorado com uma medalha militar...

Segundo o Decreto -Lei n.º 316/2002, de 27 de dezembro, as medalhas privativas do Ministério da Defesa Nacional, do Estado-Maior-General e dos ramos das Forças Armadas destinam-se a galardoar os militares
e civis, nacionais ou estrangeiros, que, no âmbito técnico-profissional, revelem elevada competência, extraordinário desempenho e relevantes qualidades pessoais, contribuindo significativamente para a eficiência, prestígio e cumprimento da missão do Ministério da Defesa Nacional, do Estado-Maior-General das Forças Armadas ou do respectivo ramo.

É de realçar, desde já, que o respectivo âmbito se circunscreve à área técnico-profissional...

Segundo a imprensa, de que li atentamente diversas versões credíveis para ter a certeza de que não estava a ser alvo de uma burla - tão comum nos tempos que correm - o Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, foi agraciado recentemente com a medalha militar da Cruz de S. Jorge, de primeira classe, imposta pelo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, em "reconhecimento pelos serviços prestados que em muito contribuíram para a eficiência e cumprimento das Forças Armadas Portuguesas na Madeira", e que foi entregue em cerimónia pública onde estiveram presentes o Representante da República, o Presidente da Assembleia Legislativa, e o Bispo do Funchal, além de outras individualidades.

O Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, terá dito durante a cerimónia respectiva nutrir pelo governante madeirense "respeito e admiração", reconhecendo-lhe "carisma", "patriotismo", "prestígio", "pragmatismo", acrescentando tratar-se de um "verdadeiro líder, homem de honra e de uma só palavra", realçando também a "postura" do Presidente do executivo madeirense em matéria de cooperação institucional com os três ramos das Forças Armadas.

Cabe assim recordar, dado que a memória colectiva por vezes é curta, os múltiplos comportamentos pautados por profundas grosserias relativamente a diversos dos mais altos responsáveis do Estado demonstrados por aquele agente público, bem como os reiterados despautérios em matéria de gestão dos réditos públicos, e o inconcebível comportamento institucional face a um dos anteriores Comandantes da Zona Marítima da Madeira que apenas procurava cumprir várias disposições legais.

Para além do espírito da lei apontar para ser necessário o exercício de qualidades pessoais no âmbito técnico-profissional - não constando que o Presidente do Governo Regional em causa tenha desempenhado funções de tal tipo - os encómios proferidos na cerimónia pelo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas parecem ser notoriamente desajustados face ao perfil da personalidade agraciada.

O tempora ...

13.Janeiro.13
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Recapitalizações bancárias.

Parece que o Governo não tirou as ilações necessárias da desastrosa nacionalização do BPN, cujos resultados negativos continuam a estar presentes e pelos vistos sem muitas hipóteses de solução para os "enormes "buracos" financeiros que contribuem para o agravamento das contas públicas.

Isto, a propósito da utilização na recapitalização do Banco Internacional do Funchal (BANIF) de 1100 milhões de Euros ainda disponíveis para tais efeitos no quadro do "Memorando de entendimento" firmado em Maio de 2011.

Aparentemente o motivo que terá levado o Governo a tal decisão terá sido o receio de falência do BANIF, e o eventual efeito de uma "corrida aos depósitos" no sistema bancário, motivo aliás semelhante ao invocado pelo Governo de então quanto ao BPN, rejeitando as propostas apresentadas por Miguel Cadilhe para evitar a nacionalização - estando ainda por conhecer outras razões porventura ligadas à influência de muitas personalidades relevantes nos meios políticos e empresariais com notórios interesses na SLN, cuja osmose com o BPN era bem conhecida.

Diversos analistas nestas áreas consideram que o BANIF não tinha hipóteses de sobrevivência, e que a presente operação não as irá aumentar, pelo que o capital de 1100 milhões de Euros, acrescido dos juros de cerca de 400 milhões que lhe serão devidos pelo facto de se tratar de um empréstimo internacional, acabará por ser um´- mais um - ónus para os contribuintes, que assistirão impotentes à sua provável venda a troco de algumas toneladas de bananas madeirenses ou dos seus equivalentes monetários...

Não esqueçamos entretanto que um dos conceitos de base que terá presidido à elaboração do já famoso "Memorando de entendimento" assenta na pressuposição de que com o "regresso aos mercados" na sequência dos equilíbrios do orçamento e da balança de pagamentos será possível à Banca financiar-se no exterior do país e fora do quadro transitório dos empréstimos do BCE, sendo-lhe então possível conceder mais créditos financeiros, nomeadamente ao tecido empresarial.

Esta perspectiva contribui talvez para explicar as razões que têm levado o Governo a adiar a constituição de um Banco de investimento, pois este acabaria por retirar aos bancos tradicionais parte importante da respectiva capacidade creditícia. E também ajuda a compreender os motivos que estarão na base do aparente desinteresse por um aumento do recurso ao BEI - Banco Europeu de Investimento, quer directamente, quer através da pressão sobre o Conselho Europeu e sobre a Comissão Europeia (aliás parece que está lá em funções uma conhecida personalidade portuguesa...) no sentido de ser demonstrada a vantagem de um papel mais preponderante no financiamento da economia numa Europa em notória recessão.

E tal, sem prejuízo das disposições que visem atingir os necessários e imprescindíveis equilíbrios tanto de natureza orçamental como de proporção de despesa pública face ao PIB.

Será que estas observações querem dizer que o sistema económico e financeiro da União Europeia (e a nível mundial) está excessivamente dependente da Banca privada, pois quando treme acaba por ter que recorrer a formas de recapitalização que não passam de nacionalizações parciais - directas ou indirectas ?


6.Janeiro.2013





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